SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. GUARDA E ALIMENTOS DE FILHO MENOR.
SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. GUARDA E ALIMENTOS DE FILHO MENOR. CONVENÇÃO DE NOVA IORQUE. INSTITUIÇÃO INTERMEDIÁRIA. MITIGAÇÃO DOS REQUISITOS DE CHANCELA CONSULAR E TRADUÇÃO OFICIAL. MODIFICAÇÃO DO ESTADO DE FATO E DE DIREITO. SENTENÇA DE GUARDA E ALIMENTOS SUJEITA À REVISÃO.
I - Por tramitar o pedido de homologação pelas vias diplomáticas, tendo a Procuradoria-Geral da República como Instituição Intermediária, desnecessária a chancela da autoridade consular e a tradução oficial. Reforça a dispensa da tradução oficial o fato de o título judicial estrangeiro ter sido proferido em Portugal, cujo idioma oficial é o português.
II - A modificação do estado de fato e de direito sujeita a revisão da sentença que estabelece a guarda e os alimentos dos filhos menores.
III - Sentença estrangeira que preenche os demais requisitos para homologação.
IV - Homologação deferida.
(HDE 465/EX, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 05/12/2018, DJe 12/12/2018)
JURISPRUDÊNCIA NA ÍNTEGRA
O EXMO. SR. MINISTRO FRANCISCO FALCÃO (Relator):
Trata-se de pedido de homologação de sentença estrangeira de "Regulação das Responsabilidades Parentais" proferida pelo Tribunal de Comarca e de Família e Menores de Almada, Portugal, formulado por M. M., representado por M. R. DOS. S., em face de M. R. DE M., que julgou procedente o pedido de fixação de alimentos e guarda do menor.
Narra a inicial que o requerente, nascido em 23 de novembro de 2005, menor e representado pela sua genitora, requer a execução das prestações alimentares que lhe são devidas pelo requerido.
O requerido foi citado conforme certidão positiva de fl. 68. A Defensoria Pública da União, curadora especial da parte requerida, apresentou contestação de fls. 39-52.
Sustenta, em síntese, que, atualmente, o requerido não possui condições de cumprir a obrigação alimentar fixada em € 200,00 (duzentos euros) mensais, posto que se encontra desempregado há mais de dois anos, tendo sua própria assistência material suprida pelos seus familiares, ensejando na dificuldade de prestar alimentos a seu filho em decorrência da frágil situação econômica. Aduz que tal situação impossibilita o requerido arcar com seu próprio sustento, tornando o pedido de homologação da decisão estrangeira desumano, violando o requisito essencial da dignidade da pessoa humana.
O Ministério Público Federal opinou, às fls. 72-73, pelo deferimento do pedido de homologação de sentença estrangeira, à vista que a situação financeira do requerido não configura óbice à homologação da sentença estrangeira, uma vez que, na ordem processual brasileira, a sentença de guarda e alimentos é uma decisão rebus sic stantibus, passível de modificação em ação revisional, podendo o requerido, a qualquer tempo, rever tais cláusulas.
É o relatório.
Preliminarmente, há se ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça tem competência para emitir juízo meramente delibatório acerca da homologação de sentença estrangeira. Nesse contexto, é preciso verificar se a pretensão homologatória atende aos requisitos do art. 963 do Código de Processo Civil de 2015 e dos arts. 216-C e 216-D do Regimento Interno deste Tribunal Superior.
A apresentação de questionamentos acerca do mérito da decisão alienígena é de competência do juízo estrangeiro. Assim, eventual deferimento do pedido de homologação, portanto, limita-se a dar eficácia à sentença estrangeira, nos exatos termos em que proferida, não sendo possível aditá-la para inserir provimento que dela não conste.
Feito esse esclarecimento, passa-se à análise dos requisitos. Segundo os arts. 963 do CPC⁄2015 e 216-C e 216-D do RISTJ, constituem-se requisitos necessários para a homologação de título judicial estrangeiro: i) ter sido proferido por autoridade competente; ii) terem sido as partes regularmente citadas ou verificada a revelia; iii) ter transitado em julgado; iv) estar chancelado pela autoridade consular brasileira, e; v) ser traduzido por tradutor oficial ou profissional juramentado no Brasil. Além disso, a sentença estrangeira não pode ofender a soberania nacional, a dignidade da pessoa humana e⁄ou a ordem pública.
Quanto ao primeiro requisito, cabe salientar que a hipótese versada nos autos se insere no rol de competência concorrente da justiça brasileira previsto no art. 21 do CPC⁄2015. Trata-se, assim, de matéria de competência relativa da autoridade brasileira e, dessa forma, de conhecimento concorrente entre as duas jurisdições.
O requisito da citação do requerido pode ser verificado pela sua efetiva atuação no processo alienígena, posto que foi o autor da ação.
O trânsito em julgado consta da certidão de fl. 9.
A chancela da autoridade consular brasileira é dispensada no caso, posto que os documentos que integram a inicial foram enviados diretamente pela autoridade remetente à PGR brasileira, já que a PGR é instituição intermediária da Convenção da ONU sobre Prestação de Alimentos no Estrangeiro – Convenção de Nova Iorque –, promulgada pelo Decreto n. 56.826⁄1965, c⁄c a Lei n. 5.478⁄1968.
No que concerne à tradução, a sentença homologanda é de origem portuguesa, cujo idioma oficial é o português, logo, não é necessária a sua tradução.
Nesse sentido:
Quanto à possível violação à dignidade da pessoa humana, cumpre esclarecer que a sentença de guarda e alimentos é uma decisão rebus sic stantibus, ou seja, poderá ser objeto de revisão por ação própria quando houver modificação no estado de fato e de direito entre alimentando e alimentado.
Por fim, não se vislumbra nenhum impedimento à homologação da sentença estrangeira na medida em que foram satisfeitos todos os requisitos.
Ante o exposto, nos termos do art. 216-K, parágrafo único, do RISTJ, defiro o pedido de homologação de sentença estrangeira.
Expeça-se a carta de sentença.
É o voto.
Jurisprudência do stj na íntegra