Jurisprudência - TRF 4ª R

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL. APELAÇÕES CRIMINAIS.

Por: Equipe Petições

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EMENTA: PENAL E PROCESSUAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. OPERAÇÃO PERSA. ARTIGO 288 DO CÓDIGO PENAL (REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 12.850/2013). QUADRILHA. ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA. ABSOLVIÇÃO DE ZAMIR E DA RÉ MANTIDA, COM ALTERAÇÃO DO ENQUADRAMENTO JURÍDICO. ARTIGO 386, INCISO VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DOS DEMAIS RÉUS COMPROVADOS. CONDENAÇÕES MANTIDAS. EXECUÇÃO IMEDIATA. 1. A Operação Persa foi deflagrada pela Polícia Federal de Santa Catarina para desarticular um esquema de fraudes na concessão de benefícios na Agência da Previdência Social do Município de São José/SC. 2. O delito de quadrilha ou bando, na sua redação original, caracteriza-se por ser formal, permanente e de perigo, consumando-se com a associação estável de pelo menos quatro pessoas para o cometimento de ilícitos penais, independentemente da efetiva prática dos mesmos. 3. O conjunto probatório coligido aos autos não permite a formação de um juízo de valor seguro acerca da prática delitiva por parte de Rosana e de Zamir, inexistindo elementos contundentes que contrariem as versões defensivas apresentadas. Manutenção da absolvição de ambos, com alteração do enquadramento jurídico, quanto à Rosana, para o disposto no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, por força do apelo ministerial. 4. Hipótese em que as as condutas delitivas foram perpetradas de modo organizado, em conjunto, para tal. A associação criminosa verificada não era eventual, haja vista que o esquema criminoso possibilitou a concessão irregular de inúmeros benefícios previdenciários durante anos, além de restar evidente o prévio acerto dos agentes e aperfeita determinação de quais papéis caberiam a cada um deles. 5. Devidamente provados a autoria, a materialidade e o dolo dos acusados Hamilton, Valdomiro, Leomir e Valeri, sendo os fatos típicos, antijurídicos e culpáveis, considerando a inexistência de causas excludentes, a manutenção da sentença condenatória é medida que se impõe. 6. O enunciado sumular 122 deste Regional, aderindo à orientação do Supremo Tribunal Federal (HC 126.292, Plenário, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 17-5-2016), entendimento confirmado no julgamento das medidas cautelares nas ADC 43 e 44 (05-10-2016), bem como reafirmado em sede de repercussão geral (ARE 964246 RG, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 25-11-2016), autoriza que a decisão de segundo grau irradie, integralmente, seus efeitos, é dizer, em toda a extensão do que tiver sido provido pelo julgamento, uma vez (a) decorrido o prazo para interposição de Embargos Infringentes e de Nulidade ou para oposição de Embargos de Declaração, nos casos em que esses forem cabíveis, ou (b) se tiverem sido apresentados tais recursos, (b.1) não forem admitidos pelo Relator, (b.2) assim que forem julgados. 7. Parcial provimento do apelo da acusação e improvimento das apelações defensivas. (TRF4, ACR 5005026-82.2014.4.04.7200, OITAVA TURMA, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, juntado aos autos em 11/03/2019)

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JURISPRUDÊNCIA NA ÍNTEGRA

  

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

 

 

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5005026-82.2014.4.04.7200/SC

 

RELATORDESEMBARGADOR FEDERAL VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

APELANTEVALDOMIRO ALVES SOBRINHO (RÉU)

APELANTELEOMIR MIGUEL SCHEFFER (RÉU)

APELANTEMINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (AUTOR)

APELANTEVALERI DE OLIVEIRA ALVES (RÉU)

APELANTEHAMILTON BERNARDES (RÉU)

APELADOVALMIR GARCIA (RÉU)

APELADOOS MESMOS

APELADOZAMIR PEREIRA (RÉU)

APELADOROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA (RÉU)

RELATÓRIO

O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de HAMILTON BERNARDES (nascido em 7-11-1961), imputando-lhe a prática dos delitos previstos nos artigos 288 e 313-A, na forma do artigo 29, todos do Código Penal; de ROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA (nascida em 27-9-1966), ZAMIR PEREIRA (nascido em 1-12-1954), LEOMIR MIGUEL SCHEFFER (nascido em 31-8-1957) e VALERI DE OLIVEIRA ALVES (nascido em 19-3-1958), imputando-lhes a prática do crime disposto no artigo 288 do Código Penal; VALDOMIRO ALVES SOBRINHO (nascido em 25-7-1955), imputando-lhe a prática dos delitos tipificados nos artigos 171, §3º, 288 e 313-A, na forma do artigo 29, todos do Código Penal; e de Valmir Garcia (nascido em 15-5-1952), imputando-lhe o cometimento da infração penal disposta no artigo 171, §3º, do Código Penal, em virtude dos seguintes fatos delituosos (eventos 1 e 8 do processo originário):

"Conforme consta dos autos do IPL registro n. 0163/2009 (fls. 7614/11111), a Polícia Federal deflagrou a “Operação Persa” destinada a apurar diversos processos concessórios de aposentadoria por tempo de serviço, autorizadas e concedidas na agência da Previdência Social em São José-SC.

Verificou-se, inicialmente, que as aposentadorias ilegais foram deferidas pelo servidor da Previdência, lotado na agência de São José, HAMILTON BERNARDES.

No final das investigações, constatou-se que os benefícios haviam sido intermediados por VALERI DE OLIVEIRA ALVES que captava “clientes” e encaminhava os respectivos documentos ao servidor da Previdência HAMILTON BERNARDES. Ele, VALERI, era o atravessador da fraude, cabendo-lhe a preparação de documentos forjados, para fraudar o tempo de contribuição dos segurados que não preenchiam os requisitos para aposentadoria, a fim de obter vantagem ilícita decorrente dos benefícios ilegais.

VALERI DE OLIVEIRA ALVES, à época, era empregado da empresa União de Transportes, de Araranguá-SC, e nela exercia a função de motorista de ônibus.

Apurou-se, com a “Operação Persa”, que a maior parte dos 12 processos concessórios ilegais de aposentadoria por tempo de contribuição tinha como beneficiário pessoa que exercia a profissão de motorista de ônibus e residia em Araranguá-SC, cidade do domicílio de VALERI DE OLIVEIRA ALVES e da antiga empregadora dele, a empresa União de Transportes.

A partir das investigações decorrentes da “Operação Persa”, observou-se a atuação de uma quadrilha especializada em fraudar o INSS, identificando-se mais de 100 benefícios ilegalmente concedidos por dois servidores da Agência da Previdência Social em São José-SC, mediante apresentação de documentos falsificados, pelos demais integrantes da quadrilha, intermediários entre pretensos segurados e servidores.

Fato 1 (artigo 171, §3º, CP)

No dia 20 de setembro de 2004, VALMIR GARCIA, consciente e voluntariamente, requereu e obteve aposentadoria por tempo de contribuição, fraudulentamente, junto à Agência da Previdência Social em São José-SC, induzindo e mantendo em erro o INSS, mediante contrato de trabalho fictício, para obtenção de vantagem ilícita, consubstanciada percepção de benefício indevido (NB 42/134.227.179-0), no período compreendido entre 20.09.2004 e 30.04.2012, resultando em prejuízo ao INSS no valor de R$ 142.221,74 (cento e quarenta e dois mil reais, duzentos e vinte e um reais e setenta e quatro centavos).

VALMIR GARCIA, no ano de 2004, trabalhava como motorista de ônibus na empresa Brasil Sul Linhas Rodoviárias. Nesta época, VALMIR tinha 52 anos de idade.

Possuindo idade significativamente inferior à necessária para a aposentadoria, VALMIR GARCIA procurou um colega de trabalho, VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, também motorista de ônibus, que estava encaminhando aposentadorias para outros motoristas. Era de seu conhecimento que ele, SOBRINHO, havia encaminhado aposentadorias para, pelo menos, outros 03 (três) motoristas. VALMIR e SOBRINHO, anteriormente, trabalharam juntos na empresa Pluma Conforto e Turismo. Em 2004, VALDOMIRO ALVES SOBRINHO era, também, dirigente sindical no SINTRAFÓPOLIS, sindicato dos motoristas rodoviários, o qual abrangia a categoria dos motoristas de linhas interestaduais.

VALDOMIRO era conciliador no referido sindicato, função que lhe viabilizou o contato com as questões trabalhistas e previdenciárias da categoria. Por conta disso, VALDOMIRO teve condições de angariar diversos motoristas para encaminhar benefícios fraudulentos (adiante será narrado o crime de quadrilha).

Então, VALMIR GARCIA, com idade insuficiente e ciente de que não preenchia os requisitos necessários à aposentadoria, contratou o serviço de VALDOMIRO ALVES SOBRINHO pela quantia de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), a ser paga logo após o recebimento do primeiro depósito do benefício. VALMIR entregou a sua Carteira de Trabalho e Previdência Social a VALDOMIRO ALVES SOBRINHO a fim de que ele preenchesse fraudulentamente o tempo de contribuição necessário e encaminhasse o pedido ao INSS. VALDOMIRO ALVES SOBRINHO , em razão da existência de vínculo por ele mantido com dois servidores da Previdência para a prática de diversas fraudes, não solicitou nem necessitou de procuração outorgada por VALMIR para encaminhar o benefício. VALMIR não precisou se dirigir à Agência da Previdência Social.

A fraude consistiu na inserção de dados falsos no sistema informatizado da Previdência Social promovida por VALDOMIRO ALVES SOBRINHO e HAMILTON BERNARDES, este servidor da Previdência (crime adiante narrado), consubstanciada na modificação do período inicial do tempo de serviço do contrato de trabalho de VALMIR com a empresa Agostinho Bombassaro, que foi inserido no sistema como se tivesse vigorado no período compreendido entre 01.11.1973 e 24.01.1978, quando na realidade foi 01.11.1975 a 24.01.1976, aumentando significativamente o tempo de contribuição, conforme constou do Cadastro Nacional de Informações Sociais. Registre-se que VALMIR, na época de entrada do benefício, possuía apenas 52 anos, idade bastante inferior ao mínimo exigido para aposentadoria por tempo de contribuição (fls. 103/106 e 113/115 – Apenso I, anexo ao IPL).

Após o sucesso da fraude, VALMIR GARCIA efetuou o pagamento de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) a VALDOMIR ALVES SOBRINHO, conforme haviam contratado.

O benefício foi requerido por VALDOMIRO ALVES SOBRINHO na Agência da Previdência Social em São José-SC, em razão do vínculo existente entre ele e dois servidores da referida agência, todos integrantes de uma mesma quadrilha, estabilizada para prática de diversas fraudes.

Fato 2 (artigo 313-A do CP)

HAMILTON BERNARDES, servidor do INSS, matrícula n. 0928684, lotado na Agência da Previdência Social de São José-SC, funcionário autorizado a modificar dados nos sistemas informatizados da Previdência Social, em comunhão de esforços e unidade de desígnios com VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, nos dias 20 e 21 de setembro de 2004, consciente e voluntariamente, inseriu informações falsas no sistema informatizado da Previdência Social, com o fim de obter vantagem indevida, informações estas que subsidiaram a concessão ilegal do benefício previdenciário de Valmir Garcia (NB/134.227.179-0).

Conforme narrado no fato 1, VALMIR GARCIA contratou o serviço de VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, consistente no encaminhamento fraudulento da aposentadoria por tempo de contribuição.

VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, de posse dos documentos de VALMIR GARCIA, encaminhou o expediente fraudulento diretamente a HAMILTON BERNARDES.

Para concessão do benefício, necessário seria que VALMIR GARCIA comparecesse pessoalmente, mediante agendamento, à Agência da Previdência Social, em São José, para realizar o pedido administrativo.

Sem o agendamento prévio para requerimento do benefício e sem exigir procuração de VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, HAMILTON BERNARDES, sem apoio em qualquer documentação para comprovação do vínculo fictício, inseriu os dados falsos, necessários à concessão da aposentadoria, no sistema informatizado da Previdência Social, com o fim de obter indevida vantagem, consistente em parte do pagamento recebido por VALDOMIRO ALVES SOBRINHO.

HAMILTON BERNARDES inseriu informação falsa, consubstanciada na modificação do período inicial do tempo de serviço do contrato de trabalho de VALMIR com a empresa Agostinho Bombassaro, que foi inserido no sistema como se tivesse vigorado no período compreendido entre 01.11.1973 e 24.01.1978, quando na realidade foi 01.11.1975 a 24.01.1976, aumentando significativamente o tempo de contribuição, conforme constou do Cadastro Nacional de Informações Sociais. Registre-se que VALMIR, na época de entrada do benefício, possuía apenas 52 anos, idade bastante inferior ao mínimo exigido para aposentadoria por tempo de contribuição (fls. 103/106 ).

Saliente-se que as condutas de VALDOMIRO ALVES SOBRINHO e HAMILTON BERNARDES, narradas nesta denúncia, são apenas uma das diversas fraudes praticadas por uma quadrilha por eles idealizada (crime adiante narrado), especializada em fraudar o INSS.

As falsidades inseridas no sistema informatizado foram lançadas com o objetivo de que fosse concedido o benefício de titularidade de VALMIR GARCIA, o qual foi efetivamente deferido e gerou prejuízo à Previdência Social no importe de R$ 142.221,74 (cento e quarenta e dois mil reais, duzentos e vinte e um reais e setenta e quatro centavos).

Fato 3 (Quadrilha - artigo 288 do CP)

Entre os anos de 2004 e 2011, VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, HAMILTON BERNARDES, ROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA, VALERI DE OLIVEIRA ALVES, ZAMIR PEREIRA e LEOMIR MIGUEL SCHEFFER associaram-se de modo permanente e estável com o fim específico de praticar diversos crimes de estelionato e inserção de dados falsos nos sistemas informatizados da Previdência Social, a fim de obterem diversas vantagens ilícitas, que resultaram em grande prejuízo da Previdência Social, consubstanciado em, pelo menos, R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais).

Conforme consta dos autos do IPL registro n. 0163/2009 (fls. 7614/11111), a Polícia Federal deflagrou a “Operação Persa” destinada a apurar diversos processos concessórios de aposentadorias por tempo de serviço fraudulentas, autorizadas e concedidas na agência da Previdência Social em São José-SC.

Verificou-se, inicialmente, que as aposentadorias ilegais foram deferidas pelos servidores da Previdência, lotados na referida agência, HAMILTON BERNARDES e ROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA.

No final das investigações, constatou-se que os benefícios haviam sido intermediados por VALERI DE OLIVEIRA ALVES que captava “clientes” e encaminhava os documentos deles aos servidores da Previdência HAMILTON BERNARDES e ROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA. Ele, VALERI, era o atravessador da fraude, cabendo-lhe a preparação de documentos forjados para fraudar o tempo de contribuição dos segurados que não preenchiam os requisitos para aposentadoria, a fim de obter vantagens ilícitas decorrentes das aposentadorias ilegais.

VALERI DE OLIVEIRA ALVES foi empregado da empresa União de Transportes, de Araranguá-SC, exercendo a função de motorista de ônibus, no período compreendido entre 01.07.2005 e 09.04.2008.

Apurou-se, com a “Operação Persa”, que a maior parte dos 12 processos concessórios ilegais de aposentadoria por tempo de contribuição tinha como beneficiário pessoa que exercia a profissão de motorista de ônibus e todos eles eram residentes em Araranguá-SC, cidade da residência de VALERI DE OLIVEIRA ALVES e da antiga empregadora dele, a empresa União de Transportes.

Nos autos do IPL n. 163/2009, foi deferida, pelo Juízo da então 2ª Vara Criminal Federal de Florianópolis-SC, a busca e apreensão nas residências dos segurados, na residência de VALERI DE OLIVEIRA ALVES e na residência do servidor da Previdência Social HAMILTON BERNARDES.

Na residência de HAMILTON BERNARDES foram apreendidos diversos processos concessórios, documentos de segurados, dentre eles documentos de pessoas que tiveram o seus benefícios anteriormente indeferidos.

Resultou da “Operação Persa” a prova de que VALERI DE OLIVEIRA ALVES falsificou documentos para a obtenção fraudulenta de aposentadorias, na Agência da Previdência Social de São José-SC, sob orientação e instrução técnica de HAMILTON BERNARDES. Aposentaram-se, desta forma, Ledio Pedroso, José Marcio Alexandre Dal Pont, Adizio Felicidade Da Costa, Argeu Patricio, Heitor Renato Brum Gomes, Lauri Antonio Americo, Miguel Vicente Teixeira, José Luiz Gomes Marques, Carlos Alberto Parreiras Dias, João De Souza Ferraz, José Maria Schmidt e José De Souza. A maioria destes já foi denunciada, conforme se pode observar do quadro de ações penais adiante inserido nesta denúncia.

De posse destas informações, o INSS promoveu auditoria nos benefícios deferidos por HAMILTON BERNARDES, por meio da qual se verificou a concessão fraudulenta de, pelo menos, mais de 100 benefícios. Tinham em comum, as referidas fraudes, o fato de que foram inseridos diversos contratos de trabalho com empresas transportadoras e grande parte dos segurados exercia a função de motorista de ônibus.

Diante disso, foi possível identificar o início da quadrilha, que envolveu presidentes de sindicatos e outros agentes envolvidos com a categoria dos motoristas de ônibus, conforme a seguir descrito.

HAMILTON BERNARDES, servidor da Agência da Previdência Social em São José-SC, no ano 2000, candidatou-se a vereador pelo Município de São José-SC. HAMILTON, por ser servidor conhecido da Previdência Social, inseriu no “santinho” de campanha, além do seu apelido “Jhon Lennon”, a informação da instituição pública na qual trabalhava, o INSS (fls. 7391/7397).

VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, nesta mesma época, trabalhava na empresa Pluma Conforto e Turismo, como motorista de Ônibus. SOBRINHO desenvolvia, ainda, atividade sindical no SINTRAFÓPOLIS, sindicato dos motoristas Rodoviários Interestaduais. Ele era, neste sindicato, conciliador e, portanto, detinha alguns conhecimentos na área trabalhista e previdenciária, bem como mantinha contato com diversos sindicalizados do setor de transportes.

VALDOMIRO conhecia HAMILTON em razão de residirem no mesmo bairro (Floresta, em São José-SC). VALDOMIRO ALVES SOBRINHO viu o o santinho de campanha de HAMILTON, o qual anunciava que ele trabalhava no INSS, e o procurou a fim de que iniciassem a instrução conjunta de benefícios para diversos sindicalizados do setor de transportes, em regra motoristas de ônibus.

A partir de 2004, VALDOMIRO e HAMILTON praticaram os primeiros crimes de estelionato e inserção de dados falsos no sistema informatizado da Previdência Social.

Os primeiros processos administrativos de aposentadorias comprovadamente intermediados por SOBRINHO, mediante cobrança pelo serviço, foram instruídos nos anos de 2004 e 2005, em favor dos motoristas VALMIR GARCIA (narrado nos fatos 1 e 2 desta denúncia), José Ademir da Silva e ZAMIR PEREIRA, conforme apurado no Inquérito Policial n. 602/2012 (estes dois últimos apurados nos Procedimentos n. 1.33.000.002511/2013-92 e n. 1.33.000.001660/2013- 34 – de titularidade do Procurador da República João Marques Brandão Néto - , cujas cópias estão acostadas às folhas 122/326, anexo ao IPL, arquivo unificado).

ZAMIR PEREIRA, também motorista de ônibus, em conjunto com VALDOMIRO ALVES SOBRINHO e HAMILTON BERNARDES, obteve sua aposentadoria por tempo de contribuição mediante apresentação de formulários falsos de atividades exercidas em condições especiais. Esta é uma das características do modo de operação uniforme nos atos da quadrilha.

Inicialmente, VALDOMIRO ALVES SOBRINHO foi o intermediário entre os motoristas, clientes da quadrilha, e HAMILTON BERNARDES, servidor da Previdência Social. Posteriormente, ZAMIR PEREIRA, também motorista de ônibus, passou a captar clientes para a obtenção das aposentadorias fraudulentas.

ZAMIR PEREIRA e VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, que já mantinham contato contínuo, mantiveram também estreita relação com LEOMIR MIGUEL SCHEFFER, outro motorista de ônibus, e juntos com ele conquistaram diversos outros motoristas como “clientes”.

LEOMIR MIGUEL SCHEFFER (apelido “Gaiteiro”), também motorista de ônibus, foi presidente de outro sindicato de motoristas de ônibus, Grande Florianópolis-SC.

Conforme constou do Ofício 211/2013 (fls. 7499/7501 do anexo ao IPL, arquivo unificado), expedido pelo Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Urbano, Rodoviário, Turismo, Fretamento e Escolar de Passageiros da Região Metropolitana da Florianópolis-SC (SINTRATURB), LEOMIR MIGUEL SCHEFFER, muito conhecido dos sindicalizados pelo apelido “Gaiteiro”, foi Diretor Administrativo de Finanças do Sindicato, no período de 01.12.1996 a 01.12.1998. Posteriormente, LEOMIR foi presidente do mesmo sindicato, no período de 19.12.1998 a 19.12.2001 (à época o Sindicato era denominado SINDIMOC, depois substituído pela denominação SINTRATURB – fls. 7499/7501 do arquivo unificado ). Tem-se, ainda, do ofício, a informação de que LEOMIR, a partir do ano de 1999, passou a demonstrar condições financeiras superiores à da remuneração percebida pela categoria profissional dos motoristas.

Do documento formalizado pelo SINTRATURB, extrai-se, ainda, que LEOMIR MIGUEL SCHEFFER era conhecido da categoria dos motoristas pelo seu serviço de encaminhar aposentadorias perante o INSS, bem como era de conhecimento dos sindicalizados que LEOMIR (“Gaiteiro”) tinha “(...) contatos com bons advogados e funcionários(as) do INSS , o que garantia mais celeridade aos processos de aposentadoria ” (grifou-se) (fl. 7500).

Os demais integrantes da direção sindical, ao tomarem conhecimento de que LEOMIR (Gaiteiro) estava cobrando valores pelo serviço de encaminhamento de aposentadorias, decidiram excluir LEOMIR da chapa da situação, na qual ele era o Presidente, e que concorreria à eleição posterior, em 2001. LEOMIR, então, formou uma chapa de oposição que acabou por perder a referida disputa eleitoral. Todos esses acontecimentos tiveram como impulso e motivação a descoberta do envolvimento de LEOMIR, ZAMIR e VALDOMIRO ALVES SOBRINHO com o encaminhamento de aposentadorias.

Esclarece, ainda, a entidade sindical, que “Nesse período todo, era corrente na categoria comentários sobre ofertas que o senhor Zamir fazia a companheiros de trabalho, no sentido de que, juntamente com o senhor Leomir Miguel e outros , ajudavam em processos de aposentadorias junto ao INSS de Santa Catarina, cobrando uma pequena ajuda de custo. (...)

Valeri Alves dos Santos (sic) e Valdomiro Alves Sobrinho, temos a relatar que fizeram parte da categoria profissional por muitos anos, sem, contudo, participarem da direção do sindicato, apenas sempre se colocando contra todas as atividades sindicais que desenvolvemos e buscando boicotá-las.

De modo geral, é de conhecimento dos membros mais antigos da categoria profissional que os quatro senhores citados, sempre se conheceram e mantinham relações de amizade, sendo que os dois últimos eram linha auxiliar do senhor Zamir na sua tentativa de dividir a nossa entidade sindical, bem como ao senhor Leomir Miguel, quando este foi candidato a re-eleição a Presidência do sindicato ”. (fls. 7499/7501 do arquivo unificado).

LEOMIR MIGUEL SCHEFFER foi motorista de ônibus na empresa Transporte Coletivo Estrela junto com VALERI DE OLIVEIRA ALVES. Foram identificados inúmeros benefícios fraudulentos em que os segurados afirmaram que foram encaminhados ou por VALERI ou por LEOMIR. VALERI foi denunciado em pelo menos 15 processos, conforme quadro de ações penais adiante inserido. Da mesma forma, LEOMIR também foi denunciado por fraudes da mesma natureza, contando com, pelo menos, 14 processos movidos contra si. Em todos estes processos houve a atuação decisiva dos denunciados servidores da Previdência Social HAMILTON BERNARDES e ROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA, que inseriram as informações falsas no sistema informatizado da Previdência Social.

Nos processos concessórios, instruídos com documentos forjados por VALERI DE OLIVEIRA ALVES e LEOMIR MIGUEL SCHEFFER, foi possível identificar erros padrões nos formulários utilizados para comprovar atividades que teriam sido exercidas em condições especiais pelos segurados, a fim de reduzir o tempo de contribuição necessário à aposentadoria.

O formato do formulário por eles forjado possui erros grosseiros. No lado esquerdo do cabeçalho, em regra, está inscrito “Previdência Socia” em vez de Previdência Social. No título, está escrito “Instituto de Seguro Social” em vez de Instituto Nacional do Seguro Social. Estes erros foram notados nos documentos forjados tanto por VALERI quanto por LEOMIR. Ainda, constou do formato do formulário, erro na digitação da palavra exercida, que tem grafada “exercidade”. Praticamente todos os formulários forjados foram juntados aos procedimentos administrativos do INSS sem identificação do subscritor do documento, responsável pela empresa que seria empregadora. Vários desses formulários foram declarados falsos pelas próprias empresas, em resposta a ofícios expedidos pelo INSS em auditoria.

Outra característica da atuação da quadrilha era forjar vínculos fictícios com diversas empresas. Diversos pedidos de aposentadoria foram instruídos com fichas de registros de empregados falsas das empresas de transporte coletivo Emflotur, Ribeironense, Limoense, Viação Trindadense e Santa Teresinha, todas da Grande Florianópolis.

Além das ações penais propostas contra os denunciados, existem mais de uma centena de Inquéritos Policiais nos quais se investigam os crimes de estelionato e inserção de dados falsos, em razão deste modo de operação, característico da quadrilha.

De posse dos formulários e demais documentos grosseiramente falsificados, os servidores da Previdência Social HAMILTON BERNARDES e ROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA inseriam as informações falsas neles contidas e deferiam os benefícios fraudulentos (tabela de ações penais propostas contra eles abaixo inserida).

A quadrilha cobrava, por aposentadoria, uma quantia que variava entre R$ 350,00 (trezentos e cinquenta reais) e R$ 8.000,00 (oito mil reais).

Outra característica da quadrilha, observada em diversos processos concessórios, é o compartilhamento da mesma ficha de empregados em diversos processos, documento no qual nem sequer a foto do segurado era inserida, mantendo-se a mesma da original utilizado como parâmetro para a falsificação.

Registre-se que VALERI DE OLIVEIRA ALVES instruiu o benefício de um irmão seu, também fraudulento, com os documentos dele mesmo. Ele ainda aposentou, fraudulentamente, outro irmão seu (ações penais 5023936- 94.2013.404.7200 e 5002347-12.2014.404.7200).

A captação de clientes, pela quadrilha, é observada pelo vínculo dos agentes com as empresas de transportes e os empregados destas empresas.

VALDOMIRO ALVES SOBRINHO foi funcionário da empresa Pluma Conforto e Turismo, no período compreendido entre 1983 e 2009. Foi colega de trabalho de LEOMIR na empresa.

LEOMIR MIGUEL SCHEFFER, por sua vez, trabalhou nas seguintes empresas de transporte como motorista de ônibus: Jotur, Estrela, Pluma Conforto e Turismo, Santo Anjo da Guarda, Cattani SA Transporte e Turismo. Foi colega de trabalho de VALERI na empresa Estrela.

VALERI DE OLIVEIRA ALVES foi motorista de ônibus nas empresa Santo Anjo, Auto Viação Catarinense, União de Transportes. Embora VALERI tenha negado que trabalhou em qualquer outra empresa transportadora, ele efetivamente trabalhou na empresa Estrela, na Grande Florianópolis-SC, como motorista. Ele, certamente, ocultou este vínculo trabalhista para quebrar a associação com os demais motoristas de ônibus, integrantes da quadrilha. VALERI foi colega de trabalho de LEOMIR MIGUEL SCHEFFER.

Verificou-se, das investigações, que, inicialmente, a organização criminosa captou funcionários das empresas Jotur, Pluma Conforto e Turismo e Biguaçu Transportes Coletivos, conforme se observa da intermediação das aposentadorias realizadas por ZAMIR PEREIRA (Inquérito Policial n. 629/2012, fls. 3115/3636), VALDOMIRO ALVES SOBRINHO (Inquérito Policial n. 602/2012), LUIZ MIGUEL SCHEFFER (Inquéritos Policiais n. 629/2012, fls. 3115/3636, e 205/2013, fls. 6898/7108). Os servidores da Previdência Social que inseriram as informações falsas no sistema foram os ora denunciados HAMILTON BERNARDES, ROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA.

Além da ação da quadrilha nas empresas de ônibus, tem-se que ela passou a captar clientes na empresa Casas da Água. Pelo menos 22 benefícios previdenciários fraudulentos foram concedidos por HAMILTON e ROSANA, tendo a atuação dos intermediários VALERI DE OLIVEIRA ALVES e LEOMIR MIGUEL SCHEFFER (IPLs n. 606/2012, fls. 1402/1513; 607/2012, fls. 2102/2495; 631/2012, fls. 3939/4229; 632/2012, 4230/4516; 649/2012, fls. 5064/5265; 58/2013, fls.5266/5424; 59/2013, fls. 5425/5610; 60/2013, fls. 5611/5794; 61/2013, fls. 5795/5945, 62/2013, fls. 5946/6069; 63/2013, fls. 6070/6237; 201/2013, fls. 6484/6620 – esses intermediados por VALERI -; 620/2012, fls. 2843/3114; 630/2012, fls. 3637/3938, 636/2012, fls. 4832/4963; 113/2013, fls. 6238/6404 (estes intermediados por LEOMIR MIGUEL SCHEFFER). (...)

A atuação dos integrantes da quadrilha é sintetizada da seguinte forma: HAMILTON BERNARDES, servidor da Previdência Social, iniciou os primeiros processos concessórios em parceria com VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, à época dirigente sindical do SINTRAFÓPOLIS.

ROSANA REGIS APARECIDA DA ROCHA, também servidora da Previdência Social, passou a instruir os processos concessórios e auxiliar HAMILTON BERNARDES.

VALDOMIRO, por sua vez, manteve contato e captou clientes em conjunto com LEOMIR MIGUEL SCHEFFER, VALERI DE OLIVEIRA ALVES e ZAMIR PEREIRA, os quais encaminhavam os documentos dos segurados diretamente aos servidores da Previdência, HAMILTON e ROSANA.

Após a descoberta das fraudes, ROSANA e HAMILTON foram processados administrativamente e indiciados pela comissão sindicante (Processo Administrativo Disciplinar n. 35239.000520/2011-74 do INSS), concluindo, a comissão sindicante, pela responsabilidade dos dois e opinado pela demissão deles.

A quadrilha permaneceu estabilizada desde 2004, quando das primeiras concessões de aposentadorias, até o primeiro semestre de 2011, quando ela foi desmantelada com a deflagração da “Operação Persa” realizada pela Polícia Federal (IPL n. 0163/2009, fls. 7614/11111)."

A peça incoativa foi recebida em 31-7-2014 (evento 10, idem).

Instruído o feito, com alegações finais, sobreveio sentença (evento 357, idem), disponibilizada na plataforma eletrônica em 4-6-2017, julgando parcialmente procedentes os pedidos constantes na denúncia para: a) absolver o réu Valmir Garcia da imputação pela prática do crime previsto no artigo 171, §3º, do Código Penal, fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal; b) absolver a ré Rosana Aparecida Regis da Rocha da imputação pelo cometimento do crime disposto no artigo 288 do Código Penal, forte no artigo 386, inciso IV, do Código de Processo Penal; c) absolver Zamir Pereira da imputação pela prática do delito tipificado no artigo 288 do Código Penal, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal; d) condenar Hamilton Bernardes pela prática dos crimes previstos nos artigos 288 e 313-A, ambos do Código Penal, às penas privativas de liberdade, respectivamente, de 1 (um) ano e 3 (três) meses e de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de reclusão, sem substituição por penas restritivas de direitos, e à pena de multa, referente ao segundo delito, de 36 (trinta e seis) dias-multa, na fração de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente em setembro de 2009; e) condenar Valdomiro Alves Sobrinho pela prática dos crimes previstos nos artigos 288 e 313-A, ambos do Código Penal, às penas privativas de liberdade, respectivamente, de 1 (um) ano e 3 (três) meses e de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de reclusão, sem substituição por penas restritivas de direitos, e à pena de multa, referente ao segundo delito, de 36 (trinta e seis) dias-multa, na fração de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente em setembro de 2009; f) condenar Leomir Miguel Scheffer pelo cometimento do crime disposto no artigo 288 do Código Penal, estabelecendo a pena privativa de liberdade em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão, ausente substituição por sanções restritivas de direitos; e g) condenar Valeri de Oliveira Alves pela prática do crime disposto no artigo 288 do Código Penal, fixando a pena privativa de liberdade em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão, ausente substituição por sanções restritivas de direitos.

Quanto às condenações de Valdomiro e de Hamilton pela prática do crime previsto no artigo 313-A do Código Penal, diante do reconhecimento da prescrição com base na pena em concreto entre a data do fato e o recebimento da denúncia, foi declarada a extinção da punibilidade de ambos os réus, com fulcro nos artigos 107, inciso IV, 109, inciso IV, e 110, §1º e §2º (em sua redação antiga), todos do Código Penal (evento 386, idem). Em relação a Valdomiro, por remanescer apenas a reprimenda relativa ao crime de quadrilha, a magistrada a quo procedeu à substituição por penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e prestação pecuniária no valor de 30.000,00 (trinta mil reais).

Irresignados, o representante do Ministério Público Federal e os réus Hamilton, Leomir, Valdomiro e Valeri interpuseram recursos de apelação (eventos 375, 369, 380, 450 e 472, todos do processo originário).

O órgão acusatório, por meio de seu signatário, pleiteou a condenação de Rosana e de Zamir nas sanções cominadas no artigo 288 do Código Penal, alegando, em síntese, a existência de elementos de prova suficientes acerca da autoria e do dolo dos denunciados (evento 375, idem).

A defesa de Valdomiro Alves Sobrinho sustentou, em suas razões de apelação, a necessidade de absolvição do acusado em relação ao delito disposto no artigo 288 do Código Penal, aduzindo a insuficiência de provas quanto à autoria delitiva (evento 450, idem).

Igualmente, a defesa de Valeri de Oliveira Alves postulou, em razões recursais, a reforma da sentença condenatória para absolver o acusado, ante a ausência de comprovação da autoria delitiva; subsidiariamente, a redução da reprimenda privativa de liberdade ao patamar mínimo legal (evento 472, idem).

Por sua vez, Leomir Miguel Scheffer requereu, em suas razões, a absolvição por insuficiência probatória e, alternativamemnte, a redução da pena-base ao patamar mínimo legal e a substituição por sanções restritivas de direitos (evento 13).

Por fim, a defesa de Hamilton Bernardes postulou, em suas razões recursais, a absolvição, considerando a insuficiência de provas quanto à autoria e ao dolo do acusado e a inexistência da permanência/estabilidade necessária à configuração do delito previsto no artigo 288 do Código Penal. Ademais, pugnou pela redução da pena privativa de liberdade para o patamar mínimo legal e pela substituição desta por restritivas de direitos (evento 14).

Com contrarrazões, ascenderam os autos a este Colegiado (eventos 461, CONTRAZ1, 479 e 488, idem).

O Ministério Público Federal atuante perante este órgão ad quem ofereceu parecer opinando pelo não provimento das apelações criminais defensivas e pelo provimento do recurso ministerial (evento 19).

É o relatório.

À revisão.



Documento eletrônico assinado por VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000859125v27 e do código CRC 38668eab.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Data e Hora: 1/3/2019, às 17:3:23

 


 

5005026-82.2014.4.04.7200
40000859125 .V27



Conferência de autenticidade emitida em 28/04/2019 14:21:38.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

 

 

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5005026-82.2014.4.04.7200/SC

 

RELATORDESEMBARGADOR FEDERAL VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

APELANTEVALERI DE OLIVEIRA ALVES (RÉU)

APELANTEHAMILTON BERNARDES (RÉU)

APELANTEVALDOMIRO ALVES SOBRINHO (RÉU)

APELANTELEOMIR MIGUEL SCHEFFER (RÉU)

APELANTEMINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (AUTOR)

APELADOZAMIR PEREIRA (RÉU)

APELADOROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA (RÉU)

APELADOVALMIR GARCIA (RÉU)

APELADOOS MESMOS

VOTO

A controvérsia devolvida a este Tribunal cinge-se à absolvição de ROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA e de ZAMIR PEREIRA da imputação pela prática do delito disposto no artigo 288 do Código Penal (redação anterior à Lei 12.850/2013) e às condenações de HAMILTON BERNARDES, LEOMIR MIGUEL SCHEFFER, VALDOMIRO ALVES SOBRINHO e VALERI DE OLIVEIRA ALVES pelo cometimento do mesmo crime.

1. Contextualização dos fatos

O caso em análise tem origem na chamada Operação Persa, deflagrada pela Polícia Federal de Santa Catarina para apurar um esquema de fraudes em processos concessórios de aposentadorias na Agência da Previdência Social do Município de São José.

No primeiro e segundo fato, ocorridos em 20-9-2004, Valmir Garcia, com o auxílio de Valdomiro Alves Sobrinho, obteve aposentadoria por tempo de contribuição mediante apresentação de contrato de trabalho fictício, cujos dados teriam sido então inseridos no sistema da Previdência Social pelo servidor Hamilton Bernardes, de modo a subsidiar a concessão fraudulenta do referido benefício previdenciário.

No terceiro fato, perpetrado entre os anos de 2004 e 2011, Valdomiro, Hamilton, Rosana, Valeri, Zamir e Leomir teriam se associado de modo permanente e estável com o fim específico de cometer infrações penais - estelionatos e inserções de dados falsos em sistema informatizado da Previdência Social - que facilitassem a concessão de vantagens ilicítas a terceiros, consistentes em benefícios previdenciários fraudulentos, resultando em dano de grande monta aos cofres públicos.

2. Tipicidade

O crime de quadrilha ou bando imputado aos denunciados encontrava-se assim disposto no Código Penal (redação anterior à Lei 12.850/2013): 

"Art. 288. Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos."

O delito em comento é formal, permanente e de perigo, consumando-se com a associação estável de pelo menos quatro pessoas para o cometimento de ilícitos penais, independentemente da efetiva prática dos mesmos. Trata-se de figura delitiva independente e autônoma, cujo objetivo é tutelar a paz pública, consubstanciada no "sentimento de tranquilidade e segurança imprescindível à segurança social" (STF, HC 72.992/SP, 1ª Turma, Relator Ministro Celso de Mello, D.J. 14/11/1996).

Nesse sentido, colaciono julgados deste Tribunal:

"DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. DESCAMINHO. ART. 334 DO CP. QUADRILHA. ART. 288 DO CP. EVASÃO DE DIVISAS. ART. 22 DA LEI 7.492/86. DOSIMETRIA DA PENA. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. CRIME CONTINUADO. PARATAR DE AUMENTO. 1. Configura o delito de descaminho, a importação de prata oriunda do Uruguai, sem a documentação legal exigida. 2. Configura crime de quadrilha, a reunião de forma estável e permanente de quatro pessoas com objetivo de praticar crime. 3. A realização do câmbio não autorizado, com a finalidade de evadir divisas, bem como a remessa de numerário físico a outro País como pagamento pela mercadoria adquirida no exterior sem a devida declaração, consuma o crime do art. 22 da Lei 7.492/86. 4. A incidência de duas circunstâncias (agravante e atenuante) de cunho subjetivo, que não estão abarcadas pelo art. 67 do CP, gera uma neutralização de seus efeitos. 5. No delito do art. 22 da Lei 7.492/86 o montante de recursos evadidos é fator apto a interferir na vetorial "consequências do crime". 6. Na continuidade delitiva, a fração de aumento da pena varia conforme o número de infrações". (TRF4, ACR 5017486-81.2012.404.7100, 8ª Turma, Des. Federal Leandro Paulsen, por maioria, juntado aos autos em 24-7-2017 - destaquei)

"PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. OPERAÇÃO DOSE ÚNICA. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. ARTIGO 288 DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. IMPORTAÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO ILÍCITA DE AGROTÓXICOS. ARTIGO 56 DA LEI 9.605/98. AUSÊNCIA DE PROVA DA PARTICIPAÇÃO DO RÉU. MANUTENÇÃO DA ABSOLVIÇÃO. DESPROVIMENTO. 1. Materialidade, autoria e dolo do crime do artigo 288 do Código Penal devidamente comprovados, em especial pelas interceptações telefônicas realizadas por quase um ano, bem como pelas demais provas produzidas. 2. Estabilidade e permanência da quadrilha comprovadas pelos diálogos captados em quase um ano de interceptações telefônicas e vigilância policial, onde ficaram demonstradas as ações do grupo, algumas até mesmo corroboradas pelas prisões em flagrante, bem como o papel desempenhado pelos acusados na estrutura criminosa. 3. Suficientemente demonstrada a reunião dos condenados com o objetivo de praticar crimes ambientais voltados ao comércio ilegal e reiterado de agrotóxicos. 4. Quanto ao delito do artigo 56 da Lei 9.605/98, não restou inequívoca a participação do réu nas apreensões narradas na denúncia, em que pese comprovada a sua efetiva atuação na associação criminosa. 5. Desprovimento dos apelos." (TRF4, ACR 5002365-55.2013.404.7010, 8ª Turma, Des. Federal Victor Luiz Dos Santos Laus, por maioria, vencido parcialmente o relator, juntado aos autos em 30-10-2017 - destaquei)

Compulsando os autos, verifico que as condutas delitivas foram perpetradas de modo organizado, em conjunto, para tal. A associação criminosa verificada não era eventual, haja vista que o esquema criminoso possibilitou a concessão irregular de inúmeros benefícios previdenciários durante anos, além de restar evidente o prévio acerto dos agentes e a perfeita determinação de quais papéis caberiam a cada um deles.

Fixadas tais premissas, tenho que a conduta imputada aos acusados amolda-se perfeitamente ao delito de quadrilha ou bando, previsto no artigo 288 do Código Penal (redação anterior à Lei 12.850/2013).

3. Materialidade 

A materialidade da infração penal em julgamento pode ser demonstrada pelos seguintes elementos:

a) Termo de declarações dos acusados Leomir, Valeri, Zamir, Valdomiro e Hamilton em sede policial (evento 11, OUT2, do Inquérito Policial 602/2012-4-SR/DPF/SC);

b) Ofício do Sindicato dos Trabalhadores em Transporte (Sintraturb) (evento 13, INQ4, idem);

c) Informação 266/2013, datada de setembro de 2013, tratando do reconhecimento fotográfico dos acusados junto aos funcionários de Cartórios, no qual consta (evento 14, idem):

"OFÍCIO DO REGISTRO CIVIL E TABELIONATO DE NOTAS - COLÔNIA SANTA TERESA - "Cartório Forquilhinha - Marcos Augusto Silva": - As funcionárias Luciana Nascimento Broering e Greice Sueli Dias Gelsleuster reconheceram a foto de LEOMIR MIGUEL SCHEFFER e afirmaram que ele esteve varias vezes solicitando os serviços do Cartório. Greice, que atende no balcão, confirmou que Leomir solicitou várias vezes Cópias Autenticadas de Fichas de Registros de Empregados.

OFÍCIO DO REGISTRO CIVIL E TABELIONATO DE NOTAS - DIST. CAMPINAS - "Cartório de Campinas - Sônia Regina Rupp: A funcionária Chayane Dondei reconheceu as fotos de LEOMIR MIGUEL SCHEFFER, HAMILTON BERNARDES e VALERI DE OLIVEIRA ALVES e afirmou que eles estiveram por várias vezes no Cartório; contudo, não se lembra exatamente quais serviços foram por eles solicitados." (Grifei)

d) Termo de depoimento de testemunha compromissada, Edson Rosenk, em que afirma ter sido Valdomiro Alves Sobrinho, motorista da empresa Pluma Conforto e Turismo, quem intermediou seu pedido de aposentadoria perante o Instituto Nacional do Seguro Social (evento 14, INQ2, idem);

e) Tabela contendo os números de benefícios previdenciários concedidos; os nomes de beneficiários, intermediários e servidores envolvidos e o valor do prejuízo causado aos cofres públicos (evento 16, INQ1, idem);

f) Termo de declaração de outro beneficiário, Estevão Cunha, em sede policial, apontando a ligação existente entre Valeri e Leomir Miguel na intermediação dos benefícios (evento 22, DECL2, idem):

"Que informa que no processo de sua aposentadoria, através do INSS, após ter comparecido várias vezes na Agência do INSS de São José, conheceu defronte a Agência do INSS duas pessoas, que lhe informaram se chamar Valeri e Miguel; que os mesmos lhe disseram que trabalhavam para o INSS; que por duas vezes esteve com essas duas pessoas; que Valeri e Miguel se ofereceram para ajudá-lo em sua aposentadoria."

g) Laudo de Perícia Criminal Federal (documentoscopia) 1404/2013, atestando a inidoneidade de formulários de "informações sobre atividades exercidas em condições especiais", haja vista atestarem que as assinaturas existentes nos documentos foram produzidas por Valeri de Oliveira Alves (evento 22, LAUDO3, idem);

h) Investigações criminais de inúmeros casos de concessão de aposentadorias fraudulentas que culminaram na deflagração de várias ações penais, nas quais foram apontados os nomes de Valdomiro, Valeri e Leomir como intermediários e de Hamilton e Rosana como servidores supostamente responsáveis pela tramitação e concessão dos benefícios (anexos eletrônicos do Inquérito Policial 602/2012-4-SR/DPF/SC).

Nesses termos, atestada a ocorrência do fato delitivo, passo ao exame da autoria e do dolo dos agentes.

4. Autoria e dolo 

No que tange à autoria e ao dolo dos denunciados, especificamente quanto ao delito de quadrilha, insta observar os termos da magistrada singular na sentença, cujo excerto transcrevo, adotando seus fundamentos como razões de decidir, de modo a evitar tautologia (evento 357 da ação penal originária):

"O delito de quadrilha, por sua vez, caracteriza-se pela reunião em sociedade com a finalidade de cometimento de crimes, com caráter, portanto, de durabilidade e de permanência. Não se exige a concretização dos delitos, sendo a reunião das pessoas com esse fim crime de perigo abstrato para a paz pública.

Em 28/03/2011, a assessoria de pesquisa estratégica e de gerenciamento de riscos do INSS elaborou relatório alusivo à denúncia originária da Ouvidoria Geral da Previdência Social n. BBBX70968, que deu origem à Operação Persa (2009.72.00.005932-6 - IPL 0163/2009-4 - SR/DPF/SC).

Nesse contexto, foram identificadas diversas irregularidades em benefícios previdenciários concedidos, entre os quais identificam-se as seguintes coincidências:

a) a maioria dos segurados residia em Araranguá;

b) os beneficiários possuíam o registro na empresa União de Transportes, como motorista;

c) os processos, na grande maioria, foram concedidos com despacho 10 - concessão com conversão de tempo de serviço - pelo login do servidor Hamilton Bernardes. Alguns dos benefícios foram deferidos pelo login da servidora Rosana Aparecida Regis da Rosa.

Diversos benefícios concedidos na agência da Previdência Social em São José/SC foram revisados pelo INSS.

Com base na análise conjunta de diversos inquéritos policiais relacionados à Operação, foi constatada a atuação de intermediadores e de servidor do INSS nas fraudes perpetradas, fraudes estas alusivas à inclusão de dados falsos nos sistemas de previdência social, mediante o reconhecimento de tempos de serviço inexistentes e conversões fraudulentas de atividades comuns em atividades especiais. (...)

O resultado das investigações convergiu para reconhecimento da atuação do Servidor demitido do INSS, Hamilton Bernardes e de outros atores que agiam como intermediadores, entre eles Valeri de Oliveira Alves e Leomir Miguel Scheffer. Com raras exceções, os beneficiários denunciados não sofreram condenação. Em seus depoimentos, afirmaram que foram iludidos pelos intermediadores, os quais se apresentavam como advogado, facilitadores, despachantes. Valeri e Miguel (Leomir) foram sistematicamente citados pelos beneficiáriosOs benefícios foram rapidamente concedidos e pelo serviço foram exigidos "honorários" entre R$ 5.000,00 a R$ 7.000,00, em média. Além disso, há padrões encontrados nas fraudes, especialmente identificados pela reiteração de erros de grafia e uso da mesma foto em fichas relacionadas a beneficiários diferentes.

Nos termos do relatório final do 297/14 (5017255-74.2014.4.04.7200):

Com base na análise conjunta de vários Inquéritos Policiais em tramitação nesta Superintendência Regional, entre eles os de n°s. 546/2012, 598/2012 602/2012, 606/2012, 607/2012, 608/2012, 620/2012, 629/2012, 630/2012, 631/2012, 632/2012, 633/2012, 636/2012, 649/2012, 058/2013, 059/2013, 060/2013, 061/2013, 062/2013, 063/2013, 113/2013, 201/2013, 203/2013, 204/2013, 205/2013 e 206/2013, foi possível constatar que os intermediários Valeri de Oliveira Alves, Zamir Pereira, Leomir Miguel Scheffer e Valdomiro Alves Sobrinho, com a participação ativa e decisiva do Servidor Público Federal do INSS, Hamilton Bernardes, Matrícula 092.868-4, estavam associados em quadrilha, com a finalidade de incluir dados falsos nos sistemas da previdência social (artigo 313-A, do Código Penal), mediante o reconhecimento de tempos de serviço inexistentes e conversões fraudulentas de atividades comuns em atividades especiais.

Em relação ao réu Valdomiro, embora não tenha sido referido por muitos beneficiários, há provas de sua atuação nos fatos, especialmente de sua vinculação com Hamilton Bernardes, Leomir e Valeri.

Em linhas gerais, é possivel extrair das provas colhidas no bojo da Operação Persa, elementos que permitem concluir pela efetiva vinculação do Hamilton, Valeri, Leomir e Valdomiro aos fatos. No ponto, uma análise contextualizada das ações penais em julgamento reforça com segurança a convicção judicial.

Nesse enfoque, as investigações tiveram início com a presença de indícios de que Hamilton Bernardes associou-se com terceiros, com o objetivo de obter documentos falsos para a concessão de benefícios previdenciários.

Nos termos do relatório apresentado no Inquérito Policial nº 163/2009-4, páginas 943-962 (processo nº 2009.72.00005932-6), o Ofício N° 0213/2009/APEGRlSE/MPS/SC, oriundo da Assessoria de Pesquisas Estratégicas e de Gerenciamento de Risco em Santa Catarina, em aditamento ao Ofício nº 131/2009/APEGR/SE/MPS/SC, e relatório de mesmo teor apresentado no Inquérito policial 0795/2011 (Processo 5020473-81.2012.4.04.7200, Evento 1, PORT_INST_IPL1, Páginas 3-9), foi encaminhada relação de benefícios, objeto da amostragem de benefícios concedidos na Agência da Previdência Social APS em São José/SC, de segurados residentes no município de Araranguá/SC que, em tese, na data de entrada do requerimento, não implementavam as condições mínimas à concessão do benefício, quais sejam: VALERI DE OLIVEIRA ALVES, MIGUEL VICENTE TEIXEIRA, ERNESTO JOSÉ WERNER, LAURI ANTONIO AMÉRICO, VALDECIR MORO BOTELHO, ARGEU PATRíCIO, ADÍZIO FELICIDADE DA COSTA, HEITOR RENATO BRUM GOMES, JOSÉ MÁRIO ALEXANDRE DAL PONT, JOSÉ DE SOUZA, JOSÉ MARIA SCHMIDT, CARLOS ALBERTO PEREIRA DIAS, LÉDIO PEDROSO, JOSÉ LUIZ GOMES MARQUES e JOÃO DE SOUZA FERRAZ.

Os quinze benefícios foram analisados e indevidamente concedidos pelo servidor Hamilton Bernardes.

Com o julgamento das demais ações penais relacionadas à Operação Persa, ficou comprovada a atuação de Hamilton nos processos concessórios de aposentadorias eivados de fraude. Hamilton, por várias vezes, inclusive, utilizou-se da senha de sua colega de trabalho, Rosana Aparecida, a qual foi absolvida em todas as demais ações penais em que foi denunciada.

A atuação de Valeri de Oliveira Alves e Leomir Miguel Scheffer como intermediadores do pedido de aposentadoria concedidos de forma irregular foi amplamente demonstrada com o julgamento das ações penais atreladas à Operação Persa.

No bojo da operação Persa, Valeri e Leomir foram sistematicamente identificados pelos beneficiários como as pessoas que intermediava a concessão dos benefícios. Exigiam entre R$ 5.000,00 a R$ 7.000,00 (muitas vezes sob a alegação de que o valor seria destinado ao pagamento de contribuições). Com essa operação, identificou-se que Leomir utilizava-se de sua condição de motorista e de presidente de sindicato para arregimentar clientes.

Além disso, em inquéritos relacionados, observa-se que o formato do formulário forjado possui erros característicos. Nos formulários identificados, havia inscrito, no local destinado ao preenchimento da intensidade da exposição do trabalho aos agentes nocivos, a palavra grafada “ativividade” em vez de atividade. Além disso, no título verificou-se, em alguns deles, a presença de “Instituto de Seguro Social” em vez de Instituto Nacional do Seguro Social”.

Especificamente em relação a Valeri, cumpre trazer à presente fundamentação o fato de que as investigações tiveram início com a presença de indícios de que Valeri de Oliveira Alves integraria grupo especializado em fraudar informações na Carteira de Trabalho de Terceiros, com o objetivo de obter documentos falsos para a concessão de benefícios previdenciários. (...)

Das provas produzidas em juízo, merecem destaque:

a) Loiva Teresinha Ferronato (evento 286, VÍDEO1), servidora do INSS. Trabalha em setor que apura a irregularidades na concessão de benefícios previdenciários. Afirmou que analisou os processos identificados pela Polícia Federal como fraudulentos, relacionados à Operação Persa. Foram identificados aproximadamente 200 casos, que tinham como ponto em comum inconsistências na documentação que comprovava condição especial de trabalho. Referiu que, no casos de motorista de caminhão, ônibus e máquinas pesadas, para que o tempo seja computado como especial - acréscimo de 40% - é necessária a anotação na CTPS e o formulário preenchido pela empregadora com a descrição da atividade. Nesses procedimento de concessão, foram identificadas irregularidades como fichas registros montadas, fraudes relacionadas às atividades especiais, muitos identificados como motoristas, falsidades/rasuras nas CTPS. Declarou que, para a concessão inicial, não é norma a confirmação dos vínculos, mas os documentos devem seguir um padrão e, naqueles que instruíram os benefícios fraudulentos, não constava a identificação da pessoa que assinava pela empresa e a assinatura, mas apenas uma rubrica, além de erros de grafia que se repetiam. Informou que grande parte dos beneficiários tinham algum vínculo com empresas de ônibus ou com a empresa Casas da Água. Aclarou que, no caso de eletricista, o procedimento é diferenciado, pois é obrigatória a análise por perícia médica, já que se trata de um agente agressivo que demanda quantitativo. Esclareceu que não é função do MOB apurar a responsabilidade de servidor e que não sabe se os computadores do INSS foram periciados.

b) André Vinícius Stradiotto (evento 286, VÍDEO2), servidor do INSS. Esclareceu que participou das apurações da concessão fraudulenta de benefícios. Pelo que se recorda, foram identificadas irregularidades como ausência de procurações, embora muitos dos beneficiários ouvidos tenham comentado a contratação de terceiros para realizar a aposentadoria e afirmado que sequer compareceram à agência do INSS, dizendo que assinaram os documentos fora do posto de atendimento. Esclareceu que, inicialmente, Valeri foi identificado como intermediário, depois foram também citados Valdomiro Sobrinho, dirigente sindical, e Leomir.

c) Evonezia de Amorim Oliveira (evento 287, VÍDEO1), servidora do INSS. Esclareceu que participou da apuração das irregularidades na concessão dos benefícios. Declarou que alguns dos beneficiários, quando convocados para apresentar defesa/esclarecimentos, citaram a participação de intermediários, os quais compareciam aos locais de trabalho e colhiam a documentação. Referiu que foram citados os nomes de Valeri, Leomir e de um terceiro que não se recorda. Esclareceu não ser função do MOB apurar a responsabilidade de servidores e, pelo que se recorda, nenhum dos segurados mencionou o nome dos servidores. Inclusive disseram que nem foram à agência. Disse desconhecer se foi realizada perícia nos computadores daquela agência.

Os depoimentos colhidos dos beneficiários em sede policial e em Juízo não deixam dúvidas acerca da prática criminosa desenvolvida de forma profissional pelos corréus. Como ocupavam a função de motoristas e desempenhavam papéis no respectivo sindicado, arregimentavam companheiros de trabalho e funcionários de lojas tradicionais de São José, a exemplo da Casas da Água, empresa que mantém o mesmo quadro de pessoal há muitos anos. Os depoimentos não deixam dúvidas do modo de operar dos intermediadores em todos os casos.

Embora corréu Valdomiro tenha sido denunciado apenas em duas ações penais, é inegável sua atuação nos fatos relacionados à Operação Persa, identificado como intermediário (captação de clientela dentre motoristas de ônibus, mediante a cobrança de valores, ou seja, com obtenção de vantagem financeira), na concessão irregular de benefícios previdenciários a terceiros no período de 2004 a 2010, benefícios nos quais foi constatada fraude em documentos como CTPS's (ou cópia de CTPS's adulteradas, formação de documentos falsos (PPP'S e FRE's) e inclusão de dados falsos nos sistemas do INSS, sempre do mesmo modus operandi.

Sobre a atuação de Valdomiro, utilizo-me da percuciente fundamentação exarada da sentença proferida pelo Juiz Federal Gustavo Dias de Barcellos, em 15 de março de 2017, nos autos da ação de improbidade administrativa relacionada aos mesmos fatos:

"Segundo a petição inicial, teria sido constatado que VALDOMIRO ALVES SOBRINHO cooptava empregados da empresa PLUMA CONFORTO E TURISMO

Já VALDOMIRO, em sua defesa alega que apenas um dos segurados, VALMIR GARCIA, em seu depoimento fala que pagou quantia a VALDOMIRO DOS SANTOS SOBRINHO, ou seja pessoa diversa.

O INSS, ao oferecer réplica, confirma que esse é o único benefício em que SOBRINHO é citado nestes autos. Diz, porém, tratar-se da mesma pessoa e pede a utilização de processos criminais nos quais foram aplicados os princípios da ampla defesa e contraditório, inclusive com a apresentação de alegações finais pelo réu.

No que concerne à prova material, consta dos Anexos ao processo administrativo no evento 1:

Da apuração de irregularidades na concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição de VALMIR GARCIA - Protocolo GeralGEX/PORTO ALEGRE 35239.001468/2012-54 - Anexo nº. 41 ao PAD (evento 1 - PROCADM259 a PROCADM261), após a análise da documentação do processo originário de concessão, em confronto com as CTPS's e PPP's apresentados pelo segurado, concluiu-se que somente o vínculo de 01/11/1973 a 24/01/1978 contém irregularidade, pois na verdade exercido de 01/11/1975 a 24/01/1976, com majoração indevida de 4 (quatro) anos no seu tempo de contribuição. Demais disso, o segurado não apresentou formulário de atividade especial com a empresa Viação Teresópolis Cavalhada Ltda., de modo que também a conversão do tempo especial para comum estaria em desacordo com a legislação vigente (evento 1 - PROCADM260, p. 90/93).

Intimado, VALMIR GARCIA prestou declarações ao INSS (evento 1 - PROCADM261, p. 6/8), nas quais, aduz, em síntese, que:

quem deu entrada na sua aposentadoria foi um colega de serviço da Empresa PLUMA Conforto e Turismo, conhecido como SOBRINHO, pois este era seu sobrenome, não se recordando do nome completo; o referido cidadão na época (2004) era motorista da empresa PLUMA, enquanto que o declarante era da Brasil Sul; que pelo que sabe o referido cidadão era da Administração do Sindicato dos Motoristas de Ônibus da Grande Florianópolis dos últimos seis anos prá cá, mas hoje não faz mais parte da entidade pois o pessoal antigo, pelo que sabe, já saiu todo, que inclusive foi atrás do SOBRINHO depois que recebeu o nosso ofício e conseguiu um número de celular que seria dele mas nunca ninguém atendeu; que o número discado foi (...); que o nome completo do intermediário seria Valdomiro dos Santos Sobrinho segundo conseguiu ao ligar neste momento para a PLUMA; que entregou todas as suas CTPS's para ele e seus formulários de atividade especial também; que não conhece como sua a assinatura de fls. 01; que não compareceu à APS/São José para dar entrada no requerimento; que não passou procuração para o SOBRINHO representá-lo junto ao INSS; que pelos serviços do SOBRINHO pagou a importância de R$ 1.530,00 (um mil quinhentos e trinta reais) que foi a integralidade do primeiro pagamento; que o referido cidadão o acompanhou no banco no dia desse primeiro pagamento e ficou com todo o dinheiro; que essa foi a combinação entre o declarante e o intermediário, o primeiro valor seria o pagamento pelos trabalhos prestados; que o declarante passou a receber sua aposentadoria somente para si a partir do segundo mês; que naquela época mais uns 03 (três) motoristas da PLUMA se aposentaram por intermédio do SOBRINHO; que; que não se recorda agora o nome deles; que a cunhada do declarante fez uma pesquisa no GOOGLE pelo nome do servidor do INSS e verificou que tem um monte de gente envolvida nesses problemas; que o nome pesquisado foi Rocélio de Souza Freitas, conforme junta uma folha com o carimbo e assinatura; que confirma que seu primeiro emprego de CTPS assinada foi em 01 de novembro de 1975 na empresa Agostinho Bombassaro, não sabendo porque na aposentadoria aparece 01 de novembro de 1973, inclusive apresenta nesta data o seu comprovante de inscrição no PIS ocorrida em 01 de dezembro de 1975.

Em juízo VALDOMIRO ALVES SOBRINHO assim se manifestou em seu interrogatório no processo criminal antes referido:

(3) RÉU VALDOMIRO ALVES SOBRINHO (denunciadona Ação Penal nº. 5005026-82.2014.404.7200) (evento 290 - VÍDEO 1, da AçãoPenal nº 5005026-82.2014.404.7200)

Juíza:

Questionado, respondeu que trabalha como recepcionista num hotel. É casado. Sua esposa não trabalha. Tem três filhos, com 40, 38 e 28 anosde idade. Estudou até o segundo grau. Não tem casa própria, renda mensal em torno de dois mil e poucos reais. Nunca foi preso ou processado.

Advertido de que tem direito ao silêncio, foi questionado se prefere responder, ao que disse que sim.

MPF:

1) Consta no processo que o Senhor teria auxiliado o Senhor Walmir Garcia a receber um benefício previdenciário indevido no período de 2004 a 2012. O Senhor como motorista de ônibus estava encaminhando aposentadorias para outros motoristas. Esse fato é verdadeiro: R.: Não. O que aconteceu foi uma conversa, simplesmente disse que conhecia essa pessoa que poderia ajudar. É... HAMILTON, se eu não me engano. eu o conheci quando ele era candidato a vereador. Ele se apresentou dizendo que era candidato, que trabalhava no INSS, se alguém precisasse de alguma coisa,poderia procurar ele. Foi isso que eu comentei, só isso. Agora, dizer que eu peguei documento de alguém, essas coisas, nunca fiz isso. Só dizia que conhecia o HAMILTON.

2) Como é que o Senhor Valmir Garcia fez para conseguir a sua aposentadoria? R.: Não sei, não tenho nem ideia. Ele mesmo que procurou oSr. Hamilton? R.: Não sei, só na conversa eu falei que essa pessoa pode ajudar,mas como ele fez eu não sei. Não peguei documento de ninguém, não peguei nada.

3) O senhor já é aposentado? R.: Sim. Como o Senhor conseguiu a aposentadoria? R.: Eu tinha tempo, fui lá no INSS e fiz a prévia e deu 36 anos de serviço. Foi o Senhor Hamilton que fez a sua aposentadoria? Não,nem conhecia o Hamilton nessa época. O Senhor está aposentado há quanto tempo?R.: Desde 2004, se não me engano. Conheceu o Hamilton quando? Conheci o Hamilton acho que foi em 2006, 2007, por aí, nessa época.

4) O Senhor conhece a Rosana Aparecida Regis da Rocha?R.: Não, nunca ouvi falar.

5) Conhece o Senhor Valeri de Oliveira Alves? R.: Conheci de vista, mas não tenho intimidade, não tenho conhecimento assim com ele. Conheceu de vista aonde? R.: Conheci dentro da loja HAVAN, um dia que eu estava fazendo uma compra lá e a gente ficou conversando na fila.Questionado; Na fila da HAVAN que o Senhor conhece? Isso, só isso.

6) E o Senhor Zamir Pereira, o Senhor conhece? R.: De vista, também. De onde o Senhor conhece o Senhor Zamir Pereira?Eu estava no sindicato e ele estava lá, nós íamos pintar uma sala, uma coisa assim.

7) O Senhor também trabalhava no Sindicato? R.: Sim. Trabalhei de 2004 até 2008, 2009, por aí.Qual era a sua função no sindicato? Eu trabalhava na Comissão de Conciliação Prévia. Eu só agendava as audiências. Quem era o Presidente do Sindicato nesse período? Isso na época, Sidnei Medeiros.

8) E o Senhor Leomir Miguel Scheffer, o Senhor conhece? Ele trabalhou na mesma empresa que eu trabalhei, só não lembro a época. Na empresa Pluma. Só que eu não tinha contato com ele,pois eu estava à disposição do pessoal da carga e o pessoal que viajava ia separado, não tinha como. Não tenho intimidade, não tenho vínculo nenhum.

9) Além de o Sr. Walmir Garcia, tinha mais alguém que o Senhor disse que conhecia o HAMILTON ver o benefício? Eu disse que estava tomo mundo reunido, tinha um monte de gente,agora se alguém... - Pergunta: Tá, mas todo mundo quem? R.: É só o pessoal que a gente fica à noite esperando o ônibus para viajar, fica todo mundo por ali, né. aí na conversa tá cheio de gente. Naõ sei quem estava ali,porque é muita gente.

10) Qual era a empresa? Eu trabalhava na Pluma. -Pergunta - não esse local em que o Senhor disse que falou para todo mundo? E.: Na parada de ônibus. Tem várias empresas que param lá. foi só uma conversa. foi"se alguém precisar eu tenho um conhecido", mas não que eu estivesse agenciando alguma coisa.

11) O Senhor nunca recebeu nenhum valor para isso? R.: Não, não. De jeito nenhum. Nunca peguei documento, nem dinheiro de ninguém.

MPF:

1) O Senhor tinha atuação no SINTRATURB?r.: Era SINTRAFORB -Sindicato dos Rodoviários, hoje não existe mais. Era transporte só interestadual. Era só no âmbito dos rodoviários ali. Pessoal de cargas que viajava.

2) Quando o Senhor falou que o HAMILTON iria ajudar, ele insinuou que era alguma coisa assim informal ou ...?Não, ele simplesmente falou "eu trabalho no INSS, eu sou candidato, acho que era a vereador, se alguém precisar de mim, eu estou àdisposição. quando alguém precisar, pode procurar por mim, que se eu puder ajudar eu ajudo", só isso. Não se comprometeu a nada,simplesmente falou isso.

3) Mas só por causa disso o Senhororientou a ...? Pois é, daí começou essa coisarada toda, esse monte de coisas, que não sei da onde. Essa conversa toda, essas invenções que falaram a meu respeito. Eu não sei de onde surgiu. Só dessa conversa que eu tive.

4) O Senhor me diz que uma mera informação de que um funcionário possa ajudar passa a encaminhar essas pessoas a passar documentos para essa pessoa, sem agendar uma consulta de aposentadoria? Isso realmente é de estranhar... R.: Eu não sei como é que eles faziam, só sei queeu forneci essa informação de que ele poderia ajudar quem precisasse.

5) Por que o Senhor não orientava a ir no INSS? R.: Mas foi, vai lá no INSS que o fulano assim assim eassim atende as pessoas. Foi isso que eu falei. Não mandei procurar em outrolugar, simplesmente eu falei que tem o fulano que trabalha no INSS, se alguém precisar da ajuda dele, ele está lá à disposição.

Juíza:

1) Só para complementar essa sua versão, nenhum dos segurados que esteve aqui disse que compareceu no INSS. O Senhor sabe se eles se encontraram com outra pessoa, em outro local? Não, não. Isso aí eu não sei.Quer dizer, não tenho nem ideia.

PELA DEFESA:

1) O Senhor sabia, ou desconfiava que poderia se tratar de ma fraude? Não, nunca. Porque eu nunca tive contato com ele, foi só daquela vez que eu dei a informação a quem precisasse.

O depoimento judicial de VALMIR GARCIA foi no seguinte sentido:

INTERROGATÓRIO DOS RÉUS

(1) RÉU VALMIR GARCIA (denunciado na Ação Penal nº. 5005026-82.2014.4.04.7200) (evento 288 - VÍDEO 2, da Ação Penal nº 5005026-82.2014.404.7200)

JUÍZA:

O Senhor trabalha em que atividade? R.: Sou motorista.. - Sua companheira / sua esposa trabalha? R.: É professora aposentada.. O Senhor tem filhos? Tenho uma filha de 34 anos. Qual é o seu grau de instrução? R.: 4º ano primário. O Senhor tem casa própria? R.: Tenho um apartamento financiado pela CEF. Qual é a sua renda mensal? R.: Eu tenho ali a aposentadoria, mas eu continuo trabalhando daí a renda de de R4 4.000,00 e pouco mais ou menos. O Senhor já está aposentado então? R.: Já, eu já estou aposentado e continuo trabalhando na função de motorista de ônibus. O Senhor já foi preso ou processado? R.: Não

Faço as perguntas e o Senhor tem direito ao silêncio. O Senhor gostaria de responder as perguntas? R.: Sim, posso responder.

(1) Consta aqui da denúncia que o Senhor teria recebido, num período compreendido entre 20/09/2004 a 30/04/2012, um benefício previdenciário indevido, resultando um prejuízo ao INSS no valor de R$ 142.221,00 (cento e quarenta e dois mil duzentos e vinte e um reais). Consta aqui que o Senhor teria procurado um colega de trabalho , VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, também motorista de ônibus, que estava encaminhando aposentadorias para outros motoristas. Consta que o Senhor teria pago R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais) para o Senhor VALDOMIRO. Esse fato é verdade? R.: Eu não procurei ele. Foi ele que chegou até a minha pessoa e perguntou se eu já estava aposentado. Ele perguntou se eu já tinha tempo, respondi que não sabia. Aí ele disse "me dá os seus documentos que eu vou ver se você tem direito a já se aposentar". Aí eu dei, porque a gente trabalhou 10 (dez) anos juntos. Ele era uma pessoa de confiança na época, na empresa PLUMA, não tinha porque desconfiar dele. E aí levou um certo tempo e ele disse "vocês já está aposentado e você tem que pagar o primeiro salário para mim ( no caso, para ele)". Aí eu falei tá. questionei se estava tudo certo, ele disse que sim. aí a gente combinou um dia, porque eu morava em Porto Alegre/RS. Então fomos ao BANRISUL, eu peguei o que me era devido, paguei a ele aqueles R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais). Perguntei se estava tudo certo, ele disse que sim. eu continuei trabalhando e não vi mais ele.

(2) Então, o Senhor realmente teve o auxílio do Sr. Valdomiro. E ele comentou com o Senhor com quem que ele conseguiria , se ele mesmo, se seria algum servidor do INSS? R.: ele disse para mim que a esposa dele trabalhava com um advogado que fazia esses documentos, fazia a aposentadoria lá do pessoal do INSS. foi o que ele comentou para mim.

(3) O Senhor sabe o nome da esposa dele? R.: Não, não sei.

(4) O Senhor foi alguma vez lá na agência para postular o benefício? R.: Não, nunca fui lá.

(5) E os documentos o Senhor assinou aonde? R.: Eu não assinei documento nenhum prá ele. eu apenas dei o documento para ele fazer uma contagem. Aí depois ele me disse que um motorista que trabalha , ele tem um direito a um abono de 4 anos cada dez anos trabalhados. O que eu também não sabia. E eu não dei nada prá ele, eu não dei procuração, não dei nada. Eu só dei para ele fazer a contagem. aí depois que ele disse prá mim que eu já tava aposentado.

(6) Então o Senhor não assinou nenhum documento? R.: Não, Senhora, não assinei.

(7) Nessa época o Sr. VALDOMIRO era dirigente sindical do SINTRAFOPOLIS? R.: É, ele era lá do sindicato lá.

(8) E o Senhor depois obteve a aposentadoria quando? Seu benefício foi cassado, aí o Senhor postulou uma nova aposentadoria ... R.: sim, aí eu fiz uma outra aposentadoria, né.

(9) Desde quando o Senhor está aposentado, então, pela segunda vez ? R.: Acho que faz uns 3 anos ou 4. Ou 2 ou 3 anos. A data certa eu não lembro, tá. Mas é mais ou menos isso, dois ou três anos. - Advogado observa que inclusive foi ele quem protocolou o novo benefício dele. Benefício regular agora.

(10) quanto tempo de contribuição foi computado nesse benefício? R.: Ele fechou o tempo que precisava, mais de 35 (trinta e cinco) anos.

(11) Consta aqui que ele trabalhou na empresa "Agostinho Bombassaro", no período de 01/11/1973 a 24/01/1978. quanto da realidade o período foi 01/11/1975 a 24/01/1976. É verdade, Sr. Valmir? R.: Sim, Senhora.

(12) Então o período é menor? R.: Isso. Deu, praticamente 3 meses, né.

(13) O senhor foi chamado lá na Agência do INSS para prestar esclarecimentos para a equipe do MOB, quando foram apuradas essas irregularidades? R.: Eu fui duas vezes lá.

(14) E lá mostraram esses documentos para o Senhor? R.: Mostraram, disseram que estava irregular, isso e aquilo, mas eu não entendo muito, né.

(15) Certo, e o Senhor confirmou para eles que o período não era esse, que o período correto eram só três meses? R.: Olha Dra. , eu não me lembro direito, mas eu disse para eles "nessa empresa de táxi eu trabalhei em torno de três meses só".

(16) Ah, so Sr. disse para eles isso. R: É, que eu trabalhei três meses só.

(17) E quando o Senhor soube que o benefício era irregular, o Sr. procurou o Sr. VALDOMIRO para pedir o seu dinheiro de volta, ou ...? R.: Eu não vi mais ele. Até hoje, eu não vi mais ele. Não sei o que é feito da vida dele.

MPF:

(1) É só para confirmar, o Sr. disse que não sabia daquele acréscimo ali para motorista, então quando o Sr. pediu, o Sr. achava que não havia fraude ali no pedido? R.: Não porque eu não sabia desse tempo aí. E eu dei o documento prá ele e aí ele veio e me disse que eu estava aposentado. Mas eu não sabia de nada, eu não perguntei para ele. Ele que me disse que cada dez anos que eu trabalhava eu ganhava quatro anos.

Por outro lado, o argumento de VALDOMIRO no sentido que que VALMIR GARCIA estaria se referindo a outra pessoa destoa dos demais elementos probatórios contidos na ação penal, cuja prova emprestada se está utilizando nestes autos.

Nesse sentido, observe-se o depoimento da testemunhas de acusação ANDRÉ VINÍCIUS STRADIOTTO (funcionário do INSS), ANTONIO CARLOS MARTINS (Secretário do SINTRATURB) e do então acusado naqueles autos, ZAMIR PEREIRA, como abaixo transcrevo, mais uma vez:

(2) DEPOIMENTO de ANDRÉ VINÍCIUS STRADIOTTO (testemunha arrolada pelo MPF nos autos 5004180-31.2015.404.7200, 5005030-22.2014.404.7200 e 5005026-82.2014.404.7200) - FUNCIONÁRIO DO INSS, testemunha compromissada (evento 286 - VÍDEO 2, da Ação Penal nº 5005026-82.2014.404.7200)

MPF:

(1) O Senhor participou da equipe de fiscalização de benefícios da Gerência Executiva da "Operação Persa"? R.: Sim. - Pergunta - Nessa equipe vocês não apuravam a responsabilidade de servidores, apuravam objetivamente a fraude no benefício? R.: Exato. A nossa função é estabelecer ao final do procedimento de apuração do procedimento administrativo de apuração de irregularidades se o benefício é regular ou não, se pode ser mantido ou não; e quando tem indícios de envolvimento de servidores, a gente extrai uma cópia, encaminha ao Chefe de Benefícios da Gerência. E depois, ele também estando de acordo, ao Gerente Executivo e este encaminha à Corregedoria Regional, que depois realiza o PAD, se achar que tem elementos para tanto.

(2) Nesses processos, são dezenas de processos aqui, envolvendo especialmente os beneficiários, os servidores e alguns intermediários, o Senhor tem lembrança da atuação desses intermediários, especialmente LEOMIR e VALERI? R.: Pelo que eu me recordo dos processos, não existiam procurações nos processos. Mas alguns interessados que vieram pessoalmente ao nosso Setor quando foram receber os nossos ofícios para pegar cópia dos processos para poderem se defender, eles comentaram que contrataram terceiros para realizar a sua aposentadoria. Inclusive muitos deles disseram que nem foram à Agência do INSS de São José/SC e que assinaram o requerimento que deveria ser assinado dentro da Agência no Posto Ernestão, no Posto de Gasolina, ou no Terminal de Ônibus, nos mais diversos locais. Então, assim, a informação que a gente tem da atuação de terceiros veio através desses termos de declarações . e a própria "Operação Persa" identificou inicialmente o VALERI como intermediário. Mas assim, não existiam procurações, que seria o esperado num processo em que o segurado não foi à Agência. O esperado é que exista uma procuração e que esse procurador assinasse o requerimento de aposentadoria.

(3) Num dos casos também, de hoje, o acusado VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, ele tinha condição de dirigente sindical do SINTRAFOQUINS - Sindical dos Motoristas Rodoviários - segundo essa denúncia, ele teria atuado como intermediário também. O Senhor tem lembrança da atuação desse delegado sindical? R.: Foi, até se eu não me engano aquele LEOMIR também já foi vinculado ao Sindicato de alguma forma e em tempos atrás, foram nomes que surgiram , ou desses termos de declarações, ou eventualmente de petições de defesa que nos traziam essas informações. Mas o nosso foco é decidir se o benefício está certo ou está errado. E por existir indícios de fraude, também é encaminhado cópia, através de nosso Chefe Executivo e do Gerente Executivo, para a nossa Procuradoria Federal Especializada encaminhar a notícia crime para o Ministério Público Federal. Mas a gente não ia ao fundo. Se valores foram pagos, também eram informações que a gente recebia de livre e espontânea vontade dos cidadãos.

(4) DEPOIMENTO DE ANTONIO CARLOS MARTINS (arrolada pelo MPF nos autos 5005026-82.2014.404.7200) - Secretário do SINTRATURB; testemunha compromissada (evento 287 - VÍDEO 2, da Ação Penal nº 5005026-82.2014.404.7200)

MPF:

1) O Senhor foi Secretário do Sindicato da SINTRATURB? Certo, hoje continuo sendo Diretor do SINTRATURB. Ali no período de 2007 a 2011 o Senhor também atuou lá? Sim. Aqui nós temos algumas denúncias envolvendo alguns segurados, servidores do INSS e intermediários na concessão de benefícios previdenciários em que foram aplicadas fraudes; especialmente a inserção de tempo como motorista, que daria um acréscimo fictício ao tempo de serviço. Uma das denúncias aqui envolvem o ZAMIR PEREIRA e o VALDOMIRO ALVES SOBRINHO. O Senhor conhecia: Conheço sim., o ZAMIR. Não conhece Valdomiro Alves Sobrinho.

2) Quem era o Presidente do Sindicato do SINTRATURB? O nosso Sindicato sempre foi por colegiado, então era só por secretarias.

3) Quanto ao ZAMIR, consta na denúncia que ele teria contato com o LEOMIR, que seria também o "Gaiteiro"? ah, sim, o Scheffer, isso, sim.

4) Tem conhecimento de alguma relação entre eles? Daquela época em que havia o boato entre os terminais, havia os boatos, mas a gente não sabia exatamente da ligação.

5) O Senhor tinha também um trabalho interno, ou externo no Sindicato? Externo. No Sindicato a gente está só nas segundas-feiras. Nos demais dias a gente está nos terminais fazendo serviço de base. Então os boatos são os que ouviam dentro do local? A gente escutava ali.

6) O Senhor já teve conhecimento de alguma maquinação para alguma fraude para esse tipo de benefício envolvendo essas pessoas aí? Só através dos boatos e que depois veio a sair na mídia. não que a gente ficou sabendo. Tinha os comentários dentro dos terminais e depois saiu na mídia.

7) Podemos dizer que esses boatos tinham algum fundo de verdade, pois temos aqui dezenas, até centenas de denúncia na Justiça Federal envolvendo esses fatos. Qual o teor desses boatos? O que a gente escutava é que quem estava próximo de aposentar-se o procurava para fazer as aposentadorias. Era o que agente escutava dentro dos terminais.

8) Sobre a informação de que motorista tem direito a tempo especial, é uma coisa geral, ou nem todo mundo conhecia? R: Nem todo mundo conhecia. Sobre a informação mesmo, técnica, vocês conheciam isso? R.: Quase não. Eles não tinha esse conhecimento de que teria esse tempo certo para aposentadoria. A categoria nos procura. E a gente tinha as informações nos boletins que a gente "solta" prá categoria. Mas, no geral, na categoria, nem todos leem o jornal do Sindicato.

9) E essa atividade do Zamir Pereira era o que, então? O que comentavam é que ele também praticava nesse sentido, de auxiliar as pessoas que teriam tempo de aposentadoria.

10) Ele trabalhava em alguma empresa? Sim, Jotur.

(4) RÉU ZAMIR PEREIRA (denunciado na Ação Penal nº. 5005026-82.2014.404.7200) (evento 291 - VÍDEO 1, da Ação Penal nº 5005026-82.2014.404.7200)

Juíza:

Questionado, respondeu que trabalha como motorista, na empresa JOTUR. Sua esposa não trabalha, Tem dois filhos, um de 24 para 25 outro de 34. Estudou até a 8ª série. Tem casa própria. Renda mensal de R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais). Nunca foi preso ou processado.

Advertido de que tem direito ao silêncio, foi questionado se prefere responder, ao que disse que sim.

JUÍZA:

(1) Consta aqui da denúncia que o Senhor teria juntamente com VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, HAMILTON BERNARDES, ROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA, VALEI DE OLIVEIRA ALVES e LEOMIR MIGUEL SCHEFFER, associado-se de modo permanente e estável, com o fim específico de praticar diversos crimes de estelionato e inserção de dados falsos nos sistemas informatizados da Previdência Social, a fim de obterem diversas vantagens ilícitas que resultaram em prejuízo à Previdência Social, num valor mais ou menos de 4 milhões de reais. Eu pergunto para o Senhor: esse fato é verdadeiro? R.: Não.

(2) O Senhor se associou com essas pessoas? R.: Olha é que na época a gente estava montando um Sindicato, aí o SINTRATOPS, eles estavam apurando o nosso Sindicato. Aí eu peguei uma amizadezinha lá com o VALDOMIRO. Aí ele perguntou para mim se faltava muito tempo para eu me aposentar.disse que nunca tinha passado para um advogado para ver quanto tempo falta. Aí ele disse "Zalmir, se quiseres, eu dou uma olhada, é um advogado bom, que lá no INSS, ele tem 'arrego' lá e bota em cima, para adiantar". Pega os meus documentos e coloca em cima para aposentar mais rápido. ele tem um "arrego" lá. Disse, tudo bem, eu peguei meus documentos ali. Daí a cabo de 20 dias, um mês, a sua aposentadoria... mas 98% vai dar. Perguntei o quanto iria dar, ele respondeu R$ 972,00 (novecentos e setenta e dois reais). Ele falou que se um pagasse mais um pedágio, pois eu não tinha idade. Ele falou, não mais tu vais continuar trabalhando e depois de cinco anos tu podes fazer a nova revisão. Eu disse, tá, tudo bem. Aí pensei, aceitei. Aí a cabo de 5 (cinco) anos eu fui fazer a nova revisão. A revisão não saiu e veio uma carta do INSS para comparecer lá, ali na Felipe Schmidt. Aí eu peguei e fui. Cheguei lá e o funcionário me perguntou se eu já havia trabalhado com a "Mercearia Pão, Café e Feijão", não sei o que. Respondi que nunca trabalhei. Disse: é, mas está aqui. Mas nunca trabalhei Então o que que eles fizeram nesse meio tempo: eles colocaram essa empresa, uma mercearia em que eu teria trabalhado e eu nunca trabalhei. Aí eu pensei, aí tem coisa errada. Daí eu perdi a minha aposentadoria, dizendo que era um advogado. só que antes desse meio tempo, eu falei para um primo meu. Ele perguntou como eu me aposentei e respondi que foi com um advogado lá do posto. O Carlos Pereira. Perguntou se eu levaria os documentos dele e eu disse que sim. Veio a aposentadoria, mas quando acaba era tudo uma jogada deles, lá do INSS devia ser, né? Porque um de nós aqui a gente não pode assinar nada. É funcionário lá do INSS. Aí sujaram a minha carteira e eu não vi. Só que nessa aposentadoria antes de sair eles tinham me cobrado mais R$ 3.000,00 (três mil reais). eu disse que não quis, mas eu peguei um envelope e eu levei esse envelope que estava no INSS, eu mesmo levei. Cheguei lá eles disseram que tinha 7 anos que eles colocaram a mais e eu passei a receber a aposentadoria. Que eu paguei prá eles lá, pro VALDOMIRO, não sei se foi R$ 300,00 (trezentos reais)ou R$ 400,00 (quatrocentos reais), uma gorjeta. Mas eles iriam me cobrar R$ 3.000,00 (três mil reais) pela aposentadoria.

(3) Quem é que ia cobrar do Senhor? R.: O VALDOMIRO disserto ia dar esse dinheiro lá prá esse advogado. E não era advogado. Era cara lá do INSS. Depois que eu fui descobrir. É o tal de HAMILTON. Mas só que eu não conheço HAMILTON, eu não conheço ninguém.

(4) O Senhor não conhece o HAMILTON? R.: Não, não conheço e se disser que me conhece é mentira.

(5) Então a sua aposentadoria o Senhor conseguiu com o auxílio do VALDOMIRO? R.: É ele pegou os meus documentos e não sei para onde ele levou.

(6) E o Senhor pagou quanto para ele? R.: Era para pagar R$ 3.000,00 (três mil reais). Aí eu disse que não quis, mas mesmo assim eu levei lá no INSS. Falei que iria dar uma gorjeta para eles. Eu dei não sei se foi R$ 300,00 (trezentos reais), ou R$ 500,00 (quinhentos reais), já não me lembro.

(7) Prá quem? Eu dei pro VALDOMIRO.

(8) Aí ele levou os seus documentos lá no INSS? R.: Não, eu levei. Eles fizeram o cálculo, né. Aí eu disse que não queria, porque era pouco. Aí eu pensei, vou levar lá para não pagar os R$ 3.000,00 (três mil reais) prá eles. Daí eles tinham colocado essa empresa que eu tinha trabalhado. Se eles não tivessem colocado, eu não tinha me aposentado. Mas eles botaram, fizeram sujeira. Aí até hoje eu não me aposento.

(9) Mas quem que botou esse período? Não foi o Senhor que levou seus documentos lá? R.: Eu não sei quem foi que botou. Eu fui saber depois que eles cortaram a minha aposentadoria.

(10) É muito importante a questão se foi o Senhor que levou os documentos lá, ou se o Senhor entregou os documentos pro VALDOMIRO. Tenta se lembrar desse fato R.: Eu entreguei os documentos pro VALDOMIRO para fazer o cálculo, né, fazer a base. Aí eu não sei se ele entregou para outro ou o quê. Mas só sei que ele disse, "ó Zalmir, a sua aposentadoria vai dar tanto". eu disse que era pouco. E ele disse que eu teria de pagar R$ 3.000,00 (três mil reais). Eu achei demais. Eu não tinha R$ 3.000,00 (três mil reais). Aí eu peguei o envelope dali, mas eles já tinham botado aqueles 7 anos que faltava. disserto tinham botado, eu não vi. Aí eu peguei o envelope e levei lá pro HAMILTON no INSS. Aí a cabo de um mês mais ou menos, ligaram para mim e disseram que o benefícios estava concedido.

(11) O Senhor foi lá no INSS como? O Senhor falou com quem lá? O Senhor agendou uma consulta? R.: Não não. Eu levei o envelope. Lá dentro do INSS. Lá no INSS do Kobrasol a gente faz na hora. Pega uma fichinha que tem lá no balcão ali e já consulta. Naquele tempo era assim.

(12) Aí o Senhor consultou com quem? R.: Eu não me lembro quem foi que pegou. Não me lembro se foi uma mulher ou um homem. Já faz tempo. Já faz 11 anos.

(13) Perguntado se foi essa pessoa que lhe atendeu lá que colocou documento falso, respondeu: Eles que fizeram a sacanagem. O Valdomiro ou o outro, ou o advogado. E era advogado, e era disserto do Hamilton. É Hamilton, o Hamilton trabalha lá dentro. Só pode ser o Hamilton que faz a sacanagem.

(14) Quando o Senhor foi lá no INSS o Senhor levou quais documentos? R.: eu levei a maioria tudo fotocópia, mas de identidade de título, de residência. - Pergunta - E a Carteira de Trabalho? Levei também, a cópia. Eu levei cópia porque a minha carteira profissional eles tinham me roubado; aí eu peguei uma certidão no INSS das empresas em que eu já trabalhei. E lá disserto eles pegaram, prá botar uma empresa que não existia, disserto eles botaram também. Mas eu não sabia de nada. Depois é que eu fui descobrir que tinham botado lá no INSS, que eles perguntaram., se eu tinha trabalhado numa Mercearia "Pão, Café e Feijão"? Eu disse não, nunca trabalhei.

(15) Então não foi o Senhor quem colocou essa informação no seu processo? R.: Não, de jeito nenhum.

(16) Isso não tinha nessa cópia que o Senhor falou que entregou lá no INSS? R.: Na hora que eles fizeram essa base aí, disserto eles botaram, porque eu não abri o envelope. Eles disseram: Vai no INSS que é 99% que vc está aposentado. Aí eu levei. Mas eu nem abri o envelope, eu cheguei lá e entreguei. Ou disserto eles botaram isso aí, né. Porque na carteira eles não botaram. Porque eu não tinha carteira. A minha carteira foi roubada.

(17) Eu não entendi, então. O Senhor disse que entregou os documentos para o VALDOMIRO, ele lhe devolveu o envelope, sem a aposentadoria, daí o Senhor voltou com esse envelope no INSS? R.: Eu entreguei para ele fazer o cálculo. aí disserto ele entregou para outro. Ele não iria fazer essa safadeza também. Disserto ele entregou para outro. Não sei prá quem, porque não tem prova. Aí depois é que eu vi no computador aí é que quem tá no rolo aí é o VALDOMIRO. O VALDOMIRO, não, esse cara aí do INSS. Aí eles me trouxeram o envelope de volta, dizendo olha, tu levas no INSS que 99% tu estás aposentado.

(18) Quem disse isso pro Senhor? R.: O VALDOMIRO.

(19) Então para que que o Senhor levou o envelope no INSS? R.: Para ele não levar. Se ele levasse, eu tinha que pagar os R$ 3.000,00 (três mil reais).

(20) Mas o Senhor disse que ele já tinha levado, feito a conta e que tinha 99% de chances de se aposentar. R.: Não, mas eles não levaram lá no INSS, eles não levaram. Porque disserto esse VALDOMIRO e esse cara do INSS tinham muita amizade e fizeram em casa o cálculo, disserto. Eles não fizeram lá.

(21) Essa sua versão não está muito coerente... R.: Aí eu não vou falar mentira, porque eu não conheço nada. Se eu conhecesse alguém do INSS, ou conhecesse eles, mas não.

Outrossim, conforme cópia da denúncia referente ao Inquérito Policial nº. 502119-56.2012.404.7200, acostada aos autos no evento 1, documentos DENUNCIA266 e DENUNCIA267, foi apurado no aludido Inquérito que a candidatura a vereador de HAMILTON BERNARDES remonta ao ano de 2000 (conforme documento anexado àquele Inquérito), de modo que VALERI DE OLIVEIRA ALVES e HAMILTON BERNARDES, conhecem-se, ao menos desde 2000, e não de 2004. Observe-se (evento 1 - DENUNCIA266, p. 11/12):

HAMILTON BERNARDES, servidor da Agência da Previdência Social em São José-SC, no ano de 2000, candidatou-se a vereador pelo Município de São José-SC. HAMILTON, por ser servidor conhecido da Previdência Social, inseriu no "santinho" de campanha, além do seu apelido "Jhon Lennon", a informação da instituição pública na qual trabalhava, o INSS (fls. 7391/7397).

VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, nesta época,trabalhava na empresa Pluma Conforto e Turismo, como motorista de Ônibus. SOBRINHO desenvolvia, ainda, atividade sindical no SNTRAFÓPOLIS, sindicato de motoristas rodoviários interestaduais. Ele era, neste sindicato, conciliador e, portanto, detinha alguns conhecimentos na área trabalhista e previdenciária, bem como mantinha contato com diversos sindicalizados do setor de transportes.

VALDOMIRO conhecia HAMILTON em razão de residirem no mesmo bairro (Floresta, em São José-SC). VALDOMIRO ALVES SOBRINHO viu o santinho de campanha de HAMILTON, o qual anunciava que ele trabalhava no INSS, e o procurou a fim de que iniciassem a instrução conjunta de benefícios para diversos sindicalizados do setor de transportes, em regra motoristas de ônibus.

A partir de 2004, VALDOMIRO e HAMILTON praticaram os primeiros crimes de estelionato e inserção de dados falsos no sistema informatizado da Previdência Social. (...)

Inicialmente, VALDOMIRO ALVES SOBRINHO foi o primeiro intermediário entre os motoristas, clientes da quadrilha, e HAMILTON BERNARDES, servidor da Previdência Social. (...)

Na sua contestação, VALDOMIRO ALVES SOBRINHO faz expressa menção ao Inquérito Policial nº. 0602/2012-4-SR/DPF/SC, instaurado em 01/11/2012, demonstrando a plena ciência do conteúdo do aludido inquérito.

O que se infere do conjunto probatório é que o fato de VALMIR GARCIA ter se enganado ao informar o nome de VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, dizendo ser VALDOMIRO DOS SANTOS SOBRINHO não significa que não se trate da mesma pessoa.

Em verdade, VALDOMIRO DOS ALVES SOBRINHO já conhecia HAMILTON BERNARDES desde o remoto ano de 2000, oportunidade em que este último se candidatou a vereador. E foi em tal época que VALDMIRO afirmou que HAMILTON teria lhe dito que "poderia ajudar" nas concessões de benefícios previdenciários.

Demais disso, ele fez parte da parte de conciliação do Sindicato dos Motoristas Interestaduais em Florianópolis, do que se infere que possuía ao menos alguma informação sobre legislação trabalhista e previdenciária.

Não fosse apenas isso, ZAMIR PEREIRA, em seu depoimento na esfera criminal também apontou VALDOMIRO ALVES SOBRINHO como sendo a pessoa responsável pelo encaminhamento de sua aposentadoria, nos mesmos moldes que as demais aposentadorias fraudulentas até aqui analisadas.

Logo, do conjunto probatório, resta devidamente demonstrado que VALDOMIRO ALVES SOBRINHO era, juntamente com Leomir Miguel Sheffer e Valeri de Oliveira Alves, intermediário na concessão de benefícios previdenciários fraudulentos.

Sendo assim, VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, tal como LEOMIR MIGUEL SCHEFFER e VALERI DE OLIVEIRA ALVES, atuou juntamente com HAMILTON BERNARDES, este na condição de ex-funcionário do INSS e VALDOMIRO ALVES SOBRINHO como intermediário (captação de clientela dentre motoristas de ônibus, mediante a cobrança de valores, ou seja, com obtenção de vantagem financeira), na concessão irregular de benefícios previdenciários a terceiros no período de 2004 a 2010, benefícios nos quais foi constatada fraude em documentos como CTPS's (ou cópia de CTPS's adulteradas, formação de documentos falsos (PPP'S e FRE's) e inclusão de dados falsos nos sistemas do INSS, sempre do mesmo modus operandi.

Tais condutas caracterizam improbidade administrativa nos termos do art. 9º, caput e inciso I; art. 10, incisos VII e XII; e art. 11, inciso I, todos da Lei de Improbidade Administrativa, ensejando, portanto, a aplicação das penas previstas no art. 12 da mesma lei.

No que concerne à parte patrimonial, ou seja, ressarcimento ao erário, como já enfatizado anteriormente, a presente ação, no entanto, está adstrita aos benefícios noticiados com a petição inicial e sobre cujos fatos se apura a existência de improbidade administrativa.

Além disso, em importante depoimento prestado por Hamilton Bernardes (5013680-92.2013.404.7200, evento 6, DESP1, p. 2), revelou-se um pouco de suas relações de Valdomiro:

"pelo nome, não se recorda de Gilmar Kurtz; que analisando os autos deste inquérito, respondeu acreditar tratar-se de caso do 'atravessador' Valdomiro; (...) que acredita, assim, que Valdomiro pudesse ter relação com Valeri; que o interrogado afrma não ter recebido qualquer quantia para dar entrada e encaminhamento a pedido de aposentadoria; que na verdade às vezes Valdomiro deixava envelope com algum trocadinho (...)"

Nesse enfoque, o contexto fático vincula a atuação de Valeri, Leomir e Valdomiro a do então servidor do INSS, Hamilton. Para tanto, reconheço como evidente a necessária vinculação das condutas e o concerto entre elas é inegável.

Ademais, os crimes identificados na Operação Persa, que representaram expressivo prejuízo ao sistema previdenciário, não aconteceriam sem a necessária vinculação das condutas dos corréus.

Portanto, entendo estar comprovado que, entre os anos de 2004 e 2011, VALDOMIRO ALVES SOBRINHO, HAMILTON BERNARDES, VALERI DE OLIVEIRA ALVES e LEOMIR MIGUEL SCHEFFER associaram-se de modo permanente e estável com o fim específico de praticar diversos crimes contra a Previdência Social, a fim de obterem diversas vantagens ilícitas, que resultaram em grande prejuízo da Previdência Social, consubstanciado em, pelo menos, R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais).

A autoria da ré Rosana Aparecida Regis da Rocha em relação aos fatos a ela imputados não se mostra comprovada.

Nas oportunidades em que foi inquirida, Rosana informou que foi demitida em decorrência da Operação Persa. Encontra-se desempregada. Questionada sobre os fatos, negou que tenha concorrido para a prática dos delitos. Alegou ter havido o uso indevido de sua senha. Disse que tinha hábito de guardar as próprias senhas em agendas. Conheceu Hamilton em 2000. Hamilton estava sempre na agência, trabalhava muito. Acredita ter sido Hamiton quem utilizou suas senhas. Disse que foi encontrada na casa de Hamilton a sua senha escrita em uma agenda (senha da Rosana escrita em agenda encontrada na casa de Hamilton). Relatou a atuação da estagiária Bruna, que, a pedido de Hamilton, utilizava-se do carimbo da ré e rubricava as folhas com um "p/". Sua senha era de chefe da agência, que dava acesso a mais funcionalidades dos sistemas. Foram apresentados à ré vários documentos por sua defesa, os quais, segundo a ré, foram providenciados por Hamilton. Explicou ainda situações apontadas pelo Ministério Público Federal que poderiam comprometer sua defesa.

Rosana foi absolvida em outras ações penais relacionadas à Operação Persa, acima especificadas, e nelas foi possível averiguar o uso indevido da senha de Rosana e de seus carimbos.

Utilizados como prova emprestada, os depoimentos das testemunhas apresentadas pela defesa de Rosana em outros processos foram esclarecedoras em relação à dinâmica em que os fatos se sucederam. Bruna do Amaral Rosseto, estagiária/menor aprendiz na época dos fatos, fez estágio no INSS no período de março até dezembro de 2011. Afirmou que Hamilton era a única pessoa que lhe pedia para numerar processos. Várias vezes utilizava, a pedido de Hamilton, o carimbo de Rosana. Rosana nunca lhe pediu para fazer esse trabalho. Ele pedia para numerar, carimbar e rubricar. Ela cumpria ordens de Hamilton.

Em seu depoimento, a servidora do INSS, Alice, confirma o uso de agenda com as senhas por Rosana. Informou que há vários sistemas que exigem senha. Por isso muitos tinham a rotina de guardar as senhas em papeis ou agenda. Todos sabiam que as senhas eram guardadas em agendas pessoais e muitos utilizavam dessa prática.

Além dos depoimentos das testemunhas, as razões apresentadas pela defesa, somadas à ausência de maiores diligências acerca da efetiva atuação da ré nas fraudes, tornam crível as alegações apresentadas por Rosana.

É fato notório, principalmente para quem atua no serviço público, a existência de inúmeros sistemas, bem como a modificação constante das senhas para acesso a eles. No caso que se apresenta, apenas o dono de uma memória prodigiosa é capaz de armazenar tantas senhas de acesso sem a necessidade de socorrer-se de anotações. Rosana afirma que anotava suas senhas em agendas, guardadas em suas gavetas.

Nesse contexto, não se mostra desarrazoado um servidor proceder à anotação de senhas em agendas e guardá-las em gavetas acessíveis, dentro da estação de trabalho. Ao que tudo indica, Rosana confiava em seus colegas de trabalho, principalmente em Hamilton. Hamilton, por sua vez, sabendo da facilidade de acesso às gavetas de sua colega, utilizou-se das senhas para ocultar sua prática criminosa.

A alegação da defesa é plenamente possível, nada fantasiosa, e os elementos de prova evidenciam que essas foram as circunstâncias do fato. Ademais, em sede policial, Hamilton confirmou que se utilizou da senha de Rosana em várias oportunidades.

Além disso, de acordo com o depoimento de Bruna Rosseto, em alguns processos, os carimbos foram utilizados indevidamente por ela, a pedido de Hamilton.

Por certo, não há como ter um controle acerca do horário em que os carimbos foram utilizados nos processos de concessão questionados. No caso, os carimbos provavelmente foram utilizados fora do horário de expediente ou mesmo na ausência de Rosana.

Da mesma forma, a justificativa apresentada pela ré de que Hamilton utilizou-se de computador de apoio não se mostra inverossímil.

Mostra-se crível também que um servidor, encontrando-se o servidor no gozo de seu período de férias, ao retornar ao seu ambiente de trabalho no referido período, obviamente ele não utilizaria de sua senha para a concessão de benefícios.

Com efeito, a utilização de senha de sua colega de trabalho tornou imperceptível sua atuação no período.

A utilização indevida de senha da servidora, a confiança que esta depositava em seu colega de trabalho, o reconhecimento da utilização indevida de seu carimbo por estagiária, sob a ordem de Hamilton, são circunstâncias que trazem, no mínimo, a dúvida quanto à autoria dos fatos. Contudo, para este Juízo há uma quase certeza de que a acusada Rosana, efetivamente, não tenha praticado os crimes a ela atribuídos.

Por todo o exposto, entendo que a ré Rosana não é autora dos crimes que a ela foram imputados. A absolvição, portanto, mostra-se inafastável.

Por fim, acerca dos fatos identificados na Operação Persa, cumpre referir que Hamilton Bernardes, Leomir Miguel Scheffer, Valeri de Oliveira Alves e Valdomiro Alves Sobrinho foram condenados na Ação Civil de Improbidade Administrativa nº 5019417-08.2015.4.04.7200 pela prática de atos de improbidade administrativa previstos no art. 9º, caput e inciso I; art; 10, incisos VII e XII; e art. 11, inciso I; todos da Lei nº. 8.429/1992 (...).

Por fim, ressalto que os pedidos na ação civil de improbidade administrativa foram julgados improcedentes em relação à corré Rosana.

Por fim, em relação ao réu Zamir, contudo, entendo que não há provas suficientes para o reconhecimento de sua efetiva ligação com o crime de quadrilha, de modo que absolvição em relação a ele mostra-se como medida necessária.

Em relação aos réus Valeri, Leomir, Hamilton e Valdomiro, o dolo encontra-se intrinsecamente vinculado às condutas dos réus e, de acordo com os elementos presentes nos autos, não há como afastar a manifestação volitiva dos agentes." (Destaquei)

Nada impede que o órgão revisor se convença das razões lançadas pela instância originária e as adote como fundamento de decidir, pois é livre o convencimento judicial. Desde que as transcreva em seu voto, estão declinados os motivos que conduziram o seu convencimento. Aliás, assim pode proceder com as razões de quaisquer dos sujeitos processuais (acusação, defesa, órgão julgador, órgão ministerial).

Com efeito, quanto a Hamilton Bernardes, Valdomiro  Alves Sobrinho, Valeri de Oliveira Alves e Leomir Miguel Scheffer tenho que a autoria delitiva restou indene de dúvidas. Vejamos.

No que tange às apurações administrativas efetuadas nos processos de concessão irregular de benefícios previdenciários, as testemunhas de acusação Evonezia de Amorim Oliveira, Loiva Terezinha Ferronato e André Vinicíus Stradiotto, servidores da Autarquia Previdenciária lotados na Equipe de Monitoramento Operacional de Benefícios de Florianópolis, mencionaram que Valeri, Leomir e Valdomiro foram apontados como intermediários em vários processos concessórios.

Quanto à atuação de Valdomiro Alves Sobrinho como um dos intermediários do esquema criminoso, o depoimento do beneficiário Valmir Garcia mostrou-se esclarecedor (evento 288, VÍDEO2, do processo originário):

"Eu não procurei ele, ele (Valdomiro) que chegou até a minha pessoa e perguntou se eu estava aposentado; ai eu disse não; (...) ele disse me dá teus documentos que eu vou lá ver se tu tem direito já à aposentadoria; ai eu dei, porque a gente trabalhou 10 anos juntos, era uma pessoa de confiança na empresa Pluma; depois de um certo tempo ele chegou e me disse tu já está aposentado e tu tem que pagar o primeiro salário no caso para ele.(...) Eu não assinei documento nenhum para ele."

Muito embora Valdomiro tenha sido apontado em poucos casos como facilitador de concessões indevidas de benefícios previdenciários e, inclusive, negue a autoria delitiva em sua defesa, aduziu em seu interrogatório judicial que "conversei que conhecia essa pessoa que podia ajudar, é , o Hamilton, que conheci ele quando era candidato (...); conheci o Valeri de vista, dentro da loja Havan; o Zamir, de vista também, no sindicato (...); também trabalhei no sindicato de 2004 a 2008; Leomir trabalhou na mesma empresa que trabalhei" (evento 290, idem).

Percebe-se que Valdomiro, atuante no sindicato de motoristas, conhecia os demais acusados, em especial Hamilton, servidor da Autarquia Previdenciária responsável pela concessão de inúmeros benefícios fraudulentos, dentre eles, o de Valmir. Além da hipótese dos autos, Valdomiro foi apontado como intermediário nos processos administrativos de aposentadorias de José Ademir da Silva e Zamir Pereira. Dessa forma, inegável a participação do réu na empreitada delitiva, cooptando "clientes", preparando a documentação necessária e apontando, inclusive, Hamilton como alguém que poderia viabilizar a tramitação do requerimento junto ao Instituto Nacional do Seguro Social.

Igualmente, no tocante a Leomir Miguel Scheffer, não merece amparo  a alegação defensiva de insuficiência probatória. As testemunhas de acusação alhures referidas, integrantes da Equipe de Monitoramento Operacional de Benefícios e responsáveis pelas investigações na esfera administrativa da Autarquia Previdenciária, apontaram a existência de menção expressa ao nome do réu por vários segurados. Ainda, de acordo com o Ofício 211/2013 do Sindicato dos Trabalhadores em Transporte de Florianópolis, Leomir assumiu a direção da entidade de 1998 a 2001, mas que, a partir de 1999, "passou a demonstrar condições financeiras superiores à da remuneração percebida pela categoria profissional dos motoristas (...) e que era conhecido pelo seu serviço de encaminhar aposentadorias perante o INSS (...) tinha contato com bons advogados e funcionários do INSS" (evento 13, INQ4, do Inquérito Policial 602/2012-4-SR/DPF/SC). 

Como bem elucida o representante do Parquet Federal em suas alegações finais (evento 314 do processo originário):

"Leomir Miguel Scheffer foi motorista de ônibus na empresa Transporte Coletivo Estrela junto com Valeri de Oliveira Alves. Foram identificados inúmeros benefícios fraudulentos em que os segurados afirmaram que foram encaminhados ou por Valeri ou por Leomir. (...) Nos processos concessórios, instruídos com documentos forjados por Valeri de Oliveira Alves e Leomir Miguel Scheffer, foi possível identificar erros padrões nos formulários utilizados para comprovar atividades que teriam sido exercidas em condições especiais pelos segurados, a fim de reduzir o tempo de contribuição necessário à aposentadoria."

Por sua vez, em seu interrogatório Valeri optou por exercer o direito ao silêncio. Contudo, além de já ter sido colega de trabalho de Leomir, verifico dos autos e dos diversos depoimentos de beneficiários que Valeri, utilizando-se do mesmo modus operandi empregado para a concessão de outros benefícios indevidos investigados pela Operação Persa, foi apontado como responsável pela juntada de documentos e por dar entrada a requerimentos administrativos junto à Autarquia Previdenciária (evento 245, VÍDEO2, do processo originário).

Por oportuno, evidente a ligação existente também entre Valeri e Valdomiro, visto que o automóvel de Valeri - Chrysler PT Cruiser, placas MES 1376 - foi transferido para Valdomiro, de acordo com as diligências realizadas no âmbito do Inquérito Policial 5017496-48.2014.404.7200.

Da mesma forma, no tocante à participação de Hamilton no esquema criminoso, tenho que restou inconteste, a despeito da tese defensiva. Além de constar sua matrícula em diversos processos concessórios apurados, impende destacar que Hamilton foi demitido do serviço público em virtude das fraudes investigadas, sendo encontrados em sua residência requerimentos de aposentadoria, documentos de segurados e do Instituto Nacional do Seguro Social, comprovando que tratava de tais assuntos fora do seu ambiente institucional de trabalho.

Portanto, verifico que a prova testemunhal e documental coligida aos autos mostra-se suficiente para atestar o esquema criminoso perpetrado por Hamilton Bernardes, Valeri de Oliveira Alves, Valdomiro Alves Sobrinho e Leomir Miguel Scheffer. Restou comprovada a existência de uma atuação conjunta, permanente e estável, que se estendeu durante cerca de 8 (oito) anos, com tarefas específicas para intermediários e servidor: enquanto Valeri, Leomir e Valdomiro arregimentavam terceiros e providenciavam a documentação fraudulenta que subsidiaria a concessão ilícita do benefício previdenciário, Hamilton, funcionário público autorizado, inseria os dados inverídicos no sistema informatizado do Instituto Nacional do Seguro Social. Tal conclusão encontra respaldo especialmente nas declarações daqueles que obtiveram o benefício indevido, todas harmônicas entre si e convergentes.

Assim, em que pese alegações defensivas de insuficiência probatória, tenho que restou claramente delineada a organização criminosa entre os réus Valeri, Leomir, Valdomiro e Hamilton, os quais agiram de maneira a subsidiar a concessão de diversos benefícios previdenciários indevidos, recebendo em razão de suas ações parte dos valores auferidos pelos beneficiários.

O dolo delitivo igualmente está provado, uma vez que os acusados agiram com o escopo de proporcionar a concessão de benefícios indevidos.

Em contrapartida, diferente é a conclusão que se infere a partir da análise do comportamento de Rosana Aparecida Regis da Rocha e de Zamir Pereira. Isso porque, a despeito de Rosana ter sido demitida do serviço público em razão do acolhimento das conclusões apresentadas pela Comissão Processante do Processo Administrativo Disciplinar 35239.000520/2011-74 e de haver indícios da participação de Zamir no sentido de captar "clientes", tenho que uma condenação penal exige um juízo de certeza, isto é, um conjunto de elementos robustos e substancialmente convergentes no sentido da autoria e do dolo delitivos, pressupostos não configurados, suficientemente, nos autos.

No caso de Rosana, verifico ser plausível a tese defensiva de que os dados de acesso (login e senhas) ao sistema informatizado do Instituto Nacional do Seguro Social exclusivos dela foram utilizados pelo colega de trabalho Hamilton para instrumentalizar concessões irregulares de benefícios previdenciários a terceiros, com o fim de escamotear-se de eventual investigação.

A testemunha Bruna do Amaral Rosseto, estagiária da Agência da Previdência Social de São José na época dos fatos, afirmou que a única pessoa que lhe pedia para numerar, dentre outros favores, era Hamilton, e que por várias vezes colocava carimbo de Rosana nos processos, atendendo ordens dele (evento 297 do processo originário).

Na mesma linha, Antônio Paulo Pires da Costa, servidor da Agência do Município de São José/SC, informou saber que Rosana possuía uma agenda com senhas pessoais, guardada na gaveta do guichê. Contou que todos os servidores eram de extrema confiança e que, para algumas ações, era necessáira a senha da Chefia, afirmando também "ter quase certeza que ela (Rosana) não esteja envolvida nisso" (eventos 299 a 301, idem).

Nesse cenário, Rosana negou a autoria, sustentando que anotava as senhas em agenda guardada na gaveta de sua mesa de trabalho, sem chave. Referiu acreditar ter sido Hamilton quem se apoderou de seus dados de acesso ao sistema, considerando a apreensão da agenda dele contendo a matrícula e a senha da denunciada (eventos  294 e 295, idem).

Diante do exposto, inegável a existência de dúvida considerável quanto à autoria delitiva da acusada, o que impossibilita, por conseguinte, a decretação de um édito condenatório. Tenho que as provas coligidas não permitem a formação de uma valoração segura acerca da prática delitiva por Rosana, inexistindo elementos contundentes que contrariem a versão apresentada pela ré e adotada pela magistrada sentenciante.

Igualmente, a despeito do pleito ministerial pela condenação de Zamir, verifico que sua conduta não foi suficientemente delineada nos autos, constando como beneficiário de uma aposentadoria irregular e, em tese, como arregimentador de eventuais segurados, sem comprovação quanto a este fato.

A teor do artigo 156 do Código de Processo Penal, incumbe à acusação produzir prova robusta e apta a demonstrar, com certeza, a materialidade do delito, a autoria e o dolo dos agentes.

Se, no momento do recebimento da denúncia, prevalece o interesse da sociedade para apuração da infração penal, ocasião em que se apresenta suficiente a prova da materialidade e indícios de autoria, diversa é a fase de julgamento, em que deve preponderar a certeza, não bastando fracos indícios, por envolver um dos direitos fundamentais do indivíduo, a liberdade. Impera a aplicação da máxima in dubio pro reo.

Saliento que não se está a afirmar, inequivocadamente, a inocência de Rosana e de Zamir. Entretanto, havendo dúvida séria sobre a participação destes na empreitada criminosa, aplica-se à hipótese tal postulado, devendo-se decidir pelo modo mais favorável aos acusados.

Portanto, mantenho a absolvição de Rosana Aparecida Regis da Rocha e de Zamir Pereira em relação ao delito tipificado no artigo 288 do Código Penal (redação anterior à Lei 12.850/2013), alterando-se, todavia, quanto à Rosana, por força do apelo da acusação, o enquadramento jurídico para o disposto no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, diante do estado de dúvida, mas não de certeza de que a ré não praticou a infração penal e, por estarem comprovadas a materialidade e autoria delitiva, bem assim o dolo dos demais agentes, sendo os fatos típicos, antijurídicos e culpáveis e inexistindo causas excludentes, mantenho a condenação de Hamilton Bernardes, Valdomiro Alves Sobrinho, Valeri de Oliveira Alves e Leomir Miguel Scheffer pela prática do crime de quadrilha.

5. Dosimetria das penas

O tipo previsto no artigo 288 do Código Penal comina uma sanção reclusiva variável entre 1 (um) e 3 (três) anos.

5.1. Réu Hamilton Bernardes

A magistrada singular assim procedeu à dosimetria da pena privativa de liberdade (evento 357 do processo originário):

"1. Pena-base: em relação às circunstâncias do art. 59 do Código Penal, verifico que a culpabilidade do agente, tendo em vista toda a teia de fraudes que envolveram o delito, deverá ser valorada negativamente. No que toca aos antecedentes criminais, observo que réu é tecnicamente primário. Nada foi alegado contra sua conduta social. Não há elementos para aferir sua personalidade. Os motivos do crime são inerentes ao tipo penal. As circunstâncias do delito não desbordam do ordinário. As consequências merecem valoração negativa, porquanto a concessão indevida de benefícios previdenciários traz prejuízos sistêmicos e, tendo em vista a condição atual de deficit nos cofres da previdência, poderá comprometer a concessão de benefícios previdenciários às gerações futuras. Não houve influência do comportamento da vítima.

Assim, reconhecidas duas circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

2. Pena provisória: na segunda fase, não verifico incidir no caso qualquer circunstância agravante ou atenuante motivo pelo qual mantenho a pena provisória em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

3. Pena definitiva: Na terceira fase, verifico que não há qualquer causa de aumento ou diminuição da pena, razão por que fixo a pena definitiva em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade é o aberto (Código Penal, art. 33, § 2°, 'c')." (Destaques originais)

Não merece reparos a decisão, a qual mantenho com base na fundamentação acima transcrita, considerando a ausência de recurso ministerial.

No caso concreto, a despeito do pleito defensivo pela redução da reprimenda ao patamar mínimo legal, ao analisar as vetoriais do artigo 59 do Código Penal tenho que devem ser mantidas as valorações negativas dos vetores culpabilidade, considerando o descumprimento dos deveres inerentes à Administração Pública de moral e boa-fé que, na condição de servidor público, deveria ter observado, de modo a tornar sua conduta mais reprovável, e consequências do delito, haja vista a repercussão negativa da conduta na imagem da Administração Pública, mais especificamente da Previdência Social brasileira.

Nesse sentido, colaciono precedentes:

"APELAÇÃO CRIMINAL. ARTIGO 313-A DO CÓDIGO PENAL. INSERÇÃO DE DADOS FALSOS NO SISTEMA INFORMATIZADO DO INSS VISANDO À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA INDEVIDA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA. REDUÇÃO DA PENA DE RECLUSÃO E DE MULTA. REGIME SEMIABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. A acusada foi condenada pela prática do crime definido no artigo 313-A do Código Penal, por inserir dados falsos no sistema informatizado de concessão de benefícios do INSS, com o fim de obter vantagem indevida, consistente na concessão de aposentadoria. Após apuração administrativa, a Gerência Executiva concluiu que foi computado tempo de contribuição sem a devida comprovação. Descontando-se o tempo de serviço não comprovado, o contribuinte não fazia jus à concessão do benefício à época do fato. O prejuízo causado aos cofres públicos foi apurado no valor de R$ 178.226,34 (cento e setenta e oito mil duzentos e vinte e seis reais e vinte e trinta e quatro centavos) em janeiro de 2011. Ficou cabalmente demonstrado nos autos que a ré foi a responsável pelo recebimento e análise dos documentos apresentados para comprovação do tempo de contribuição, bem como pelo lançamento dos dados no sistema do INSS, que ensejaram a concessão do benefício indevido. Evidente o dolo da acusada, que conscientemente inseriu informações inverídicas visando à complementação do tempo necessário para a concessão da aposentadoria. Os argumentos lançados nas razões recursais não se prestam a fixar a pena-base no mínimo legal, uma vez que as consequências do crime merecem valoração negativa, bem como a culpabilidade da ré é reprovável. Não há elementos nos autos que permitam a valoração negativa da personalidade da acusada. Assim, diante da redução da quantidade de circunstâncias desfavoráveis à ré, a pena-base comporta mitigação. Pena-base fixada em 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão. Agravante do art. 61, II, g do Código Penal. Violação do dever funcional. A conduta da ré constitui crime próprio, somente praticado por servidor público. A aplicação da agravante referente à violação de dever inerente ao cargo (art. 61, II, g, do Código Penal) implicaria em inaceitável bis in idem. A pena de multa deve guardar proporcionalidade com a pena privativa de liberdade, bem como de acordo com o sistema trifásico de dosimetria da pena. Pena de multa fixada em 22 (vinte e dois) dias-multa, mantido o valor unitário equivalente a 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato. Regime inicial eleito com base no art. 33, §2º, b do Código Penal. Regime semiaberto. Não restaram preenchidos os requisitos para a concessão do benefício previsto no artigo 44 do Código Penal. Permissão legal de cumulação de pretensão acusatória com a indenizatória não dispensa a existência de expresso pedido formulado pelo ofendido ou do Ministério Público durante a instrução processual, para que seja oportunizado o contraditório ao réu, sob pena de violação ao princípio da ampla defesa. Apelação do Ministério Público Federal a que se nega provimento. Apelação da defesa a que se dá parcial provimento para reduzir a pena-base e a pena de multa e conceder a justiça gratuita. Pena definitivamente fixada em 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 22 (vinte e dois) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. De ofício, afastado o quantum fixado a título de reparação dos danos, na forma acima fundamentada." (TRF3, ACR 00000796920144036110, 11ª Turma, Relator Des. Federal José Lunerdelli, DJe 7-6-2016 - grifei)

"PENAL. CONCUSSÃO (ART. 316 DO CÓDIGO PENAL). MATERIALIDADE E AUTORIA. COMPROVAÇÃO. DOSIMETRIA. PERDA DO CARGO. MANUTENÇÃO. Comprovados a autoria e a materialidade e o dolo na prática do crime de concussão, impõe-se a manutenção da condenação. É desfavorável a culpabilidade do réu em vista da especial função por ele exercida (policial rodoviário federal), pois incrementa a exigência do comportamento que dele a sociedade espera, tornando mais reprovável a conduta praticada. São graves as consequências do crime, quando o fato criminoso repercute imagem negativa sobre a Polícia Rodoviária Federal perante a sociedade. Manutenção da perda do cargo decretada na sentença condenatória, devidamente fundamentada nas circunstâncias do caso, evidenciando que a conduta do servidor se revela incompatível com o desempenho de cargo, emprego ou função pública." (TRF4, ACR 5079549- 83.2014.404.7000, 7ª Turma, Relator Des. Federal Márcio Antônio Rocha, juntado aos autos em 12-8-2016 - grifei)

Por tais razões, preservo as valorações desfavoráveis dos vetores culpabilidade e consequências do crime. Assim, mantenho a pena basilar em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão, porquanto entendo que o referido aumento sobre a pena mínima é adequado à ação praticada.

Na segunda etapa, inexistem circunstâncias agravantes e atenuantes.

Na derradeira fase, verifico não incidirem quaisquer causas de aumento ou de diminuição, restando a pena definitivamente fixada em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial aberto, nos termos do artigo 33, §2º, alínea 'c', do Código Penal.

5.1.2. Substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos

Não preenchidos os pressupostos do artigo 44 do Código Penal, inviável a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, inobstante a irresignação defensiva no ponto.

Com efeito, em que pese condenação do réu à pena corporal inferior a 4 (quatro) anos, a circunstância judicial atinente à culpabilidade, além das consequências do crime, foram valoradas negativamente.

Nessa linha, colaciono precedentes do Supremo Tribunal Federal:

"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES PRIVILEGIADO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE EM RESTRITIVA DE DIREITOS E FIXAÇÃO DE REGIME INICIAL DIVERSO DO FECHADO. VIA PROCESSUAL INADEQUADA. NECESSIDADE DE ANÁLISE DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SUBSTITUIÇÃO NEGADA COM BASE NAS CIRCUNSTÂNCIAS PREVISTAS NO INCISO III DO ART. 44 DO CÓDIGO PENAL. IMPOSIÇÃO DE REGIME INICIAL MAIS GRAVOSO CONCRETAMENTE JUSTIFICADA. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. No que tange à negativa de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, a decisão questionada, além de estar suficientemente fundamentada, está em perfeita consonância com a jurisprudência desta Corte Suprema, no sentido de que, havendo a indicação de circunstâncias judiciais desfavoráveis pelas instâncias ordinárias, não é o habeas corpus a via adequada para ponderar, em concreto, a suficiência delas para a majoração da pena-base (HC nº 92.956/SP, Primeira Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJ de 25/4/08). Penso que o mesmo deva ocorrer na hipótese de pretendida substituição. 2. Do mesmo modo, a via eleita não deve ser utilizada para conceder a pretendida substituição, com reanálise das circunstâncias previstas no inciso III do art. 44 do Código Penal, senão em situações excepcionalíssimas, nas quais a teratologia seja patente, especialmente porque isso exigiria o reexame de fatos e provas, providência incabível nesta sede. 3. Ao contrário do que alegado na inicial, o juiz não está obrigado a proceder à substituição quando ausentes os requisitos previstos no art. 44 do Código Penal, tendo plena liberdade para negá-la quando entender que essa medida não seja suficiente e necessária para reprovar e prevenir o crime, segundo as peculiaridades de cada caso concreto. Do contrário, seria inócua a previsão legal facultando a substituição. 4. Como se vê, na espécie, a negativa não apenas atendeu aos requisitos legais, como também respeitou o princípio da individualização da pena e as especificidades próprias da legislação, especialmente porque o paciente foi flagrado com expressiva quantidade cocaína, entorpecente de altíssima lesividade à saúde pública. 5. Em relação ao regime prisional fechado estabelecido para o início do cumprimento da reprimenda carcerária, observo que sua fixação está igualmente justificada, diante do que dispõe o § 3º do art. 33 do Código Penal, que impõe a 'observância dos critérios previstos no art. 59', segundo o qual, o magistrado deve observar a necessidade e a suficiência da sanção 'para reprovação e prevenção do crime'. 6. Recurso não provido." (STF, RHC 114742/DF, 1ª Turma, Relator Ministro Dias Toffoli, DJe 8-11-2012 - destaquei)

"PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIME DE ESTELIONATO EM CONTINUIDADE DELITIVA (ART. 171, C/C ART. 71, AMBOS DO CP). REGIME INICIAL FECHADO. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. IMPOSIÇÃO DE REGIME MAIS GRAVOSO. POSSIBILIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVAS DE DIREITO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 44, III, DO CÓDIGO PENAL. INEXISTÊNCIA DE REFORMATIO IN PEJUS. FIXAÇÃO DE REGIME INICIAL SEMIABERTO EM RAZÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. O regime inicial de cumprimento da pena não resulta tão-somente de seu quantum, mas, também, das circunstâncias judiciais elencadas no artigo 59 do Código Penal, a que faz remissão o artigo 33, § 3º, do mesmo Código. Destarte, não obstante a pena ter sido fixada em quantidade que permite o início de seu cumprimento em regime aberto, nada impede que o juiz, à luz do artigo 59 do Código Penal, imponha regime mais gravoso. (...) 2. As circunstâncias judiciais quando desfavoráveis revelam a inviabilidade da substituição da sanção corporal, em razão do não preenchimento dos requisitos elencados no artigo 44, inciso III, do Código Penal. Precedentes: RHC 112.875, Primeira Turma, Relator o Ministro Luiz Fux, DJ de 19.11.12; RHC 114.742, Primeira Turma, Relator o Ministro Dias Toffoli, DJ de 08.11.12 e HC 103.824, Segunda Turma, Relator o Ministro Ayres Britto, DJ de 05.11.10. 3. a 7. Omissis." (STF, RHC 118658/SP, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz Fux, DJe 2-6-2014 - destaquei)

Ainda, segue julgado do Superior Tribunal de Justiça:

"PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. ESTELIONATO EM CONTINUIDADE DELITIVA. RÉU PRIMÁRIO. PENA INFERIOR A 4 ANOS DE RECLUSÃO. CIRCUNSTÂNCIA DO ART. 59 DO CP DESFAVORÁVEL. REGIME INICIAL SEMIABERTO. ART. 33, § 3°, DO CP. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. NÃO PREENCHIMENTO DO REQUISITO SUBJETIVO. WRIT NÃO CONHECIDO. 1. Não há ilegalidade na fixação do regime inicial semiaberto quando apontado dado fático suficiente a indicar a gravidade concreta do crime - na espécie, a culpabilidade desfavorável e as graves consequências do crime -, ainda que o réu seja primário e o quantum da pena seja inferior a 4 anos (art. 33, § 3º, do CP). 2. Para a substituição da sanção privativa de liberdade por restritiva de direitos, é necessário que estejam preenchidos, cumulativamente, os requisitos objetivos e subjetivos exigidos para a concessão dessa benesse, os quais se encontram previstos no art. 44 do CP. 3. Conquanto a condenação haja sido inferior a 4 anos de reclusão, o Tribunal de origem concluiu ser insuficiente e desproporcional à reprovação do delito a aplicação do benefício, pois o réu praticou os estelionatos "mediante abuso de confiança em razão do cargo que ocupava" e foram graves as consequências financeiras suportadas pela empresa vítima, o que denota o não preenchimento do art. 44, III, do CP. 4. Habeas corpus não conhecido." (STJ, HC 266748/SP, 6ª Turma, Relator Ministro Rogério Schietti Cruz, DJe 28-4-2016 - destaquei)

Por fim, corroborando, destaco jurisprudência desta Corte:

"PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 334 DO CÓDIGO PENAL. CONTRABANDO DE CIGARROS. DOSIMETRIA. CIRCUNSTANCIAS DO CRIME. INABILITAÇÃO PARA DIRIGIR VEÍCULOS. ART. 70 DA LEI Nº 4.117/62. CRIME CONTRA AS TELECOMUNICAÇÕES. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA. SÚMULA 269 DO STJ. [...] 6. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, em razão de o réu não preencher os requisitos do artigo 44, III, do Código Penal. 7. Apelação criminal parcialmente provida". (TRF4, ACR 5001923- 68.2013.404.7017, 8ª Turma, Relator Des. Federal João Pedro Gebran Neto, juntado aos autos em 28-7-2016)

5.2. Réu Valdomiro Alves Sobrinho

A magistrada singular assim procedeu à dosimetria da pena privativa de liberdade (idem):

"1. Pena-base: em relação às circunstâncias do art. 59 do Código Penal, verifico que a culpabilidade do agente, tendo em vista toda a teia de fraudes que envolveram o delito, deverá ser valorada negativamente. No que toca aos antecedentes criminais, observo que réu é tecnicamente primário. Nada foi alegado contra sua conduta social. Não há elementos para aferir sua personalidade. Os motivos do crime são inerentes ao tipo penal. As circunstâncias do delito não desbordam do ordinário. As consequências merecem valoração negativa, porquanto a concessão indevida de benefícios previdenciários traz prejuízos sistêmicos e, tendo em vista a condição atual de deficit nos cofres da previdência, poderá comprometer a concessão de benefícios previdenciários às gerações futuras. Não houve influência do comportamento da vítima.

Assim, reconhecidas duas circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

2. Pena provisória: na segunda fase, não verifico incidir no caso qualquer circunstância agravante ou atenuante motivo pelo qual mantenho a pena provisória em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

3. Pena definitiva: Na terceira fase, verifico que não há qualquer causa de aumento ou diminuição da pena, razão por que fixo a pena definitiva em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade é o aberto (Código Penal, art. 33, § 2°, 'c')."

Igualmente, quanto ao réu Valdomiro, entendo que a dosimetria fixada no édito condenatório não merece maiores digressões, devendo ser mantida.

Destarte, à míngua de recurso da acusação e por se mostrar adequado ao caso concerto, mantenho o juízo de valor desfavorável acerca das vetoriais culpabilidade e consequências do crime, preservando, portanto, a pena basilar em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

Nessa senda, colaciono precedente:

"PENAL. PROCESSO PENAL. NULIDADE. PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ARTIGO 313-A DO CÓDIGO PENAL. TIPICIDADE. MATERIALIDADE. AUTORIA. DOLO. DOSIMETRIA DA PENA. 1. Comprovadas a materialidade e a autoria delitivas pela inserção, por funcionário autorizado, de dados falsos no sistema informatizado do Instituto Nacional do Seguro Social, para o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem, confirma-se a sentença condenatória pela prática do crime previsto no artigo 313-A do Código Penal. 2. Por ser elementar do tipo, a condição de funcionário autorizado se comunica ao intermediador na concessão dos benefícios previdenciários indevidos, coautor do delito, a teor do artigo 30 do Código Penal, quando demonstrado que ele tinha ciência dessa condição especial do corréu e dela se valeu para a prática do crime. 3. Na fixação da pena-base, a condição de possuir curso superior não configura culpabilidade negativa a ponto de exasperar a pena-base, quando essa condição em nada favoreceu a prática do crime. 4. O fato do réu de ter ciência das conseqüências de sua conduta, por trabalhar na mesma função há muitos anos, não enseja exasperação da pena, quando essa circunstância integra o tipo, relativamente ao "funcionário autorizado". 5. Configura culpabilidade grave a do intermediador na concessão do benefício previdenciário que, sendo estagiário de Direito, apresentava-se como advogado e se utilizava dessa aparente condição para a empreitada criminosa, angariando a confiança das pessoas com o anúncio de que era conhecedor do ordenamento jurídico, de forma que obteria êxito na concessão do benefício. 6. O expressivo prejuízo causado pela prática do crime autoriza a exasperação da pena-base. 7. O artigo 313-A do Código Penal exige que a inserção de dados falsos em sistema informatizado da Administração Pública seja feita por funcionário autorizado, de forma que a aplicação da agravante do artigo 61, inciso II, alínea g, do Código Penal - violação de dever inerente ao cargo - configura bis in idem. Se o crime só é praticado por funcionário autorizado, a conduta sempre ocorrerá com violação de dever inerente ao cargo exercido." (TRF4, ACR 00004563920084047010, 7ª Turma, Relator Des. Federal Márcio Antônio Rocha, DJe 17-11-2015 - destaquei)

Na segunda etapa, inexistem circunstâncias agravantes e atenuantes.

Na derradeira fase, ausentes causas de aumento ou de diminuição, resta a pena definitiva fixada em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial aberto, nos termos do artigo 33, §2º, alínea 'c', do Código Penal.

5.2.1. Substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos

Diante do reconhecimento do decurso do prazo prescricional quanto ao delito previsto no artigo 313-A do Código Penal, remanescendo apenas o crime de quadrilha disposto no artigo 288 do mesmo diploma legal, a juíza singular procedeu à substituição da pena privativa de liberdade de Valdomiro por sanções restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e prestação pecuniária,  por serem as que melhor atingem a finalidade da persecução criminal (evento 386, idem). A primeira, porque exige do condenado um esforço no sentido de contribuir com o interesse público. A segunda, porque, ao contrário da multa que reverte sempre ao Estado, converte-se em prol da vítima, seus dependentes ou entidade pública ou privada com destinação social.

Quanto ao valor da segunda substitutiva em questão (artigo 43, inciso I, do Código Penal), cumpre referir que o julgador, dentre os parâmetros estabelecidos pelo artigo 45, §1º, do mesmo diploma legal, deve considerar certos fatores, de modo a não tornar a prestação em pecúnia tão diminuta a ponto de mostrar-se inócua, nem tão excessiva de maneira a inviabilizar seu cumprimento.

Nessa linha, tenho que tal prestação deve ser suficiente para a prevenção e reprovação do crime praticado, atentando-se, ainda, para a extensão dos danos decorrentes do ilícito e para a situação econômica do condenado, a fim de que se possa viabilizar seu cumprimento. Levando-se em conta tais critérios, mantenho o montante arbitrado em sentença, qual seja, o valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

Saliento que poderá haver o parcelamento da referida pena restritiva de direitos, caso comprovada, perante o juízo da execução, a impossibilidade de seu pagamento em parcela única.

5.3. Réu Leomir Miguel Scheffer

A magistrada singular assim procedeu à dosimetria da pena privativa de liberdade de Leomir (idem):

"1. Pena-base: em relação às circunstâncias do art. 59 do Código Penal, verifico que a culpabilidade do agente, tendo em vista toda a teia de fraudes que envolveram o delito, deverá ser valorada negativamente. No que toca aos antecedentes criminais, observo que réu é tecnicamente primário. Nada foi alegado contra sua conduta social. Não há elementos para aferir sua personalidade. Os motivos do crime são inerentes ao tipo penal. As circunstâncias do delito não desbordam do ordinário. As consequências merecem valoração negativa, porquanto a concessão indevida de benefícios previdenciários traz prejuízos sistêmicos e, tendo em vista a condição atual de deficit nos cofres da previdência, poderá comprometer a concessão de benefícios previdenciários às gerações futuras. Não houve influência do comportamento da vítima.

Assim, reconhecidas duas circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

2. Pena provisória: na segunda fase, não verifico incidir no caso qualquer circunstância agravante ou atenuante motivo pelo qual mantenho a pena provisória em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

3. Pena definitiva: Na terceira fase, verifico que não há qualquer causa de aumento ou diminuição da pena, razão por que fixo a pena definitiva em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade é o aberto (Código Penal, art. 33, § 2°, 'c')."

Da mesma forma, quanto ao réu Leomir, a despeito do pleito defensivo pela fixação da pena no patamar mínimo legal, tenho que adequada a dosimetria fixada na sentença, não carecendo de maiores digressões, à míngua de recurso da acusação.

Nesse cenário, com base nos fundamentos alhures, mantenho o juízo de valor desfavorável acerca das vetoriais culpabilidade e consequências do crime, preservando a pena basilar em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

Na segunda etapa, inexistem circunstâncias agravantes e atenuantes.

Na derradeira fase, ausentes causas de aumento ou de diminuição, resta a pena definitiva fixada em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial aberto, nos termos do artigo 33, §2º, alínea 'c', do Código Penal.

5.3.1. Substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos

Nada obstante a tese defensiva, compartilho do entendimento manifestado pela juíza singular no sentido de ser incabível a referida substituição, diante do não preenchimento dos requisitos subjetivos estabelecidos no artigo 44, inciso III, do Código Penal. Destarte, a valoração negativa da culpabilidade e das consequências do crime atesta que a substituição não se mostra medida socialmente recomendável ao caso concreto.

5.4. Réu Valeri de Oliveira Alves

A magistrada singular assim procedeu à dosimetria da pena privativa de liberdade de Leomir (idem):

"1. Pena-base: em relação às circunstâncias do art. 59 do Código Penal, verifico que a culpabilidade do agente, tendo em vista toda a teia de fraudes que envolveram o delito, deverá ser valorada negativamente. No que toca aos antecedentes criminais, observo que réu é tecnicamente primário. Nada foi alegado contra sua conduta social. Não há elementos para aferir sua personalidade. Os motivos do crime são inerentes ao tipo penal. As circunstâncias do delito não desbordam do ordinário. As consequências merecem valoração negativa, porquanto a concessão indevida de benefícios previdenciários traz prejuízos sistêmicos e, tendo em vista a condição atual de deficit nos cofres da previdência, poderá comprometer a concessão de benefícios previdenciários às gerações futuras. Não houve influência do comportamento da vítima.

Assim, reconhecidas duas circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

2. Pena provisória: na segunda fase, não verifico incidir no caso qualquer circunstância agravante ou atenuante motivo pelo qual mantenho a pena provisória em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

3. Pena definitiva: Na terceira fase, verifico que não há qualquer causa de aumento ou diminuição da pena, razão por que fixo a pena definitiva em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade é o aberto (Código Penal, art. 33, § 2°, 'c')."

Igualmemte, a despeito do pleito defensivo pela fixação da pena no patamar mínimo legal, tenho que adequada a dosimetria fixada na sentença, razão pela qual mantenho o juízo de valor desfavorável acerca das vetoriais culpabilidade e consequências do crime, preservando a pena basilar em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão.

Na segunda etapa, inexistem circunstâncias agravantes e atenuantes.

Na derradeira fase, ausentes causas de aumento ou de diminuição, resta a pena definitiva fixada em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial aberto, nos termos do artigo 33, §2º, alínea 'c', do Código Penal.

5.4.1. Substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos

No ponto, reitero que compartilho do entendimento manifestado pela juíza singular no sentido de ser incabível a referida substituição, diante do não preenchimento dos requisitos subjetivos estabelecidos no artigo 44, inciso III, do Código Penal. Destarte, a valoração negativa da culpabilidade e das consequências do crime atesta que a substituição não se mostra medida socialmente recomendável ao caso concreto.

6. Prescrição

Diante da manutenção da pena aplicada aos réus, importa confirmar a não ocorrência da prescrição.

As reprimendas privativas de liberdade concretamente impostas a Hamilton, Valdomiro, Leomir e Valeri, referentes ao delito de quadrilha, remetem ao prazo prescricional de 4 (quatro) anos (artigo 109, inciso V, do Código Penal).

Considerando que a prescrição penal é instituto de natureza material e que o crime em comento caracteriza-se pela estabilidade e permanência, configurada até o ano de 2011, aplicável ao caso as alterações introduzidas no Código Penal pela Lei 12.234, de 5-5-2010, no que interessa a este julgamento.

Nesses termos, verifico que a peça vestibular foi recebida em 31-7-2014 (evento 10, idem) e a sentença condenatória publicada em 4-6-2017 (evento 357, idem), levando-se em conta, ainda, a data do presente julgamento, verifico que não se consumou o lapso extintivo entre os respectivos marcos, permanecendo hígida a pretensão punitiva estatal.

7. Execução imediata

Aderindo à orientação do Supremo Tribunal Federal (HC 126.292, Plenário, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 17-5-2016), entendimento confirmado no julgamento das medidas cautelares nas ADC 43 e 44 (5-10-2016), bem como reafirmado em sede de repercussão geral (ARE 964246 RG, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 25-11-2016), este Regional voltou a compreender que a execução provisória de acórdão penal condenatório, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio da presunção de inocência (artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal).

Portanto, restando superada a tese adotada em precedente contrário daquele Excelso Pretório (HC 84.078), e revigorada a exegese compendiada na súmula 267, do Superior Tribunal de Justiça, esta Corte consolidou sua jurisprudência no enunciado 122:

"Encerrada a jurisdição criminal de segundo grau, deve ter início a execução da pena imposta ao réu, independentemente da eventual interposição de recurso especial ou extraordinário."

Cabe pontuar, à guisa de explicitação, que havendo porção não unânime no acórdão, inexatidão material ou ponto que demande esclarecimento ou complementação, o prazo para apresentação dos recursos supramencionados estará interrompido, se forem oferecidos embargos infringentes e de nulidade, ou de declaração àquele julgado, e, o sendo, atendam os seus pressupostos de admissibilidade e/ou cabimento (STF, AI 583960 - AgR, 1ª Turma, relator Ministro Roberto Barroso, DJe 28-8-2015, e STJ, AgInt no REsp 1.424.222, 1ª Turma, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 13-3-2018). Nesse caso, isto é, não sendo negado seguimento pelo Relator, a jurisdição de segundo grau estará encerrada tão logo sejam julgados (STJ, HC 430.198-SP, 5ª Turma, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, DJe 21-03-2018, e TRF4, EINUL 5008572-31.2012.4.04. 7002, 4ª Seção, relator Desembargador Federal Sebastião Ogê Muniz, juntados em 10-04-2016).

Assim, uma vez (a) decorrido o prazo para interposição de Embargos Infringentes e de Nulidade ou para oposição de Embargos de Declaração ao acórdão, (b) apresentados tais recursos, (b.1) não forem admitidos pelo Relator ou (b.2) forem julgados, deve ser comunicado o juízo de origem para que dê cumprimento aos termos da condenação.

8. Conclusão

Mantida a absolvição de Rosana quanto à imputação pela prática do delito previsto no artigo 288 do Código Penal (redação anterior à Lei 12.850/2013), alterando-se, todavia, o enquadramento jurídico para o disposto no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, no que provida a apelação ministerial.

Preservada, igualmente, a absolvição de Zamir Pereira em relação ao crime de quadrilha, forte no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.

Mantidas as condenações dos réus Hamilton Bernardes, Valdomiro Alves Sobrinho, Leomir Miguel Scheffer e Valeri de Oliveira Alves pela prática do crime de quadrilha (redação anterior à Lei 12.850/2013), vez que comprovadas a materialidade e autoria delitivas, bem assim o dolo, sendo o fato típico, antijurídico e culpável, inexistindo causas excludentes.

À míngua de recurso da acusação, a pena privativa de liberdade de todos os réus restou definitivamente fixada em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial aberto. Para Valdomiro houve a substituição da reprimenda privativa de liberdade por restritivas de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de R$30.000,00 (trinta mil reais), o que restou mantido.

Na primeira fase das dosimetrias das reprimendas corporais dos réus, foram valoradas negativamente as vetoriais culpabilidade e consequências do crime, exasperando a pena-base em 3 (três) meses; na segunda, inexistentes agravantes e atenuantes; e, na terceira, ausentes causas de aumento ou de diminuição de pena.

Determinado que seja comunicado o juízo de origem para que dê cumprimento aos termos da decisão de segundo grau, uma vez implementadas as condições previstas neste julgamento.

9. Dispositivo

Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação criminal do Ministério Público Federal, negar provimento às apelações criminais defensivas e comunicar o juízo de origem para que dê cumprimento aos termos da decisão de segundo grau, uma vez implementadas as condições previstas neste julgamento.



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5005026-82.2014.4.04.7200
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

 

 

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5005026-82.2014.4.04.7200/SC

 

RELATORDESEMBARGADOR FEDERAL VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

APELANTEVALDOMIRO ALVES SOBRINHO (RÉU)

APELANTELEOMIR MIGUEL SCHEFFER (RÉU)

APELANTEMINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (AUTOR)

APELANTEVALERI DE OLIVEIRA ALVES (RÉU)

APELANTEHAMILTON BERNARDES (RÉU)

APELADOVALMIR GARCIA (RÉU)

APELADOOS MESMOS

APELADOZAMIR PEREIRA (RÉU)

APELADOROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA (RÉU)

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. OPERAÇÃO PERSA. ARTIGO 288 DO CÓDIGO PENAL (REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 12.850/2013). QUADRILHA. ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA. ABSOLVIÇÃO DE ZAMIR E DA RÉ MANTIDA, COM ALTERAÇÃO DO ENQUADRAMENTO JURÍDICO. ARTIGO 386, INCISO VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DOS DEMAIS RÉUS COMPROVADOS. CONDENAÇÕES MANTIDAS.  EXECUÇÃO IMEDIATA.

1. A Operação Persa foi deflagrada pela Polícia Federal de Santa Catarina para desarticular um esquema de fraudes na concessão de benefícios na Agência da Previdência Social do Município de São José/SC.

2. O delito de quadrilha ou bando, na sua redação original, caracteriza-se por ser formal, permanente e de perigo, consumando-se com a associação estável de pelo menos quatro pessoas para o cometimento de ilícitos penais, independentemente da efetiva prática dos mesmos.

3. O conjunto probatório coligido aos autos não permite a formação de um juízo de valor seguro acerca da prática delitiva por parte de Rosana e de Zamir, inexistindo elementos contundentes que contrariem as versões defensivas apresentadas. Manutenção da absolvição de ambos, com alteração do enquadramento jurídico, quanto à Rosana, para o disposto no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, por força do apelo ministerial.

4. Hipótese em que as as condutas delitivas foram perpetradas de modo organizado, em conjunto, para tal. A associação criminosa verificada não era eventual, haja vista que o esquema criminoso possibilitou a concessão irregular de inúmeros benefícios previdenciários durante anos, além de restar evidente o prévio acerto dos agentes e aperfeita determinação de quais papéis caberiam a cada um deles.

5. Devidamente provados a autoria, a materialidade e o dolo dos acusados Hamilton, Valdomiro, Leomir e Valeri, sendo os fatos típicos, antijurídicos e culpáveis, considerando a inexistência de causas excludentes, a manutenção da sentença condenatória é medida que se impõe.

6. O enunciado sumular 122 deste Regional, aderindo à orientação do Supremo Tribunal Federal (HC 126.292, Plenário, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 17-5-2016), entendimento confirmado no julgamento das medidas cautelares nas ADC 43 e 44 (05-10-2016), bem como reafirmado em sede de repercussão geral (ARE 964246 RG, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 25-11-2016), autoriza que a decisão de segundo grau irradie, integralmente, seus efeitos, é dizer, em toda a extensão do que tiver sido provido pelo julgamento, uma vez (a) decorrido o prazo para interposição de Embargos Infringentes e de Nulidade ou para oposição de Embargos de Declaração, nos casos em que esses forem cabíveis, ou (b) se tiverem sido apresentados tais recursos, (b.1) não forem admitidos pelo Relator, (b.2) assim que forem julgados.

7. Parcial provimento do apelo da acusação e improvimento das apelações defensivas.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação criminal do Ministério Público Federal, negar provimento às apelações criminais defensivas e comunicar o juízo de origem para que dê cumprimento aos termos da decisão de segundo grau, uma vez implementadas as condições previstas neste julgamento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 27 de fevereiro de 2019.



Documento eletrônico assinado por VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000859127v6 e do código CRC bf015b05.

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5005026-82.2014.4.04.7200
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/02/2019

 

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5005026-82.2014.4.04.7200/SC

 

RELATORDESEMBARGADOR FEDERAL VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

REVISORDESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO PEDRO GEBRAN NETO

PRESIDENTEDESEMBARGADOR FEDERAL VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

PROCURADOR(A)MAURICIO GOTARDO GERUM

APELANTEMINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (AUTOR)

APELANTEVALERI DE OLIVEIRA ALVES (RÉU)

ADVOGADOFABRÍCIO VON MENGDEN CAMPEZATTO (DPU)

APELANTEHAMILTON BERNARDES (RÉU)

ADVOGADOALEXANDRE VARGAS AGUIAR (DPU)

APELANTEVALDOMIRO ALVES SOBRINHO (RÉU)

ADVOGADOHENRIQUE GUIMARAES DE AZEVEDO (DPU)

APELANTELEOMIR MIGUEL SCHEFFER (RÉU)

ADVOGADORICARDO HENRIQUE ALVES GIULIANI (DPU)

APELADOOS MESMOS

APELADOZAMIR PEREIRA (RÉU)

ADVOGADORICARDO HENRIQUE ALVES GIULIANI (DPU)

APELADOROSANA APARECIDA REGIS DA ROCHA (RÉU)

ADVOGADOALCEU JOSÉ NUNIS JUNIOR

APELADOVALMIR GARCIA (RÉU)

ADVOGADODIRCEU MACHADO RODRIGUES

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/02/2019, na sequência 14, disponibilizada no DE de 11/02/2019.

Certifico que a 8ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A 8ª TURMA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO CRIMINAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, NEGAR PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES CRIMINAIS DEFENSIVAS E COMUNICAR O JUÍZO DE ORIGEM PARA QUE DÊ CUMPRIMENTO AOS TERMOS DA DECISÃO DE SEGUNDO GRAU, UMA VEZ IMPLEMENTADAS AS CONDIÇÕES PREVISTAS NESTE JULGAMENTO.

RELATOR DO ACÓRDÃODESEMBARGADOR FEDERAL VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

VOTANTEDESEMBARGADOR FEDERAL VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

VOTANTEDESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO PEDRO GEBRAN NETO

VOTANTEJUIZ FEDERAL NIVALDO BRUNONI

LISÉLIA PERROT CZARNOBAY

Secretária



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