Jurisprudência - STJ

PROCESSUAL CIVIL. HABEAS CORPUS.

Por: Equipe Petições

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PROCESSUAL CIVIL. HABEAS CORPUS. ALIMENTOS DEVIDOS À EX-CÔNJUGE. INADIMPLEMENTO DAS PRESTAÇÕES ALIMENTARES REFERENTES AOS TRÊS MESES ANTERIORES AO AJUIZAMENTO E ÀS VINCENDAS. PRISÃO CIVIL. POSSIBILIDADE. NCPC, ART. 528, § 3°, 911 E SÚM 309 DO STJ.

1. A jurisprudência do STJ, há tempos, se pacificou no sentido de que "o débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo" (Súm 309 do STJ).

Entendimento que acabou sendo consagrado pelo novo Código de Processo Civil, na dicção de seus arts. 528, § 7º, e 911, caput.

2. O alimento devido entre cônjuges, decorrentes de obrigação na linha horizontal, tem como fundamento o princípio da solidariedade social e familiar (CF, art. 3°, I) e, mesmo que transitórios, uma vez fixados pelo magistrado, depois da comprovação de sua necessidade, devem ser tidos, ao menos durante esse período, como indispensáveis à sobrevivência humana.

3. Na execução de alimentos devidos entre cônjuges - mesmo quando estipulados na forma transitória - incide, de forma plena, a técnica executiva da coação prisional quando a verba alimentar se enquadrar na tipicidade normativa das 3 (três) prestações anteriores ao seu ajuizamento e das que se vencerem no curso do processo, já que se trata de alimentos legítimos e necessários. 4. A restrição da execução aos valores das últimas três parcelas atrairia o efeito deletério de obrigar o credor alimentar a ajuizar várias execuções paralelas pelo rito prisional, acarretando, inevitavelmente, a acumulação de prazos de prisão decretados em diversos processos distintos.

5. A lei não faz distinção, para fins de prisão, entre a qualidade da pessoa que necessita de alimentos - maior, menor, capaz, incapaz, cônjuge, filho, neto -, mas, tão somente, se o débito é atual ou pretérito, até porque o que se mostra decisivo é a real necessidade do alimentado, mesmo que se trate de ex-consorte. 6. Não é possível, em regra, a discussão sobre à necessidade ou não dos alimentos devidos no âmbito da execução, procedimento que deve ser extremamente célere e cujo escopo de sua deflagração é justamente a indispensabilidade de tais alimentos. 7. Na hipótese, como a execução ocorreu pelo rito da coação pessoal, considerando as prestações vencidas no trimestre anterior ao ajuizamento da execução e as vincendas no curso do processo, ainda que tenha se alongado no tempo, continuará a execução devendo ser tida como de débitos atuais.

8. Ordem de habeas corpus denegada, com revogação da liminar.

(HC 413.344/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 19/04/2018, DJe 07/06/2018)

 

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JURISPRUDÊNCIA NA ÍNTEGRA

HABEAS CORPUS Nº 413.344 - SP (2017⁄0210608-1)
IMPETRANTE : JAIR CASSIMIRO DE OLIVEIRA
ADVOGADOS : JAIR CASSIMIRO DE OLIVEIRA  - SP065196
    THIAGO SERVILHA E OUTRO(S) - SP327165
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE  : L G C R (PRESO)
 
RELATÓRIO
 

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

 

1. S. I. A. R. ajuizou, na origem, ação de divórcio cumulada com pedido de alimentos provisórios e partilha de bens em face de L. G. C. R., tendo a sentença decretado o divórcio e condenado o réu a pagar à autora alimentos no valor de R$ 2.500,00 por mês (fls. 192-198).

Na oportunidade, para a definição do valor, o magistrado sentenciante destacou que:

Cumpre salientar, entretanto, que a obrigação alimentar somente terá lugar quando comprovada a real necessidade do alimentando, não podendo se transformar em meio de vida ou estímulo à ociosidade ou à falta de compromisso em buscar o sustento por intermédio do próprio esforço.
No caso em questão, conforme se verifica da certidão de casamento das partes, a autora tinha 18 anos de idade quando do enlace matrimonial.
Consoante CTPS juntada a fls. 175 pelo próprio réu, a autora somente trabalhou de 1992 a 1998, na função de merendeira na Prefeitura Municipal de Tietê, somente tendo retornado ao labor em janeiro de 2013, como secretária, ficando no escritório do réu até junho de 2014.
Tem-se, dessa forma, que durante grande parte do casamento a autora não trabalhou, o que se coaduna com as suas alegações da inicial, de que deixou de trabalhar para cuidar da família e dos filhos. Não há comprovantes de qualificação profissional da autora.
Quanto ao trabalho na empresa do réu, a partir de janeiro de 2013, verifica-se que o retorno ao labor se deu no fim do período de convivência conjugal, tendo em vista o ajuizamento dessa ação em abril de 2015.
Não foram juntados aos autos comprovantes de renda da autora durante o período em que estava casada e não trabalhou, bem como comprovante de eventual fonte de renda após a separação de fato. O próprio réu afirma que era o responsável pelas despesas da casa e da família, o que era feito por meio dos gastos nos cartões de crédito em seu nome.
Ainda, a autora tem problemas de saúde, principalmente psiquiátricos, o que se verifica das prescrições médicas juntadas a fls. 23 e 791⁄792.
Considerando que, quando do ajuizamento da ação, a autora tinha 50 anos de idade, baixa capacitação profissional e problemas de saúde, tem-se que dificilmente conseguirá trabalho formal, não tendo ela também tempo de contribuição suficiente para a concessão da aposentadoria em seu favor.
Assim, sem entrar no âmbito de eventual submissão da autora ao réu durante o casamento, diante da situação que ora se apresenta, qual seja, a dependência financeira integral da autora em relação ao réu, durante todo o período de matrimônio, de cerca de 32 anos, justo que o requerido, em razão da separação do casal, auxilie sua ex-cônjuge com o mínimo necessário à subsistência dela.
[...]
Para a fixação do valor da pensão, tem-se que a autora não juntou documentos a comprovar seus gastos regulares, com moradia, saúde e alimentação. Trata-se de seu ônus probatório que não foi cumprido a contento, de forma que não há como se considerar em seu orçamento doméstico gasto extraordinários além dos usuais para uma pessoa de sua idade.
Por outro lado, em relação ao réu, há a declaração de ajuste anual de imposto de renda dele, bem como os valores movimentados nas conta-correntes e cartões de crédito em seu nome.
Considerando os elementos probatórios constantes dos autos, entendo que a quantia de R$ 2.500,00 mensais se mostra proporcional e suficiente para a autora garantir sua subsistência básica.
(fls. 192-198)
 
 

Posteriormente, já em sede de execução dos alimentos, o devedor, ora paciente, foi devidamente intimado a pagar o débito de R$ 63.988,21, em três dias, sob pena de prisão, tendo impugnado a pretensão, sem, contudo, apresentar o valor que entendia devido.

Em razão disso, o Juízo executório, apesar de reconhecer a existência de depósitos parciais (insuficientes), bem como "o alto grau de litigiosidade que envolve requerente e requerido" e "a resistência do executado em dar cumprimento às determinações judiciais", concluiu que, em "restando incontroverso que a pensão alimentícia destinada à exequente não foi integralmente paga, solução outra não resta senão decretar a prisão do devedor contumaz. Com isso, rejeito as justificativas apresentadas e decreto a prisão de L. G. C. R., pelo prazo de 2 meses, nos termos do artigo 528, §3º, do Código de Processo Civil, ou até o pagamento do valor devido. Determino o protesto do pronunciamento judicial" (fls. 26-27).

Interposto agravo de instrumento, o Desembargador Relator concedeu "em parte a antecipação da tutela recursal, apenas e tão-somente para, desde já, reduzir o prazo do decreto prisional para trinta (30) dias" (fls. 13-14).

Contra esSa decisão, Jair Cassimiro de Oliveira impetra o presente habeas corpus em favor de L. G. C. R., apontando como autoridade coatora o Desembargador da 3ª Câmara de Direito Privado do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Egídio Giacoia.

Alega que "a dívida que ensejou a prisão civil do Paciente não atende aos critérios de atualidade do débito", nos termos da Súm 309 do STJ, já que o débito remonta há dois anos (desde Dez⁄2015), perdendo o caráter de emergencialidade dos alimentos.

Salienta que o valor é ilíquido, haja vista ter ocorrido o pagamento parcial do débito, "chegando até agora num total de R$ 15.109,20 (quinze mil, cento e nove reais e vinte centavos)".

Afirma que "a credora tem o mesmo grau de instrução do devedor (doc. 7 e 8), mesma idade, goza de boa saúde e sua situação financeira permite estabilidade sem necessitar da vultuosa pensão", tendo colado grau no mesmo curso e na mesma universidade do paciente.

Assevera que a alimentante, sua ex-mulher, para a obtenção da pensão alimentícia em valores tão vultosos, valeu-se indevidamente do menor G. dos S. como álibi para pleitear verba alimentar para ela e para o menor, sendo que, posteriormente, depois de obter os alimentos vindicados, abdicou da guarda do menor (apesar de ele ser sobrinho da alimentada).

Aduz que "não pode pensionar eternamente a credora", não tendo condições financeiras de pagar o valor devido, já que a empresa da qual era sócio foi encerrada desde out⁄2016, ocupando, atualmente, o cargo de auxiliar administrativo, recebendo R$ 1.000,00 por mês, verba voltada a custear diversas outras despesas.  Aliás, "sua reduzida capacidade econômica já foi reconhecida pelo E. Tribunal de Justiça Bandeirante quando deferiu ao Paciente os benefícios da Justiça Gratuita (doc. 27; e doc. 26: extratos bancários acostados no referido Agravo de Instrumento)".

Salienta que, apesar de ter tentado, diversas vezes, entabular acordo com a credora, ela vem-se furtando de qualquer tipo de negociação. Por outro lado, "o Paciente está impedido de realizar empréstimos bancários, uma vez que seu nome está negativado, pois, como dito, várias pessoas dependem dele – inclusive a sadia ex-esposa".

Requer, assim, "que ao menos a dívida alimentar seja em relação às três últimas parcelas, devendo as demais serem executadas pelo rito da penhora".

Liminar deferida pela Quarta Turma às fls. 143-150, nos termos da seguinte ementa:

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL CIVIL. ALIMENTOS DEVIDOS A EX-CÔNJUGE. INADIMPLEMENTO. PRISÃO CIVIL. RECENTE POSICIONAMENTO DA TERCEIRA TURMA DO STJ. LIMINAR CONCEDIDA.
1. A Terceira Turma do STJ, no julgamento do HC 392.521⁄SP (Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 01⁄08⁄2017), adotou novo posicionamento no sentido de que "quando o credor de débito alimentar for maior e capaz, e a dívida se prolongar no tempo, atingindo altos valores, exigir o pagamento de todo o montante, sob pena de prisão civil, é excesso gravoso que refoge aos estreitos e justificados objetivos da prisão civil por dívida alimentar, para desbordar e se transmudar em sanção por inadimplemento", concluindo, em razão disso, que a restrição civil só deve ocorrer pelo "inadimplemento das três últimas parcelas do débito alimentar".
2. Na hipótese, trata-se de alimentos devidos à ex-cônjuge e que alcançam montantes elevados. Assim, diante das circunstâncias fáticas do presente caso e em razão dos substanciosos fundamentos exarados no referido precedente, vislumbra-se, a priori, a desnecessidade da coação civil extrema, porquanto, em juízo perfunctório, não se consubstanciaria o necessário risco alimentar da credora, elemento indissociável da prisão civil.
3. Liminar em habeas corpus deferida.
 

Informações prestadas pela autoridade coatora às fls. 170-176.

Instado a se manifestar, o Parquet opinou pela concessão da ordem:

HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PRISÃO CIVIL. ALIMENTOS DEVIDOS A EX-CÔNJUGE INADIMPLEMENTO JUSTIFICADO. ANÁLISE DO CASO CONCRETO. LIMINAR DEFERIDA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM DISSONÂNCIA COM ATUAL ENTENDIMENTO DA TERCEIRA TURMA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PARECER PELA CONCESSÃO DA ORDEM.
(fls. 179-184)
 

Sobreveio a petição do impetrante às fls. 186-199, afirmando que "o Paciente não tem como pagar sequer as 03 (três) últimas parcelas vencidas da prestação alimentar, sob pena de prejuízo de sustento seu e da família".

É o relatório.

 
HABEAS CORPUS Nº 413.344 - SP (2017⁄0210608-1)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
IMPETRANTE : JAIR CASSIMIRO DE OLIVEIRA
ADVOGADOS : JAIR CASSIMIRO DE OLIVEIRA  - SP065196
    THIAGO SERVILHA E OUTRO(S) - SP327165
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE  : L G C R (PRESO)
EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. HABEAS CORPUS. ALIMENTOS DEVIDOS À EX-CÔNJUGE. INADIMPLEMENTO DAS PRESTAÇÕES ALIMENTARES REFERENTES AOS TRÊS MESES ANTERIORES AO AJUIZAMENTO E ÀS VINCENDAS. PRISÃO CIVIL. POSSIBILIDADE. NCPC, ART. 528, § 3°, 911 E SÚM 309 DO STJ.

1. A jurisprudência do STJ, há tempos, se pacificou no sentido de que "o débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo" (Súm 309 do STJ). Entendimento que acabou sendo consagrado pelo novo Código de Processo Civil, na dicção de seus arts. 528, § 7º, e 911, caput.

2. O alimento devido entre cônjuges, decorrentes de obrigação na linha horizontal, tem como fundamento o princípio da solidariedade social e familiar (CF, art. 3°, I) e, mesmo que transitórios, uma vez fixados pelo magistrado, depois da comprovação de sua necessidade, devem ser tidos, ao menos durante esse período, como indispensáveis à sobrevivência humana.

3. Na execução de alimentos devidos entre cônjuges - mesmo quando estipulados na forma transitória - incide, de forma plena, a técnica executiva da coação prisional quando a verba alimentar se enquadrar na tipicidade normativa das 3 (três) prestações anteriores ao seu ajuizamento e das que se vencerem no curso do processo, já que se trata de alimentos legítimos e necessários.

4. A restrição da execução aos valores das últimas três parcelas atrairia o efeito deletério de obrigar o credor alimentar a ajuizar várias execuções paralelas pelo rito prisional, acarretando, inevitavelmente, a acumulação de prazos de prisão decretados em diversos processos distintos.

5. A lei não faz distinção, para fins de prisão, entre a qualidade da pessoa que necessita de alimentos - maior, menor, capaz, incapaz, cônjuge, filho, neto -, mas, tão somente, se o débito é atual ou pretérito, até porque o que se mostra decisivo é a real necessidade do alimentado, mesmo que se trate de ex-consorte.

6. Não é possível, em regra, a discussão sobre à necessidade ou não dos alimentos devidos no âmbito da execução, procedimento que deve ser extremamente célere e cujo escopo de sua deflagração é justamente a indispensabilidade de tais alimentos.

7. Na hipótese, como a execução ocorreu pelo rito da coação pessoal, considerando as prestações vencidas no trimestre anterior ao ajuizamento da execução e as vincendas no curso do processo, ainda que tenha se alongado no tempo, continuará a execução devendo ser tida como de débitos atuais.

8. Ordem de habeas corpus denegada, com revogação da liminar.

 
 
VOTO
 

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

 

2. É sabido, como regra, que, de acordo com o entendimento pacífico desta Corte e com a Súmula n. 691 do Supremo Tribunal Federal, não cabe habeas corpus contra decisão que denega a liminar em outro habeas corpus, sob pena de indevida supressão de instância, salvo excepcionalíssima hipótese de ilegalidade manifesta ou abuso de poder. Entendimento que é "aplicável, mutatis mutandis, aos casos em que o writ ataca decisão estadual indeferitória de  efeito suspensivo a agravo de instrumento" (HC 163.172⁄SP, Rel. Ministro Paulo Furtado (Desembargador Convocado do TJ⁄BA), Terceira Turma, julgado em 11⁄05⁄2010, DJe 21⁄05⁄2010).

No entanto, na hipótese, pareceu prudente conhecer do remédio heróico, pois que o ato judicial impugnado mostrava-se, em juízo perfunctório, contendo aparente ilegalidade, causando dano de difícil reparação ao paciente, já que existia decreto prisional expedido e, em tese, estaria contrariando a recente jurisprudência da Terceira Turma (HC n° 392.521⁄SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, DJe 01⁄08⁄2017). De fato, nesse precedente, em linha de princípio, restringiu-se, no tocante aos alimentos devidos a ex-cônjuge, a possibilidade de prisão civil do alimentante ao inadimplemento apenas das três últimas parcelas da pensão alimentícia, independentemente do montante das parcelas vencidas no decorrer do processo.

Na oportunidade, destaquei em meu voto que, "com o resguardo de possível divergência do posicionamento exarado pela Terceira Turma no HC 392.521⁄SP, diante da excepcionalidade na adoção da medida de prisão pelo rito do art. 733 do CPC, em juízo perfunctório, concedo a liminar para determinar a expedição de salvo-conduto em favor do paciente até o julgamento do mérito do presente writ" (fl. 150).

3. Nesse contexto, a questão controvertida está em definir se a regra que autoriza a prisão civil do alimentante pelo inadimplemento das prestações alimentares referentes aos três meses anteriores ao ajuizamento e às vincendas (NCPC, art. 528, § 3°, 911 e da Súm 309 do STJ) pode ser limitada - em se tratando de alimentos devidos na relação entre ex-cônjuges - a apenas as três últimas parcelas da pensão alimentícia.

O Desembargador relator manteve o decreto prisional, apenas reduzindo  seu prazo para trinta (30) dias:

1. Trata-se de agravo de instrumento interposto contra r. decisão digitalizada a fls. 62⁄63 (fls. 514⁄515 dos autos principais) que, nos autos de ação de execução de alimentos proposta por S. I. A. R. em face de L. G. C. R., decretou a prisão do executado, pelo prazo de 2 meses, nos termos do artigo 528, § 3.º, do Código de Processo Civil, ou até o pagamento do valor devido, determinando o protesto do pronunciamento judicial, bem como a vista ao Ministério Público a fim de que possa ser apurado eventual crime de abandono material, nos termos do artigo 532 do Código de Processo Civil.
2. Insurge-se contra a decisão o executado, aduzindo, em síntese, a necessidade de remessa dos autos à Contadoria. Afirma que pretende entabular acordo com a agravada, de modo que o pedido de designação de audiência de conciliação não poderia ser indeferido. Aponta iliquidez do débito, uma vez que há depósitos judiciais no valor total de R$ 15.109,20. Alega incapacidade financeira para adimplir a obrigação alimentícia e desnecessidade da agravada em receber os alimentos, certo, ainda que sustenta várias pessoas da família. Sustenta que há outros meios de satisfazer o débito alimentar, como a expropriação de bens. Defende que foram propostas duas execuções indicando os mesmos meses de inadimplemento. Pondera inexistir crime de abandono material.
Ante o exposto, requer a concessão de efeito suspensivo ao recurso para o fim de determinar a imediata expedição de contramandado de prisão, e, ao final, pugna pelo provimento do recurso.
Recurso tempestivo.
3. Com reservas de início de cognição, além das pertinentes colocações do MM. Juiz a quo na r. decisão agravada, acrescenta-se que os depósitos judiciais mencionados pelo agravante já foram contabilizados no cálculo elaborado pela exequente (fls. 462⁄463 dos autos principais). Ademais, após a decisão proferida no Agravo de Instrumento, processo n.º 2163110-88.2016.8.26.0000 (fls. 430⁄433), a quantia depositada é ínfima. Assim, concedo em parte a antecipação da tutela recursal, apenas e tão-somente para, desde já, reduzir o prazo do decreto prisional para trinta (30) dias. Para esta finalidade, oficie-se à origem para as adequações que se fizerem necessárias.
Comunique-se, via e-mail, ao MM. Juízo "a quo".
4. Intime-se a agravada para, querendo, oferecer resposta ao recurso, no prazo legal.
5. Após, à douta Procuradoria Geral de Justiça para manifestação.
6. Adota-se a forma virtual para o julgamento do(s) presente(s) recurso(s). Ficam as partes intimadas quanto ao disposto no art. 1º da Resolução 549⁄2011, TJSP. Int.
(fls. 13-14)
 

4. Nesse passo, como é sabido, o habeas corpus é remédio vocacionado à tutela da liberdade de locomoção, com previsão constitucional, sendo de utilização excepcional, em hipóteses de manifesta ilegalidade ou abuso no decreto prisional.

O art. 5°, LXVII, da Carta da República estabelece que "não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel".

De fato, percebe-se claramente que o escopo da norma foi proibir a prisão civil por dívida, admitindo-a, tão somente, se presentes as exceções ressalvadas pela Carta Magna, como sói acontecer com a dívida voluntária e indesculpável de alimentos.

Buscando conferir efetividade à tutela jurisdicional, foi instituído, por força do art. 19 da Lei n. 5.478⁄1968, do art. 733 do CPC⁄1973 e agora dos arts. 528 e 911 do NCPC, meio executório de coerção pessoal, com possibilidade de restrição à liberdade individual do devedor de alimentos, de caráter excepcional.

Realmente, o novo diploma processual manteve, com alguns avanços e peculiaridades, a possibilidade de prisão do devedor de alimentos "pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses", caso não pague ou não venha a ter sua justificativa aceita, além de ter seu nome protestado (art. 528, § 3°, do CPC), determinando, ainda, que "o cumprimento da pena não exime o executado do pagamento das prestações vencidas e vincendas" (§ 5°).

Por outro lado, no tocante aos cônjuges, tem esta Corte reconhecido que os alimentos devem se dar, em regra, de forma "transitória", ou seja, os alimentos transitórios (que não se confundem com os alimentos provisórios) têm por objetivo estabelecer um marco final para que o alimentando não permaneça em eterno estado de dependência do ex-cônjuge ou ex-companheiro, isso quando lhe é possível assumir sua própria vida de modo autônomo.

Em percuciente artigo sobre o tema, o Ministro Marco Buzzi leciona que:

Partindo do pressuposto de que o direito deve eliminar não só condutas de má-fé, mas também de desequilíbrio entre as partes e de enriquecimento sem causa, os alimentos transitórios surgem para celebrar os princípios da igualdade e razoabilidade, bem como para fazer cessar o abuso de direito dos ex-cônjuges⁄companheiros que se valem do direito a alimentos para perpetuar uma posição de conforto, atualmente não mais admissível, por meio do recebimento de créditos sem que haja a real necessidade, preterindo a efetiva busca para prover seu próprio sustento.
[...]
Assim, acredita-se que, ao fixar alimentos de forma transitória a bem do alimentado, pode ele não só reorganizar a sua vida financeira, mas procurar formas de sustento próprio de forma digna, resgatando sua autonomia e independência, evitando-se assim tornar regra o pensionamento de forma vitalícia, de modo a evitar condutas ociosas e de parasitose (BUZZI, 2003, p. 168), como se concluiu na tese defendida Alimentos transitórios, de 2003, deste subscritor.
Por outro lado, a fixação de alimentos a tempo certo imuniza o devedor por eventual abuso de direito por parte do demandante e, também, o isenta de sacrificar o seu próprio sustento para cumprir a obrigação alimentícia, uma vez que ela só pode ser fixada se o alimentante possuir condições de honrá-la.
Esse instituto funda-se na ideia do equilíbrio e justiça no âmbito das relações conjugais garantindo e tutelando de forma justa os direitos decorrentes de sua ruptura.
Portanto, como a obrigação alimentícia baseia-se nos valores ditados pela ética e pela moral, não se pode afastar a aplicação desses valores no sentido de se exigir providências concretas daquele que possui condições para prover o seu sustento, daí a fixação de um dado prazo para que sejam arregimentadas habilidades para tanto, cessando o provimento exterior e um lapso compatível com as circunstâncias do caso, somente não se adotando tal solução quando o alimentando não reunir condições para promover sua própria subsistência.
(Alimentos Transitórios: uma obrigação por tempo certo In Direito civil: diálogos entre a doutrina e a jurisprudência. Coords. Luis Felipe Salomão e Flávio Tartude. São Paulo: Atlas, 2018, p. 670-671).

 

Realmente, "entre ex-cônjuges ou ex-companheiros, desfeitos os laços afetivos e familiares, a obrigação de pagar alimentos é excepcional, de modo que, quando devidos, ostentam, ordinariamente, caráter assistencial e transitório, persistindo apenas pelo prazo necessário e suficiente ao soerguimento do alimentado, com sua reinserção no mercado de trabalho ou, de outra forma, com seu autossustento e autonomia financeira" (REsp 1.454.263⁄CE, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 16⁄04⁄2015, DJe 08⁄05⁄2015).

Importante frisar, ainda, que "a obrigação de prestar alimentos transitórios - a tempo certo - é cabível, em regra, quando o alimentando é pessoa com idade, condições e formação profissional compatíveis com uma provável inserção no mercado de trabalho, necessitando dos alimentos apenas até que atinja sua autonomia financeira, momento em que se emancipará da tutela do alimentante - outrora provedor do lar -, que será então liberado da obrigação, a qual se extinguirá automaticamente" (REsp 1.362.113⁄MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 18⁄02⁄2014, DJe 06⁄03⁄2014).

Trata-se da atual jurisprudência do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. SEPARAÇÃO JUDICIAL. PENSÃO ALIMENTÍCIA. BINÔMIO NECESSIDADE⁄POSSIBILIDADE. ART. 1.694 DO CC⁄2002. TERMO FINAL. ALIMENTOS COMPENSATÓRIOS (PRESTAÇÃO COMPENSATÓRIA). POSSIBILIDADE. EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DOS CÔNJUGES. JULGAMENTO EXTRA PETITA NÃO CONFIGURADO.  VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO DEMONSTRADA.
(...)
5. Os chamados alimentos compensatórios, ou prestação compensatória, não têm por finalidade suprir as necessidades de subsistência do credor, tal como ocorre com a pensão alimentícia regulada pelo art. 1.694 do CC⁄2002, senão corrigir ou atenuar grave desequilíbrio econômico-financeiro ou abrupta alteração do padrão de vida do cônjuge desprovido de bens e de meação.
6. Os alimentos devidos entre ex-cônjuges devem, em regra, ser fixados com termo certo, assegurando-se ao alimentando tempo hábil para sua inserção, recolocação ou progressão no mercado de trabalho, que lhe possibilite manter, pelas próprias forças, o status social similar ao período do relacionamento.
7. O Tribunal estadual, com fundamento em ampla cognição fático-probatória, assentou que a recorrida, nada obstante ser pessoa jovem e com instrução de nível superior, não possui plenas condições de imediata inserção no mercado de trabalho, além de o rompimento do vínculo conjugal ter-lhe ocasionado nítido desequilíbrio econômico-financeiro.
8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, parcialmente provido para fixar o termo final da obrigação alimentar.
(REsp 1290313⁄AL, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 12⁄11⁄2013, DJe 07⁄11⁄2014).
_______________________
RECURSO ESPECIAL - AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS E RECONVENÇÃO - NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL - NÃO-OCORRÊNCIA, NA ESPÉCIE - JULGAMENTO EXTRA PETITA - AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL TIDO POR VIOLADO - INCIDÊNCIA ANALÓGICA DO ENUNCIADO N. 284 DA SÚMULA⁄STF - OBRIGAÇÃO ALIMENTÍCIA - CARÁTER TRANSITÓRIO - ADMISSIBILIDADE - PRECEDENTES - HIPÓTESE APLICÁVEL AO CASO DOS AUTOS - RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
(...)
III - Admite-se o caráter transitório conferido à obrigação alimentícia, porquanto a fixação de alimentos por tempo determinado, dependente da análise do caso concreto, constitui instrumento de motivação para que o alimentando procure meios próprios de subsistência, para que não permaneça, por tempo indeterminado, em ociosidade, a depender do conforto material propiciado pelos alimentos que lhe são prestados pelo ex-cônjuge, sendo esta a hipótese dos autos;
IV - Recurso especial improvido.
(REsp 1112391⁄SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p⁄ Acórdão Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 07⁄04⁄2011, DJe 23⁄05⁄2011).

 

Apesar disso, tanto a doutrina como a jurisprudência reconhecem a necessidade de se estabelecer exceções à transitoriedade alimentar, permitindo sua concessão de forma perene, por tempo incerto, a ser aferida no caso concreto, em situações como: impossibilidade de ingresso ou retorno no mercado de trabalho; incapacidade laboral permanente, frágil estado de saúde do alimentado; e idade avançada.

De fato, destaca Rolf Madaleno que:

Acaso entenda o julgador persista o direito de receber alimentos em determinados casos, estes devem ser apenas naquelas hipóteses de incapacidade do alimentado, por razões humanitárias e dirigidas somente aos que realmente não podem nem têm alguma vocação para o trabalho [...] quando a pessoa não tem esse potencial, porquanto o ex-parceiro alimentado não dispõe de reais condições de reinserção no mercado de trabalho e de assim adquirir sua autonomia financeira, então, nesse caso, a lei civil já preve implicitamente essa possibilidade de os alimentos serem prestados por tempo incerto, eis que também não se trata de evento futuro e incerto, mas, pelo contrário, se trata de evento futuro e desde logo absolutamente certo, de que o alimentando não guarda um potencial de independência financeira
(Alimentos entre cônjuges in Direito civil: diálogos entre a doutrina e a jurisprudência. Coord. Luis Felipe Salomão e Flávio Tartude. São Paulo: Atlas, 2018, p. 639-640)

 

Nesse sentido:

RECURSO ESPECIAL - DIREITO CIVIL - FAMÍLIA - AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS - PENSIONAMENTO ENTRE EX-CÔNJUGES - EXCEPCIONALIDADE - CARÁTER TEMPORÁRIO - CAPACIDADE LABORATIVA E INSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO DA EX-CONSORTE - EXONERAÇÃO - POSSIBILIDADE - PROVIMENTO DO APELO EXTREMO.
Hipótese: Trata-se de ação de exoneração de alimentos julgada parcialmente procedente pelas instâncias ordinárias para exonerar o autor de prestar alimentos aos filhos, mantendo o dever em relação à ex-esposa.
1. Esta Corte firmou a orientação no sentido de que a pensão entre ex-cônjuges não está limitada somente à prova da alteração do binômio necessidade-possibilidade, devendo ser consideradas outras circunstâncias, como a capacidade do alimentando para o trabalho e o tempo decorrido entre o início da prestação alimentícia e a data do pedido de exoneração. Precedentes.
2. A pensão entre ex-cônjuges deve ser fixada, em regra, com termo certo, assegurando ao beneficiário tempo hábil para que seja inserido no mercado de trabalho, possibilitando-lhe a manutenção pelos próprios meios. perpetuidade do pensionamento só se justifica em excepcionais situações, como a incapacidade laboral permanente, saúde fragilizada ou impossibilidade prática de inserção no mercado de trabalho, que evidentemente não é o caso dos autos. Precedentes.
3. A ausência de alteração nas condições financeiras dos envolvidos, por si só, não afasta a possibilidade de desoneração dos alimentos prestados à ex-cônjuge. Precedentes.
4. No caso em apreço, não se evidencia hipótese a justificar a perenidade da prestação alimentícia e excetuar a regra da temporalidade do pensionamento devido aos ex-cônjuges, merecendo procedência o recurso, em razão do lapso de tempo decorrido desde o início da prestação alimentar até o pedido de exoneração.
5. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 1370778⁄MG, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 10⁄03⁄2016, DJe 04⁄04⁄2016)
______________________
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ALIMENTOS. EXONERAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE ALTERAÇÃO NO BINÔMIO NECESSIDADE⁄POSSIBILIDADE.
1- Os alimentos devidos entre ex-cônjuges serão fixados com termo certo, a depender das circunstâncias fáticas próprias da hipótese sob discussão, assegurando-se, ao alimentado, tempo hábil para sua inserção, recolocação ou progressão no mercado de trabalho, que lhe possibilite manter pelas próprias forças, status social similiar ao período do relacionamento
2 - Serão, no entanto, perenes, nas excepcionais circunstâncias de incapacidade laboral permanente ou, ainda, quando se constatar, a impossibilidade prática de inserção no mercado de trabalho.
3 - Em qualquer uma das hipóteses, sujeitam-se os alimentos à cláusula rebus sic stantibus, podendo os valores serem alterados quando houver variação no binômio necessidade⁄possibilidade.
4 - Se os alimentos devidos a ex-cônjuge não forem fixados por termo certo, o pedido de desoneração total, ou parcial, poderá dispensar a existência de variação no binômio necessidade⁄possibilidade, quando demonstrado o pagamento de pensão por lapso temporal suficiente para que o alimentado revertesse a condição desfavorável que detinha, no momento da fixação desses alimentos.
5 - Recurso especial provido.
(REsp 1205408⁄RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 21⁄06⁄2011, DJe 29⁄06⁄2011)
 

Apenas para registro, destaco que esta Corte Superior, recentemente, reconheceu a possibilidade da referida pretensão alimentar, inclusive, em relação homoafetiva rompida (REsp 1.302.467⁄SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 03⁄03⁄2015, DJe 25⁄03⁄2015).

5. No tocante a execução de alimentos sob o rito da prisão, destaca-se que a jurisprudência do STJ, há tempos, se pacificou no sentido de que "o débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo" (Súm 309 do STJ).

Entendimento, aliás, expressamente encampado pelo Novo Código de Processo Civil, na dicção do seu art. 528, § 7º, e 911, caput:

Art. 528, § 7º O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende até as 3 (três) prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.
 
Art. 911.  Na execução fundada em título executivo extrajudicial que contenha obrigação alimentar, o juiz mandará citar o executado para, em 3 (três) dias, efetuar o pagamento das parcelas anteriores ao início da execução e das que se vencerem no seu curso, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de fazê-lo.
Parágrafo único.  Aplicam-se, no que couber, os §§ 2° a 7° do art. 528.
 

No ponto, importante frisar que o STF vem, reiteradamente, reconhecendo a possibilidade dessa forma de prisão:

HABEAS CORPUS. DEVEDOR DE ALIMENTOS. PRISÃO CIVIL. DECRETO. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA. POSSIBILIDADE DE UNIFICAÇÃO DAS EXECUÇÕES NUMA ÚNICA ORDEM DE PRISÃO. SÚMULA 309 DO STJ. ALEGAÇÃO DE INCAPACIDADE ECONÔMICA PARA O CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. ORDEM DENEGADA.
I – Consoante dispõe o art. 733, § 1º, do Código de Processo Civil, se o devedor de alimentos, intimado para efetuar o pagamento, não o faz nem justifica a impossibilidade de fazê-lo, o juiz poderá decretar sua prisão pelo prazo de 1 a 3 meses, tal como ocorreu. Não há, nesse ato, qualquer ilegalidade ou abuso de poder que justifique a concessão da ordem.
II – É correto o procedimento que unifica as execuções numa única ordem de prisão, por força do que dispõe o enunciado da Súmula 309 do STJ, segundo o qual “O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo”.
III – A análise da suposta incapacidade econômica do executado ou do alegado cerceamento de defesa não tem lugar em habeas corpus, por demandar aprofundado exame dos fatos e provas da causa, providência sabidamente inviável nesta via. Precedente. IV – Ordem denegada.
(HC 112254, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 04⁄12⁄2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-246 DIVULG 14-12-2012 PUBLIC 17-12-2012)
___________________
HABEAS CORPUS. SONEGAÇÃO DE ALIMENTOS. PRISÃO CIVIL.
Prisão civil decretada não pelo inadimplemento do acordado na ação de execução de alimentos, mas por falta de pagamento das últimas 3 (três) parcelas em atraso. Decisão que se ajusta à jurisprudência desta Corte. Ordem denegada.
(HC 93501, Relator(a): Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 23⁄09⁄2008, DJe-241 DIVULG 18-12-2008 PUBLIC 19-12-2008 EMENT VOL-02346-04 PP-01046)

 

O intuito da norma foi o de evitar a coação do devedor de alimentos, por meio da privação de sua liberdade, a pagar dívidas pretéritas que, pelo decurso do tempo, acabaram perdendo a urgência e a essencialidade e, ao mesmo tempo, evitar tanto o prosseguimento de várias execuções de forma paralela pelo rito prisional, como a cumulação de tempo de prisão estabelecido em diversos e sucessivos decretos prisionais.

Nesse sentido:

Habeas corpus. Diversas execuções de alimentos. Decretada prisão do devedor. Cumulação de prazo de prisão. Impossibilidade. Renovação do decreto prisional. Cabimento.
- Em execução de alimentos proposta pelo procedimento descrito no art. 733 do CPC, o decreto prisional expedido contra o devedor abrange todas as prestações alimentícias que se vencerem, no curso do processo, até o cumprimento do prazo de prisão estabelecido no decreto.
- Propostas sucessivas execuções de alimentos, todas pelo procedimento do art. 733 do CPC, mostra-se inviável o cumprimento cumulativo dos decretos prisionais, expedidos em cada um dos processos, pois, nesta hipótese, estaria configurado bis in idemconsiderando que as prestações que se vencerem no curso da primeira execução e, portanto, abrangidas pelo primeiro decreto prisional serão, justamente, o objeto das execuções posteriores.
- O cumprimento cumulativo dos decretos prisionais expedidos em processo distintos frustra a finalidade da prisão que deve ser decretada, excepcionalmente, apenas como meio de coagir o devedor a adimplir o débito alimentar e não como mecanismo de punição pelo não pagamento.
- No entanto, nosso ordenamento jurídico não veda a possibilidade de o juiz, renovar, no mesmo processo de execução de alimentos, o decreto prisional, após analisar a conveniência e oportunidade e, principalmente, após levar em conta a finalidade coercitiva da prisão civil do alimentante.
(HC 39.902⁄MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 18⁄04⁄2006, DJ 29⁄05⁄2006, p. 226)

 

6. Analisando a questão posta no writ, saliento que, em recente precedente (HC 392.521⁄SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, DJe 01⁄08⁄2017), a 3ª Turma deste STJ acabou por afastar, na específica relação dos alimentos devidos a ex-cônjuge (maiores e capazes), o consagrado entendimento propalado na Súm 309 do STJ e nos arts. 528, § 7°, e 911, caput, do NCPC e, em razão disso, tem-se constatado um incremento no número de habeas corpus com tal fundamento.

O acórdão foi assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL. HABEAS CORPUSALIMENTOS DEVIDOS A EX-CÔNJUGE. INADIMPLEMENTO. PRISÃO CIVIL. POSSIBILIDADE.
O texto constitucional e os comandos infraconstitucionais que lhe detalham, somente admitem a prisão civil de devedor de alimentos quando o inadimplemento colocar em risco a própria vida do credor-alimentado. A prisão civil por dívida de alimentos não está atrelada a uma possível punição por inadimplemento, ou mesmo à forma de remição da dívida alimentar, mas tem como primário, ou mesmo único escopo, coagir o devedor a pagar o quanto deve ao alimentado, preservando, assim a sobrevida deste, ou em termos menos drásticos, a qualidade de vida do alimentado.
Se não há risco iminente à vida do credor de alimentos, ou mesmo, se ele pode, por meio de seu esforço próprio, afastar esse risco, não se pode aplicar a restrita e excepcional opção constitucional, porque não mais se discute a sublimação da dignidade da pessoa humana, em face da preponderância do direito à vida.
Seguindo a linha desse entendimento, a prisão civil só se justifica se: i) for indispensável à consecução dos alimentos inadimplidos; ii) atingir o objetivo teleológico perseguido pela prisão civil - garantir, pela coação extrema da prisão do devedor, a sobrevida do alimentado - e; iii) for a fórmula que espelhe a máxima efetividade com a mínima restrição aos direitos do devedor.
Em se tratando de prole menor ou incapaz, a iminência e impossibilidade de superação do risco alimentar é presunção que raramente pode ser desafiada.
No entanto, quando o credor de débito alimentar for maior e capaz, e a dívida se prolongar no tempo, atingido altos valores, exigir o pagamento de todo o montante, sob pena de prisão civil, é excesso gravoso que refoge aos estreitos e justificados objetivos da prisão civil por dívida alimentar, para desbordar e se transmudar em sanção por inadimplemento, patrocinada pelo Estado, mormente na hipótese, quando é sabido que o alimentante tem patrimônio passível de expropriação, fórmula até hoje não cogitada para a satisfação do crédito perseguido.
Ordem concedida para restringir o decreto prisional ao inadimplemento das três últimas parcelas do débito alimentar.
(HC 392.521⁄SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27⁄06⁄2017, DJe 01⁄08⁄2017)

 

De plano, deve-se realçar que, apesar de não haver enfatizado em sua ementa, ao que parece, a construção do entendimento ocorreu para um caso específico, tendo a própria Ministra Relatora realçado, no bojo de seu voto, que se trata de "uma excepcionalidade, ditada pelas circunstâncias específicas aqui ocorridas".

Destaca-se do voto o seguinte:

O propósito do habeas corpus é a suspensão da ordem de prisão do paciente, que aponta, além da falta de atualidade do débito, sua iliquidez por não ter sido abatido, na cobrança deduzida pela exequente, os pagamentos parciais realizados pelo executado.
[...]
05. A prisão civil por dívida de alimentos não está, nesse sentido, atrelada a uma possível punição por inadimplemento, ou mesmo à forma de remição da dívida alimentar, mas tem como primário, ou mesmo único escopo, coagir o devedor a pagar o quanto deve ao alimentado, preservando, assim a sobrevida deste, ou em termos menos drásticos, a qualidade de vida do alimentado.
06. Daí a relevante restrição consolidada pela Súmula 309⁄STJ, que admite a prisão civil apenas àquelas três anteriores ao ajuizamento da execução, pois valores fora desse período, por certo, não dizem mais respeito a um risco potencial de sobrevivência do credor do débito alimentar.
07. Sob esse parâmetro, embora o CPC⁄2015, nos arts. 528 e 911, não distinga a matriz geradora dos alimentos para efeitos de cobrança, ou mesmo para a aplicação da coação extrema da prisão civil, releva evidenciar, para a apreciação deste habeas corpus, que há distinções reais entre os diversos grupos de alimentados, em razão da sua dependência do alimentante.
08. Nessa linha, os alimentos devidos aos filhos menores ou incapazes,  ostentam nível máximo de exigibilidade, sendo o cuidado com a prole, enquanto menor ou incapaz, fruto do amálgama de obrigações biológicas oriundas da reconhecida incapacidade de autossustento, e imposições legais, que vão para além das relações de afeto que usualmente existem entre ascendentes e descendentes, e condicionam os ascendentes a mais que uma simples manutenção física da prole,  abrangendo todo o conjunto de aporte necessário a um desenvolvimento sadio dos filhos (lazer, educação, saúde, vestuário e alimentos – stricto-sensu).
09. Em contraste com esse grupo, os alimentos devidos ao ex-cônjuges e ex-companheiros (art. 1694 do CC), embora também tenha por objetivo satisfazer todas as necessidades de vida, hoje são vistos e fixados, de regra, por período determinado, para que o ex-cônjuge alimentado possa adquirir condições próprias de se auto sustentar, porque não mais se admite, salvo exceções, que vínculos de afeto desfeitos, ainda obriguem alguém a sustentar outra pessoa indefinidamente, apenas porque um dia foram casados ou mantiveram uma união estável.
10. A distinção, por óbvio, reside na capacidade potencial que tem um adulto de garantir sua sobrevida, com o fruto de seu trabalho, circunstância não reproduzida quando se fala de crianças, adolescentes ou incapazes, sendo assim, intuitivo, que a falha na prestação alimentar impacte esses grupos de alimentados, de modo diverso.
11. E aqui reside o ponto que gostaria de evidenciar neste habeas corpus:
12. A prisão civil pode ser aplicada, indistintamente, a todos os devedores de alimentos, e por todo o período da dívida discutida judicialmente (as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e mais as parcelas vincendas)?
13. Palmilhando nesse cenário, com extrema cautela, os caminhos que informam e justificam a prisão civil do devedor de alimentos, cabe ponderar sobre a validade, razoabilidade, e mesmo, constitucionalidade da prisão civil que refoge ao substrato teleológico que informa a exceção preconizada pelo texto constitucional.
14. É certo que o texto constitucional e os comandos infraconstitucionais que lhe detalham, admitem a prisão civil de devedor de alimentos, quando o inadimplemento do devedor de alimentos colocar em risco a própria vida do credor-alimentado (Art. 5º, LXVII, da C.F.; arts. 528 e 911 do CPC⁄2015).
15. O raciocínio subjacente parte, de um lado, da presunção de que o alimentado é totalmente dependente dos alimentos para a sua subsistência, e de outro, de que a dignidade da pessoa humana, que no mais das vezes, preserva o devedor de cobranças aviltantes, como o encarceramento, cede vez à preservação da dignidade do alimentado, igualmente vituperada quando deixa de perceber os alimentos a que tem direito.
16. Em outras palavras, é justificável a vulneração da dignidade da pessoa humana do devedor de alimentos, se a ela se contrapõe a própria vida do credor desses alimentos.
17. A vida é a gênese dos direitos, inclusive da dignidade da pessoa humana, então é razoável a conclusão de que, entre a sobrevida do alimentado e a dignidade do alimentante, dará o Direito, proteção à primeira.
18. É dizer, o risco alimentar do credor de alimentos deve ser iminente e insuperável, de forma digna, pelo alimentado, para que se possa exercer a cobrança via coação máxima da prisão.
19. Volvendo à divisão exemplificativa anteriormente feita entre os destinatários dos alimentos, tenho que, em se tratando de prole menor ou incapaz, a iminência e impossibilidade de superação do risco alimentar é presunção que raramente pode ser desafiada.
20. E essa premência alimentar se protrai no tempo, enquanto perdurar o inadimplemento, porque não apenas a alimentação está englobada no débito alimentar, mas também outras necessidades, igualmente relevantes ao desenvolvimento e formação das crianças e adolescentes, ou manutenção adequada da qualidade de vida dos incapazes.
21. Diversa, porém, é a situação de alimentados maiores e capazes. Para esses, embora se possa ainda admitir a iminência do risco alimentar, esse, em algumas situações, pode ser minorado, ou mesmo superado, de forma digna, com o próprio labor.
22. Note-se, não se está afirmando que os alimentos não podem mais ser cobrados nessa hipótese, mas apenas se avaliando a necessidade de aplicação da prisão civil para coagir o devedor ao pagamento do débito alimentar.
23. Assim, a prisão civil deve ser vista como efetivamente é: uma agressão ao princípio da dignidade da pessoa humana. Princípio que não é absoluto, pois se submete à própria vida do alimentado, mas que deve ser vulnerado apenas em situações limítrofes.
24. Pedro Lenza (Lenza, Pedro – Direito Constitucional esquematizado – 14ª ed. – São Paulo : Saraiva, 2010, pág. 138.) tratando do Princípio da Proporcionalidade ou Razoabilidade, declina a sua aplicabilidade nas situações de colisão entre valores constitucionalizados (in casu, prisão civil X dignidade da pessoa humana) e aponta a necessidade de preenchimento de três elementos para a preponderância de um valor constitucional sobre o outro:
“Necessidade: por alguns denominada a exigibilidade, a adoção da medida que possa restringir direitos só se legitima se indispensável para o caso concreto e não se puder substituí-la por outra menos gravosa;
Adequação: também chamado de pertinência ou idoneidade, quer significar que o meio escolhido deve atingir o objetivo perquirido;
Proporcionalidade em sentido estrito: sendo a medida necessária e adequada, deve-se investigar se o ato praticado, em termo de realização do objetivo pretendido, supera a restrição a outros valores constitucionalizados. Podemos falar em máxima efetividade e mínima restrição”.
25. Seguindo a linha desse entendimento, a prisão civil só se justifica, na hipótese de o alimentado ser maior e capaz se: i) for indispensável à consecução dos alimentos inadimplidos; ii) atingir o objetivo teleológico perseguido pela prisão civil – garantir a sobrevida do alimentado – e; iii) for a fórmula que espelhe a máxima efetividade com a mínima restrição aos direitos do devedor.
26. Assim, v.g., embora seja pacífico o entendimento de que se insere na obrigação dos ascendentes em relação à sua prole, a educação dos filhos (obrigação considerada pela Jurisprudência como limitada à conclusão de um curso superior), é inegável que o descumprimento dessa obrigação não atinge  a própria sobrevida do alimentado, ficando no exemplo dado afastada, por orfandade teleológica, a possibilidade de prisão civil do devedor desses alimentos.
27. Isso porque, se não há risco iminente à vida do credor de alimentos, ou mesmo, se ele pode, por meio de seu esforço próprio, afastar esse risco, não se pode aplicar a restrita opção constitucional, porque não mais se discute a sublimação da dignidade da pessoa humana em face da preponderância do direito à vida.
28. De igual forma, para além do debate que envolve os sub-reptícios estratagemas utilizados pelo devedor de alimentos, é certo que não se pode ter um débito alimentar que alcança a monta de quase R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), e que se acumula por mais de cinco anos, como valor necessário à garantia de sobrevida da alimentada.
29. Exigir o pagamento de todo esse montante, sob pena de prisão civil, é excesso gravoso que refoge aos estreitos e justificados objetivos da prisão civil por dívida alimentar, para desbordar e se transmudar em sanção por inadimplemento, patrocinada pelo Estado, mormente na hipótese, quando é sabido que o alimentante tem patrimônio passível de expropriação, fórmula até hoje não cogitada para a satisfação do crédito perseguido.
30. Impõe-se então, em consonância com o quanto exposto, ajustar a possibilidade de prisão civil, na hipótese, para um lapso temporal, que ao menos teoricamente, possa dizer do risco de sobrevida do alimentado.
31. Repito que esse posicionamento é uma excepcionalidade, ditada pelas circunstâncias específicas aqui ocorridas, que dizem de marchas e contramarchas no curso da execução que teve dois acordos entabulados, cumprimentos parciais e um acúmulo de débito que, por certo não estão sendo cobrados para a mantença imediata da alimentada, razão pela qual, são retirados os pressupostos autorizadores da prisão civil, na hipótese.
Forte nessas razões, CONCEDO a ordem de Habeas Corpus para restringir a possibilidade de prisão civil do alimentante ao inadimplemento das três últimas parcelas da pensão alimentícia, devendo o restante da dívida ser cobrada pelos meios ordinários. 

 

Diante disso, notadamente em razão dos substanciosos fundamentos exarados, claro que, diante de interpretação constitucional da norma, o objetivo teleológico perseguido pela prisão civil deve ser sempre e sempre o de garantir a sobrevida do alimentado.

Realmente, o legislador constituinte, no conflito entre os valores "vida", "dignidade da pessoa humana", "integridade física", "assistência familiar" do alimentando e "liberdade" do alimentante, deu preponderância aos primeiros, ou seja, "o nosso legislador constitucional, entre a sobrevivência e a liberdade individual, curialmente, deu preferência àquele" (GOMES, Luiz Flávio. Prisão civil por dívida alimentar. Revista dos Tribunais. RT 582⁄9, abril,1984).

Com relação ao alimento devido entre cônjuges, decorrente de obrigação na linha horizontal, seu fundamento está no princípio da solidariedade social e familiar (CF, art. 3°, I) e, mesmo que transitórios, uma vez fixados pelo magistrado, depois de devidamente comprovada sua necessidade, devem ser tidos como "indispensáveis", ou seja, estritamente voltados à sobrevivência humana.

7. No entanto, observada a máxima vênia, penso que, na execução de alimentos devidos entre cônjuges - mesmo quando estipulados na forma transitória -, incide, de forma plena, a técnica executiva da coação prisional quando a verba alimentar se enquadrar na tipicidade normativa das 3 (três) prestações anteriores ao seu ajuizamento e das que se vencerem no curso do processo. 

Isto porque, como dito, apesar de os alimentos devidos aos cônjuges serem, em regra, definidos na forma transitória, ao menos durante esse período, haverá a presunção de que são necessários à sobrevivência do alimentado.

Caso se enquadrem em alguma excepcionalidade a justificar a perenidade da prestação alimentícia na referida relação horizontal, com maior razão deve ser reconhecida a essencialidade dos alimentos a permitir a deflagração do cumprimento especial pelo regime da prisão civil do devedor.

Por outro lado, ao contrário do que almeja o impetrante, não é possível a discussão sobre à necessidade ou não dos alimentos devidos no âmbito da execução.

É que a eleição sobre o fato de que os alimentos são ou não devidos para garantir a sobrevida do cônjuge deve ocorrer em momento anterior, na ação de conhecimento em que são fixados, e não no âmbito da execução, procedimento que deve ser extremamente célere - o devedor é intimado a pagar em 3 dias -, e cujo escopo, para sua deflagração, é justamente a indispensabilidade de tais alimentos.

Decerto, é no âmbito da ação ordinária de alimentos que ocorre, com base nos fatos e provas, a definição em relação às necessidades (ou não) de alimentos do requerente (ex-cônjuge ou ex-companheiro), maior e capaz, para a sua sobrevida, até porque, se não forem voltadas a referido objetivo, não deveriam sequer ter sido contemplados.

É que "o fosso fático entre a lei e o contexto social impõe ao Juiz detida análise de todas as circunstâncias e peculiaridades passíveis de visualização ou de intelecção no processo, para a imprescindível aferição da capacidade ou não de autossustento daquele que pleiteia alimentos, notadamente em se tratando de obrigação alimentar entre ex-cônjuges ou ex-compaheiros. Disso decorre a existência ou não da presunção da necessidade de alimentos" (REsp 1.025.769⁄MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira turma, julgado em 24⁄08⁄2010, DJe 01⁄09⁄2010)

Exatamente por isso que, no âmbito estreito da execução alimentar, cabe à parte, tão somente, "pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo" (CPC, art. 528, caput), não tendo espaço para outras discussões, salvo, por óbvio, exceções teratológicas.

Nesse sentido, aliás, já decidiu o STF:

- Não cabe a pretensão de renovar, em fase de execução (art. 733 do C.P.C.), a dilação própria do processo de conhecimento da ação de alimentos. Recusa de pagamento compreendendo prestações atuais, além das supostamente pretéritasHabeas corpus indeferido.
(HC 75767, Relator(a): Min. OCTAVIO GALLOTTI, Primeira Turma, julgado em 07⁄10⁄1997, DJ 05-12-1997 PP-63906 EMENT VOL-01894-02 PP-00261)

 

E o STJ:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ALEGADO JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. ALIMENTOS. EXECUÇÃO. RESCISÃO DE CONTRATO DE TRABALHO NÃO RETIRA A LIQUIDEZ, CERTEZA E EXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO. PRECEDENTES. MUDANÇA DA CAPACIDADE FINANCEIRA DEVE SER DISCUTIDA EM AÇÃO REVISIONAL. INOVAÇÃO RECURSAL EM AGRAVO REGIMENTAL. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. O julgamento do pedido da credora dos alimentos realizado pelo acórdão recorrido dentro dos limites postos na petição inicial não caracteriza hipótese de julgamento extra petita.
2. Esta egrégia Corte Superior tem precedentes no sentido de que a rescisão do contrato de trabalho do devedor de alimentos não tem o condão de retirar a liquidez do título executivo judicial que fixou o valor da pensão alimentícia em percentual incidente sobre a sua remuneração mensal. A mudança da situação financeira do alimentante deverá ser discutida em ação revisional de alimentos, não em execução. Precedentes.
3. Em agravo regimental não é possível analisar tese que não tenha sido apresentada anteriormente no recurso especial, por caracterizar inovação de fundamentos. Precedentes.
4. Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1391531⁄RS, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 28⁄04⁄2015, DJe 12⁄05⁄2015)
 

Realmente, o próprio sistema estabelece as formas e os lugares em que deve haver discussão sobre a modificação da situação fática atinente à obrigação alimentar: ação de exoneração ou revisional de alimentos, em que se produzirão as provas necessárias para se decidir acerca da possibilidade de redução ou até extinção de seu dever alimentar, inclusive com possibilidade de inversão do ônus da prova (NCPC, art. 373, § 1°).

É que "não há previsão, nesse procedimento específico que poderá acarretar a prisão civil do executado, de meio de oposição similar à impugnação ao cumprimento de sentença (art. 525). Assim, fundamentos de defesa do executado que não digam respeito estritamente à impossibilidade absoluta de pagamento, ou à prova de que este já se realizou, deverão ser veiculados por ação autônoma (por exemplo, ação de exoneração ou revisão de alimento)" (GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Processo de conhecimento e cumprimento de sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 769).

Por fim, não se pode olvidar a peculiaridade dos alimentos transitórios, que, após o exaurimento de seu termo, deverão ser extintos ipso facto.

Nesse sentido.

PROCESSO CIVIL E DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. AÇÃO DE SEPARAÇÃO JUDICIAL LITIGIOSA. IMPUTAÇÃO DE CULPA. VIOLAÇÃO DOS DEVERES DO CASAMENTO. PRESUNÇÃO DE PERDÃO TÁCITO. ALIMENTOS TRANSITÓRIOS. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA.
1. A presunção de perdão tácito declarada pelo TJ⁄MG constitui circunstância fática imutável na via especial, a teor da Súmula 7⁄STJ.
2. A boa-fé objetiva deve guiar as relações familiares, como um manancial criador de deveres jurídicos de cunho preponderantemente ético e coerente.
3. De acordo com os arts. 1.694 e 1.695 do CC⁄02, a obrigação de prestar alimentos está condicionada à permanência dos seguintes pressupostos: (i) o vínculo de parentesco, ou conjugal ou convivencial; (ii) a necessidade e a incapacidade do alimentando de sustentar a si próprio; (iii) a possibilidade do alimentante de fornecer alimentos.
4. O fosso fático entre a lei e o contexto social impõe ao Juiz detida análise de todas as circunstâncias e peculiaridades passíveis de visualização ou de intelecção no processo, para a imprescindível aferição da capacidade ou não de autossustento daquele que pleiteia alimentos, notadamente em se tratando de obrigação alimentar entre ex-cônjuges ou ex-compaheiros. Disso decorre a existência ou não da presunção da necessidade de alimentos.
5. A realidade social vivenciada pelo casal ao longo da união deve ser fator determinante para a fixação dos alimentos. Mesmo que se mitigue a regra inserta no art. 1.694 do CC⁄02, de que os alimentos devidos, na hipótese, são aqueles compatíveis com a condição social do alimentando, não se pode albergar o descompasso entre o status usufruído na constância do casamento ou da união estável e aquele que será propiciado pela atividade laborativa possível.
6. A obrigação de prestar alimentos transitórios – a tempo certo – é cabível, em regra, quando o alimentando é pessoa com idade, condições e formação profissional compatíveis com uma provável inserção no mercado de trabalho, necessitando dos alimentos apenas até que atinja sua autonomia financeira, momento em que se emancipará da tutela do alimentante – outrora provedor do lar –, que será então liberado da obrigação, a qual se extinguirá automaticamente.
7. Nos termos do art. 1.710 do CC⁄02, a atualização monetária deve constar expressamente da decisão concessiva de alimentos, os quais podem ser fixados em número de salários mínimos. Precedentes.
8. Recurso especial parcialmente provido.
(REsp 1025769⁄MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 24⁄08⁄2010, DJe 01⁄09⁄2010)
 

8. Assim, no que toca aos alimentos entre cônjuges, dentro do lapso temporal em que forem devidos, eventual execução, pelo rito da coerção por prisão, deverá abrangir, inevitavelmente, as três últimas parcelas antes do ajuizamento e as vincendas no curso do processo.

Primeiro porque os alimentos foram tidos por legítimos, isto é, decorrentes do grau de parentesco, casamento ou união estável (CC, art. 1.694) e necessários, justamente os que, segundo a jurisprudência do STJ, são aptos a deflagrar a execução por meio do rito da prisão civil.

Segundo porque a lei não faz distinção, para fins de prisão, entre a qualidade da pessoa que necessita de alimentos - maior, menor, capaz, incapaz, cônjuge, filho, neto -, mas, tão somente, se o débito é atual ou pretérito.

Realmente,

o legislador ordinário se pauta na cláusula geral de adequação, prevista pelo art. 5°, LIV, da CR⁄88 para criar e adaptar procedimentos judiciais em consideração a variados fatores, como a natureza do direito material que objetivam tutelar, a profundidade e amplitude de cognição a ser desenvolvida, a maior ou menor concentração dos atos processuais, a necessidade ou não de que determinados sujeitos nele participem, enfim, valências diversas com o objetivo de que a tutela possa ser prestada e efetivada de forma mais adequada à realidade de direito material. Logo, se ele não condicionou o emprego do rito sob estudo a quantidades mínima ou máxima de prestações em atraso, talvez não caiba ao intérprete fazê-lo. Do mesmo modo, se ele estabeleceu prazos e meios de defesa singelos, sem fazer qualquer restrição a seu uso, possivelmente o aplicador tenha que respeitar essa escolha. Por outro lado, se ele restringiu a aplicação da técnica de prisão civil a determinado número de parcelas cobradas, é porque isso tem que ser observado no caso concreto". (CALMON, Rafael. Direito das famílias e processo civil: interação, técnicas e procedimentos sob o enfoque do novo cpc. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 345-346).
 

O que se mostra decisivo é a necessidade do alimentando, mesmo que se trate de ex-consorte. "Não interessa a espécie - interessa o gênero. Havendo necessidade de alimentos, não há razão para distinguir técnicas processuais atinentes somente a essa ou àquela espécie: a necessidade dos alimentos é a mesma. Seu fundamento último também: dignidade da pessoa humana (art. 1°, III, CF)" (MARINONI, Luiz Guilherme. Novo código de processo civil comentado. São Paulo: RT, 2015, p. 560).

Em assim sendo, uma vez definido e fixado os alimentos em prol do cônjuge, é presumido que esses são voltados para a sobrevida do alimentado, havendo direito potestativo do credor de requerer a técnica executiva da prisão, já que se trata de necessidade impostergável.

Com efeito, "há intrínseco propósito de assegurar a proteção do credor de alimentos, mediante um regime legal específico, e cujo crédito visa a cobrir as necessidades impostergáveis do credor, cuja satisfação alimentar não pode admitir maiores demoras, razão pela qual o legislador também rodeou o direito alimentar de uma série de garantias especiais para assegurar o pronto pagamento dos alimentos, e mesmo assim, outros tantos procedimentos precisam ser urgentemente adotados para garantir a real efetividade do crédito alimentar" (MADALENO, Rolf. Curso de direito de família. 6 ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 927),

Terceiro porque, entender de forma diversa, restringindo os valores da execução às últimas três parcelas, acarretaria o efeito deletério de obrigar o credor a ajuizar várias execuções paralelas pelo rito prisional, ocasionando, inevitavelmente, a acumulação de prazos de prisão decretados em diversos processos distintos.

9. Na presente hipótese, trata-se de alimentos devidos de forma perene à ex-cônjuge, tendo o magistrado sentenciante, na definição do valor, se valido dos seguintes fundamentos (fls. 192-198):

i) "a autora tinha 18 anos de idade quando do enlace matrimonial";

ii) "durante grande parte do casamento a autora não trabalhou";

iii) "o próprio réu afirma que era o responsável pelas despesas da casa e da família, o que era feito por meio dos gastos nos cartões de crédito em seu nome";

iv) "ainda, a autora tem problemas de saúde, principalmente psiquiátricos, o que se verifica das prescrições médicas juntadas a fls. 23 e 791⁄792";

v) "considerando que, quando do ajuizamento da ação, a autora tinha 50 anos de idade, baixa capacitação profissional e problemas de saúde, tem-se que dificilmente conseguirá trabalho formal, não tendo ela também tempo de contribuição suficiente para a concessão da aposentadoria em seu favor";

vi) "diante da situação que ora se apresenta, qual seja, a dependência financeira integral da autora em relação ao réu, durante todo o período de matrimônio, de cerca de 32 anos, justo que o requerido, em razão da separação do casal, auxilie sua ex-cônjuge com o mínimo necessário à subsistência dela.

Em razão disso, fixou alimentos no importe mensal de R$ 2.500,00, tendo-se como proporcional e suficiente para a autora garantir sua subsistência básica.

Conforme decisão do magistrado de piso (fls. 26-27), a presente execução alcançou montantes elevados (R$ 63.988,21), tendo destacado que, "como se observa desde o ajuizamento da presente execução – início de 2016 –, o executado deixa de apresentar justificativas plausíveis para o descumprimento de sua obrigação, alegando ter feito depósitos parciais nos autos de outros processos em que as partes litigam. Tais depósitos existem, porém se nota, ictu oculi, que não são suficientes nem mesmo para cobrir 25% dos valores devidos. Não trouxe o executado elementos mínimos que pudessem infirmar a planilha de cálculo apresentada pela exequente (fls. 462⁄463), que pormenorizou os lançamentos dos débitos e créditos do período e concluiu que ainda lhe são devidos quase 64 mil reais".

Portanto, na espécie, como a execução ocorreu pelo rito da coação pessoal, considerando as prestações vencidas no trimestre anterior ao ajuizamento da execução e as vincendas no curso do processo, ainda que se tenha alongado no tempo, a execução continuará devendo ser concebida como de débitos atuais.

Nesse sentido, é a jurisprudência pacífica da Casa:

PROCESSUAL CIVIL. HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PRISÃO CIVIL. WRIT UTILIZADO COMO SUCEDÂNEO DE RECURSO CABÍVEL. IMPOSSIBILIDADE. AFERIÇÃO DA POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO. ALEGADO EXCESSO NA EXECUÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. DEMORA NO JULGAMENTO DA APELAÇÃO NA ORIGEM. MATÉRIA NÃO EXAMINADA PELO ACÓRDÃO IMPUGNADO. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME PELO STJ. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. CONSTATAÇÃO DA CAPACIDADE FINANCEIRA DO ALIMENTANTE. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ESTREITA DO WRIT. PRECEDENTES. LEGALIDADE DO DECRETO DE PRISÃO. INADIMPLEMENTO DAS TRÊS PARCELAS ANTERIORES AO AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO E DAS QUE VENCERAM NO CURSO DA AÇÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 309 DO STJ. CUMPRIMENTO PARCIAL DA OBRIGAÇÃO AUTORIZA A PRISÃO CIVIL. PRETENSÃO DE CUMPRIMENTO DA PRISÃO CIVIL EM REGIME DOMICILIAR. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO DEMONSTRADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
1. Não é admissível a utilização de habeas corpus como sucedâneo ou substitutivo de recurso ordinário cabível. Precedentes.
2. A inércia do executado em adimplir obrigação alimentar após a adequação do valor da pensão nos termos da ação revisional de alimentos afasta a alegação de excesso de execução. 2.1. O não enfrentamento pela autoridade coatora da alegação de demora no julgamento da apelação da ação revisional impede esta eg. Corte de se manifestar sobre o tema, sob pena de indevida supressão de instância.
3. A verificação da incapacidade financeira do alimentante e a revisão das justificativas apresentadas para o inadimplemento da obrigação demandam dilação probatória, não se mostrando o writ a via adequada para este mister. Precedentes.
4. Há jurisprudência dominante do STJ segue no sentido de que o não pagamento integral das parcelas alimentares devidas autoriza a prisão civil do devedor de alimentos. Precedentes.
5. O decreto de prisão proveniente da execução de alimentos na qual se visa o recebimento integral de até as três parcelas anteriores ao ajuizamento da ação e das que vencerem no seu curso não é ilegal. Inteligência da Súmula nº 309 do STJ e precedentes.
6. A pretensão de cumprimento da prisão civil em regime domiciliar, em regra, não encontra abrigo na jurisprudência desta egrégia Corte Superior, pois desvirtua a finalidade de compelir o devedor a adimplir com a obrigação alimentar e viola direito fundamental que tem o alimentado a uma sobrevivência digna. Precedentes.
7. A inexistência de ilegalidade flagrante ou de coação no direito de locomoção do paciente não enseja a concessão da ordem de ofício.
8. Habeas corpus não conhecido.
(HC 403.272⁄RO, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 21⁄09⁄2017, DJe 04⁄10⁄2017)
__________________
RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL E CIVIL. ALIMENTOS. AÇÃO EXECUTIVA. RITO PROCEDIMENTAL. PRISÃO CIVIL. REQUISITOS: DÍVIDA ATUAL; URGÊNCIA E NECESSIDADE DO ALIMENTANDO; INADIMPLEMENTO VOLUNTÁRIO E INESCUSÁVEL. AÇÃO REVISIONAL. DECISÃO QUE RETROAGE À DATA DA CITAÇÃO. PRECEDENTE. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA.
1. Não se viabiliza o recurso especial que alega violação do art. 535 do CPC, quando, embora rejeitados os embargos de declaração, a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte recorrente.
2. A Constituição Federal, em seu art. 5º, LXVII, prevê exceção à vedação de prisão por dívida para os casos de obrigação alimentar. A regulamentação dessa permissão constitucional está na Lei de Alimentos, Lei n. 5.478⁄1968, art. 19, e no Código de Processo Civil, mais especificamente, seu art. 733.
3. Diante da especialidade e relevância conferida aos alimentos, o ordenamento jurídico, autorizado pela exceção constitucional, estabeleceu modalidade diferenciada de execução ao crédito derivado da obrigação de prestá-los, com possibilidade de atos de coação pessoal do devedor inadimplente.
4. O procedimento regulado pelo art. 733 do CPC, cujo meio executório é a coação pessoal, exige que o crédito alimentar tenha prestação pecuniária limitada às últimas três prestações antecedentes ao ajuizamento da execução e às que se vencerem no curso da própria execução, consoante a Súmula 309 do STJ. As demais prestações que se acumularam no tempo hão de ser executadas por outro meio, quase sempre a expropriação.
5. Como dito, a dívida que autoriza o ajuizamento de execução pelo rito da coação pessoal deve ser presente, sendo desta forma consideradas as referentes ao trimestre anterior ao ajuizamento da execução. Assim, ainda que a ação tenha se alongado no tempo, a execução continua a se referir àquelas parcelas que ao tempo do ajuizamento eram atuais e às que foram se vencendo.
6. A execução de dívida de alimentos pelo rito que prevê a prisão do devedor, consoante jurisprudência desta Corte superior, exige o preenchimento dos seguintes requisitos, concomitantemente: dívida atual, urgência e necessidade no recebimento dos alimentos e inadimplemento voluntário e inescusável pelo devedor.
7. Os efeitos da sentença proferida em ação de revisão de alimentos - seja em caso de redução, majoração ou exoneração - retroagem à data da citação (Lei n. 5.478⁄1968, art. 13, § 2º), ressalvada a irrepetibilidade dos valores adimplidos e a impossibilidade de compensação do excesso pago com prestações vincendas. (EREsp 1181119⁄RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p⁄ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, DJe 20⁄06⁄2014)
8. Recurso especial parcialmente provido, para determinar o retorno dos autos à origem de modo a que a execução das prestações devidas e não pagas seja retomada com base no rito ditado pelo art. 732 do Código de Processo Civil, observada a regra estabelecida em precedente da Segunda Seção referido neste voto (EREsp n. 1.181.119⁄RJ).
(REsp 1219522⁄MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 08⁄09⁄2015, DJe 21⁄10⁄2015)

 

Por fim, apenas para constar, apesar de devidamente intimado a comprovar o pagamento das três últimas parcelas da pensão alimentícia, o paciente limitou-se a informar que não tem como pagar sequer estas últimas três, sem prejuízo de seu sustento e de sua família.

Por outro lado, tem-se notícia de que o paciente ingressou com ação exoneratória (fls. 120-124). Em sendo assim, caso obtenha provimento em seu favor, "os efeitos da sentença proferida em ação de revisão de alimentos - seja em caso de redução, majoração ou exoneração - retroagem à data da citação (Lei 5.478⁄68, art. 13, § 2º), ressalvada a irrepetibilidade dos valores adimplidos e a impossibilidade de compensação do excesso pago com prestações vincendas" (EREsp 1.181.119⁄RJ, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Rel. p⁄ acórdão Ministra Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, julgado em 27⁄11⁄2013, DJe 20⁄06⁄2014).

10. Ante o exposto, o voto é no sentido de revogar a liminar anteriormente concedida e denegar a ordem de habeas corpus.

É como voto.

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HABEAS CORPUS Nº 413.344 - SP (2017⁄0210608-1)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
IMPETRANTE : JAIR CASSIMIRO DE OLIVEIRA
ADVOGADOS : JAIR CASSIMIRO DE OLIVEIRA  - SP065196
    THIAGO SERVILHA E OUTRO(S) - SP327165
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE  : L G C R (PRESO)
 
VOTO-VISTA
 
EXMO. SR. MINISTRO MARCO BUZZI:
Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado por JAIR CASSIMIRO DE OLIVEIRA, em favor de L.G.C.R, contra decisão monocrática proferida pelo Desembargador-Relator do Agravo de Instrumento n.º 2152189-36.2017.826.0000, que, em sede de antecipação de tutela, manteve a prisão do paciente por dívida alimentícia, reduzindo, todavia, o prazo do decreto prisional para 30 (trinta) dias (fls. 13⁄14, e-STJ).
Na origem, observa-se que o paciente foi intimado, no bojo da execução de alimentos ajuizada por sua ex-cônjuge, a pagar o débito de R$ 63.988,21 (sessenta e três mil, novecentos e oitenta e oito reais e vinte e um centavos), sob pena de prisão. Apresentada impugnação pela defesa, o juízo executório, apesar de reconhecer a existência de depósitos parciais e insuficientes, decretou a prisão do alimentante pelo prazo de 02 (dois) meses, nos termos do art. 528, § 3º, do CPC⁄15.
Contra as referidas decisões, foi impetrado o presente writ of mandamusalegando-se, em suma, que o débito perdeu o caráter de emergencialiade dos alimentos, porquanto a dívida remonta há mais de dois anos. Afirma, ainda, dificuldade financeira, pois a empresa da qual era sócio foi encerrada na junta comercial no mês de outubro de 2016 e, atualmente, o paciente ocupa o cargo de auxiliar administrativo, percebendo a quantia de R$ 1.000,00 (mil reais) por mês.
O pedido liminar foi deferido em plenário pela Quarta Turma do STJ, nos termos do acórdão de fls. 143⁄153 (e-STJ), tendo sido, ainda, determinada a intimação do paciente para comprovar o pagamento das três últimas parcelas da pensão alimentícia, sob pena de revogação da tutela de urgência.
Instado a se manifestar, o Ministério Público Federal opinou favoravelmente à revogação do decreto prisional (fls. 179⁄184, e-STJ).
Na assentada do dia 17 de abril de 2018, o relator denegou a ordem, apresentando, sinteticamente, os seguintes motivos: a) os alimentos entre cônjuges, além de serem devidos e necessários, são aptos a deflagrarem a execução por meio do rito da prisão civil; b) não houve o pagamento das três últimas parcelas e, também, das vincendas no curso do processo, nos termos da Súmula 309 do STJ; e, c) a impossibilidade de se examinar a incapacidade financeira do alimentante, em sede de habeas corpus, por demandar dilação probatória.
É o relatório.
 
VOTO
 
Acompanho, pelos seus judiciosos fundamentos, o voto proferido pelo e. Ministro Luís Felipe Salomão.
1. Analisadas com acuidade as particularidades que envolvem o presente caso, não há, todavia, como se afastar do entendimento jurisprudencial consolidado no âmbito desta Corte Superior, mormente porque, devidamente intimado dos termos da decisão liminar anteriormente deferida, o paciente não comprovou o pagamento das três últimas parcelas alimentares devidas, atendo-se apenas em novamente sustentar a sua incapacidade econômica para prover as suas obrigações (PET 00688629⁄3027, fls. 186⁄199).
Inicialmente, quanto à exigibilidade dos alimentos pelo ex-cônjuge, cumpre destacar que o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que o rito da prisão civil não se restringe ao inadimplemento do encargo alimentar fundado em vínculo consanguíneo, pois o ex-cônjuge inadimplente tem o dever de quitar o débito alimentício (RHC 37.365⁄SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 25⁄06⁄2013, DJe 06⁄08⁄2013).
Segundo, é iterativa a jurisprudência desta Corte Superior no sentido de que o pagamento parcial do débito alimentar não produz o efeito de liberar o devedor do pagamento do restante do débito e da consequência da decretação prisão por dívida alimentar (AgInt no RHC 81.501⁄SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 03⁄08⁄2017, DJe 09⁄08⁄2017).
Feitas estas considerações, não há como afastar a higidez do decreto de prisão, por ter o ora paciente deixado de cumprir integralmente a obrigação alimentar devida à sua ex-cônjuge, conforme restou cristalizado pela instância ordinária, tendo, ainda, o feito executório observado sobre o tema o comando inserto no enunciado da Súmula 309 do STJ ("O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo"), não havendo notícia, mesmo após a recente juntada da petição de fls. 203⁄230 (PET 00198452⁄2018), do ajuizamento de ação revisional.
Por fim, a verificação da incapacidade financeira do alimentante e a revisão das justificativas apresentadas para o inadimplemento da obrigação  demandam, inevitavelmente, dilação probatória, não se mostrando o writ a via adequada para este desiderato, devendo o devedor, como já foi asseverado, ajuizar, a pertinente ação de revisão de alimentos.
Nesse diapasão:
 
HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PRISÃO CIVIL. LEGALIDADE. ADEQUAÇÃO AO ENTENDIMENTO TRAÇADO NO ENUNCIADO DA SÚMULA N.º 309⁄STJ. CAPACIDADE FINANCEIRA DO PACIENTE. REEXAME. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PAGAMENTOS PARCIAIS. ORDEM DE PRISÃO QUE SÓ SE DEBELA COM O PAGAMENTO INTEGRAL DO DÉBITO. INCLUSÃO DE VERBAS ESTRANHAS À PENSÃO ALIMENTÍCIA AO PROCEDIMENTO DO ART. 733 DO CPC⁄1973. DEMONSTRAÇÃO. AUSÊNCIA.
1. Admissibilidade da prisão civil do alimentante por dívida atual, correspondente às três últimas prestações anteriores ao ajuizamento da execução, acrescidas das que se vencerem no curso do processo (Súmula n. 309⁄STJ).
2. Os estreitos limites instrutórios do procedimento do "habeas corpus" não permitem discussão dependente da produção de provas, inviabilizando o conhecimento da alegação de incapacidade econômica do devedor.
3. Na linha da orientação jurisprudencial desta Corte, pagamentos parciais não são suficientes a obstaculizar o rito da coerção pessoal, nem torna ilegal a ordem de prisão, que só se debela diante do integral pagamento do débito.
4. Inviabilidade, à mingua de comprovação, mediante prova pré-constituída, do acolhimento da alegação de que estariam sido incluídas verbas estranhas à pensão alimentícia ao procedimento do art. 733 do CPC⁄1973.
5. HABEAS CORPUS DENEGADO.
(HC 363.573⁄SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 18⁄10⁄2016, DJe 25⁄10⁄2016)
 
Concluindo, os fundamentos apresentados pelo e. relator, na assentada de 17 de abril de 2018, encontram-se, quanto aos pontos individualizados na petição inicial da presente impetração, em consonância com o posicionamento pretoriano sedimentado, em casos similares, por esta Corte Superior.
2. Ante o exposto, acompanho o voto do Ministro Luís Felipe Salomão para denegar a ordem ora pleiteada e, por conseguinte, revogar a liminar anteriormente deferida.
É como voto.

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HABEAS CORPUS Nº 413.344 - SP (2017⁄0210608-1)
 
VOTO
 
MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI: Senhor Presidente, acompanho integralmente o voto do eminente Relator. Penso que se é reconhecido o caráter alimentar da obrigação, é porque há necessidade e, portanto, não haveria sentido lógico, ao meu ver, data venia, em que esse caráter alimentar fosse apenas de três prestações sem se considerar as vincendas ao curso do processo, o que tornaria necessário o ajuizamento de uma ação a cada três meses.

Portanto, acompanho o eminente Relator.

Jurisprudência do stj na íntegra