Jurisprudência - STJ

RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL.

Por: Equipe Petições

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RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. HONORÁRIOS DO ADMINISTRADOR JUDICIAL. RESERVA DE 40%. ARTS. 24, § 2º, DA LFRE. INAPLICABILIDADE NO ÂMBITO DOS PROCESSOS DE SOERGUIMENTO. 1. Recuperação judicial requerida em 15/12/2015. Recurso especial interposto em 24/3/2017 e concluso ao Gabinete em 11/12/2017.

2. O propósito recursal é definir se a regra do art. 24, § 2º, da Lei 11.101/05 - que trata da reserva de honorários do administrador judicial - aplica-se também aos processos de recuperação ou apenas às ações de falência.

3. O art. 24, § 2º, da LFRE faculta a reserva de 40% dos honorários do administrador judicial para pagamento posterior, providência que se condiciona, segundo a mesma norma, à verificação e à realização de procedimentos relativos estritamente a processos de falência - (i) prestação de contas (após a realização do ativo e a distribuição do produto entre os credores); e (ii) apresentação do relatório final da falência, indicando valores patrimoniais e pagamentos feitos, bem como as responsabilidades com que continuará o falido.

4. Diante disso, uma vez que as condições a que se sujeita o pagamento diferido guardam relação com procedimentos específicos de processos falimentares, não se pode considerar tal providência aplicável às ações de recuperação judicial.

RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

(REsp 1700700/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/02/2019, DJe 08/02/2019)

 

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JURISPRUDÊNCIA NA ÍNTEGRA

RECURSO ESPECIAL Nº 1.700.700 - SP (2017⁄0248135-5)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : ALVAREZ & MARSAL CONSULTORIA EMPRESARIAL DO BRASIL LTDA
ADVOGADOS : FERNANDO GOMES DOS REIS LOBO  - SP183676
    LEANDRO ARARIPE FRAGOSO BAUCH E OUTRO(S) - SP286619
RECORRIDO : POLICARNE COMERCIAL LTDA
ADVOGADOS : EDUARDO BIRKMAN  - SP093497
    PAULO BIRKMAN E OUTRO(S) - SP119493
 
RELATÓRIO
 
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
 

Cuida-se de recurso especial interposto por ALVAREZ & MARSAL CONSULTORIA EMPRESARIAL DO BRASIL LTDA, com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional.

Ação: recuperação judicial da sociedade POLICARNE COMERCIAL LTDA.

Decisão interlocutória: arbitrou os honorários da recorrente, administradora judicial, em R$ 189.205,00 (3,715% do total dos créditos), a serem pagos em 30 parcelas mensais de R$ 6.306,83, e determinou que as já vencidas fossem pagas de uma só vez, no prazo de 30 dias.

Acórdão: deu parcial provimento ao agravo de instrumento interposto pela recorrida, para reduzir a remuneração da recorrente para 3% do passivo sujeito à recuperação judicial (R$ 152.796,29), sobrestar o pagamento de 40% (R$ 61.118,52) até o término dos trabalhos da administradora e determinar o pagamento do saldo em 30 (trinta) parcelas mensais no valor de R$ 3.055,93 cada uma, preservadas as demais condições de pagamento estabelecidas na r. decisão guerreada, inclusive no tocante ao pagamento em 30 (trinta) dias das parcelas já vencidas.

Recurso especial: alega violação dos arts. 24, § 2º, 154 e 155 da Lei 11.101⁄05, bem como dissídio jurisprudencial. Sustenta que a reserva de 40% dos honorários do administrador judicial se aplica apenas na hipótese de falência, sendo regra que não incide em processos de recuperação judicial.

É o relatório.

 
RECURSO ESPECIAL Nº 1.700.700 - SP (2017⁄0248135-5)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : ALVAREZ & MARSAL CONSULTORIA EMPRESARIAL DO BRASIL LTDA
ADVOGADOS : FERNANDO GOMES DOS REIS LOBO  - SP183676
    LEANDRO ARARIPE FRAGOSO BAUCH E OUTRO(S) - SP286619
RECORRIDO : POLICARNE COMERCIAL LTDA
ADVOGADOS : EDUARDO BIRKMAN  - SP093497
    PAULO BIRKMAN E OUTRO(S) - SP119493
EMENTA
 
RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. HONORÁRIOS DO ADMINISTRADOR JUDICIAL. RESERVA DE 40%. ARTS. 24, § 2º, DA LFRE. INAPLICABILIDADE NO ÂMBITO DOS PROCESSOS DE SOERGUIMENTO.
1. Recuperação judicial requerida em 15⁄12⁄2015. Recurso especial interposto em 24⁄3⁄2017 e concluso ao Gabinete em 11⁄12⁄2017.
2. O propósito recursal é definir se a regra do art. 24, § 2º, da Lei 11.101⁄05 – que trata da reserva de honorários do administrador judicial – aplica-se também aos processos de recuperação ou apenas às ações de falência.
3. O art. 24, § 2º, da LFRE faculta a reserva de 40% dos honorários do administrador judicial para pagamento posterior, providência que se condiciona, segundo a mesma norma, à verificação e à realização de procedimentos relativos estritamente a processos de falência – (i) prestação de contas (após a realização do ativo e a distribuição do produto entre os credores); e (ii) apresentação do relatório final da falência, indicando valores patrimoniais e pagamentos feitos, bem como as responsabilidades com que continuará o falido.
4. Diante disso, uma vez que as condições a que se sujeita o pagamento diferido guardam relação com procedimentos específicos de processos falimentares, não se pode considerar tal providência aplicável às ações de recuperação judicial.
 
RECURSO ESPECIAL Nº 1.700.700 - SP (2017⁄0248135-5)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : ALVAREZ & MARSAL CONSULTORIA EMPRESARIAL DO BRASIL LTDA
ADVOGADOS : FERNANDO GOMES DOS REIS LOBO  - SP183676
    LEANDRO ARARIPE FRAGOSO BAUCH E OUTRO(S) - SP286619
RECORRIDO : POLICARNE COMERCIAL LTDA
ADVOGADOS : EDUARDO BIRKMAN  - SP093497
    PAULO BIRKMAN E OUTRO(S) - SP119493
 
VOTO
 
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
 

O propósito recursal é definir se a regra do art. 24, § 2º, da Lei 11.101⁄05 – que trata da reserva de honorários do administrador judicial – aplica-se também aos processos de recuperação ou apenas às ações de falência.

 

DA RESERVA DE HONORÁRIOS DO ADMINISTRADOR JUDICIAL. ART. 24, § 2º, DA LFRE.

O art. 24 da Lei de Falência e Recuperação de Empresas possui a seguinte redação:

Art. 24. O juiz fixará o valor e a forma de pagamento da remuneração do administrador judicial, observados a capacidade de pagamento do devedor, o grau de complexidade do trabalho e os valores praticados no mercado para o desempenho de atividades semelhantes.

§ 1º Em qualquer hipótese, o total pago ao administrador judicial não excederá 5% (cinco por cento) do valor devido aos credores submetidos à recuperação judicial ou do valor de venda dos bens na falência.

§ 2º Será reservado 40% (quarenta por cento) do montante devido ao administrador judicial para pagamento após atendimento do previsto nos arts. 154 e 155 desta Lei.

§ 3º O administrador judicial substituído será remunerado proporcionalmente ao trabalho realizado, salvo se renunciar sem relevante razão ou for destituído de suas funções por desídia, culpa, dolo ou descumprimento das obrigações fixadas nesta Lei, hipóteses em que não terá direito à remuneração.

§ 4º Também não terá direito a remuneração o administrador que tiver suas contas desaprovadas.

§ 5º A remuneração do administrador judicial fica reduzida ao limite de 2% (dois por cento), no caso de microempresas e empresas de pequeno porte.

 

Como se percebe, o § 2º do dispositivo retro transcrito determina que 40% da remuneração do administrador judicial devem ser reservados para pagamento posterior, após atendidas as previsões dos arts. 154 e 155 da LFRE:

Art. 154. Concluída a realização de todo o ativo, e distribuído o produto entre os credores, o administrador judicial apresentará suas contas ao juiz no prazo de 30 (trinta) dias.

§ 1º As contas, acompanhadas dos documentos comprobatórios, serão prestadas em autos apartados que, ao final, serão apensados aos autos da falência.

§ 2º O juiz ordenará a publicação de aviso de que as contas foram entregues e se encontram à disposição dos interessados, que poderão impugná-las no prazo de 10 (dez) dias.

§ 3º Decorrido o prazo do aviso e realizadas as diligências necessárias à apuração dos fatos, o juiz intimará o Ministério Público para manifestar-se no prazo de 5 (cinco) dias, findo o qual o administrador judicial será ouvido se houver impugnação ou parecer contrário do Ministério Público.

§ 4º Cumpridas as providências previstas nos §§ 2º e 3º deste artigo, o juiz julgará as contas por sentença.

§ 5º A sentença que rejeitar as contas do administrador judicial fixará suas responsabilidades, poderá determinar a indisponibilidade ou o seqüestro de bens e servirá como título executivo para indenização da massa.

§ 6º Da sentença cabe apelação.

 

 Art. 155. Julgadas as contas do administrador judicial, ele apresentará o relatório final da falência no prazo de 10 (dez) dias, indicando o valor do ativo e o do produto de sua realização, o valor do passivo e o dos pagamentos feitos aos credores, e especificará justificadamente as responsabilidades com que continuará o falido.

 

Vale frisar que esses artigos – que disciplinam a prestação e o julgamento das contas do administrador judicial, bem como a apresentação do relatório final – estão insertos no capítulo V da lei em questão, que, em sua seção XII, trata especificamente do “Encerramento da Falência e da Extinção das Obrigações do Falido”.

Desse modo, uma vez que o comando normativo apontado como violado (art. 24, § 2º, da LFRE) condiciona o pagamento dos honorários reservados à verificação e à realização de procedimentos relativos estritamente a processos de falência, não se pode considerar tal providência aplicável às ações de recuperação judicial.

Quisesse o legislador que a reserva de 40% da remuneração devida ao administrador fosse regra aplicável também aos processos de soerguimento, teria feito menção expressa ao disposto no art. 63 da LFRE – que trata da apresentação das contas e do relatório circunstanciado nas recuperações judiciais –, como efetivamente o fez em relação às ações falimentares, ao sujeitar o pagamento da reserva à observância dos arts. 154 e 155 da LFRE.

Vale destacar, a propósito, que as disposições dos artigos retro mencionados tratam de procedimentos distintos, que guardam relação, cada qual, com as particularidades inerentes a cada processo (recuperação ou falência). A título exemplificativo, de se consignar que, na recuperação judicial, o art. 63, III, da LFRE exige a apresentação, em 15 dias, de relatório circunstanciado que verse sobre a execução do plano de soerguimento; na falência, por outro lado, a apresentação do relatório final, por força do art. 155 da LFRE, deve ocorrer em 10 dias, indicando valores patrimoniais, pagamentos realizados e responsabilidades.

No sentido da impossibilidade de reserva de remuneração do administrador judicial nas recuperações judiciais, confira-se o entendimento do Prof. FÁBIO ULHOA COELHO:

A reserva de 40% da remuneração devida ao administrador judicial para pagamento apenas após a aprovação de suas contas é aplicável unicamente na falência. Isso decorre da própria literalidade do dispositivo abrigado no § 2º do artigo objeto de comentário, que se remete a normas exclusivas do processo falimentar em sentido estrito. Na recuperação judicial, a remuneração do administrador judicial é paga à vista ou a prazo e nas datas definidas pelo juízo recuperacional.

(Lei de Falências e de Recuperação de Empresas, 13ª ed., Revista dos Tribunais, p. 112, sem destaque no original)

 

A mesma posição é compartilhada pelo Prof. MANOEL JUSTINO BEZERRA FILHO:

Atento a esse aspecto da remuneração, o § 2º estabeleceu critério novo, determinando a reserva de 40% do devido ao administrador, para pagamento após a realização do ativo e o julgamento de suas contas. A parcela de 60% deverá ser paga na ordem legal estabelecida no inc. 1 do art. 84; só depois é que serão pagos os 40% restantes, ou seja, após julgadas e aprovadas as contas do administrador. O valor correspondente a 40%, porém, já terá sido reservado anteriormente. Esta reserva aplica-se apenas a casos de falência, não aplicável a casos de recuperação judicial, até porque na recuperação não ocorre a fase dos arts. 154 e 155, exclusivos do procedimento falimentar. Ademais, como tem sido praxe, os juízes em geral têm estabelecido a remuneração do administrador judicial na recuperação, para pagamento em 24 parcelas, que é o período de duração da fiscalização prevista no art. 61. Aliás, quanto a este ponto, parece que o mais razoável seria determinar o pagamento em 30 parcelas, ou seja, 6 parcelas relativas ao prazo inicial de 180 dias previsto no § 4º do art. 6º, mais as 24 parcelas relativas ao período do art. 61.

(Lei de Recuperação de Empresas e Falência. 13ª ed. Revista dos Tribunais, ps. 128⁄129)

 

Diante desse panorama, portanto, impõe-se a reforma do acórdão recorrido, para afastar a reserva de 40% dos honorários do administrador judicial para pagamento posterior.

 

CONCLUSÃO

Forte nessas razões, DOU PROVIMENTO ao recurso especial, para afastar a suspensão do pagamento de 40% do valor devido ao administrador judicial imposta pelo Tribunal de origem, mantendo-se as demais condições de pagamento (percentual e prazo).

 

 

Documento: 91894100 RELATÓRIO, EMENTA E VOTO