Jurisprudência - STJ

RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.

Por: Equipe Petições

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RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MAGISTRADO. REPRESENTAÇÃO AO CNJ. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. ACTIO NATA. CONHECIMENTO DA REPRESENTAÇÃO. EXERCÍCIO DE DIREITO DE PETIÇÃO. ABUSO. AUSÊNCIA. DANOS MORAIS. NÃO CONFIGURAÇÃO. VALOR DA REPARAÇÃO. EXCESSIVIDADE.

1. Ação ajuizada em 08/08/2013. Recurso interposto em 23/01/2017 e concluso ao gabinete em 21/09/2017.

2. O propósito recursal consiste em verificar: (i) a ocorrência de prescrição da pretensão indenizatória, em função da determinação de seu termo inicial; (ii) a existência de dano moral, pelo exercício de representação junto à Corregedoria-Nacional de Justiça do CNJ; e (iii) possível excesso no valor de reparação dos danos morais fixados pelo Tribunal de origem.

3. O surgimento da pretensão ressarcitória não se dá necessariamente no momento em que ocorre a lesão ao direito, mas sim quando o titular do direito subjetivo violado obtém plena ciência da lesão e de toda a sua extensão, bem como do responsável pelo ilícito, inexistindo, ainda, qualquer condição que o impeça de exercer o correlato direito de ação. Precedente.

4. Não há como concluir que o ato de representar qualquer magistrado ao CNJ, com fundamento em notícias circuladas em imprensa local, possa causar, por si próprio, a configuração de danos morais indenizáveis, pois o direito de petição é um direito constitucionalmente garantido e a atividade da magistratura, por sua natureza pública, está constantemente sujeita a críticas e controles.

5. Recurso especial conhecido e provido.

(REsp 1745643/MT, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/02/2019, DJe 08/02/2019)

 

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JURISPRUDÊNCIA NA ÍNTEGRA

RELATÓRIO
 
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):

 

Cuida-se de recurso especial interposto por JOSÉ BRITO DE SOUZA JÚNIOR, contra decisão que negou seguimento a recurso especial fundamentado nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, contra acórdão do TJ⁄MT.

Ação: de reparação de danos morais proposta por RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO em face de JOSÉ BRITO DE SOUZA JÚNIOR, na qual alega que a parte agravante ingressou com pedido de providências na Corregedoria Nacional de Justiça com a intenção de macular sua imagem e honra, tendo em vista que o recorrido proferiu voto desfavorável ao agravante em ação rescisória promovida por este.

Sentença: julgou procedente a ação para condenar a parte agravante ao pagamento de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) a título de danos morais.

Acórdão: negou provimento ao recurso interposto pelo recorrente e deu provimento ao recurso do recorrido, para majorar o valor fixado à título de dano moral para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), nos termos da seguinte ementa:

RECURSO DE APELAÇÃO – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – PRESCRIÇÃO – INOCORRÊNCIA – PRAZO – PRESCRICIONAL QUE SE INICIA COM O CONHECIMENTO INEQUÍVOCO DO ATO – REPRESENTAÇÃO DE DESEMBARGADOR NO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – EXERCÍCIO ABUSIVO DO DIREITO DE PETIÇÃO – OFENSA À HONRA PESSOAL E PROFISSIONAL DO MAGISTRADO – EXCESSO COMETIDO – DANO MORAL CONFIGURADO – INDENIZAÇÃO DEVIDA – QUANTUM INDENIZATÓRIO MAJORADO EM ATENÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – RECURSO DO RÉU DESPROVIDO E APELO ADESIVO AO AUTOR PROVIDO.
 

Não houve oposição de embargos de declaração.

Recurso especial: alega violação do artigo 188, I, do CC⁄2002, bem como dissídio jurisprudencial. Requer a revisão do quantum indenizatório, tendo em vista que o valor arbitrado pelo tribunal de origem mostra-se exorbitante.

Admissibilidade: o recurso não fora admitido pelo Tribunal de origem (e-STJ fl. 478-482) e, após a interposição de agravo em recurso especial, reconsiderou-se a decisão para melhor exame da matéria (e-STJ fl. 524).

É o relatório.

 

 
RECURSO ESPECIAL Nº 1.745.643 - MT (2017⁄0213622-4)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : JOSÉ BRITO DE SOUZA JÚNIOR
ADVOGADOS : JOSE ANTONIO DUARTE ALVARES  - MT003432
    MARCELO SILVA MOURA  - MT012307
    BENEDITA IVONE ADORNO  - MT006391
    LUCIANO SALLES CHIAPPA  - MT011883B
    CAROLINA VIEIRA DE ALMEIDA E OUTRO(S) - MT014566
RECORRIDO : RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO
ADVOGADO : DÉCIO JOSÉ TESSARO E OUTRO(S) - MT003162
EMENTA
 
RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MAGISTRADO. REPRESENTAÇÃO AO CNJ. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. ACTIO NATA. CONHECIMENTO DA REPRESENTAÇÃO. EXERCÍCIO DE DIREITO DE PETIÇÃO. ABUSO. AUSÊNCIA. DANOS MORAIS. NÃO CONFIGURAÇÃO. VALOR DA REPARAÇÃO. EXCESSIVIDADE.
1. Ação ajuizada em 08⁄08⁄2013. Recurso interposto em 23⁄01⁄2017 e concluso ao gabinete em 21⁄09⁄2017.
2. O propósito recursal consiste em verificar: (i) a ocorrência de prescrição da pretensão indenizatória, em função da determinação de seu termo inicial; (ii) a existência de dano moral, pelo exercício de representação junto à Corregedoria-Nacional de Justiça do CNJ; e (iii) possível excesso no valor de reparação dos danos morais fixados pelo Tribunal de origem.
3. O surgimento da pretensão ressarcitória não se dá necessariamente no momento em que ocorre a lesão ao direito, mas sim quando o titular do direito subjetivo violado obtém plena ciência da lesão e de toda a sua extensão, bem como do responsável pelo ilícito, inexistindo, ainda, qualquer condição que o impeça de exercer o correlato direito de ação. Precedente.
4. Não há como concluir que o ato de representar qualquer magistrado ao CNJ, com fundamento em notícias circuladas em imprensa local, possa causar, por si próprio, a configuração de danos morais indenizáveis, pois o direito de petição é um direito constitucionalmente garantido e a atividade da magistratura, por sua natureza pública, está constantemente sujeita a críticas e controles.
5. Recurso especial conhecido e provido.
 
RECURSO ESPECIAL Nº 1.745.643 - MT (2017⁄0213622-4)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : JOSÉ BRITO DE SOUZA JÚNIOR
ADVOGADOS : JOSE ANTONIO DUARTE ALVARES  - MT003432
    MARCELO SILVA MOURA  - MT012307
    BENEDITA IVONE ADORNO  - MT006391
    LUCIANO SALLES CHIAPPA  - MT011883B
    CAROLINA VIEIRA DE ALMEIDA E OUTRO(S) - MT014566
RECORRIDO : RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO
ADVOGADO : DÉCIO JOSÉ TESSARO E OUTRO(S) - MT003162
 
VOTO
 
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
 

O propósito recursal consiste em verificar: (i) a ocorrência de prescrição da pretensão indenizatória, em função da determinação de seu termo inicial; (ii) a existência de dano moral, pelo exercício de representação junto à Corregedoria-Nacional de Justiça do CNJ; e (iii) possível excesso no valor de reparação dos danos morais fixados pelo Tribunal de origem.

1. DA DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA

O recorrido é Desembargador do TJ⁄MT e participou de julgamento de ação de interesse do recorrente. Diante de notícias que circulavam na região, o recorrente protocolizou um Pedido de Providências, em 02⁄08⁄2010, junto ao CNJ, em que alega irregularidades na conduta do magistrado recorrido.

Na representação articulada pelo recorrente, acusa-se o recorrido de oficiar durante seu período de férias e atuar em favor de seu “compadre”, in verbis:

Na sessão seguinte com a ausência do retromencionado Magistrado Perri (licença), o Insigne Des. Rubens de Oliveira mesmo ESTANDO DE FÉRIAS apareceu SURPREENDENTEMENTE com anuência do então presidente José Ferreira Leite (Desembargador cassado por ilegalidade) e para participar de sessão de julgamento administrativo, repito sessão de julgamento administrativo (questão interna do Tribunal), inclusive ressalte-se que a autorização ou convocação para regularizar o surpreendente comparecimento do Des. Rubens que esteva de férias, somente foi postulado pelo referido e elaborado e deferido pelo Presidente Des. José Ferreira após quase dois meses da aludida data do julgamento, ou seja, o Des. Rubens compareceu sem justificar ou sem autorização prévia ou mesmo comunicação ao TJ da suspensão de suas férias (só foi atentar quanto a formalidade da suspensão de suas férias após decorridos 60 dias), contudo como advogado fosse, compareceu para conduzir e proferir seu voto (com sentido total diverso do Des. Orlando e IGNORANDO A EXTREMA RELEVÂNCIA DA MATÉRIA DE DIREITO), o que no mínimo é estranho, ou seja, preferiu calar direito notório, evidente, incontestável e com empenho de um patrono, agasalhou questão absurda, favorecendo seu amigo e “compadre” Atila da Silva Gattas, por acaso advogado de Elias Leal e Pedro Henry. (e-STJ fls. 27-28)
 

Na conclusão de sua representação, o recorrente ainda afirma que o recorrido teria recebido valores de forma ilegal, conforme destacado no trecho abaixo:

Acerca do Des. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, além de ser “compadre” do advogado da parte contrária, o que já é motivo para não participar e muito menos com “total afinco” (abriu mão de férias), consta por Flávia Borges RDNEWS a devolução de R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais) aos cofres do Tribunal⁄Estado de MT, ou seja, indaga-se como o aludido teria tais valores para realizar a devolução ao Tribunal, tendo em vista seus ganhos mensais, ou seja, outro magistrado que não deveria estar participando do julgamento do processo. (...) (e-STJ fl. 31)
 

Após os esclarecimentos prestados pelo recorrido, a então Corregedora-Nacional de Justiça, Min. Eliana Calmon, determinou o arquivamento do pedido de providência, em razão da ausência de infração disciplinar a ser apurada.

Em 14⁄08⁄2013, o recorrido ajuizou ação de indenização, por considerar que a petição apresentada pelo recorrente lhe imputava comportamento desairoso e imoral, a qual teria abalado sua honra e reputação. Ao final, como relatado anteriormente, o Juízo de 1º grau de jurisdição julgou procedente o pedido, condenando o recorrente ao pagamento de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) e o TJ⁄MT deu provimento à apelação interposta pelo recorrido, para aumentar o valor da condenação para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais).

2. DA PRESCRIÇÃO DO PEDIDO INDENIZATÓRIO

Em suas razões, o recorrente alega que o termo inicial da prescrição fixado pelo Tribunal de origem, alegando que a contagem do prazo seria iniciada na data em que a representação foi apresentada junto ao CNJ, em 02⁄08⁄2010.

O art. 189 do CC⁄02 consagrou o princípio da actio nata, fixando como dies a quo para contagem do prazo prescricional a data em que nasce o direito subjetivo de ação por violação de direito, independentemente da efetiva ciência da vítima. Em outras palavras, o termo inicial da prescrição é a data em que surge o legítimo interesse para a ação e não a data em que a vítima tem conhecimento do dano.

Trata-se de critério objetivo, adotado pelo legislador como meio de se estabelecer regra certa e determinada de fixação e cálculo dos prazos de prescrição.

Neste ponto, cumpre destacar que o STJ possui posicionamento sedimentado na teoria da actio nata acerca da contagem do prazo prescricional. Isso porque “o surgimento da pretensão ressarcitória não se dá necessariamente no momento em que ocorre a lesão ao direito, mas sim quando o titular do direito subjetivo violado obtém plena ciência da lesão e de toda a sua extensão, bem como do responsável pelo ilícito, inexistindo, ainda, qualquer condição que o impeça de exercer o correlato direito de ação (pretensão)” (REsp 1347715⁄RJ, Terceira Turma, DJe 04⁄12⁄2014).

Na hipótese dos autos, contudo, escorando-se nesse entendimento, o Tribunal de origem afirmou ser a data em que o recorrido tomou conhecimento do pedido de providencias o termo inicial do prazo prescricional. Esta tese, contudo, deve ser utilizada nas hipóteses em que a existência e a extensão do dano será verifica após sua efetiva consolidação.

Outro não é o entendimento desta Corte, que já assentou reiteradas vezes que “o dies a quo do prazo prescricional surge com o nascimento da pretensão resistida (actio nata), assim considerado a possibilidade do exercício da pretensão em juízo, pressupondo, portanto, a violação do direito (ocorrência da lesão)” (AgRg no REsp 1.098.109⁄RS, 1ª Turma, DJe de 05.11.2010). No mesmo sentido: REsp 1.168.680⁄MG, 2ª Turma, DJe de 03.05.2010; e AgRg no REsp 909.547⁄RJ, DJe de 21.06.2010).

Mesmo antes do advento do CC⁄02, o STJ já seguia essa orientação, manifestando-se pela aplicação do princípio actio nata, ressalvando que “quando a lei pretende que o termo a quo seja a ciência do fato, di-lo expressamente” (REsp 43.305⁄SP, 3ª Turma, Rel. Min. Waldemar Zveiter, DJ de 14.08.1995).

Na hipótese dos autos, não deve ser aplicado o entendimento consolidado deste STJ para as situações de publicação em órgãos de imprensa, tal como descrito, a título de exemplo, na ementa abaixo:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PUBLICAÇÃO DE MATÉRIA JORNALÍSTICA. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. DATA DA PUBLICAÇÃO. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
1. A pretensão de indenização por danos morais decorrentes de publicação de matéria jornalística de conteúdo ofensivo tem como termo inicial, para fins de prescrição, a data de veiculação da matéria, não havendo que se falar em aplicação analógica da ação civil ex delicto ou em causa impeditiva de prescrição. Precedentes.
2. No caso, a eventual apuração na esfera criminal não era questão prejudicial ao ingresso do pedido indenizatório na esfera cível, afastando-se a incidência do artigo 200 do Código Civil.
3. Agravo interno desprovido.
(AgInt nos EDcl nos EDcl no AgRg no AREsp 565.154⁄SP, QUARTA TURMA, DJe 24⁄08⁄2018)
 

Isso porque, na data em que o pedido de providências foi formulado pelo recorrente, não havia como o recorrido formular qualquer providência em face dele e, assim, não há como se falar em actio nata.

Pelas peculiaridades dos autos, deve-se compreender que o termo inicial para qualquer pretensão indenizatória deve ser fixado no momento em que o recorrido teve conhecimento de sua menção no bojo da representação formulada junto ao CNJ, pois somente ao tomar conhecimento do fato é que se pode falar, na hipótese dos autos, em possível violação a seu direito subjetivo. Nesse mesmo sentido, mencione-se o julgamento abaixo do STJ:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. PROGRAMA DE CAPACITAÇÃO DE DOCENTES DO ESTADO DO PARANÁ. IRREGULARIDADES CONSTATADAS. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS E OBRIGAÇÃO DE FAZER. PRAZO PRESCRICIONAL. TERMO INICIAL. TEORIA DA ACTIO NATA. INÍCIO DO PRAZO PRESCRICIONAL NA DATA DA CIÊNCIA INEQUÍVOCA DA VIOLAÇÃO DO DIREITO SUBJETIVO E DA EXTENSÃO DE SUAS CONSEQUÊNCIAS.
1. Cuida-se, na origem, de ação de obrigação de fazer combinada com indenização por danos morais e materiais ajuizada por professores que se sentiram lesados por irregularidades em programa de capacitação promovido pelo Estado do Paraná, com o apoio da Faculdade Vizinhança Vale do Iguaçu.
2. A controvérsia consiste em definir a data da ciência inequívoca da lesão do direito pelo seu titular para fins de contagem do prazo prescricional.
3. Em relação ao termo inicial da prescrição, deve ser observada, in casu, a teoria da actio nata, em sua feição subjetiva, pela qual o prazo prescricional deve ter início a partir do conhecimento da violação ou da lesão ao direito subjetivo.
4. Para tanto, necessário analisar as peculiaridades do caso concreto, identificando quatro aspectos: (i) qual o direito subjetivo em discussão; (ii) qual o momento em que foi violado; (iii) quando o titular teve ciência inequívoca acerca de sua existência e da extensão de suas consequências; e (iv) qual o prazo prescricional a ser observado.
5. Em relação ao direito subjetivo em discussão, a matéria jurídica de fundo na demanda proposta na origem diz respeito à reparação da lesão decorrente do insucesso do Programa de Capacitação de Docentes em nível superior ministrado pela Faculdade Vizivali, mediante convênio firmado com o Estado do Paraná.
6. Em relação ao momento de violação do direito subjetivo, entende-se que ocorre quando as partes agravadas souberam que não teriam acesso ao diploma do curso que realizaram.
7. O acórdão proferido pelo Tribunal a quo reconheceu a prescrição, sob o fundamento de que, com a publicação no Diário Oficial da União do Parecer CNE⁄CES 139⁄2007, que concluiu ter havido irregularidades no programa, houve ciência inequívoca do ato que gerou lesão ao direito dos agravados.
8. Todavia, o mencionado ato não deve ser considerado como termo inicial do prazo prescricional, já que não é razoável entender que a publicação de um parecer de autoria do Poder Executivo Federal, que sequer foi solicitado pelos professores que se submeteram ao curso, configura ciência inequívoca da lesão ao direito. 9. Em caso análogo, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que "a nomeação em concurso público após considerável lapso temporal da homologação do resultado final, sem a notificação pessoal do interessado, viola o princípio da publicidade e da razoabilidade, não sendo suficiente a convocação para a fase posterior do certame por meio do Diário Oficial" (AgRg no AREsp 345.191⁄PI, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 18⁄9⁄2013). 10. A mesma solução deve ser observada na questão em exame, levando-se em consideração a regra hermenêutica segundo a qual: "onde há a mesma razão de ser, deve prevalecer a mesma razão de decidir" (ubi eadem legis ratio ibi eadem dispositio).
11. Agravo Regimental não provido.
(AgRg no REsp 1479738⁄PR, Segunda Turma, DJe 19⁄12⁄2017)
 

Pelo exposto acima, deve ser afastada a alegação do recorrente, segundo a qual, nos autos, haveria ocorrido a prescrição da pretensão indenizatória.

3. DO DANO MORAL

Segundo a jurisprudência desta Corte, pode-se definir dano moral como lesões a atributos da pessoa, enquanto ente ético e social que participa da vida em sociedade, estabelecendo relações intersubjetivas em uma ou mais comunidades, ou, em outras palavras, são atentados à parte afetiva e à parte social da personalidade (REsp 1426710⁄RS, Terceira Turma, julgado em 25⁄10⁄2016, DJe 09⁄11⁄2016).

No mesmo sentido, a doutrina de Carlos Alberto BITTAR afirma que os danos morais são aqueles relativos “a atributos valorativos, ou virtudes, da pessoa como entes sociais, ou seja, integrada à sociedade, vale dizer, dos elementos que a individualizam como ser, de que se destacam a honra, a reputação e as manifestações do intelecto”. (Reparação civil por danos morais. S. Paulo: Saraiva, 4ª ed., 2015 p. 35). Sobre o tema, contudo, este Tribunal mantém posicionamento pacífico segundo o qual simples dissabores ou aborrecimentos são incapazes de causar danos morais, como é possível perceber no julgamento do REsp 202.564⁄RJ (Quarta Turma  julgado em 02⁄08⁄2001, DJ 01⁄10⁄2001, p. 220) e do REsp 1.426.710 (julgado em 25⁄10⁄2016, DJe 08⁄11⁄2016).

A jurisprudência do STJ, incorporando a doutrina desenvolvida acerca da natureza jurídica do dano moral, conclui pela possibilidade de compensação independentemente da demonstração da dor, traduzindo-se, pois, em consequência in re ipsa, intrínseca à própria conduta que injustamente atinja a dignidade do ser humano.

Assim, em diversas oportunidades se deferiu indenização destinada a compensar dano moral diante da simples comprovação de ocorrência de conduta injusta e, portanto, danosa. Essa concepção também encontra raízes no valor da solidariedade social, albergado pela Constituição Republicana em seu art. 3º, inc. I. 28. Segundo Maria Celina Bodin de Moraes:

“A expressa referência à solidariedade, feita pelo legislador constituinte, estabelece em nosso ordenamento um princípio jurídico inovador, a ser levado em conta não só no momento da elaboração da legislação ordinária e na execução de políticas públicas, mas também nos momentos de interpretação e aplicação do Direito, por seus operadores e demais destinatários, isto é, por todos os membros da sociedade. Se a solidariedade fática decorre da necessidade imprescindível da coexistência humana, a solidariedade como valor deriva da consciência racional dos interesses em comum, interesses esses que implicam, para cada membro, a obrigação moral de 'não fazer aos outros o que não se deseja que lhe seja feito'. Esta regra não tem conteúdo material, enunciando apenas uma forma, a forma da reciprocidade, indicativa de que 'cada um, seja o que for que possa querer, deve fazê-lo pondo-se de algum modo no lugar de qualquer outro. É o conceito dialético de 'reconhecimento' do outro”. (Danos à pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 110-112)
 

Quanto a este ponto, há de perscrutar neste julgamento se a formulação de uma representação junto ao CNJ, o qual, em tese, é um direito constitucionalmente garantido a qualquer cidadão, teria o condão de causar danos morais, com a consequente obrigação de prestar a devida reparação. Neste ponto, portanto, deve-se questão se ocorreu um abuso do direito de petição por parte do recorrente.

É fato que o ordenamento jurídico pátrio coíbe o abuso de direito, ou seja, o desvio no exercício do direito, de modo a causar dano a outrem. Dispõe o art. 187 do CC⁄02 que comete ato ilícito “o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.

Desse modo, o exercício abusivo de direito pressupõe a existência de um direito legítimo, cuja utilização ocorre apenas para prejudicar terceiro, seja parte da relação jurídica originária ou não. Da mesma forma, não é qualquer excesso que caracteriza o abuso, cabendo ao "julgador apontar, em cada caso, os fatos que tornam evidente o abuso do direito, com o que se evitará a temida arbitrariedade, ou o cerceamento do legítimo exercício do direito" (Sérgio Cavalieri Filho, Programa de Responsabilidade Civil, 6ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 173).

 

De fato, até o manejo de habeas corpus, um importante instrumento processual previsto constitucionalmente, foi considerado abusivo, diante das graves consequências suportadas por terceira pessoa, conforme trecho da ementa abaixo:

Controvérsia: dizer se o manejo de habeas corpus, pelo recorrido, com o fito de impedir a interrupção da gestação da primeira recorrente, que tinha sido judicialmente deferida, caracteriza-se como abuso do direito de ação e⁄ou ação passível de gerar responsabilidade civil de sua parte, pelo manejo indevido de tutela de urgência. (...)
Necessidade de perquirir sobre a ilicitude do ato praticado pelo recorrido, buscando, na existência ou não - de amparo legal ao procedimento de interrupção de gestação, na hipótese de ocorrência da síndrome de body stalk e na possibilidade de responsabilização, do recorrido, pelo exercício do direito de ação - dizer da existência do ilícito compensável; Reproduzidas, salvo pela patologia em si, todos efeitos deletérios da anencefalia, hipótese para qual o STF, no julgamento da ADPF 54, afastou a possibilidade de criminalização da interrupção da gestação, também na síndrome de body-stalk, impõe-se dizer que a interrupção da gravidez, nas circunstâncias que experimentou a recorrente, era direito próprio, do qual poderia fazer uso, sem risco de persecução penal posterior e, principalmente, sem possibilidade de interferências de terceiros, porquanto, ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio. (Onde existe a mesma razão, deve haver a mesma regra de Direito) (...)
(REsp 1467888⁄GO, Terceira Turma, DJe 25⁄10⁄2016)
 
Contudo, na hipótese dos autos, não há como compreender que o exercício do direito constitucional de petição poderia ser lesivo à pessoa do magistrado, cuja atividade é – por sua própria natureza – sujeita a controles e críticas. Ademais, no contexto de pedido de providências perante o CNJ, era de se esperar a formulação de críticas e suspeitas em relação a atividades dos magistrados, que, como afirmado, é pública.
Em situações um pouco distintas, este STJ afirmou que as críticas aos magistrados, por ser uma atividade pública, não enseja a configuração de danos morais. Assim, vejam os julgamentos abaixo:
 
(...) 1. O dano moral deve ser visto como violação do direito à dignidade, estando nela inseridos a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem. Dessa forma, havendo agressão à honra da vítima, é cabível indenização.
2. Críticas à atividade desenvolvida pelo homem público, in casu, o magistrado, são decorrência natural da atividade por ele desenvolvida e não ensejam indenização por danos morais quando baseadas em fatos reais, aferíveis concretamente. (REsp 531.335⁄MT, TERCEIRA TURMA, DJe 19⁄12⁄2008)
 
(...) 4. O direito à imagem, de consagração constitucional (art. 5º, X), é de uso restrito, somente sendo possível sua utilização por terceiro quando expressamente autorizado e nos limites da finalidade e das condições contratadas.
5. A princípio, a simples utilização de imagem da pessoa, sem seu consentimento, gera o direito ao ressarcimento das perdas e danos, independentemente de prova do prejuízo (Súmula 403⁄STJ), exceto quando necessária à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública (CC⁄2002, art. 20).
6. Tratando-se de imagem de multidão, de pessoa famosa ou ocupante de cargo público, deve ser ponderado se, dadas as circunstâncias, a exposição da imagem é ofensiva à privacidade ou à intimidade do retratado, o que poderia ensejar algum dano patrimonial ou extrapatrimonial. Há, nessas hipóteses, em regra, presunção de consentimento do uso da imagem, desde que preservada a vida privada.
7. Em se tratando de pessoa ocupante de cargo público, de notória importância social, como o é o de magistrado, fica mais restrito o âmbito de reconhecimento do dano à imagem e sua extensão, mormente quando utilizada a fotografia para ilustrar matéria jornalística pertinente, sem invasão da vida privada do retratado.
8. Com base nessas considerações, conclui-se que a utilização de fotografia do magistrado adequadamente trajado, em seu ambiente de trabalho, dentro da Corte Estadual onde exerce a função judicante, serviu apenas para ilustrar a matéria jornalística, não constituindo, per se, violação ao direito de preservação de sua imagem ou de sua vida íntima e privada. Não há, portanto, causa para indenização por danos patrimoniais ou morais à imagem. (REsp 801.109⁄DF, QUARTA TURMA, DJe 12⁄03⁄2013)
 

De fato, o Superior Tribunal de Justiça inclina-se a compreender pela ausência de danos morais por denúncia a autoridade policial, quando há suspeita da ocorrência de atividade que possa ser considerada crime. Por óbvio, com exceção da ação com dolo e, se a partir da denúncia, há a ocorrência de outros eventos gravosos. Nesse sentido, mencione-se o julgamento abaixo:

I. Em princípio, não dá ensejo à responsabilização por danos morais o ato daquele que denuncia à autoridade policial atitude suspeita ou prática criminosa, porquanto tal constitui exercício regular de um direito do cidadão, ainda que, eventualmente, se verifique, mais tarde, que o acusado era inocente ou que os fatos não existiram.
II. Todavia, configura-se o ilícito civil indenizável, se o denunciante age com dolo ou culpa, e seu ato foi relevante para produção do resultado lesivo (REsp n. 470.365⁄RS, Relatora Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, unânime, DJU de 01.12.2003 e REsp n. 721.440⁄SC, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, 3ª Turma, unânime, DJU de 20.08.2007).
III. Caso em que houve imprudência e excesso dos recorrentes, que além de fornecer informação equivocada, ameaçou anteriormente a autora com vários telefonemas e, inclusive, de fornecer uma suposta gravação à mídia para divulgação. (...)
(REsp 1040096⁄PR, Quarta Turma, DJe 22⁄02⁄2011)
 

De todo o exposto acima, não há como concluir que o ato de representar qualquer magistrado ao CNJ, com fundamento em notícias circuladas em imprensa local, possa causar, por si próprio, a configuração de danos morais indenizáveis, pois o direito de petição é um direito constitucionalmente garantido e a atividade da magistratura, por sua natureza pública, está constantemente sujeita a críticas e controles.

Forte nessas razões, CONHEÇO do recurso especial e DOU-LHE PROVIMENTO, com fundamento no art. 255, § 4º, III, do RISTJ, para afastar a configuração de danos morais alegadamente suportados pelo recorrido.

Determino a  inversão dos ônus sucumbenciais, na hipótese de serem afastados os danos morais, sem majoração os honorários advocatícios, pois fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação pelo Tribunal de origem.

 

Documento: 91891823 RELATÓRIO, EMENTA E VOTO