Jurisprudência - TRF 4ª R

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL.

Por: Equipe Petições

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EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. NOVO JULGAMENTO POR FORÇA DE DECISÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CONTRABANDO. ÓBICE À APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ARTIGO 334-A, §1º, INCISOS I E IV, DO CÓDIGO PENAL. CRIME PERMANENTE. ESTADO DE FLAGRÂNCIA. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA. REINCIDÊNCIA E CONFISSÃO ESPONTÂNEA. COMPENSAÇÃO. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO. EXECUÇÃO IMEDIATA. DESPROVIMENTO. 1. Questão de ordem apresentada ao Colegiado em razão do retorno dos autos do Superior Tribunal de Justiça, que, em sede de recurso especial interposto pelo Ministério Público Federal, determinou a retomada do julgamento anterior da Turma, a fim de que a excludente da insignificância fosse afastada. 2. Crime de contrabando confirmado no caso concreto na forma do entendimento firmado na Corte Superior, com ressalva de entendimento pessoal, e consequente afastamento da aplicação do princípio da insignificância jurídica e reconhecimento da tipicidade da conduta narrada na denúncia. 3. O delito de contrabando, na modalidade manter em depósito, é de natureza permanente, motivo pelo qual se protrai no tempo o estado de flagrância, inexistindo qualquer ilegalidade na diligência de busca e apreensão realizada pelos policiais na residência do réu, supostamente sem o mandado judicial, após denúncia anônima. 4. Comprovadas a materialidade e a autoria delitivas, bem assim o dolo do agente, sendo os fatos típicos, antijurídicos e culpáveis e inexistindo causas excludentes, impõe-se a condenação do réu pelo crime previsto no artigo 334-A, §1º, incisos I e IV, do Código Penal. 5. O enunciado sumular 122 deste Regional, aderindo à orientação do Supremo Tribunal Federal (HC 126.292, Plenário, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 17-5-2016), entendimento confirmado no julgamento das medidas cautelares nas ADC 43 e 44 (05-10-2016), bem como reafirmado em sede de repercussão geral (ARE 964246 RG, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 25-11-2016), autoriza que a decisão de segundo grau irradie, integralmente, seus efeitos, é dizer, em toda a extensão do que tiver sido provido pelo julgamento, uma vez (a) decorrido o prazo para interposição de Embargos Infringentes e de Nulidade ou para oposição de Embargos de Declaração, nos casos em que esses forem cabíveis, ou (b) se tiverem sido apresentados tais recursos, (b.1) não forem admitidos pelo Relator, (b.2) assim que forem julgados. 6. Apelação desprovida. (TRF4, ACR 5004156-36.2016.4.04.7016, OITAVA TURMA, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, juntado aos autos em 11/03/2019)

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JURISPRUDÊNCIA NA ÍNTEGRA

  

 

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5004156-36.2016.4.04.7016/PR
RELATOR
:
Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
APELANTE
:
ILVO HARTWIG
ADVOGADO
:
JONAS MILTON RUTKE
APELADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
























EMENTA
























PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. NOVO JULGAMENTO POR FORÇA DE DECISÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CONTRABANDO. ÓBICE À APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ARTIGO 334-A, §1º, INCISOS I E IV, DO CÓDIGO PENAL. CRIME PERMANENTE. ESTADO DE FLAGRÂNCIA. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA. REINCIDÊNCIA E CONFISSÃO ESPONTÂNEA. COMPENSAÇÃO. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO. EXECUÇÃO IMEDIATA. DESPROVIMENTO.
1. Questão de ordem apresentada ao Colegiado em razão do retorno dos autos do Superior Tribunal de Justiça, que, em sede de recurso especial interposto pelo Ministério Público Federal, determinou a retomada do julgamento anterior da Turma, a fim de que a excludente da insignificância fosse afastada.
2. Crime de contrabando confirmado no caso concreto na forma do entendimento firmado na Corte Superior, com ressalva de entendimento pessoal, e consequente afastamento da aplicação do princípio da insignificância jurídica e reconhecimento da tipicidade da conduta narrada na denúncia.
3. O delito de contrabando, na modalidade manter em depósito, é de natureza permanente, motivo pelo qual se protrai no tempo o estado de flagrância, inexistindo qualquer ilegalidade na diligência de busca e apreensão realizada pelos policiais na residência do réu, supostamente sem o mandado judicial, após denúncia anônima.
4. Comprovadas a materialidade e a autoria delitivas, bem assim o dolo do agente, sendo os fatos típicos, antijurídicos e culpáveis e inexistindo causas excludentes, impõe-se a condenação do réu pelo crime previsto no artigo 334-A, §1º, incisos I e IV, do Código Penal.
5. O enunciado sumular 122 deste Regional, aderindo à orientação do Supremo Tribunal Federal (HC 126.292, Plenário, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 17-5-2016), entendimento confirmado no julgamento das medidas cautelares nas ADC 43 e 44 (05-10-2016), bem como reafirmado em sede de repercussão geral (ARE 964246 RG, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 25-11-2016), autoriza que a decisão de segundo grau irradie, integralmente, seus efeitos, é dizer, em toda a extensão do que tiver sido provido pelo julgamento, uma vez (a) decorrido o prazo para interposição de Embargos Infringentes e de Nulidade ou para oposição de Embargos de Declaração, nos casos em que esses forem cabíveis, ou (b) se tiverem sido apresentados tais recursos, (b.1) não forem admitidos pelo Relator, (b.2) assim que forem julgados.
























ACÓRDÃO
























Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação criminal, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre - RS, 27 de fevereiro de 2019.




































Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Relator

 


Documento eletrônico assinado por Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9475114v17 e, se solicitado, do código CRC AFF3CE3.
 
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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5004156-36.2016.4.04.7016/PR
RELATOR
:
Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
APELANTE
:
ILVO HARTWIG
ADVOGADO
:
JONAS MILTON RUTKE
APELADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
























RELATÓRIO
























O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em desfavor de ILVO HARTWIG (nascido em 22-05-1958), imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 334-A, §1º, incisos I e IV, do Código Penal c/c artigos e 2° e 3º do Decreto-lei 399/68.

 

Os fatos foram assim narrados (evento 01, "DENUNCIA1", da ação penal originária):

 

"No dia 22 de março de 2016, às 14h30min, na Rua São José, nº 359, no Loteamento Alto Boa Vista, no município de Marechal Cândido Rondon/PR, Ilvo Hartwig, proprietário do estabelecimento comercial, apenas denominado como 'Bar'1, de maneira livre e consciente, manteve em depósito e expôs à venda mercadoria de origem estrangeira de introdução proibida em território nacional, consistente em 399 (trezentos e noventa e nove) maços de cigarros de procedência paraguaia.

 

Com efeito, na data e local acima mencionado, policiais militares realizaram buscas nas dependências do bar onde localizaram pacotes e carteiras avulsas de cigarros de origem paraguaia para venda, conforme Boletim de Ocorrências de fls. 08/11.

 

Salienta-se que os cigarros apreendidos foram encontrados em situação que configura contrabando, uma vez que o importador de cigarros deve ser constituído na forma de sociedade, sujeitando-se ao Registro Especial e o fornecimento de selos de controle junto à Receita Federal (IN/SRF n. 770/2007 e Lei n. 9.532/1997, arts. 47 e 48; Decreto-Lei 1.593/77, art. 1º).

 

A obrigatoriedade do registro, também é imposta pela Resolução nº 320/1999, da ANVISA, que trata, conjuntamente com a Lei nº 9.782/1999, da regulamentação, controle e fiscalização dos produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública.

 

Ainda, a transnacionalidade do delito é vislumbrada em razão da Documentação Fiscal apresentada pela Receita Federal do Brasil, na qual consta que os cigarros apreendidos são de "procedência estrangeira". Some-se o fato de que esta região de fronteira entre o Brasil e o Paraguai é plenamente reconhecida e utilizada como rota de contrabando.

 

A prova da materialidade do crime de contrabando e os indícios de autoria estão demonstrados pelos documentos juntados à Notícia de Fato, notadamente:

 

a) Representação Fiscal Para Fins Penais e Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal de Mercadorias emitidas pela Receita Federal do Brasil (fls. 01-04);
b) Boletim de Ocorrência n. 2016/315424 (fls. 08-11);
c) Termo de retenção e lacração de mercadorias (fl. 12);
d) Termo de guarda fiscal (fl. 13).

 

Doutro norte, a natureza e a quantidade de cigarros revelam a destinação comercial dos fumígenos."

 

A peça incoativa foi recebida em 23-11-2016 (evento 03, idem).

 

Instruído regularmente o feito, sobreveio sentença (evento 34, idem), disponibilizada na plataforma digital em 07-7-2017, julgando procedente a denúncia para condenar o réu pela prática do crime do artigo 334-A, §1º, inciso I, do Código Penal, c/c os artigos 2º e 3º do Decreto-Lei 399/68, à pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de 01 (um) salário mínimo vigente na data da execução.

 

Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação postulando primeiramente o reconhecimento da ilicitude das provas, pois que procedida a busca na residência do acusado (situada no mesmo terreno do estabelecimento comercial), sem autorização judicial ou permissão do proprietário, com a consequente absolvição por insuficiência probatória, afirmando que a condenação não pode se fundar exclusivamente nas provas colhidas no inquérito policial. Ademais, requereu a absolvição do réu pela aplicação do princípio da insignificância. Por fim, postulou a substituição da prestação de serviços à comunidade por outra pena restritiva de direitos (evento 42, idem).

 

Com as contrarrazões (evento 48, idem), subiram os autos a este Regional.

 

Em seu parecer, o representante do órgão ministerial atuante nesta instância manifestou-se pelo desprovimento do recurso (evento 11, destes autos).

 

Esta Colegiado, em assentada anterior, deu provimento a apelação criminal, absolvendo o denunciado, face ao reconhecimento da insignificância penal da conduta sub examine (evento 13, destes autos).

 

O Ministério Público Federal interpôs recurso especial (evento 18, "RECESPEC1", idem), após autuado sob o número 1.755.527- PR, que restou provido pelo Superior Tribunal de Justiça, para o fim de afastar a aplicação da tese despenalizante (evento 39, "DEC10", idem), cuja decisão transitou em julgado em 08-10-2018 (evento 43, "CERTTRAN15", idem).

 

Após, retornaram os autos a esta Corte para novo exame do recurso de apelação.

 

É o relatório.
























Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Relator

 


Documento eletrônico assinado por Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9475112v13 e, se solicitado, do código CRC 9C65F3B6.
 
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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5004156-36.2016.4.04.7016/PR
RELATOR
:
Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
APELANTE
:
ILVO HARTWIG
ADVOGADO
:
JONAS MILTON RUTKE
APELADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
























VOTO
























A controvérsia trazida a este Regional em sede de razões recursais cinge-se à condenação do acusado pela prática do crime insculpido no artigo 334-A, §1º, incisos I e IV do Código Penal c/c artigo 3º do Decreto-Lei nº 399/68.

 

Destaco que a incidência do princípio tantum devolutum quantum appellatum, no processo penal, apresenta dimensão mais ampla do que no processo civil, podendo o juiz examinar a sentença em todos os seus aspectos, inclusive quando não hostilizada, desde que seja para beneficiar o réu, não só em atenção ao princípio do favor rei, mas também em face do permissivo constitucional alusivo à possibilidade de concessão de habeas corpus de ofício.

 

1. Contextualização dos fatos

 

Na data de 22-3-2016, no município de Marechal Cândido Rondon/PR, o acusado ILVO HARTWIG foi flagrado mantendo em depósito e expondo à venda 399 (trezentos e noventa e nove) maços de cigarros de origem estrangeira e de importação proibida no país.

 

2. Tipicidade

 

Ao acusado foi imputada a prática do crime tipificado no artigo 334-A, § 1º, incisos I e IV, Código Penal, que assim dispõe:

 

"Art. 334-A. Importar ou exportar mercadoria proibida:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 ( cinco) anos.
§ 1o Incorre na mesma pena quem:
I - pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando;
(...)
IV - vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira;
(...)"

 

Ademais, os artigos 2° e 3º do Decreto-Lei 399/68 são claros quanto à tipicidade da conduta de manter em depósito cigarros de procedência estrangeira. Transcrevo:

 

"Art 2º O Ministro da Fazenda estabelecerá medidas especiais de contrôle fiscal para o desembaraço aduaneiro, a circulação, a posse e o consumo de fumo, charuto, cigarrilha e cigarro de procedência estrangeira.

 

Art. 3º. Ficam incursos nas penas previstas no artigo 334 do Código Penal os que, em infração às medidas a serem baixadas na forma do artigo anterior adquirirem, transportarem, venderem, expuserem à venda, tiverem em depósito, possuírem ou consumirem qualquer dos produtos nele mencionados."

 

Como se vê, o fato descrito na denúncia amolda-se perfeitamente ao tipo legal descrito.

 

3. Insignificância penal - decisão do Superior Tribunal de Justiça

 

O e. Superior Tribunal de Justiça proveu o recurso especial interposto pelo Ministério Público Federal, autuado sob o número 1.755.527 - PR, cuja decisão transitou em julgado em 08-10-2018 (evento 43, "DEC10" e "CERTTRAN15", destes autos), reformando a decisão exarada, em assentada anterior por esta Turma, nos seguintes termos:

 

"Assiste razão ao recorrente.
É que este Tribunal Superior firmou entendimento de que a importação não autorizada de cigarros tipifica o crime de contrabando, que, por sua vez, não admite a aplicação do princípio da insignificância, em razão do alto grau de reprovabilidade da conduta.

 

Confiram-se nesse sentido:

 

'PENAL.AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME DE CONTRABANDO. ERRO DE TIPO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS N.282 E 356 DO STF. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. REGIMENTAL IMPROVIDO. [...] 2. Este Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que a introdução clandestina de cigarros, em território nacional, em desconformidade com as normas de regência, configura o delito de contrabando, ao qual não se aplica o princípio da insignificância, por tutelar interesses que transbordam a mera elisão fiscal.Precedentes. 3. Agravo regimental improvido.(AgRg no AREsp 1.116.451/MT, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 19/4/2018, DJe 2/5/2018.)'

 

'AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL.PENAL. VIOLAÇÃO DO ART. 334-A DO CP. CONTRABANDO DE CIGARROS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFRONTO COM A JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO STJ. SÚMULA 7/STJ. NÃO INCIDÊNCIA. QUESTÃO EMINENTEMENTE JURÍDICA. DECISÃO MANTIDA. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1.588.190/RS,Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 2/6/2016, DJe 16/6/2016.) AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CONTRABANDO DE CIGARROS.PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. ACUSADO QUE RESPONDE A OUTRA AÇÃO PENAL. INVIABILIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A importação não autorizada de cigarros constitui crime de contrabando, insuscetível de aplicação do princípio da insignificância. Precedentes. 2. A existência de ação penal em curso contra o acusado impede a suspensão condicional do processo (ex vi do art. 89 da Lei n. 9.099/1995). 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no RHC 55.884/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 1º/10/2015, DJe 27/10/2015.)'

 

'RECURSO ESPECIAL. CONTRABANDO DE CIGARROS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. INSURGÊNCIA PROVIDA. 1. Os Tribunais Superiores possuem entendimento consolidado de que o princípio da insignificância não se aplica aos crimes de contrabando de cigarros, por menor que possa ter sido o resultado da lesão patrimonial, pois a conduta atinge outro bens jurídicos, como a saúde, a segurança e a moralidade públicas.Precedentes do STF e do STJ. 2. Ao manter a rejeição da denúncia, por considerar insignificante a guarda em depósito de 180 (cento e oitenta) maços de cigarros de origem e de procedência estrangeira, sem registro nos órgãos públicos competentes, com o objetivo de venda, no exercício de atividade comercial (art. 334-A,§1º,IV,do CP), o acórdão impugnado dissentiu da jurisprudência sobre o tema. 3. Recurso especial provido. (REsp 1.719.439/PR, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 16/8/2018, DJe 24/8/2018.)'

 

Ante o exposto, tendo em vista que o posicionamento expendido no acórdão recorrido está em confronto com a orientação firmada no Superior Tribunal de Justiça, dou provimento ao recurso especial a fim de afastar a incidência do princípio da insignificância e determinar o retorno dos autos para que prossiga no julgamento da apelação."

 

Nesse sentido, e antes de prosseguir na referida análise, peço vênia para ressalvar meu entendimento, haja vista que, em obséquio ao postulado constitucional da dignidade da pessoa, tem-se evoluído para um conceito material de tipicidade, de acordo com o qual se analisa não apenas a subsunção do fato à norma mas também a violação ou não do código de conduta previsto pelo legislador.

 

Nesse passo, o bem jurídico tutelado pela norma que tipifica o delito de contrabando, para além de transcender a mera ilusão do crédito fiscal, vê-se violado a modo potencial, e significativamente. Nada obstante, há situações excepcionais em que a ínfima quantidade de cigarros irregularmente introduzidos no País, porque reveladora de mínima ofensividade da conduta, autoriza a não incidência da norma penal incriminadora.

 

Contudo, entendo que dita excepcionalidade somente encontra âmbito para reconhecimento quando se estiver diante de quantitativo que não ultrapassa o limite estabelecido pelo Fisco para o ingresso desembaraçado dessa espécie de mercadoria em território nacional (bagagem acompanhada).

 

A esse respeito, a Instrução Normativa SRF 117, de 06-10-1998, em seu artigo 3º, inciso V, expressamente excluía do conceito de bagagem os "cigarros e bebidas de fabricação brasileira, destinados a venda exclusivamente no exterior". Assim, a bagagem acompanhada estava isenta relativamente a outros bens, desde que observados os limites definidos no artigo 6º, inciso III, da referida norma, a saber, US$500,00 (ingresso por via aérea ou marítima) e US$150,00 (ingresso por via terrestre, fluvial ou lacustre), esse último posteriormente alterado para US$300,00 (IN SRF 538, de 20-4-2005).

 

A exclusão dos cigarros do conceito de bagagem acompanhada permaneceu até a Instrução Normativa RFB 1059, de 02-8-2010, a qual passou a estabelecer que, para além daqueles limites, deve-se observar também o parâmetro quantitativo, consistente em 10 (dez) maços de cigarros, com 20 (vinte) unidades cada.

 

Nessa mirada, se a Fiscalização Alfandegária permite que cigarros possam ser livremente internalizados até um determinado número de itens, presume-se que, para além de transcender à mera ilusão do crédito fiscal, há uma tolerância do Estado em relação aos efeitos danosos à saúde pública que adviriam da importação em quantidade acima da cota estabelecida administrativamente, do que resulta que os bens jurídicos tutelados pelos artigos 334, caput (na redação anterior à Lei 13.008/2014) e, atualmente, 334-A, ambos do Código Penal, vêem-se violados a modo potencial e significativamente.

 

Partindo desse critério inicial, evoluí para admitir a aplicabilidade da tese despenalizante da insignificância quando a quantidade importada fosse inferior a 500 (quinhentos) maços, ou 01 (uma) caixa, desde que não apresentem destinação comercial.

 

Por outro lado, caso se verifique a finalidade comercial, haverá a violação ao bem jurídico tutelado, que não pode ser considerada ínfima, hipótese na qual não se afere insignificância penal.

 

Nessa senda, aliás, foi o entendimento exarado por esta e. Turma, por maioria, no julgamento do Recurso Criminal em Sentido Estrito autuado sob o n. 5007345-64.2016.4.04.7002/PR, julgado em 5-12-2017, cujo Relator Des. Federal Leandro Paulsen assim consignou:

 

"[...] destaco que, conforme consta do interrogatório do recorrido perante a autoridade policial, ele referiu "que o cigarro era para comercializar em seu bar" (evento 1- IINQ1 do IPL). Em tese, a exposição à venda afasta a insignificância, porquanto o intuito comercial revelaria a inserção, no mercado, do produto cuja importação não poderia ter ocorrido, dando acesso ao mesmo pela população. Isso porque se trata de um crime pluriofensivo e, nessas hipóteses, implica ofensa a interesses do fisco, à saúde da população consumidora e à própria concorrência." (TRF4, RSE 5007345-64.2016.4.04.7002/PR, 8ª Turma, Desembargador Federal Relator Leandro Paulsen, Julgado em 5-12-2017).

 

Inclusive, o e. STJ já sedimentou, no julgamento do RHC 31352/RS, o entendimento de que, havendo a destinação comercial de pequena quantidade de fármacos, afasta-se a insignificância penal, porquanto não há como reconhecer reduzido grau de reprovabilidade da conduta ou a mínima ofensividade penal, o qual, mutatis mutandis, aplica-se ao caso em liça, vejamos:

 

"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. IMPORTAÇÃO E EXPOSIÇÃO À VENDADE PRODUTO DESTINADO A FINS TERAPÊUTICOS OU MEDICINAIS. 1. ATIPICIDADE DA CONDUTA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. 2. MEDICAMENTO DE VENDA PROIBIDA. MÍNIMA OFENSIVIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. RISCO À SAÚDE PÚBLICA. 3. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME PARA CONTRABANDO OU DESCAMINHO. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA DE PROVA. 4. RECURSO ORDINÁRIO IMPROVIDO.
1. A lei penal não deve ser invocada para atuar em hipóteses desprovidas de significação social, razão pela qual os princípios da insignificância e da intervenção mínima surgem para evitar situações dessa natureza, atuando como instrumentos de interpretação restrita do tipo penal.
2. No caso, não há como reconhecer o reduzido grau de reprovabilidade ou a mínima ofensividade da conduta, pois a quantidade de medicamentos apreendidos, a saber, 59 (cinquenta enove) comprimidos de PRAMIL - vasodilatador utilizado no tratamentoda disfunção erétil e que não possui registro na ANVISA, não podendo, portanto, ser comercializado no Brasil - e a claradestinação comercial, caracterizada pelo local da apreensão, afastam a aplicação do princípio da insignificância, pois indiscutível o risco à saúde pública decorrente da exposição, à venda, demedicamento proibido.
3. Omissis.
4. Omissis (RHC 31352/RS, 5ª Turma, Min. Relator Marco Aurélio Bellizze, Julgado em 5-4-2013)"

 

Destarte, em suma, compreendo que é aferível a insignificância penal quando não restar superado o limite de 500 (quinhentos) maços e, quando dentro desse limite, não restar averiguada a destinação comercial.

 

Contudo, esse não foi o entendimento da Corte Superior neste caso (evento 43, "DEC10", destes autos), afastando a tese despenalizante em decisão pelo Superior Tribunal de Justiça.

 

Sendo assim, prossigo no julgamento da apelação criminal.

 

4. Preliminar - nulidade da prova produzida pela ação policial
 
Sustentou a defesa, em suas razões de apelação, que a busca e apreensão feriu o direito constitucional de inviolabilidade do domicílio resguardado pelo inciso XI, artigo 5º, da Constituição Federal, pois teria sido realizada sem autorização do morador.
 
Entretanto, o próprio dispositivo invocado não tutela, de forma intransponível, tal direito; o próprio texto legal aponta o "flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro" como exceções a essa garantia.
 
Nota-se que a abordagem dos policiais ocorreu em virtude de denúncia anônima de que o acusado estaria vendendo cigarros contrabandeados em seu estabelecimento. No tocante à garantia constitucional da inviolabilidade de domicílio, entende a jurisprudência e doutrina majoritária, que, quando existirem fundados indícios de que um delito esteja ocorrendo, é possível a invasão domiciliar.
 No caso em tela, deve-se observar que ocorreu a manutenção de cigarros contrabandeados, e tal fato deve ser tido como crime permanente, o que faz a situação de flagrância se prolongar no tempo, tal como ocorre com o delito de tráfico de drogas. Logo, nessa hipótese, a jurisprudência dos Tribunais Superiores tem decidido que a necessidade de coletar provas autoriza a invasão de domicilio pelas autoridades policiais, ainda que sem o instrumento judicial.
 
Nessa linha de intelecção, pacificou-se a jurisprudência dos tribunais superiores:
 
"DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. NULIDADE DO PROCESSO. ALEGAÇÃO DE PROVA ILÍCITA E DE VIOLAÇÃO AO DOMICÍLIO. INEXISTÊNCIA. ESTADO DE FLAGRÂNCIA. CRIME PERMANENTE. 1. A questão controvertida consiste na possível existência de prova ilícita ("denúncia anônima" e prova colhida sem observância da garantia da inviolabilidade do domicílio), o que contaminaria o processo que resultou na sua condenação. 2. Legitimidade e validade do processo que se originou de investigações baseadas, no primeiro momento, de "denúncia anônima" dando conta de possíveis práticas ilícitas relacionadas ao tráfico de substância entorpecente. Entendeu-se não haver flagrante forjado o resultante de diligências policiais após denúncia anônima sobre tráfico de entorpecentes (HC 74.195, rel. Min. Sidney Sanches, 1ª Turma, DJ13.09.1996). 3. Elementos indiciários acerca da prática de ilícito penal. Não houve emprego ou utilização de provas obtidas por meios ilícitos no âmbito do processo instaurado contra o recorrente, não incidindo, na espécie, o disposto no art. 5º, inciso LVI, da Constituição Federal. 4. Garantia da inviolabilidade do domicílio é a regra, mas constitucionalmente excepcionada quando houver flagrante delito, desastre, for o caso de prestar socorro, ou, ainda, por determinação judicial. 5. Outras questões levantadas nas razões recursais envolvem o revolver de substrato fático-probatório, o que se mostra inviável em sede de habeas corpus. 6. Recurso ordinário em habeas corpus improvido. (STF, RHC 86082, 2ª Turma, Rel.ª Ministra Ellen Gracie, DJe 21-8-2008 - grifei.)
 
"HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE. CRIME PERMANENTE. VIOLAÇÃO AO PRECEITO CONTIDO NO ART. 5.º, INCISO XI, DA CONSTITUIÇÃO. INOCORRÊNCIA. REGIME PRISIONAL: OBRIGATORIEDADE DO REGIME INICIAL FECHADO AFASTADA. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ART. 33, §§ 2.º E § 3.º DO CÓDIGO PENAL. PRECEDENTES. PENAS-BASE NO MÍNIMO LEGAL. CONCESSÃO, DE OFÍCIO, EM RELAÇÃO A UM DOS PACIENTES. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. INVIABILIDADE. PENAS SUPERIORES A 04 ANOS. HABEAS CORPUS PARCIALMENTE CONCEDIDO. 1. Os Pacientes foram surpreendidos com 112 trouxinhas de cocaína (25,01g), 129 invólucros de maconha (177,54g) e 185 invólucros de crack (18,50g). Em primeiro instância, RODRIGO TEODORO ALVES CABRAL foi absolvido e RAFAEL ASSUNÇÃO DA SILVA condenado, pela prática do delito de tráfico de drogas. Em sede de apelação, a Corte a quo reformou a sentença e condenou o primeiro réu à sanção de 05 anos e500 dias-multa e, o segundo, à 04 anos e 02 meses de reclusão e 400 dias-multas, ambos como incursos no art. 33 da Lei n.º 11.343/06,sendo o último com a incidência do § 4.º do mesmo dispositivo, ambos ainda no regime inicial fechado. 2. O tráfico ilícito de drogas é crime permanente, razão por que não há se falar em ilegalidade da prisão em flagrante por violação de domicílio, pois a Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XI,autoriza a entrada da autoridade policial, seja durante o dia, seja durante a noite, independente da expedição de mandado judicial.2 a 7. Omissis." (STJ, HC 204108, 5ª Turma, Rel.ª Ministra Laurita Vaz, DJe 17-4-2013 - grifei.)
 
"DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. NULIDADE DO PROCESSO. ALEGAÇÃO DE PROVA ILÍCITA E DE VIOLAÇÃO AO DOMICÍLIO. INEXISTÊNCIA. ESTADO DE FLAGRÂNCIA. CRIME PERMANENTE. [...]4. Garantia da inviolabilidade do domicílio é a regra, mas constitucionalmente excepcionada quando houver flagrante delito, desastre, for o caso de prestar socorro, ou, ainda, por determinação judicial. [...]" (RHC 86082, Relatora Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 05/08/2008, DJe-157 DIVULG 21-08-2008 PUBLIC 22-08-2008 EMENT VOL-02329-02 PP-00240, grifei).
 
"HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. RECEPTAÇÃO. ALEGADA NULIDADE DA PROVA OBTIDA COM A BUSCA E APREENSÃO REALIZADA. FLAGRANTE DE CRIMES PERMANENTES. DESNECESSIDADE DE EXPEDIÇÃO DE MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO. EIVA NÃO CARACTERIZADA. ORDEM DENEGADA. 1. O paciente foi acusado da prática de delitos de natureza permanente, quais sejam, tráfico de entorpecentes e receptação na modalidade "ocultar". 2. É dispensável o mandado de busca e apreensão quando se trata de flagrante de crime permanente [como a guarda de moeda falsa verificada na espécie], podendo-se realizar a apreensão sem que se fale em ilicitude das provas obtidas. Doutrina e jurisprudência. 3. Ordem denegada." (HC 188.195/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 27/09/2011, DJe 28/10/2011, grifei).
 
Portanto, considerando que o réu não trouxe provas ou ao menos indícios da verossimilhança do que alegou com relação à nulidade da ação policial, e uma vez que as provas produzidas tanto em sede inquisitorial quanto em juízo demonstram que os fatos não se deram como descrito pelo acusado, rejeito a preliminar.

 

5. Materialidade

 

Verifico que a materialidade restou demonstrada nos autos, conforme descrito na sentença (evento 34, "SENT1", da ação penal originária):

 

"Da materialidade

 

A materialidade do delito restou comprovada pelos documentos que integram a Representação Fiscal para Fins Penais, especialmente pelo Auto de Infração e Apreensão e Guarda Fiscal de Mercadorias, pelo Demonstrativo de Créditos Tributários Evadidos, pelo Boletim de Ocorrência elaborado pela polícia militar e pelo Termo de Retenção e Lacração de Volumes (PROCADM2 - ev 1).

 

Tais documentos dão conta da procedência estrangeira dos cigarros apreendidos, os quais encontravam-se desprovidos da respectiva documentação legal, avaliados em R$ 1.795,50 (um mil setecentos e noventa e cinco reais e cinquenta centavos), sendo aferido pelo Fisco o montante de R$ 1.167,08 (mil cento e sessenta e sete reais e oito centavos), à título de tributos federais (II e IPI) incidentes no caso de uma importação regular.

 

Desse modo, e sendo inaplicável à espécie o princípio da insignificância, configurada a materialidade do delito em comento."

 

Os documentos citados demonstram que foram apreendidas diversas caixas de cigarros estrangeiros, de fabricantes distintos (boletim de ocorrência policial - evento 1, 'PROCADM2', pg. 8, da ação penal originária); ademais, fala-se em uma ilusão tributária de R$1.167,08 (demonstrativo de créditos tributários evadidos - evento 1, 'PROCADM2', pg. 4, idem).

 

Como se vê, resta caracterizado o delito de contrabando.

 

6. Autoria

 

A autoria delitiva restou igualmente comprovada, conforme descrito na sentença (evento 34, da ação penal originária):

 

"Da autoria

 

A autoria delitiva é certa recaindo sobre a pessoa do acusado.

 

Narra a denúncia que no dia 22 de março de 2016, policiais militares constataram que o réu mantinha em depósito e expunha à venda em seu estabelecimento comercial maços de cigarros de procedência paraguaia.

 

E de fato, os documentos lavrados por servidores públicos contidos na Representação Fiscal para Fins Penais (Boletim de Ocorrência, Auto de Infração com Apreensão de Mercadorias e Termo de Retenção e Lacração de Volumes) apontaram o réu como proprietário dos cigarros.

 

Some-se a isso que os procedimentos administrativos são revestidos de presunção de legitimidade e veracidade, principalmente porque fazem prova de uma abordagem fiscalizatória in loco, com a apreensão da materialidade do crime de contrabando.

 

Logo, embora não tenham sido arroladas testemunhas de acusação em sede judicial, a autoria deflui dos documentos da representação criminal, sendo plenamente possível atribuir ao réu a responsabilidade pelas mercadorias internadas de forma irregular no país.

 

De qualquer modo, interrogado em juízo, restou claro que o réu é o responsável pelos cigarros apreendidos. Disse que adquiriu os cigarros para revendê-los no bar de sua propriedade, bem como que havia cigarros em depósito dentro de sua residência (evento 26):

 

(...) J: Só esse processo que...
R: Sim. Sim. É.
J: ... o senhor teve?
R: Isso. Ãham.
J: (#) sobre, sobre esses fatos aqui, ahn, a denúncia que foi feita contra o senhor, é, é de que no dia 22 de março de 2016, as duas e meia na Rua São José 359, Loteamento Alto Boa Vista, Marechal, município de Marechal Rondon, ahn, o senhor manteve no, no seu estabelecimento comercial, manteve e expô a venda trezentos e trinta e nove maços de cigarro de procedência Paraguai. Essa é a alegação.
R: Uhum.
J: Ahn, policiais militares teriam feito buscas nesse, na, nas dependências desse bar, encontraram os, os pacotes dos cigarro. Ahn, segundo o MPF, essa, essa situação configura como (#) contrabando, por se tratarem de cigarros estrangeiros. E haveria destinação comercial por foi no seu, num bar. Onde o senhor estava. Então essa, resumidamente, esse é conteúdo da denúncia. Agora o senhor tem a oportunidade de se manifestar sobre isso, dá detalhes, né.
R: É, tinha, tinha cigarro (#) tinha cigarro.
J: O senhor tava com esses cigarros?
R: Não.
J: Pra vender?
R: É, tinha lá pra meu gasto e pra já vendi isso mesmo.
J: Esse, é, é um bar que o senhor tem?
R: É um barzinho.
J: Hum. Ahn, o senhor sabia que era crime manter esse tipo de mercadoria pra, pra vender?
R: Na, na verdade, sei lá. Eu, eu tinha (#) pra vender, mas acabei comprando, pessoal passou vendendo lá, né, mas na verdade eu não sabia que era, era proibido assim, né.
J: Não sabia que era proibido?
R: Não.
J: Quem é que lhe vendeu?
R: Ah, um, um homem passou vendendo, eu comprei uma caixa (#)
J: Uhum.
R: E daí é o seguinte, o homem que passou vendendo, comprei aquela caixa, foi a primeira e a última vez também.
J: Uhum. Ela era, era, foi, o senhor comprou por que achou barato?
R: É, na verdade tá (#) aí eu comprei, né.
J: Uhum. Quanto que o senhor pagou por esses cigarros?
R: Eu paguei mil real a caixa.
J: Veio quantos na caixa?
R: Rapaz, vem cinquenta pacote, né.
J: Quantos, quantos que cabem ali dentro? Quanto, dentro de um pacote tem quantos maços?
R: Um pacote contém dez carteira, né.
J: Dez carteira?
R: Isto. Uhum.
J: Então, dez carteira, cinquenta pacotes, são quinhentos, quinhentas carteiras. No total, foi?
R: É, quando eu comprei sim. Daí...
J: Pagou quanto que o senhor disse?
R: Mil real.
J: Mil real... mil reais por quinhentas carteiras de cigarro. Dá dois reais pela carteira. O senhor nem desconfiou que podia ter algo errado? Saiu bem barato mesmo nesse valor.
R: É. Foi barato, né. E eu acho, né.
J: Ahn, bom da minha... O senhor tem mais alguma coisa a dizer em sua defesa?
R: Não. Não tenho o que falar, né.
J: Pelo Ministério Público alguns esclarecimentos?
MP: (#) Boa tarde. É, com relação a, a essas compras desses pacotes de, de cigarro. Depois desse fato, que foi ano passado, o senhor voltou a compar mercadorias?
R (Réu): Não.
MP: De cigarro de origem estrangeira?
R: Não.
MP: O senhor tinha um bar (#) de que ele seria (#) de cigarros do Paraguai. Ahn, o senhor não desconfiou pelo fato de não haver nota fiscal que pudesse embasar aquisição desse cigarro de maneira formal com esse vendedor? Digo, a compra (#) sem qualquer nota?
R: Pois é. Na verdade, na verdade, ele tirou, né. Eu comprei isso aí sem nota no caso, né.
MP: Uhum. Certo. Tem ciência que o senhor comprou sem nota, foi isso, né?
R: Sim.
MP: Tá ok. (#) Excelência.
J: Pela defesa.
D: Excelência, só pra esclarecer. Por quanto o senhor vendia cada carteira dessa?
R: Eu vendia a três reais.
D: Comprou por dois e vendia por três?
R: É. No caso comprei por dois e vendi por três, né.
D: E (#) em que local lá foi apreendido essa, essa quantidade aí? Em que, em que, era no bar mesmo? O senhor mora junto no bar lá?
R: Moro junto.
D: E em que local da casa, do bar, aonde que tava, aonde que foi, aonde que foi pego esses, esse cigarro?
R: Dentro da minha casa, no caso. Dentro da casa, né.
D: (#)
R: (#)
D: ... a cozinha, no quarto?
R: É, ele entrou lá no quarto pra pegar.
D: A polícia entrou dentro do, do quarto e pegou as carteiras. Ela chegou a te, te mostrar o mandado judicial, alguma situação pra poder...
R: Não. Não. O policial chegou, chegou só a polícia e mostrou um negócio que eu tenho na polícia, entrou lá dentro e pegou o cigarro, né.
D: O senhor em algum momento autorizou eles entrar?
R: Não.
D: Que horas que foi isso?
R: Olha, eu não tenho bem certeza, mas eu calculo que era uma duas horas, por aí, duas horas da tarde, assim.
D: Foram trezentos e noventa e nove maços?
R: Acho que era, eles, eles falaram.
D: O senhor não contou?
R: Eu não contei. Eles pegaram o cigarro e foram embora.
D: Pode ser menos?
R: Eu não contei nada.
D: O senhor acha que pode ser menos o maço?
R: É, na verdade é um pouco menos, eu acho, (#) das quantia. Que era uma caixa, mas eu tinha vendido um pouco, né. Aí na verdade ele não contou junto comigo, ele levou o cigarro. Pegaram o cigarro e foram, levaram embora, né.
(...).

 

Logo, não resta qualquer dúvida acerca da autoria por parte do réu quanto à aquisição, venda e manutenção em depósito de cigarros de origem estrangeira.
Registro que o dolo traduziu-se na vontade livre e consciente de realizar a conduta típica, adquirindo, vendendo e mantendo em depósito mercadoria cuja importação é proibida (cigarros).

 

Destaco que o réu tinha plena consciência da ilicitude da sua conduta, praticada no nítido intuito de obter maior lucro.

 

Por sua vez, o acusado alegou que não sabia da proibição da venda dos cigarros de origem estrangeira.

 

O artigo 21, parágrafo único, do Código Penal trata do erro de proibição, ou seja, do desconhecimento da ilicitude do fato:

 

Art. 21 - O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Parágrafo único - Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência.

 

Contudo, não se está diante de erro inevitável, tampouco de erro evitável, em que o agente tem o potencial conhecimento da ilicitude. E é fato notório a restrição à importação de certos produtos do exterior, como cigarros e medicamentos.

 

Aliás, não é crível que o réu sendo comerciante não tivesse ciência de que é ilícita a comercialização de cigarros contrabandeados, particularmente quando se sabe que eles são fornecidos sem documentos fiscais que os acobertem, e que seu preço de aquisição é bastante reduzido, quando comparado ao preço de aquisição de cigarros nacionais.

 

E sendo inescusável o desconhecimento da lei, não há como admitir que o réu não soubesse ser proibida a comercialização dos cigarros paraguaios em seu estabelecimento comercial. A esse respeito, o TRF 4ªRegião decidiu:
'DIREITO PENAL. ARTIGO 334, § 1, "D", DO CÓDIGO PENAL (COM A REDAÇÃO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.008/2014). NULIDADE DA SENTENÇA. INOCORRÊNCIA. ERRO DE PROIBIÇÃO. INEXISTÊNCIA. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO.1. Não havendo demonstração de prejuízo à defesa em decorrência da inversão na ordem de inquirição das testemunhas, não há falar em nulidade da sentença.2. O erro de proibição, previsto no artigo 21 do Código Penal, é aplicável quando comprovado que o agente inequivocamente não possuía os meios que lhe viabilizassem o conhecimento do ilícito penal, não sendo suficiente a alegação de desconhecimento da lei. (TRF4, ACR 5007064-80.2013.404.7110, SÉTIMA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 22/11/2016)'

 

Portanto, não há como prosperar a alegação de erro de proibição.

 

Em suma, não se comprovou a ocorrência de qualquer causa excludente de ilicitude (legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal ou exercício regular de direito), motivo pelo qual considero como antijurídica a conduta do acusado.
Ainda, verifica-se que ao tempo do fato o acusado era imputável, tinha plena consciência da ilicitude de seus atos e dele era exigível uma conduta diversa, de modo que a culpabilidade está presente.
Em relação à adequação típica, o artigo 334-A do Código Penal (redação da Lei nº 13.008, de 26 de junho de 2014) assim dispõe:
Art. 334-A. Importar ou exportar mercadoria proibida:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.
§ 1º Incorre na mesma pena quem:
I - pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando.
Trata-se o incido I do § 1º do art. 334-A do Código Penal de norma penal em branco, a qual é complementada, no caso concreto, pelos artigos 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/68, que equipara a contrabando a aquisição, a venda, a exposição à venda e o depósito de cigarros irregularmente introduzidos no território nacional, nos seguintes termos:
Art 2º O Ministro da Fazenda estabelecerá medidas especiais de controle fiscal para o desembaraço aduaneiro, a circulação, a posse e o consumo de fumo, charuto, cigarrilha e cigarro de procedência estrangeira.
Art. 3º Ficam incursos nas penas previstas no artigo 334 do Código Penal os que, em infração às medidas a serem baixadas na forma do artigo anterior adquirirem, transportarem, venderem, expuserem à venda, tiverem em depósito, possuírem ou consumirem qualquer dos produtos nele mencionados."
Desse modo, a conduta praticada pelo acusado afigura-se típica, antijurídica e culpável, razão pela qual a condenação pela prática do crime capitulado no art. 334-A, §1º, inciso I, do Código Penal, c/c arts. 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/68, é medida que se impõe.

 

Nada impede que o órgão revisor se convença das razões lançadas pela instância originária, e as adote como fundamento de decidir, pois é livre o convencimento judicial. Desde que as transcreva em seu voto, estão declinados os motivos que conduziram o seu convencimento. Aliás, assim pode proceder com as razões de quaisquer dos sujeitos processuais (acusação, defesa, órgão julgador, órgão ministerial).

 

Os documentos confeccionados na fase inquisitorial são suficientes para comprovar a autoria delitiva, gozando de presunção de legitimidade e veracidade, uma vez que emitidos por servidores públicos.

 

Nesse sentido o entendimento desta Oitava Turma:

 

"PENAL. DESCAMINHO. AUTORIA. PROVA. ASSINATURA NO TERMO DE ARRECADAÇÃO DAS MERCADORIAS. PENA DE RECLUSÃO. CÁLCULO. (...) A alegação de ausência de prova documental quanto à autoria não subsiste ante a verificação da assinatura da ré no Auto de Infração com Apreensão de Mercadorias descaminhadas, produzido pelas autoridades fiscalizadoras, a qual demonstra a ciência da apreensão e a sua responsabilização.(...)" (ACR 20037001014611-0, 8ª Turma, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, D.E. 4-10-2006)

 

Ademais, o artigo 155, in fine, do Código de Processo Penal, deixa claro que provas antecipadas, produzidas durante o Inquérito Policial, podem servir de sustentáculo para a fundamentação de uma possível sentença condenatória, in verbis:

 

"Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas."

 

In casu, a representação fiscal para fins penais dá conta que foram apreendidos, em poder do réu, fumígenos de procedência estrangeira desprovidos de documentação comprobatória de introdução regular no território nacional, após denúncia anônima (evento 1, 'PROCADM2', pg. 2, da ação penal originária).

 

Consta, outrossim, no boletim de ocorrência policial, que após recebimento de denúncia anônima sobre bar que venderia produtos contrabandeados do Paraguai, os policiais se dirigiram ao estabelecimento e, questionando o proprietário, este confirmou a presença de alguns maços (evento 1, 'PROCADM2', pág. 8, idem).

 

Ademais, o acusado, em interrogatório judicial, admitiu a prática do delito, alegando que tinha cigarro para vender e para seu consumo; afirmou que comprou por R$2,00 (dois reais), de um homem que passou vendendo, já que achou barato; disse que vendia por R$3,00 (três reais). Aduziu que tinha ciência de que as mercadorias não tinham nota fiscal (evento 26, 'TERMO1', idem).

 

Como se vê, a confissão do acusado não constitui prova isolada. Nos termos do artigo 197 do Código de Processo Penal, "[o] valor de confissão se aferirá pelos critérios adotados para os outros elementos de prova, e para sua apreciação o juiz deverá confrontá-la com as demais provas do processo, verificando se entre ela e estas existe compatibilidade e concordância".

 

No caso concreto, a confissão pode ser perfeitamente valorada para justificar a condenação do denunciado, porque plenamente compatível com as demais provas presentes no feito, não se verificando mácula alguma que possa infirmá-la.

 

Por fim, o dolo é genérico e consiste na vontade livre e consciente de praticar o delito, o que restou devidamente demonstrado no caso concreto.

 

Assim, devidamente comprovadas a materialidade e a autoria do crime previsto no artigo 334-A, § 1º, incisos I e IV, do Código Penal c/c o artigo 3º do Decreto-Lei 399/1968, bem assim o dolo, e sendo o fato típico, antijurídico e culpável, considerando a inexistência de causas excludentes de ilicitude ou exculpantes, a manutenção da condenação é medida que se impõe.

 

7. Dosimetria

 

O Estatuto Repressivo prevê, para o crime de contrabando, uma sanção reclusiva de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.

 

O magistrado de origem assim fixou a reprimenda para o réu (evento 34, 'SENT1', idem):

 

"Circunstâncias judiciais (1ª fase)

 

Pois bem. Na primeira fase de aplicação da pena, da análise das circunstâncias judiciais previstas no art. 59, caput, do Código Penal, infere-se que:

 

a) quanto à culpabilidade, entendo que foi normal à espécie;

 

b) o réu não possui maus antecedentes, já que eventuais inquéritos policiais ou ações penais em andamento estes não se prestam a majorar a pena-base, seja a título de maus antecedentes, conduta social negativa ou personalidade voltada para o crime, em respeito ao princípio da presunção de não culpabilidade (Súmula nº 444 do STJ);

 

c) não há elementos que permitam analisar a conduta social do réu e sua personalidade, devendo ser consideradas neutras;

 

d) os motivos do crime foram o lucro fácil, o que é ínsito ao tipo penal em análise;

 

e) quanto às circunstâncias do crime, considero normais à espécie;

 

f) as consequências do crime não foram consideráveis, em razão da apreensão dos cigarros;

 

g) não há falar em comportamento da vítima.

 

Assim, fixo a pena-base em 2 (dois) anos de reclusão.

 

Circunstâncias legais (2ª fase)

 

Embora o réu tenha confessado o delito em apreço, não há alteração na pena fixada porquanto no mínimo legal.

 

Causas de aumento e diminuição (3ª fase)

 

Não existem causas de aumento ou diminuição.

 

Torno definitiva, assim, a pena do réu em 2 (dois) anos de reclusão pela prática do crime previsto no art. 334-A, §1º, inciso I, do Código Penal, c/c arts. 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/68."

 

Na primeira fase do cálculo da pena, o juízo sentenciante, corretamente, valorou neutras as vetoriais do artigo 59 do Código Penal. Assim, mantenho a basilar determinada pelo magistrado a quo.

 

Na segunda fase, embora presente a confissão espontânea, a aplicação da atenuante encontra óbice na súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça:

 

"A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal."

 

Assim, determino a manutenção da pena provisória fixada.

 

Na terceira fase, ratifico que não existem causas de aumento ou de diminuição de pena.

 

Dessa forma, mantenho a reprimenda do acusado em 2 (dois) anos de reclusão.

 

8. Regime de cumprimento

 

Quanto ao regime de cumprimento, assim decidiu o juízo a quo:

 

"(...) examinando conjugadamente os arts. 33, § 2º, e 59, do Código Penal, estabeleço o regime inicial aberto para o cumprimento da pena privativa de liberdade, deixando de fixar suas condições em face da substituição que no parágrafo seguinte realizo."
Com fulcro no artigo 33, §§2º e 3º, do Código Penal, mantenho o regime inicial de cumprimento da pena aberto.

 

9. Substituição da pena privativa de liberdade

 

No que se refere à substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, fundamentou o magistrado de origem:

 

"Reputo cabível a substituição da pena privativa de liberdade, na forma do artigo 44 do Código Penal, tendo em vista a quantidade de pena aplicada e as condições pessoais do acusado, pelo que substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, nos termos do parágrafo 2º, do artigo 44, do Código Penal, quais sejam: a) prestação pecuniária, no valor de 1 (um) salário mínimo, em vigor no momento da execução, a ser destinada a entidade social cadastrada neste Juízo; b) e prestação de serviços à comunidade, em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros estabelecimentos congêneres, a ser definido durante o Processo de Execução Penal, segundo as aptidões do réu e à razão de 1 (uma) hora por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho, na forma do parágrafo 3º, do artigo 46, do Código Penal.

 

Registre-se que a prestação de serviços à comunidade, em se cogitando de pena restritiva de direitos, é "a mais indicada para a repressão e prevenção da prática delitiva, atendendo aos objetivos ressocializantes da lei penal, uma vez que estimula e permite melhor readaptação do apenado no seio da comunidade, viabilizando o ajuste entre o cumprimento da pena e a jornada normal de trabalho" (TRF 4ª Região, 8ª Turma, Apelação Criminal nº 1999.71.00.011249-5/RS, Rel. Des. Federal Élcio Pinheiro de Castro, j. 22/09/2004) enquanto que a prestação pecuniária reverte em proveito da própria sociedade, revelando-se conveniente à repressão dos delitos nos quais a coletividade é atingida pela prática ilícita.

 

Ressalto que o critério utilizado para a fixação do valor da prestação pecuniária foi a situação econômica do condenado e o montante do prejuízo causado."

 

Presentes os requisitos exigidos pelo artigo 44, caput, e diante da previsão contida no §2º do mesmo artigo do Código Penal, mantenho a substituição da pena privativa de liberdade aplicada por duas restritivas de direitos.
 
Desse modo, preservo as modalidades de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e prestação pecuniária, por serem as que melhor atingem a finalidade da persecução criminal. A primeira, porque exige do condenado um esforço no sentido de contribuir com o interesse público. A segunda porque, ao contrário da multa que reverte sempre ao Estado, converte-se em prol da vítima, seus dependentes ou entidade pública ou privada com destinação social.
 
Quanto ao valor da pena pecuniária (artigo 43, inciso I, do Estatuto Repressivo), cumpre referir que o julgador, dentre os parâmetros estabelecidos pelo artigo 45, §1º, do mesmo diploma legal, deve considerar certos fatores, de modo a não tornar a prestação em pecúnia tão diminuta a ponto de mostrar-se inócua, nem tão excessiva de maneira a inviabilizar seu cumprimento.
 
Nessa linha, tenho que tal prestação deve ser suficiente para a prevenção e reprovação do crime praticado, atentando-se, ainda, para a extensão dos danos decorrentes do ilícito e para a situação econômica do condenado, a fim de que se possa viabilizar seu cumprimento.

 

Dessa forma, uma vez que o valor da prestação pecuniária não pode ser irrisório, para que tenha o caráter dissuasivo almejado, bem como não pode ser desproporcional em relação à gravidade concreta do delito, entendo razoável a quantia fixada.

 

Saliento que poderá haver o parcelamento da referida pena restritiva de direitos, caso comprovada, perante o juízo da execução, a impossibilidade de seu pagamento em parcela única.

 

10. Prescrição

 

O réu foi condenado à pena de 02 (dois) anos de reclusão. Isso significa dizer que o prazo prescricional aplicável é de 04 anos, na forma do artigo 109, inciso V, do Código Penal.
 
Gize-se que, considerando que a prescrição penal é instituto de natureza material e que o presente feito diz respeito a fatos ocorridos em momento posterior ao advento da Lei 12.234, de 05-5-2010, aplicam-se ao caso em comento as alterações oriundas de tal.
 
Assim, tendo em vista que entre a data do recebimento da denúncia (23-11-2016) e a da publicação da sentença (07-7-2017), e, ainda, desde então até o presente momento, não transcorreu o referido lapso temporal, não há falar em prescrição da pretensão punitiva pela pena em concreto.

 

11. Execução imediata

 

Aderindo à orientação do Supremo Tribunal Federal (HC 126.292, Plenário, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 17-5-2016), entendimento confirmado no julgamento das medidas cautelares nas ADC 43 e 44 (5-10-2016), bem como reafirmado em sede de repercussão geral (ARE 964246 RG, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 25-11-2016), este Regional voltou a compreender que a execução imediata de uma decisão de segundo grau em matéria penal, ainda que sujeita a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio da presunção de inocência (artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal).

 

Portanto, restando superada a tese adotada em precedente contrário daquele Excelso Pretório (HC 84.078), e revigorada a exegese compendiada na súmula 267, do Superior Tribunal de Justiça, esta Corte consolidou sua jurisprudência no enunciado 122:

 

"Encerrada a jurisdição criminal de segundo grau, deve ter início a execução da pena imposta ao réu, independentemente da eventual interposição de recurso especial ou extraordinário."

 

Cabe pontuar, à guisa de explicitação, que havendo porção não unânime no acórdão, inexatidão material ou ponto que demande esclarecimento ou complementação, o prazo para apresentação dos recursos supramencionados estará interrompido, se forem oferecidos embargos infringentes e de nulidade, ou de declaração àquele julgado, e, o sendo, atendam os seus pressupostos de admissibilidade e/ou cabimento (STF, AI 583960 - AgR, 1ª Turma, relator Ministro Roberto Barroso, DJe 28-8-2015, e STJ, AgInt no REsp 1.424.222, 1ª Turma, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 13-3-2018). Nesse caso, isto é, não sendo negado seguimento pelo Relator, a jurisdição de segundo grau estará encerrada tão logo sejam julgados (STJ, HC 430.198-SP, 5ª Turma, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, DJe 21-03-2018, e TRF4, EINUL 5008572-31.2012.4.04. 7002, 4ª Seção, relator Desembargador Federal Sebastião Ogê Muniz, juntados em 10-04-2016).

 

Assim, uma vez (a) decorrido o prazo para interposição de Embargos Infringentes e de Nulidade ou para oposição de Embargos de Declaração ao acórdão, (b) apresentados tais recursos, (b.1) não forem admitidos pelo Relator ou (b.2) forem julgados, deve ser comunicado o juízo de origem para que dê cumprimento aos termos da decisão de segundo grau.

 

12. Conclusão

 

Condenado o réu pela prática do crime tipificado no artigo 334-A, §1º, incisos I e IV, do Código Penal c/c o artigo 3º do Decreto-Lei 399/1968, uma vez comprovadas a materialidade e autoria delitivas, bem assim o dolo do acusado, sendo o fato típico, antijurídico e culpável e inexistindo causas excludentes.
 
A pena privativa de liberdade restou fixada em 2 (dois) anos de reclusão. Determinado o regime de cumprimento aberto, bem como a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 1 (um) salário mínimo.
 
Determinado que seja comunicado o juízo de origem para que dê cumprimento aos termos da decisão de segundo grau, uma vez implementadas as condições previstas neste julgamento.

 

13. Dispositivo

 

Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação criminal, para manter a condenação do réu pelo crime previsto no artigo 334-A, §1º, incisos I e IV, do Código Penal c/c o artigo 3º do Decreto-Lei 399/1968 e comunicar o juízo de origem para que dê cumprimento aos termos da decisão de segundo grau, uma vez implementadas as condições previstas neste julgamento.
























Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Relator

 


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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/02/2019
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5004156-36.2016.4.04.7016/PR
ORIGEM: PR 50041563620164047016



RELATOR
:
Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
PRESIDENTE
:
Desembargador Federal Victor Luiz dos Santos Laus
PROCURADOR
:
Dr. Maurício Gotardo Gerum
REVISOR
:
Des. Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
APELANTE
:
ILVO HARTWIG
ADVOGADO
:
JONAS MILTON RUTKE
APELADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL






Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/02/2019, na seqüência 4, disponibilizada no DE de 11/02/2019, da qual foi intimado(a) o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e a DEFENSORIA PÚBLICA.






Certifico que o(a) 8ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO CRIMINAL, PARA MANTER A CONDENAÇÃO DO RÉU PELO CRIME PREVISTO NO ARTIGO 334-A, §1º, INCISOS I E IV, DO CÓDIGO PENAL C/C O ARTIGO 3º DO DECRETO-LEI 399/1968 E COMUNICAR O JUÍZO DE ORIGEM PARA QUE DÊ CUMPRIMENTO AOS TERMOS DA DECISÃO DE SEGUNDO GRAU, UMA VEZ IMPLEMENTADAS AS CONDIÇÕES PREVISTAS NESTE JULGAMENTO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.






RELATOR ACÓRDÃO
:
Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
VOTANTE(S)
:
Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
 
:
Des. Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
 
:
Juiz Federal NIVALDO BRUNONI










Lisélia Perrot Czarnobay
Diretora de Secretaria












 


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