Jurisprudência - STJ

CIVIL. FAMÍLIA.

Por: Equipe Petições

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CIVIL. FAMÍLIA. RECURSO ESPECIAL. ALIMENTOS PROVISÓRIOS. CORREÇÃO MONETÁRIA. ARTIGOS ANALISADOS: ARTS. 1.710 DO CÓDIGO CIVIL.

1. Ação de alimentos, ajuizada em 30.08.2007. Recurso especial concluso ao Gabinete em 04.08.2011.

2. Discussão relativa à incidência de correção monetária sobre o valor arbitrado a título de alimentos provisórios.

3. Variações positivas na remuneração total do alimentante, de regra, não terão impacto no valor dos alimentos, salvo se as necessidades do alimentado, constatadas inicialmente, não tiverem sido supridas integralmente, ou ainda, quando houver superveniente alteração no elemento necessidade.

4. Enquanto a ação revisional, de fato, tem como finalidade precípua a revisão do valor fixado a título de pensão alimentícia, quando modificada a condição econômica do alimentando ou do alimentante, devendo, para tanto, ser feita uma análise "percuciente do binômio necessidade/possibilidade", como consta do acórdão recorrido, a atualização monetária, visa somente recompor o valor da moeda ao longo do tempo.

5. Por ser a correção monetária mera recomposição do valor real da pensão alimentícia, é de rigor que conste, expressamente, da decisão concessiva de alimentos - sejam provisórios ou definitivos -, o índice de atualização monetária, conforme determina o art. 1.710 do Código Civil.

6. Diante do lapso temporal transcorrido, deveria ter havido incidência da correção monetária sobre o valor dos alimentos provisórios, independentemente da iminência da prolação de sentença, na qual seria novamente analisado o binômio necessidade-possibilidade para determinação do valor definitivo da pensão.

7. Na hipótese, para a correção monetária, faz-se mais adequada a utilização do INPC, em consonância com a jurisprudência do STJ, no sentido da utilização do referido índice para correção monetária dos débitos judiciais.

8. Recurso especial provido.

(REsp 1258824/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/04/2014, DJe 30/05/2014)

 

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JURISPRUDÊNCIA NA ÍNTEGRA

RECURSO ESPECIAL Nº 1.258.824 - SP (2011⁄0073360-5)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : R A L
ADVOGADOS : JOAQUIM DA SILVA FERREIRA E OUTRO(S)
    WILLIAM SANTOS FERREIRA
RECORRIDO : M P S
ADVOGADO : ALIENE PASQUERO LIMA TORRES DE CARVALHO E OUTRO(S)
 
RELATÓRIO
 
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):
Trata-se de recurso especial interposto por R A L, com base no art. 105, III, “a” e “c”, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ⁄SP).
Ação: de alimentos, pelo rito especial, ajuizada por R A L em face de M P S. Indeferida a liminar pleiteada pela ex-cônjuge, foi interposto agravo de instrumento, em sede do qual, em outubro de 2007, fixou-se alimentos provisórios, no valor de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais).
Decisão interlocutória: indeferiu o pedido de correção monetária sobre o valor dos alimentos provisórios, feito pela recorrente, em abril de 2009 (e-STJ fls. 52).
Acórdão: negou provimento ao agravo de instrumento interposto pela recorrente, nos termos da seguinte ementa (e-STJ fls. 245⁄248):
 
EMENTA: ALIMENTOS PROVISÓRIOS – Incidência de atualização monetária – Artigo 1710 do Código Civil – Afastamento, no caso. Decisão mantida – Recurso desprovido.
 
Recurso especial: interposto por R A L, como base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional (e-STJ fls. 251⁄264), aponta ofensa ao art. 1.710 do Código Civil, em razão do acórdão recorrido ter indeferido pedido de correção monetária sobre o valor dos alimentos provisórios.
O dissídio jurisprudencial, por sua vez, estaria configurado entre o acórdão recorrido e os acórdãos proferidos pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, no Agravo de instrumento n.º 70019920347 e nos Embargos de declaração n.º 70018970632, que teriam admitido a incidência da correção monetária anual sobre o valor fixado a título de alimentos, nos termos do art. 1.710 do Código Civil.
Exame de admissibilidade: o recurso especial foi inadmitido na origem pelo TJ⁄SP (e-STJ fl. 317⁄318), tendo sido interposto agravo de instrumento contra a decisão denegatória, ao qual dei provimento para determinar a subida do recurso especial (e-STJ fls. 343).
Parecer do MPF: o i. Subprocurador-Geral da República Pedro Henrique Távora Niess opina pelo provimento do recurso especial.
É o relatório.
 
 
RECURSO ESPECIAL Nº 1.258.824 - SP (2011⁄0073360-5)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : R A L
ADVOGADOS : JOAQUIM DA SILVA FERREIRA E OUTRO(S)
    WILLIAM SANTOS FERREIRA
RECORRIDO : M P S
ADVOGADO : ALIENE PASQUERO LIMA TORRES DE CARVALHO E OUTRO(S)
 
VOTO
 
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):
Cinge-se a controvérsia a verificar há incidência da correção monetária sobre o valor fixado a título de alimentos provisórios.
 
1. Da violação do art. 1.710 do Código Civil.
 
01. O Tribunal de origem entendeu que não é devida a correção monetária na hipótese porque ela “deverá ser objeto de apreciação quando do julgamento da ação alimentar, quando então será feito um exame mais percuciente do binômio necessidade⁄possibilidade, tendo em conta, ainda, a proporcionalidade da fixação da verba alimentar definitiva” (e-STJ fls. 248).
02. Ademais, entendeu o TJ⁄SP que o valor provisoriamente fixado já é suficiente para atender as necessidades da recorrente, além de adequar-se as possibilidades do recorrido, não havendo razão para sua alteração.
03. A recorrente, por sua vez, sustenta que o art. 1.710 do Código Civil garante a atualização monetária do valor da pensão alimentícia, seja ela de que natureza for – provisória ou definitiva – a fim de “manter o real valor da pensão de acordo com a ordem econômica” (e-STJ fls. 257).
04. Não se trata, portanto, segundo a recorrente, de majoração do valor dos alimentos, mas apenas “compatibilização entre o binômio necessidade-possibilidade, na mesma proporção que o reajuste salarial do recorrido, de acordo com a ordem econômica” (e-STJ fls. 259).
05. Na operação lógica que se efetua para a fixação dos alimentos provisórios, vê-se que o julgador, diante do pedido formulado pelo possível alimentado, não se volta para a capacidade do alimentante, mas procura encontrar, diante da análise dos elementos que dispõe e do que vislumbra ser as necessidades do alimentado, o ideal dos alimentos ad necessitatem.
06. É esse o escólio de Rolf Madaleno, que sobre o tema afirma:
 
Para fixar a concreta quantidade dos alimentos o juiz toma como ponto de partida o apuro das necessidades do alimentando, sem poder deixar de considerar, por absolutamente indissociável na análise da quantificação dos alimentos, a estratificação social e econômica das pessoas envolvidas na relação de obrigação alimentar. (in: MADALENO, Rolf – Curso de Direito de Família, 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011 pag. 942).
 
07. Apenas quando ultrapassada essa análise preambular, passa-se a laborar sobre a possibilidade de adequar a realidade conceitual descortinada, às condições financeiras do alimentante. Nessa senda, constatada a existência de suficiente capacidade econômica do alimentante, fixa os alimentos no valor que originalmente concluiu ser o ideal para o sustento do alimentando.
08. Note-se, aqui, que não há perquirição sobre a possibilidade de o alimentante pagar valor maior, pois a necessidade do alimentado foi plenamente satisfeita.
09. Deparando-se o julgador, contudo, com situação contrária, onde o valor percebido pelo alimentante não é suficiente para o pagamento do quantum ideal, será este valor glosado até torná-lo factível com a realidade do alimentante, circunstância que ensejará um acompanhamento de sua fortuna, pois um aumento em sua capacidade poderá se refletir – quando pedido – em um equiparável aumento do valor dos alimentos.
10. Exsurge, dessa visão conceitual do processo de fixação dos alimentos provisórios, que a fortuna do alimentante não está associada, de forma indiscriminada, ao valor desses alimentos.
11. Conforme observei no julgamento do Resp 1.261.247⁄SP, a premissa traduz a ideia de que as variações positivas na remuneração total do alimentante, de regra, não terão impacto no valor dos alimentos, salvo se as necessidades do alimentado, constatadas inicialmente, não tiverem sido supridas integralmente, ou ainda, quando houver superveniente alteração no elemento necessidade. Nesse sentido, o posicionamento de Arnaldo Rizzardo para o tema:
 
quantum não se mede em função dos recursos que oferece o alimentante. Não está este obrigado a dividir o seu rendimento. A responsabilidade limita-se a atender as exigências, v.g., de alimentação, moradia, vestuário, educação e recreação. Não são os alimentos concedidos ad utilitatem, ou ad voluptatem, mas ad necessitatem. O aumento da possibilidade nem sempre impõe a elevação do montante a pagar. (in: RIZZARDO, Arnaldo – Direito de Família, 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, pag. 942).
 
12. Contrario sensu, pode-se afirmar que o aumento na fortuna do alimentante, independentemente da natureza da verba que dá origem a esse aumento, não tem o condão de inflar o valor dos alimentos, se esses já foram convenientemente fixados, pois as necessidades não se aumentam, automaticamente, com a possibilidade de aumento dos ganhos do alimentante.
13. Na hipótese, é certo que, desde a fixação dos alimentos provisórios, em outubro de 2007, até abril de 2009, quando foi feito o requerimento de correção monetária pela recorrente, não houve qualquer alteração nas necessidades da recorrente. Por sua vez, os rendimentos do recorrido sofreram alteração, mas, apenas e tão somente, em razão de reajuste salarial estabelecido na Convenção Coletiva de Trabalho da Federação Nacional dos Bancos FENABAM.
14. Em outras palavras, houve reajuste monetário dos rendimentos do recorrido, sem que tenha havido a respectiva correção monetária da pensão alimentícia fixada em favor da recorrente, não obstante decorridos aproximadamente 2 (dois) anos desde a sua fixação.
15. E é exatamente com esse fundamento que a recorrente pleiteou a atualização do valor. Note-se que não se tratou de um pedido revisional, fundado artigo 1.699 do Código Civil, ou seja, na alteração do binômio necessidade-possibilidade, como aponta o TJ⁄SP, mas apenas de pedido de incidência da correção monetária, conforme previsto no art. 1.710 do mesmo diploma.
16. Com efeito, enquanto a ação revisional, de fato, tem como finalidade precípua a revisão do valor fixado a título de pensão alimentícia, quando modificada a condição econômica do alimentando ou do alimentante, devendo, para tanto, ser feita uma análise “percuciente do binômio necessidade⁄possibilidade”, como consta do acórdão recorrido, a atualização monetária, visa somente recompor o valor da moeda ao longo do tempo.
17. Nesse contexto, consigne-se, por oportuno, que esta Corte sequer admite sua propositura visando a simples correção monetária do valor fixado. A razão dessa orientação busca resguardar a finalidade do art. 1.710 do CC⁄02, que é justamente a de evitar o ajuizamento de periódicas revisões destinadas tão somente a recompor o valor da prestação alimentícia, em decorrência da desvalorização da moeda e consequente perda do poder aquisitivo do valor outrora fixado (REsp 1.046.296⁄MG, de minha relatoria, DJ 8.6.2009; e REsp 611.833⁄MG, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ 16.2.2004).
18. Por ser a correção monetária mera recomposição do valor real da pensão alimentícia, é de rigor que conste, expressamente, da decisão concessiva de alimentos – sejam provisórios ou definitivos -, o índice de atualização monetária.
19. Na hipótese, esse índice não foi estabelecido pelo TJ⁄SP, ao fixar o valor dos alimentos provisórios. Contudo, isso não exclui a incidência da correção monetária. Afinal, conforme já mencionado, não se trata de majoração do valor dos alimentos, mas simples manutenção do seu poder aquisitivo.
20. A propósito da questão, vale transcrever lição de Yussef Said Cahali, ao comentar o art. 1.710 do CC⁄02, in Dos Alimentos, 3ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, 1998, pág. 935-941, verbis:
 
A pauta de reajuste automático ou atualização permanente teve o mérito da dispensa de periódicas revisões da pensão alimentícia determinada pela simples desvalorização da moeda; representando os reajustes certa forma de recomposição do poder aquisitivo da moeda; com a atualização do quantum fica do mesmo modo refeita a defasagem sofrida pela pensão arbitrada.Para Orlando Gomes, "não se compreende a atribuição ao juiz de poder impedir a atualização da dívida pela correção monetária, em decisão que imponha a obrigação. Se o próprio legislador reconheceu a necessidade dos reajustamentos periódicos, não podia deixar ao arbítrio do juiz decidir que não existe em alguns casos, sabido que a deterioração da moeda atinge a todos”.
 
21. No mesmo sentido, Milton Paulo de Carvalho Filho: “A atualização monetária da pensão alimentícia é medida imperativa, diante da realidade inflacionária em que vivemos” (in Código Civil Comentado, 5ª ed., Ed. Manole, 2011, pág. 2017).
22. A partir dessas premissas, verifica-se que, diante do lapso temporal transcorrido, deveria ter havido incidência da correção monetária sobre o valor dos alimentos provisórios, independentemente da iminência da prolação de sentença, na qual seria novamente analisado o binômio necessidade-possibilidade para determinação do valor definitivo da pensão.
23. Aliás, conforme apontado no parecer do Ministério Público Federal, essa sentença, de fato, foi prolatada algum tempo depois do julgamento do agravo de instrumento, tendo sido fixados alimentos definitivos em valor equivalente a seis salários mínimos, pelo prazo de mais 2 (dois) anos (e-STJ fls. 362).
24. Note-se que a sentença definitiva fixou o índice de correção monetária em salários mínimos, conforme é admitido pela doutrina e jurisprudência, não havendo razão para ser excluída a incidência da correção monetária dos alimentos provisórios fixados anteriormente.
25. Conclui-se, portanto, que o acórdão recorrido violou o art. 1.710 do Código Civil ao indeferir o pedido de incidência da correção monetária sobre o valor fixado a título de alimentos provisórios, devendo ser dado provimento ao recurso especial.
26. No que respeita ao índice de correção, a recorrente pleiteia a adoção do IGP-M ou, subsidiariamente, o que foi estabelecido pela Convenção Coletiva de Trabalho 2008⁄2009 da Federação Nacional dos Bancos – FENABAN para reajuste dos rendimentos do recorrido.
27. O entendimento desta Corte, todavia, é no sentido de que não há ilegalidade ou abusividade na adoção do IGP-M para atualização monetária de débitos, quando esse índice foi eleito pelas partes.
28. Na hipótese, não houve estabelecimento do índice de correção pelas partes, seja ele o IGP-M, seja o adotado pela FENABAN, razão pela qual, faz-se mais adequada a utilização do INPC, em consonância com a jurisprudência do STJ, no sentido da utilização do referido índice para correção monetária dos débitos judiciais. Nesse sentido: REsp 775.383⁄RJ, de minha relatoria, TERCEIRA TURMA, julgado em 10⁄08⁄2006, DJ 30⁄10⁄2006, EDcl no REsp 506889⁄MT, Rel. Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA TURMA, julgado em 15⁄02⁄2005, DJ 14⁄03⁄2005, AgRg nos EDcl no REsp 1180886, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe de 13.09.2012; EDcl no REsp 337094⁄MG, Rel. Humberto Gomes de Barros, Terceira Turma, DJ de 29.05.2006; EDcl no REsp 506889⁄MT, Rel. Min. Castro filho, 3ª Turma, DJ de 14.03.2005.
 

Forte nessas razões, DOU PROVIMENTO ao recurso especial para determinar a incidência da correção monetária anual sobre o valor fixado a título de alimentos provisórios, pelo INPC.