Jurisprudência - STJ

RECURSOS ESPECIAIS. DIREITO DE FAMÍLIA.

Por: Equipe Petições

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RECURSOS ESPECIAIS. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE ALIMENTOS. EX-CÔNJUGES. EXCEPCIONALIDADE. TRINÔMIO ALIMENTAR. NECESSIDADE DA ALIMENTADA. AFERIÇÃO. MANUTENÇÃO DA CONDIÇÃO SOCIAL ANTERIOR À RUPTURA DA UNIÃO. CAPACIDADE FINANCEIRA DO ALIMENTANTE. GESTOR E USUFRUTUÁRIO DO VULTUOSO PATRIMÔNIO FAMILIAR. 'QUANTUM' ALIMENTAR. PROPORCIONALIDADE. ARTIGOS 1694, §1º E 1695, DO CÓDIGO CIVIL. REVISÃO. SÚMULA 07/STJ. JUNTADA DE DOCUMENTO NA FASE RECURSAL. POSSIBILIDADE. FORMA DE APURAÇÃO DOS LUCROS, RESERVAS E DIVIDENDOS DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS. PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ.

1. Controvérsia em torno da viabilidade da estipulação de alimentos civis entre os ex-cônjuges, bem como se o "quantum" fixado deve ser adequado à manutenção da realidade social vivenciada pelo ex-casal à época da ruptura da união, estando pendente a partilha de vultuoso patrimônio comum.

2. As questões submetidas ao Tribunal de origem foram adequadamente apreciadas, não se evidenciando afronta ao art. 1.022 do CPC/2015.

3. Segundo a orientação jurisprudencial do STJ, com esteio na isonomia constitucional, a obrigação alimentar entre cônjuges é excepcional, de modo que, quando devida, ostenta caráter assistencial e transitório.

4. A perenização da obrigação alimentar, a excepcionar a regra da temporalidade, somente se justifica quando constatada a impossibilidade prática de o ex-cônjuge se inserir no mercado de trabalho em emprego que lhe possibilite, em tese, alcançar o padrão social semelhante ao que antes detinha, ou, ainda, em razão de doença própria ou de algum dependente comum sob sua guarda.

Precedentes específicos.

5. A conjuntura familiar dos recorrentes, retratada nas instâncias ordinárias, se amolda à situação excepcional descrita, reconhecendo-se a incapacidade de autossustento do cônjuge que pleiteou os alimentos.

6. Nos termos do art. 1.694 do Código Civil, os alimentos devidos entre cônjuges destinam-se à manutenção da qualidade de vida do credor, preservando, o tanto quanto possível, a mesma condição social desfrutada na constância da união, conforme preconizado na doutrina e jurisprudência desta Corte.

7. Impossibilidade de revisão, a teor da Súmula n.º 07/STJ, das conclusões alcançadas no acórdão recorrido acerca da presença dos elementos necessários para a concessão da pensão alimentícia, especialmente para majorar ainda mais o "quantum" fixado, como postulou a autora, ou, até mesmo, para reconhecer a desnecessidade desta verba, como quer o réu, por implicar o revolvimento do extenso conjunto probatório dos autos.

8. Inexistência de risco de "bis in idem" em razão da autora ter postulado em ação própria alimentos compensatórios, uma vez que esta ação foi julgada extinta sem julgamento do mérito, decisão mantida por esta Terceira Turma no REsp n.º 1655689/RJ.

9. Hipóteses de cabimento dos alimentos compensatórios (indenizatórios) que não se confundem com as dos alimentos civis devidos entre cônjuges (art. 1.694, do Código Civil), vinculados estritamente às necessidades daquele que os recebe, de caráter assistencial e suficiente para que o alimentando viva de modo compatível com a sua condição social.

10. Possibilidade de juntada de documentos novos na fase recursal, desde que não se trate de documento indispensável à propositura da ação, não haja má-fé na ocultação e seja ouvida a parte contrária (AgRg no REsp 1362266/AL, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, DJe 10/09/2015.

11. A ausência de manifestação no acórdão recorrido acerca da forma de apuração dos lucros, reservas e dividendos das sociedades anônimas, matérias de que tratam os artigos 187, 189, 190, 191, 192, 201 e 202 da Lei n.º 6.404/76, alegadamente violados, impede o conhecimento da matéria, nos termos do enunciado da Súmula n.º211/STJ.

12. RECURSOS ESPECIAIS DESPROVIDOS.

(REsp 1726229/RJ, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/05/2018, DJe 29/05/2018)

 

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JURISPRUDÊNCIA NA ÍNTEGRA

RECURSO ESPECIAL Nº 1.726.229 - RJ (2017⁄0186219-4)
RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
RECORRENTE : G A B
ADVOGADOS : SERGIO BERMUDES  - RJ017587
    ALDE DA COSTA SANTOS JÚNIOR  - DF007447
    SÉRGIO ARTHUR CALMON DU PIN E ALMEIDA  - RJ044810
    GUILHERME VALDETARO MATHIAS  - RJ075643
    ANDRÉ LUIZ SOUZA DA SILVEIRA E OUTRO(S) - DF016379
    RICARDO JUNQUEIRA DE ANDRADE E OUTRO(S) - RJ112230
ADVOGADA : ANA PAULA ALMEIDA NAYA DE PAULA E OUTRO(S) - DF022915
RECORRENTE : M A B B
ADVOGADOS : MARCO ANTÔNIO MUNDIM E OUTRO(S) - DF000941
    PAULO ROBERTO SARAIVA DA COSTA LEITE E OUTRO(S) - DF003333
    RONEI RIBEIRO DOS SANTOS  - DF018118
    FLÁVIO DIZ ZVEITER  - RJ124187
    MARIANA BURITY MARTINS E OUTRO(S) - RJ124397
    CAROLINA DE JESUS MULLER  - DF038896
    JULIANE BOIM PREVITALI E OUTRO(S) - RJ184464
RECORRIDO : OS MESMOS
 
RELATÓRIO
 
O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator):
Trata-se de recursos especiais interpostos por G. A. B e M. A. B. B., ambos com fundamento nas alíneas "a" e "c" do art. 105, III, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pela Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro nos autos da ação de alimentos em que contendem as partes.
Esta a ementa do acórdão recorrido:
APELAÇÃO. AÇÃO DE ALIMENTOS. CAPACIDADE ECONÔMICO-FINANCEIRA DO EX-CÔNJUGE VARÃO, GESTOR E USUFRUTUÁRIO EXCLUSIVO DO PATRIMÔNIO FAMILIAR. ATENDIMENTO AO QUADRINÔMIO NECESSIDADE - POSSIBILIDADE – PROPORCIONALIDADE - RAZOABILIDADE. AÇÃO DE PARTILHA DOS BENS AINDA EM TRAMITAÇÃO. AUTORA QUE NÃO RECEBE DIVIDENDOS DA EMPRESA DA QUAL É ACIONISTA. MAJORAÇÃO DA VERBA ALIMENTÍCIA. PROVIMENTO PARCIAL DO PRIMEIRO RECURSO. DESPROVIMENTO DO SEGUNDO.
1. O direito que os cônjuges e ex-cônjuges têm de pedir alimentos entre si, decorrente do dever de mútua assistência inserto no art. 1.694 do Código Civil, deve ser analisado caso a caso, sob os pressupostos da obrigação alimentar, sopesando-se a necessidade de quem os pleiteia e a correlata possibilidade do alimentante em potencial, à luz do princípio da proporcionalidade e da razoabilidade.
2. Presentes os pressupostos legais, os alimentos devem ser prestados em patamar tal que contemple em termos proporcionais e razoáveis, de um lado, a capacidade do alimentante e, do outro, a necessidade dos alimentados, sem perder de vista, no caso de famílias reconhecidamente abastadas e detentoras de patrimônio e rendimentos vultosos, a necessidade de manter, tão próximo quanto possível, o padrão social antes ostentado.
3. Assim, pretende a autora um pensionamento em montante tal que, pelo menos a luz da realidade atual do patrimônio comum não partilhado do ex-casal, possibilite, após 27 anos de casamento, ostentar padrão social compatível com o anteriormente usufruído.
4. Quando o padrão econômico de vida do ex-casal litigante situa- se muito acima da realidade vivenciada pela grande maioria dos brasileiros, como aqui observado, os alimentos extrapolam a função primária de prover as necessidades básicas do indivíduo relacionadas à alimentação, vestuário, transporte, moradia e saúde, e assumem um caráter mais amplo de manutenção do próprio status social, do padrão de riqueza, sem relação direta com a dura matemática do salário mínimo, da cesta básica, da inflação, da elevação do custo de vida e de outros fatores que corroem os orçamentos domésticos.
5. Sendo efetivamente demonstrada a elevada capacidade econômico-financeira do réu, que exerce com exclusividade a gestão de todos os negócios familiares e detém a exclusividade do usufruto vitalício de todos os rendimentos proporcionados pelo patrimônio comum do ex-casal ainda não partilhado, e havendo evidente confusão patrimonial entre a pessoa física do réu e as empresas da família, deve este contribuir condignamente, a título de pensão alimentícia, para o sustento de sua ex-esposa, impondo, no caso, a majoração do pensionamento.
6. Impossibilidade de impor à autora a integralidade dos ônus sucumbenciais, pois a postulação inicial da verba alimentar é considerada como meramente estimativa, em razão do elevado grau de subjetividade na seu arbitramento.
7. Provimento parcial do primeiro recurso e desprovimento do segundo.
 
 
Opostos embargos de declaração (fls. 3647⁄3656 e 3657⁄3670), foram rejeitados (fls. 3737⁄3751).
Em suas razões (fls. 3760⁄3790), o recorrente G. A. B. alegou, de um lado, violação ao art. 535, II, do CPC⁄1973 (atual art. 1.022, II, do CPC⁄2015), por omissão no enfrentamento das seguintes questões: (i) comprovação da necessidade da recorrida em perceber alimentos, considerando que aufere ganhos suficientes para a sua manutenção, limitando-se o Tribunal quo a fundamentar, de forma genérica, que a necessidade teria sido demonstrada "ao longo do feito" ou no "depoimento pessoal", sem indicar nos autos, contudo, os elementos da sua convicção; (ii) apuração da real capacidade do recorrente para prestar alimentos, pois consideradas como se correspondessem ao seu patrimônio as receitas brutas das empresas que administra, quando deveria ser considerado apenas os dividendos efetivamente recebidos, bem como que o fato de "ter acesso" à receita da companhia que administra não implica o recebimento desta quantia, pois atua apenas como gestor da empresa, não podendo dispor livremente do seu patrimônio, sob pena de responsabilização pessoal; (iii) adoção de falsa premissa ao concluir pela existência de confusão patrimonial entre a pessoa física do réu e as empresas da família, desconsiderando o resultado de perícia específica levada a efeito em outra demanda, cuja conclusão foi diametralmente oposta.
De outro lado, reputou violados os artigos (a) 1.694, caput e §1º, do Código Civil, pela concessão de alimentos civis com função indenizatória, para garantia de uma vida de luxo e ostentação, sem efetiva demonstração da necessidade da alimentada; (b) 396, 397 e 398, do CPC⁄1973, pela admissão da juntada de documentos novos com a apelação, fora das hipóteses legais e; (c) 187, 189, 190, 191, 192, 201 e 202 da Lei n.º 6.404⁄76, em razão da confusão entre os conceitos de faturamento e lucro - percebidos pela pessoa jurídica, e dividendos - recebidos pelos sócios, na aferição da capacidade do alimentante.
M. A. B. B., por sua vez, apontou violação aos artigos 1.022, I, do CPC⁄2015, 1.694, por ausência de completa prestação jurisdicional. No ponto, sustentou ter o Tribunal a quo incorrido em evidente contradição, na medida em que, apesar de reconhecer (i) a necessidade de manutenção de vida compatível com sua condição de riqueza, (ii) que a renda mensal do alimentante gira em torno de 7 milhões de reais, (iii) que suas despesas devidamente comprovadas não serão supridas com a quantia deliberada, bem como (iv) que o usufruto das empresas que detém o recorrido causa confusão patrimonial e não permite à recorrente, na condição de acionista, auferir qualquer lucro da atividade em uma delas empreendida, entendeu por não estipular quantia proporcional às suas necessidades.
No mérito, disse violados os artigos 1.694, §1º e 1.695 do Código Civil, uma vez que o quantum fixado à título de pensão alimentícia, em que pese majorado, ainda é irrisório, considerando a capacidade econômico-financeira do recorrido, pois corresponde a apenas 2.29% da renda mensal auferida por este e, ainda, é insuficiente para manter a condição social vivenciada à época da constância do casamento.
Ambos os recorrentes apontaram, ainda, divergência jurisprudencial, postulando o provimento dos seus recursos especiais.
Contrarrazões apresentadas às fls. 4005⁄4033 e 4043⁄4056.
Os recursos foram inadmitidos na origem (fls. 4102⁄4108), interpondo as partes, na sequência, agravos em recursos especiais (fls. 4175⁄4197 e 4200⁄4233).
Redistribuídos os autos a este Relator, em razão da conexão com o REsp n.º 1655689⁄RJ (certidão de fl. 4372), dei provimento aos agravos interpostos, determinando a conversão em recursos especiais (fls.  4405⁄4406).
É o relatório.
 
 
 
RECURSO ESPECIAL Nº 1.726.229 - RJ (2017⁄0186219-4)
 
VOTO
 
O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator):
Eminentes colegas. A controvérsia central de ambos os recursos especiais cinge-se a verificar a viabilidade, in casu, da estipulação de alimentos civis entre os ex-cônjuges, e a determinar se o quantum fixado deve ser adequado à manutenção da realidade social vivenciada pelo ex-casal à época da separação.
Historio, brevemente, as circunstâncias fáticas que envolvem o litígio estabelecido entre as partes, delineadas nas instâncias ordinárias.
Na origem, trata-se de ação de alimentos ajuizada pela ex-esposa contra seu ex-marido, no curso da ação de divórcio, requerendo a fixação da pensão alimentícia em seu favor no valor de R$450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil reais).
As partes foram casadas durante vinte e sete anos pelo regime de comunhão parcial de bens.
O divórcio foi decretado em 15⁄12⁄2011, nos autos do processo n.º 0227639-21.2011.8.19.0001, que tramitou no juízo da 9ª Vara de Família da Comarca do Rio de Janeiro, estando pendente a partilha de bens.
A família, composta por mais dois filhos comuns, hoje maiores, sempre viveu em patamar social sofisticado, mantido pela atividade econômica do réu, que sempre administrou todo o patrimônio amealhado pelo casal.
O réu possui o usufruto vitalício das cotas sociais que compõem a integralidade do capital social da empresa GB Armazéns Gerais Ltda., cujos sócios são seus quatro filhos e a autora.
A referida empresa controla, com 51% das cotas, a empresa Parso Participações Societárias Ltda., que, por sua vez, detém o controle de 100% da empresa Rio Minas 10 Empreendimentos Ltda., todas administradas pelo réu.
A autora, por sua vez, hoje com 68 anos de idade, dedicou-se exclusivamente aos cuidados do lar, sem desempenhar qualquer atividade laboral contínua ou de gestão nas empresas familiares.
A fim de perquirir os pressupostos da obrigação alimentar, a instrução do feito contou com amplo acervo probatório documental, tais como as declarações de imposto de renda das partes e das empresas da família administradas pelo réu, além dos extratos de suas movimentações financeiras, bem como depoimentos pessoais colhidos em audiência.
À luz destas provas, o Juízo da 6ª Vara de Família julgou parcialmente procedente o pedido autoral para condenar o réu ao pagamento de R$80.000,00 mensais a título de pensão alimentícia à autora.
No acórdão recorrido, o Tribunal a quo deu parcial provimento ao recurso da autora, para majorar os alimentos definitivos, fixando-os em R$ 160.000,00 mensais, e negou provimento ao recurso do réu, que buscava a improcedência do pedido.
Daí a interposição dos presentes recursos especiais.
Incidentalmente, o réu postulou a concessão de efeito suspensivo ao seu recurso especial, pedido que foi acolhido pela e. Ministra Isabel Gallotti nos autos da TP 05⁄RJ, posteriormente ratificado por este Relator, restaurando-se o valor fixado provisoriamente a título de pensão alimentícia, no montante de R$80.000,00 (oitenta mil reais), e suspendendo a execução provisória promovida pela autora até o julgamento dos recursos especiais pelo colegiado desta Terceira Turma.
Passo, assim, a analisar conjuntamente os recursos, iniciando com a alegação de violação ao art. 1.022 do CPC⁄2015.
I - Negativa de prestação jurisdicional
Neste tópico, verifico, de pronto, que o Tribunal a quo decidiu de modo integral e com fundamentação suficiente a matéria devolvida à sua apreciação, manifestando-se pontualmente sobre todas as questões consideradas omissas e contraditórias pelos recorrentes e refutando-as de modo preciso e adequado.
Com efeito, em relação às omissões apontadas pelo réu, foram explicitados no acórdão recorrido os motivos pelos quais o Tribunal a quo reconheceu a necessidade da autora em receber alimentos e os elementos de prova considerados, a ampla capacidade econômico-financeira do réu de prestá-los e a confusão patrimonial entre as pessoas jurídicas que este administra e as pessoas físicas que as integram, manifestando-se, inclusive, sobre as conclusões da perícia produzida nos embargos de terceiro opostos nos autos do processo n.º 03899002-17.2011.8.0001, que tramita no juízo da 9ª Vara de Família da Comarca do Rio de Janeiro.
Quanto à contradição apontada pela autora, relativa à fixação da pensão em patamar inferior ao postulado e insuficiente à manutenção da realidade social que estava inserida à época da separação do casal, tem-se que o Tribunal a quo detalhou os critérios utilizados para concluir que a verba fixada a título de alimentos definitivos era adequada e atendia aos parâmetros estabelecidos nos artigos 1.694, §1º e 1.695, do Código Civil.
Desse modo, todas as questões necessárias à solução da controvérsia foram tratadas no acórdão recorrido, remanescendo, tão somente a irresignação dos recorrentes com as conclusões contrárias aos seus interesses, o que, a toda evidência, não caracteriza negativa de prestação jurisdicional.
Afasto, assim, as alegações de violação ao art. 1.022⁄CPC⁄2015.
Na sequência, analiso a questão central da controvérsia, relativa à alegação de violação ao art. 1.694, caput e §1º, do Código Civil, objeto de irresignação de ambas as partes, e ao art. 1.695 deste diploma legal, reputado violado pela autora.
II - Violação aos artigos 1.694, caput e §1º, e 1.695 do Código Civil
Em seu recurso especial, o réu aduziu equivocada a interpretação conferida pela Corte de origem ao art. 1.694 do Código Civil, ao considerar que os alimentos civis devem garantir a manutenção do padrão de vida dos ex-cônjuges e não apenas a sobrevivência digna do alimentado, o que acarretou a fixação de quantum alimentar em patamares muito superiores às necessidades da autora.
Segundo alegou, fora atribuído aos alimentos civis alcance que somente poderiam ter os alimentos compensatórios, os quais foram pleiteados em ação própria.
A autora, por sua vez, sustentou inobservado o requisito da proporcionalidade na fixação do quantum alimentar, pois apesar de majorado de R$80.000,00 (oitenta mil reais) para R$160.000,00 (cento e sessenta mil reais), tal valor não seria hábil à manutenção do padrão de vida que desfrutava ao tempo do casamento, já que não possui patrimônio ou renda pessoal para tanto, remanescendo o sentimento de humilhação e violação da sua dignidade, considerando a realidade social desfrutada até hoje pelo réu e pelos filhos comuns.
Não lhes assistem razão, contudo.
Os alimentos devidos entre cônjuges são os denominados alimentos civis - nos termos do art. 1.694 do Código Civil, e decorrem do dever de mútua assistência inerente ao casamento, que é mantido após o rompimento do affectio maritalis quando presentes os requisitos previstos no art. 1.695 deste diploma legal, verbis:
Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los sem desfalque do necessário ao seu sustento.
 
Nestas hipóteses, o dever de mútua assistência se transforma, com fundamento nos princípios da solidariedade familiar e da dignidade da pessoa humana, em obrigação alimentar, tendo em vista a prévia comunhão de vida com a qual um dia o ex-casal anuiu.
É o efeito residual do matrimônio.
quantum alimentar deve ser fixado na medida da necessidade do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada, cuja aferição decorre da análise das peculiaridades fáticas de cada caso concreto e dentro das balizas da proporcionalidade.
Trata-se do que a doutrina e a jurisprudência têm denominado de trinômio alimentar - necessidade⁄possibilidade⁄proporcionalidade.
Esses pressupostos da obrigação alimentar são extraídos do §1º do art. 1.694 do Código Civil, verbis:
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
 
§1º Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.
 
Fixadas essas premissas, deve-se analisar, de início, todas as peculiaridades e circunstâncias do caso concreto para a aferição da capacidade de autossustento do cônjuge que pleiteia alimentos.
Isso porque, com esteio na isonomia constitucional entre cônjuges e considerando as mudanças sociais e culturais daí advindas, que alçaram a mulher à provedora da sua própria subsistência, esta Corte Superior de Justiça considera excepcional a obrigação alimentar entre cônjuges, de modo que, quando devida, ostenta caráter assistencial e transitório, não mais se presumindo, ordinariamente, a necessidade.
Esta igualdade da mulher na relação conjugal, entretanto, não está totalmente consolidada na sociedade brasileira, remanescendo modelos familiares patriarcais, nos quais o marido é mantido como provedor, enquanto a esposa se dedica aos cuidados do lar e dos filhos, abstendo-se da prática de atividade profissional remunerada.
Considerando, assim, a heterogeneidade da sociedade brasileira, esta Terceira Turma, no julgamento do REsp n.º 933.355⁄SP, DJe 11⁄04⁄2008, a partir do judicioso voto da Relatora, a e. Ministra Nancy Andrighi, traçou balizas conjunturais indicativas da necessidade de quem pleiteia alimentos, ou, ainda, sinalizem no sentido de sua inexistência.
No que importa ao presente julgamento, ficou assentado que a necessidade há de ser considerada presumida na hipótese de ex-conjuge que, em decorrência da combinação idade avançada e deficiência⁄desatualização na formação educacional, não consegue ou apresenta enorme dificuldade para se estabelecer profissionalmente com remuneração digna.
Conforme ponderou Sua Excelência, "inadmissível que após um longo período de relação conjugal – usualmente, mas não necessariamente, mãe que se dedica, com exclusividade, à criação dos filhos e administração do lar–, seja o ex-cônjuge tangido ao mercado de trabalho, sem qualificação técnica ou experiência que o habilite a conseguir emprego condizente com sua realidade social".
Nesta mesma linha seguiram outros julgados da Terceira e Quarta Turmas desta Corte, dos quais destaco o REsp n.º 1205408⁄RJ, também da relatoria da e. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 29⁄06⁄2011, em que reafirmado o entendimento de que a perenização da obrigação alimentar, a excepcionar a regra da temporalidade, somente se justifica quando constatada a impossibilidade prática do ex-cônjuge inserir-se no mercado de trabalho em posto que lhe possibilite, ao menos em tese, alcançar o padrão social que antes detinha, ou, ainda, por doença própria ou de algum dependente comum, sob sua guarda.
Também nesse sentido, os seguintes julgados:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DIVÓRCIO CUMULADA COM ALIMENTOS. ALIMENTOS. EX-CÔNJUGES. SÚMULA 7⁄STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Nos termos da orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, os alimentos devidos entre ex-cônjuges devem ter caráter excepcional e transitório, excetuando somente esta regra quando um dos cônjuges não detenha mais condições de reinserção no mercado de trabalho ou de readquirir sua autonomia financeira, seja em razão da idade avançada ou do acometimento de problemas de saúde. Precedentes.
2. Na hipótese dos autos, a Corte de origem assentou, mediante o exame do suporte fático-probatório dos autos, que a agravante não comprovou a impossibilidade de suprir sua subsistência por seus próprios meios, não estando caracterizados os elementos que configurem o dever do ora recorrido em prestar alimentos à recorrente.  3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1062008⁄MG, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, DJe 01⁄08⁄2017);
 
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. EXONERAÇÃO. OBRIGAÇÃO ALIMENTAR PROLONGADA. OCIOSIDADE. POSSIBILIDADE. PARENTESCO. SOLIDARIEDADE. ARTIGOS 1.694 E 1.695 DO CÓDIGO CIVIL. NOVO PEDIDO.
1. Cinge-se a controvérsia a definir se é possível a fixação indefinida de alimentos a ex-cônjuge, que, à época da decretação dos alimentos, possuía condições para sua inserção no mercado de trabalho.  (...)
3. O dever de prestar alimentos entre ex-cônjuges é regra excepcional que desafia interpretação restritiva, ressalvadas as peculiariedades do caso concreto, tais como a impossibilidade do beneficiário em laborar ou eventual acometimento de doença invalidante.
(...) 7. Recurso especial provido. (REsp 1608413⁄MG, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, DJe 05⁄05⁄2017).
 
In casu, exatamente neste norte interpretativo amparou-se o Tribunal quo ao perquirir a necessidade da autora ao recebimento dos alimentos.
Na dicção do acórdão recorrido, "a família sempre viveu em padrão altíssimo, mantido pela atividade econômica do varão", "a esposa, apesar de ser advogada, sempre se dedicou exclusivamente aos cuidados com o lar desde o início da união" e aos "65 anos, não tem como manter o padrão de vida a que o ex-casal sempre usufruiu, sem a contribuição do ex-marido", "necessitando do suporte financeiro do réu para cumprir as obrigações já assumidas e manter, ainda que parcialmente, o padrão social a que está acostumada" (fl. 3641).
Reconheceu-se, também, a insuficiência da sua renda mensal, decorrente de bens pessoais e de previdência social, pois "tais valores sequer se aproximam do suficiente para garantir-lhe uma condição social semelhante a que ostentava no estado de casada" (fl. 1248).
A conjuntura familiar dos recorrentes, como se observa, bem se amolda à situação excepcional descrita nos julgados antes referidos.
Neste cenário, é evidente a dificuldade da autora em inserir-se novamente no mercado de trabalho, tendo em vista a sua idade e o período de afastamento, sendo certo, ademais, que "o réu controla com exclusividade todo o patrimônio e os vultuosos rendimentos das empresas da família", nada destinando à autora além da pensão alimentícia a que fora condenado na sentença (fl. 3640).
Por outro lado, note-se - e aqui reside o ponto fulcral objeto da irresignação de ambas as partes, que a realidade social vivenciada pelo ex-casal à época da separação foi o fator referencial determinante utilizado pelo Tribunal a quo para aferir a necessidade da autora e, sobretudo, mensurar a obrigação alimentar.
Com efeito, essa "realidade social" a que se refere a Corte local nada mais é do que a medida da necessidade do cônjuge pleiteante de alimentos.
Por conseguinte, uma vez constatada a sua incapacidade de garantir, com seus próprios rendimentos, a sua condição social, fará jus à fixação de uma pensão alimentícia condizente àquela realidade social anterior à ruptura do casamento, a ser prestada pelo outro cônjuge, conjugada, evidentemente, à possibilidade deste em prestá-los.
À propósito, "[...] a realidade social vivenciada pelo casal ao longo da união deve ser fator determinante para a fixação dos alimentos", ainda que "se mitigue a regra inserta no art. 1.694 do CC⁄02 - de que os os alimentos devidos, na hipótese, são aqueles compatíveis com a condição social do alimentado -  não se pode albergar a possibilidade de que haja elevado descompasso entre o status anterior e aquele que será propiciado pela atividade laborativa possível" (REsp n.º 1025769⁄MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJ 24⁄08⁄2010).
Nesse sentido, elucidativa é a lição trazida por Rolf Madaleno (in Curso de Direito de Família, 5. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 976):
Tendo o casal organizado sua vida familiar para manter um dos parceiros como provedor e o outro encarregado da retaguarda nas atenções com os filhos e com a habitação nupcial, não pode o cônjuge ou convivente provedor pretender com a separação romper unilateralmente o tácito acordo do casal e exigir da parceria a renúncia alimentar.
 
É direito fundamental da esposa que se dedicou exclusivamente ao lar, usufruir do mesmo padrão socioeconômico vivido durante a unidade conjugal, em condições dignas para ela e para os filhos sob a sua custódiaNaquelas relações efetivas cujos hábitos e ajustes trataram de criar uma relação de dependência econômica do casal, por decisão e livre adesão dos cônjuges, não pode este acordo ser frustrado pelo corte abrupto dos recursos, ou pela sensível redução dos aportes financeiros, livremente alcançados atendiam as necessidades familiares em concordância com os rendimentos do provedor.
 
Também nessa linha, já se decidiu, em ação de alimentos entre ex-cônjuges, ser "[...] princípio do direito alimentar que, observado o caso concreto, tanto quanto possível, a pensão seja fixada, considerando-se a capacidade do alimentante e o padrão de vida propiciado à alimentada" (REsp 1353941⁄RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Rel. p⁄ Acórdão o Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, julgado em 16⁄04⁄2013, DJe 24⁄05⁄2013).
Sob o prisma da literalidade, aliás, outra não pode ser a conclusão a se extrair do caput do art. 1.694 do Código Civil, pois, quisesse o legislador que os alimentos devidos entre cônjuges se restringissem ao necessarium vitae (alimentos naturais)não teria incluído na redação deste artigo a expressão "de que necessitam para viver de modo compatível com a sua condição social", sequer subsistindo o elemento da culpa a justificar a restrição propugnada.
A própria definição clássica de alimentos civis, de acordo com Maria Berenice Dias (in Alimentos, 5. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 32), é de que se destinam "a manter a qualidade de vida do credor, de modo a preservar o mesmo padrão social do alimentante", direito assegurado a todo beneficiário - filhos, pais, parentes, cônjuges e companheiros, independentemente da origem da obrigação.
Note-se, porém, conforme assinalou o e. Ministro Antônio Carlos Ferreira, em voto proferido no julgamento do REsp n.º 1290313, do qual era Relator, que "o legislador, ao dispor sobre a obrigação relativa aos alimentos civis entre cônjuges e companheiros, não delimitou a extensão da expressão 'condição social', cujo exame é imprescindível para a fixação da mencionada prestação", de modo que, "aferir a condição social, de forma isolada, mercê da imprecisão e do elevado nível de subjetividade, pode ensejar excessos".
A solução, esclareceu Sua Excelência, citando a doutrina de Milton Paulo Carvalho Filho, é "a utilização do critério da proporcionalidade entre as variáveis (necessidade⁄possibilidade)", o que permitirá ao juiz "estabelecer uma prestação alimentícia de forma racional e equilibrada".
Sobre a regra da proporcionalidade, valho-me da doutrina de Yussef Said Cahali (in Dos Alimentos, 6. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 518⁄519):
Tal como os pressupostos da necessidade e da possibilidade, a regra da proporção é maleável e circunstancial, esquivando-se o Código, acertadamente, em estabelecer-lhe os respectivos percentuais, pois a final se resolve em juízo de fato ou valorativo o julgado que fixa a pensão.
 
Conforme assinalava Sílvio Rodrigues, o dispositivo "não significa que, considerando essas duas grandezas (necessidade e possibilidade), se deva inexoravelmente tirar uma resultante aritmética, como, por exemplo, fixando sempre os alimentos em um terço ou em dois quintos dos ganhos do alimentante.
 
Tais ganhos, bem como as necessidades do alimentado, são parâmetros onde se inspirará o juiz para fixar a pensão alimentícia. O legislador quis deliberadamente ser vago, fixando apenas um standard jurídico, abrindo ao juiz um extenso campo de ação, capaz de possibilitar-lhe o enquadramento dos mais variados casos"
(...)
Daí dizer-se que, quando o Código Civil determina que alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades da reclamante e dos recursos da pessoa obrigada, está deixando ao prudente critério do juiz a estimativa, para que bem se pesem aquelas e estas, não estando o julgador adstrito ao princípio da estrita legalidade.
- grifou-se
 
À luz, portanto, do critério da proporcionalidade, tem-se que a estrutura econômica e social de cada família deve ser dimensionada casuisticamente e conforme o prudente arbítrio do julgador, admitindo-se alguns parâmetros sugestivos a serem considerados para mensurar a obrigação alimentar, tais como aqueles trazidos por Rolf Madaleno em obra já citada: o patrimônio e os recursos do casal ao tempo da coabitação (p. 855).
Estes critérios serão "os marcos de exteriorização da padronagem social e econômica do casal, permitindo aferir com boa margem de segurança, a gradação financeira da pensão a ser prestada depois da ruptura da união".
Deve-se atentar, contudo, que compatibilidade do pensionamento à manutenção da condição econômica do alimentante precisa ser considerada como uma "aproximação possível" às anteriores condições de vida.
Segundo pondera Paulo Lôbo (in Direito Civil, v. 5, Famílias, 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 361):
A lei não exige que as condições de vida social e econômica que o cônjuge alimentando desfrutava sejam mantidas. O que se exige é que os alimentos assegurem compatibilidade com sua condição social, ainda que seu padrão de vida anterior não seja mantido, o que sempre ocorre, pois a separação cria novos encargos financeiros para os ex-cônjuges e redução patrimonial.
 
No sentido de condição social não está o de garantia de aquisição de bens e serviços supérfluos.
 
O que determina a lei é que, considerando os recursos do alimentante, o ex-cônjuge não seja obrigado a baixar na chamada escala social com prejuízo das relações de grupos sociais que integravam o seu modo de vida.
 
Naturalmente, até mesmo nas famílias mais abastadas a separação dos cônjuges acarreta a queda do padrão anterior.
É por isso que os alimentos não podem ser pleiteados com base "no simplista cálculo aritmético que importe no rateio proporcional da renda integral da desfeita família", como advertiu a e. Ministra Nancy Andrighiem voto proferido no julgamento de recurso já referido, o REsp n.º 1205408⁄RJ, pela Terceira Turma, do qual foi Relatora.
Conforme enfatizou Sua Excelência, "a condição social deve ser analisada à luz de padrões mais amplos, emergindo, mediante inevitável correlação com a divisão social em classes, critério que, conquanto impreciso, ao menos aponte norte ao julgador que deverá, a partir desses valores e das particularidades de cada processo, reconhecer ou não a necessidade dos alimentos pleiteados e, se for o caso, arbitrá-los".
Pois bem, sobre todos estes aspectos, o Tribunal estadual, amparado em ampla cognição fático-probatória e a partir das alegações deduzidas pelas partes, assentou, em síntese, que:
(1) as condições econômicas e sociais das partes remetem a elevado padrão de vida, exteriorizado por meio do vasto patrimônio e dos rendimentos vultuosos oriundos das empresas familiares, as quais são administradas exclusivamente pelo réu, que possui livre disposição de todo o capital destas empresas;
(2) a autora mantinha elevadíssimo padrão financeiro e social, viajando para o exterior várias vezes ao ano, hospedando-se nos melhores hotéis, comprando joias e obras de arte, e participando de eventos da alta sociedade, inclusive beneficentes, enfim, uma condição social infinitamente superior à média dos brasileiros (fl. 1247);
(3) após a separação, "foi levada a reduzir drasticamente seus gastos com diversos itens mensais de suas despesas, tais como funcionários, telefone, abastecimento de veículos, cabeleireiro e despesas básicas da casa de Angra dos Reis" (fl. 3744);
(4) até a data do divórcio das partes, inexistiam débitos da autora com terceiros, situação modificada após o divórcio, em 2011, quando teve que fazer sucessivos e regulares empréstimos junto a seu irmão, que passou a pagar diretamente, como fazia seu ex-marido, muitas de suas despesas, terminando o ano de 2011 com um débito de R$1.013.523,00 (fl. 3750);
(5) as possibilidades financeiras do réu apuradas nos autos são compatíveis com o seu status profissional, gestor de empresas familiares cujos faturamentos mensais alcançam cifras na casa dos milhões, das quais aufere rendimentos, a título de lucros e dividendos, igualmente elevados, além daqueles provenientes de aluguel de shopping que está em seu nome, no valor de R$280.000,00 ao mês;
(6) em seu depoimento pessoal, o réu afirmou que recebe, a título de dividendos, aproximadamente R$380.000,00 mensais, o que foi reafirmado em suas razões recursais;
(7) o valor retirado oficialmente pelo réu, a título de lucros e dividendos, apenas da empresa GB Armazéns Gerais LTDA, no ano de 2009, antes, portanto, do divórcio, foi de R$19.060.786,53, ao passo que no ano de 2012, após o divórcio esse valor caiu para R$4.138.000,00, sofrendo substancial redução, embora os negócios da família tenham continuado a prosperar (fl. 3635);
(8) após a separação de fato e a decretação do divórcio, houve um aumento de 3.600% dos valores a título de serviços de pessoas físicas para a empresa, ao mesmo tempo em que ocorreu uma drástica redução da retirada mensal do réu a título de lucros e dividendos (fl. 3636);
(9) a confusão patrimonial entre as pessoas jurídicas que o réu administra e as pessoas físicas que as integram, corroborada pelo fato de que todas as suas despesas são pagas, direta ou indiretamente, por estas empresas (fl. 3638);
(10) embora seja certo que a autora não conseguirá manter, com o pensionamento fixado, o padrão econômico igual ao que detinha à época do casamento, poderá manter um elevado nível de vida, suficiente para afastar o justificável sentimento de humilhação reiteradamente afirmado ao longo do feito (fl. 3642).
Confiram-se, ainda, os seguintes excertos, extraídos do acórdão recorrido (fls. 3628⁄3645), nos quais se identifica a análise minuciosa do Tribunal a quo acerca dos ativos e movimentações financeiras do réu e do conglomerado de empresas familiares, verbis:
Os documentos acostados aos autos, notadamente a fls. 1985, demonstram que a empresa GB Armazéns Gerais Ltda controla, com 51,01% das quotas, a empresa Parso Participações Societárias Ltda. Esta, por sua vez, detém o controle de 100% da empresa Rio Minas 10 Empreendimentos Ltda (fls. 1.985). Observe-se que o réu administra todas as três empresas e delas aufere lucros e dividendos, podendo ainda fazer retiradas pessoais, conforme documentado a fls. 1967,1990 e 2031.
(...)
Observe-se que a autora recebeu 880.254 quotas na condição de nova sócia, ao passo que foi constituído em favor do réu, no parágrafo terceiro da cláusula quarta, o usufruto vitalício das 4.401.270 quotas que compõem a integralidade do capital social da referida sociedade, com poderes plenos para administrar, votar, receber dividendos, lucros, bem como praticar todos os demais atos necessários à gestão da sociedade empresária, com dispensa expressa da obrigação de prestar contas.
Portanto, tem o réu livre disposição de todo o capital representado pelas empresas que controla, delas auferindo, sem qualquer necessidade de prestar contas, todos os rendimentos, lucros e dividendos, em caráter vitalício (fls. 414-421), nada recebendo a autora proporcionalmente as quotas que possui.
(...)
Constata-se por meio dos documentos encaminhados pela Receita Federal e por diversas instituições financeiras (fls. 1514-1864) que houve vultosa movimentação financeira entre as empresas controladas pelo réu, bem como os saldos e as retiradas das aplicações em CDB, o que está em consonância com as alegações autorais sobre a real capacidade econômico-financeira do réu e a confusão patrimonial entre pessoa física e pessoas jurídicas.
Nos referidos extratos de conta corrente constam transferência para conta corrente pessoa jurídica, com o nome dos respectivos beneficiários. Destacam-se os lançamentos nos extratos de conta corrente do Banco Bradesco, conta nº 38.193-4, agência 3369-3, da empresa Parso Participações, onde se observa em 28⁄11⁄2011 a transferência, sob a rubrica TED Transf Elet Dispon Remet Gilberto André B Junior, no valor de R$ 699.531,64. Em 07⁄12⁄2011, consta (a) TED Transf Elet Dispon Remet. Eduardo Bonaparte Buffara, no valor de R$1.048.292,45, e TED Transf Elet Dispon Remet. Ana Carolina B. Buffara, no valor de R$ 2.098.994,92. Em 12⁄12⁄2011 o resgate de papeis nos valores de R$ 4.367,39, R$ 5.000,00, R$2.098.662,76 e R$ 1.379.969,19. Em 12⁄12⁄2011 transf cc cc PJ GB Armazéns Gerais no valor de R$ 550.000,00 (fls. 1.618, indexação 1655).
Com relação à empresa GB Armazéns da qual a autora passou a figurar como sócia, mas sem gestão ou recebimento de qualquer valor, destaca-se a movimentação da conta corrente 14.560-2, agência 3369- 3, junto ao Banco Bradesco. Observa-se a fls. 1.636 (indexação 1674), em 11⁄11⁄2011, o resgaste de papeis nos valores de R$ 812,47, R$1.486.864,93 e R$ 267.114,08. A fls. 1.726 (indexação 1767) consta, em 11⁄01⁄2013, a rubrica “trans entre agenc dinh Gilberto Andre Buffara” nos valores de R$17.248,90 e R$ 28.748,16, “transf cc para cc PJ Gilberto Andre Buffara”, de R$ 100.000,00. A fls. 1728 (indexação 1769) constam os lançamentos, em 21⁄01⁄2013, TV por assinatura Net Rio, no valor de R$408,33, Tim Celular nos valores de R$159,90, R$ 164,80, R$ 134,50, R$ 3.316,29, Oi fixo nos valores de R$ 1.873,01, R$ 1.710,00, R$ 329,70, R$ 191,35, R$ 133,15. A fls. 1.730-1732 (indexação 1771-1773) consta, em 05⁄02⁄2013, a transferência entre agências de dinheiro, como favorecido Gilberto Andre Buffara, nos valores de R$ 17.248, 90 e R$ 28.748,15, em 08⁄02⁄2013 Bradesco Vida e Previdência nos valores R$ 136,63, R$6.493,08 e R$ 273,25. A fls. 1735 (indexação 1776), destaca-se, em 28⁄02⁄2013, a rubrica “Transf CC para CC PJ Gilberto André Buffara”, no valor de R$ 100.000,00. A fls. 1736 (indexação 1777) consta, em 06⁄03⁄0013, o lançamento de resgate mercado aberto nos valores de R$4.088.370,33, R$ 124.397,53, R$920.642,54 e R$ 13.297,55.
Os valores movimentados a título de investimento em CDB referentes somente à empresa GB Armazéns Gerais, conforme fls. 1785-1800 (indexação 1826-1842) foram de, em novembro de 2011, R$433.866,23; em dezembro de 2011, R$ 700.895,16; em janeiro de 2012, R$ 206.045,99; em fevereiro de 2012, R$ 249.185,15; em março de 2012, de R$ 817.056,03; em abril de 2012, R$ 2.298.608,71; em maio de 2012, R$ 1.645.204,00; em junho de 2012, R$ 2.691.720,06; em julho de 2012, R$ 1.691.499,76; em agosto de 2012, R$ 311.865,07; em outubro de 2012, R$ 447.082,55; em novembro de 2012, R$ 200.701,06, e em dezembro de 2012, R$9.420.175,83.
Note-se que somente pela GB Armazéns Gerais constam resgastes líquidos de CDB, no período de 01⁄01⁄2012 a 30⁄06⁄2012, no total de R$ 15.946.928,92 (fls. 1.801-1.809, indexação 1843-1850) e no período de 01⁄07⁄2012 a 31⁄12⁄2012, o montante de R$ 17.222.280,79 (fls. 1809, indexação 1851-1859). Em 2013, destaca-se a posição em janeiro no valor de R$ 9.141.755,16 (indexação 1860) e em outubro no montante de R$12.593.554,30 (indexação1883).
A parte da declaração de rendas da pessoa física do réu relativa a dívidas e ônus reais, do exercício de 2008, indica que no exercício de 2007 (ano calendário 2006) o réu possuía dívida com a GB Armazéns no valor de R$ 13.991.669,34, o que no exercício de 2008 (ano calendário 2007), aumentou consideravelmente para o montante de R$75.901.038,95 (fls. 3001, indexação 3112).
As declarações de imposto de renda pessoa física do réu apontam que o mesmo recebeu da GB Armazéns Gerais no ano de 2009 (ano calendário 2008), a título de lucros e dividendos, a quantia de R$19.060.766,53 (fls. 2.977 – indexação 3086), e no exercício de 2010, ano calendário 2009, recebeu o valor de R$ 3.580.000,00 (fls. 2.992-indexação 3103). Na declaração de imposto de renda do réu do exercício de 2011, ano calendário 2010, consta o recebimento de R$ 4.605.000,00.
Cumpre salientar que as declarações de imposto de renda pessoa física do réu referente aos exercícios de 2008 e 2012 não vieram aos autos.
Na declaração de imposto de renda de 2009 da empresa GB Armazéns Gerais (fls. 2.052-indexação 2331) consta que o réu recebeu a título de dividendos o montante de R$ 19.060.786,53, enquanto Ana Carolina Bonaparte Buffara recebeu R$ 17.250.000,00, Eduardo Bonaparte Buffara, R$ 17.250.000,00, Antonio Claudo Lage Buffara, R$ 11.500.00,00 e Gilberto André Buffara Junior os mesmos R$ 11.500.000,00.
Na declaração de renda de 2010 da empresa GB Armazéns Gerais (CNPJ 77.376.093⁄0001-88) consta a fls. 2237 (indexação 2316) lucros e dividendos pagos ao réu, Gilberto Buffara, no valor de R$3.650.000,00, enquanto na declaração de 2013 da mesma empresa consta o recebimento pelo réu, a título de lucros e dividendos, a quantia de R$4.139.000,00(fls. 2050, indexação 2125).
(...)
Assim, em 2012, o total da receita de alugueis foi de R$39.114.917,69, conforme fls. 2048 (indexação 2123), o que gerou uma renda média mensal, ao longo de 2012, de R$ 3.259.576 47.
Note-se que somente em relação à empresa GB Armazéns Gerais LTDA, no ano de 2010, conforme fls. 155-161, o réu teve acesso a um rendimento mensal médio, à época da separação das partes, no montante de R$ 3.000.000,00 mensais.
É importante mencionar que o valor retirado oficialmente pelo réu, a título de lucros e dividendos apenas da empresa GB Armazéns Gerais LTDA, no ano de 2009, antes, portanto, do divórcio, foi de R$19.060.786,53, conforme fls. 2252 (indexação 2331), ao passo que no ano de 2012, após o divórcio esse valor caiu para R$ 4.139.000,00 (fls. 2050 e indexação 2125), sofrendo substancial redução, embora os negócios da famílias tenham continuado a prosperar.
Depreende-se das declarações de imposto de renda de pessoas jurídicas das empresas administradas pelo réu que, embora tenha ocorrido decréscimo na retirada pessoal mensal do réu entre 2008 e 2012 a título de lucros e dividendos, houve um aumento substancial em outros campos, a denotar modificação de modo de lançamento de recebimentos, como por exemplo, serviços prestados por pessoa física, que se refere à Ficha 70-Informações Previdenciárias, para a empresa GB Armazéns Gerais que apresentou os seguintes valores: DIPJ 2009 (ano 2008), R$ 120.292,98 (fls. 2255, indexação 2334); DIPJ 2010 (ano 2009), zero (fls. 2239, indexação 2318); DIPJ 2011 (ano 2010), R$ 9.493,00; DIPJ 2012 (ano 2011- ano do divórcio), R$ 1.761.119,35 (fls. 2078, indexação 2153), e DIPJ 2013 (ano 2012), R$ 4.350.852,42 (fls. 2053-indexação 2128). Isto significa dizer que houve um aumento de 3.600% dos valores a título de serviços de pessoas físicas para a empresa após a separação de fato e o posterior divórcio decretado em 26⁄11⁄2012, ou seja, em 2011 e 2012, ao mesmo tempo em que ocorreu uma drástica redução da retirada mensal pelo réu a título de lucros e dividendos.
Vale notar ainda que somente a empresa GB Armazéns Gerais obteve no ano de 2009 (DIPJ 2010, fls. 2236, indexação 2315) receita de vendas e serviços no total de R$ 28.611.755,65; no ano de 2011 (DIPJ 2012, fls. 2072, indexação 2147), lucro acumulado de R$163.439.931,22, no ano de 2012 (DIPJ 2013, fls. 2047, indexação 2122), lucro acumulado de R$230.177.890,23.
Como consta na DIPJ 2012 da empresa Rio Minas 10 Empreendimentos Imobiliários Ltda esta obteve a receita de alugueis, que consta na Ficha 14 A, item 07, como receita bruta sujeita ao percentual de 7%, no 1º trimestre, no valor de R$ 10.944.580,84, no 2º Trimestre, no valor de R$ 13.983.002,69, no 3º Trimestre, no valor de R$ 14.124.691,60 e no 4º Trimestre, no valor de R$ 2.816.436,13, conforme fls. 2008-2011 (indexação 2083-2086).
Na DIPJ 2013, Ficha 14-A, item 07, a fls. 1991 (indexação 2066), a receita de alugueis da empresa Rio Minas 10 Empreendimentos Ltda, no 4º Trimestre de 2012, quando esta empresa já pertencia integralmente à família Buffara, sendo controlada e administrada unicamente pelo réu, totalizou o valor de R$ 5.949.222,34, ou seja, correspondente a R$2.974.611,17 por mês.
Deste modo, somadas as receitas mensais de alugueis somente destas duas empresas - GB Armazéns Gerais Ltda e Rio Minas 10 Empreendimentos Ltda -, resta comprovado o recebimento de receita a título de alugueis no valor mensal de R$ 6.234.187,64, quantia esta a que o réu tem acesso mensalmente, por força do usufruto vitalício a seu favor e dos poderes de administração e gestão das empresas, conforme consta do contrato social acima referenciado.
Como se verifica a fls. 1983 (indexação 2058), Ficha 38, item 5, da DIPJ 2013, a empresa Parso Participações Societárias Ltda, obteve um  lucro líquido no ano 2012 de R$ 20.519.538,63 e lucro líquido acumulado no montante de R$ 28.519.333,72.
No tocante à confusão patrimonial com as empresas do réu, efetivamente constatada nos autos, foi asseverado na sentença proferida pelo Juízo da 9ª Vara de Família da Comarca da Capital, nos autos dos embargos de terceiro, processo nº 0389002-17.2011.8.19.0001, cuja cópia foi acostada a fls. 2761-2769 destes autos (indexação 2869-2877), que “no caso em apreço, a confusão patrimonial entre o conglomerado empresarial da família Buffara, controlado pelo ex-cônjuge-varão, e a sociedade conjugal constituída pelo ex-casal é manifesta, levando-se em consideração que figuram em nome daquele diversos bens de natureza familiar, como casa de veraneio, iate e o próprio imóvel que serve de residência ao ex-cônjuge- virago” (fls. 2768).
Deve-se ter com conta que o próprio réu afirma que todas as despesas da família são pagas, direta ou indiretamente pelas empresas, o que reduz consideravelmente suas despesas pessoais e reforça a confusão patrimonial entre as pessoas jurídicas e as pessoas físicas que a integram, especialmente o réu usufrutuário.
Além disso, destaca-se que o réu também aufere as receitas de alugueis do Shopping Polo Têxtil, que está em seu nome, o que lhe proporciona rendimentos mensais no valor de R$ 280.000,00, conforme afirma o réu no depoimento pessoal transcrito a fls. 3042 (indexação 3153), o que corresponde a R$ 3.360.000,00 ao ano, tudo evidenciado pelos documentos a fls. 2888-2906 (indexação 2996-3017).
Em seu depoimento pessoal (fls. 3049-3050, indexação 3160- 3161), ao ser indagado se a autora retira algum valor das empresas e se ela é sócia, o réu afirmou que a autora é sócia da empresa e não retira nenhum valor, pois é “acionista” e não funcionária. E que outro sócio retira valores, mas não como sócio e sim pelo trabalho que faz, como sócio que trabalha.
Afirma que “as empresas dão lucro e os dividendos que ela distribui gira em torno do que eu gasto, trezentos e poucos mil reais por mês”.
Ainda em seu depoimento pessoal transcrito a fls. 3050 (indexação 3161), menciona o réu que “todo lucro da empresa está sendo reinvestido, aqueles que trabalham ao invés de retirar como pro labore pagar INSS a gente retira como lucro, adiantamento de lucro que não tem tributação de nada, de imposto de renda, INSS, nada.”, esclarecendo, portanto, que os ganhos auferidos são líquidos. Por outro lado, reitera o réu que não é sócio das empresas, mas sim usufrutuário (fls. 3051- indexação 3162) e que retira dividendos como usufrutuário.
(...)
Diante de todos os elementos de prova aqui referidos resumidamente, é possível concluir que o réu controla com exclusividade todo o patrimônio e os vultosos rendimentos das empresas da família, sem a necessidade de qualquer prestação de contas, destinando à autora parcela desproporcionalmente pequena desses rendimentos por meio dos alimentos a que foi condenado a pagar, ou seja, R$ 80.000,00 brutos ou R$ 58.000,00 líquidos, abatido o imposto de renda. Em evidente contraste, sua capacidade financeira, diante da prosperidade crescente dos negócios da família, é plenamente compatível com as alegações autorais.
 
A par dessas diretrizes fático-probatórias, as quais evidenciaram não apenas a padronagem social do ex-casal ao tempo da separação, mas também, a condição socioeconômica atual do alimentante, assim como a necessidade da credora, verifica-se que o Tribunal a quo considerou cabível a majoração da pensão alimentícia em favor da autora, entendendo razoável o montante de R$160.000,00 (cento e sessenta mil reais) mensais.
Com isso, mostra-se inviável a revisão das conclusões alcançadas no acórdão recorrido acerca da existência dos elementos necessários para a concessão da pensão alimentícia, especialmente para majorar ainda mais o quantum fixado, conforme postulou a autora, ou, até mesmo, para reconhecer a desnecessidade da verba alimentar, como quer o réu, por implicar, necessariamente, o revolvimento do extenso conjunto probatório dos autos.
Esta providência, como é cediço, é vedada a esta Corte, a teor da Súmula n.º 07⁄STJ, apenas se justificando quando constatado, de plano, evidente exagero ou manifesta irrisão na fixação do montante da pensão alimentícia, a evidenciar situação teratológica, em flagrante violação ao princípio da razoabilidade e às finalidades da lei, o que não se verifica na hipótese dos autos.
Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIALCOMPROVAÇÃO DE TEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL EM SEDE DE AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DO EXPEDIENTE FORENSE. RECESSO. AÇÃO DE ALIMENTOS. OFENSA AOS ARTS. 165, 458, 535, DO CPC. ALIMENTOS DEFINITIVOS. DESPROPORCIONALIDADE. TERMO INICIAL DA COBRANÇA. SÚMULAS STJ⁄7, 211. IMPROVIMENTO.
(...)
4.- Em relação aos alimentos definitivos, é inviável, em sede de recurso especial, a alteração do quantum fixado, cujo arbitramento, nas instâncias ordinárias, ateve-se ao binômino necessidade do alimentando⁄possibilidade do alimentante (art. 1.694, § 1º, do Código Civil), por envolver necessariamente o reexame de provas (Súmula n. 7 do STJ).
5.- Agravo Regimental improvido.
(AgRg no REsp 1392986⁄DF, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, DJe 28⁄10⁄2013);
 
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS. ALTERAÇÃO NA SITUAÇÃO FINANCEIRA DO ALIMENTANTE. VERIFICAÇÃO DO BINÔMIO NECESSIDADE⁄POSSIBILIDADE. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE.
(...)
2. A eg. Corte Estadual entendeu por negar a redução do valor da pensão alimentícia, com esteio nos elementos de prova constantes dos autos, enfatizando a observância do binômio necessidade⁄possibilidade. Nesse contexto, a alteração desse entendimento, tal como pretendida, demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório, o que é vedado pela Súmula 7 do STJ, que dispõe: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial."
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 208.866⁄PB, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, DJe 14⁄02⁄2013);
 
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AGRAVO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FIXAÇÃO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA. ANÁLISE DO VALOR. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INADMISSIBILIDADE.
-O reexame de fatos e provas em recurso especial é inadmissível. -Agravo não provido.
(AgRg no AREsp 51.276⁄MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe 26⁄06⁄2012).
 
Quanto ao mais, não se pode confundir as hipóteses de cabimento dos alimentos compensatórios, que possuem nítido caráter indenizatório, conforme construção doutrinária e jurisprudencial, com aquelas dos alimentos decorrentes das relações de conjugalidade, vinculados estritamente às necessidades daquele que os recebe, de caráter assistencial e suficiente para que o alimentando viva de modo compatível com a sua condição socialcomo é o caso dos autos.
Não se evidencia, assim, o sustentado risco de bis in idem em razão da autora ter postulado em ação própria alimentos compensatórios.
Com efeito, esta ação foi julgada extinta sem julgamento do mérito, decisão mantida pelo Tribunal a quo e, posteriormente, por esta Terceira Turma no julgamento do REsp n.º 1655689⁄RJ, encontrando-se hoje em fase de embargos de declaração.
Conforme consignei naquela oportunidade, a pensão compensatória busca restabelecer o desequilíbrio econômico gerados pelo divórcio, recompensando um dos cônjuges desprovido de bens e de meação pelos eventuais prejuízos provenientes da ruptura da sociedade conjugal.
No caso concreto, como a autora casou-se em regime de comunhão parcial de bens com o réu, fazendo jus, portanto, à futura meação, não haveria que se falar em direito à alimentos compensatórios.
Em conclusão, absolutamente adequada a valoração jurídica dada pelo Tribunal a quo aos fatos e às provas dos autos, perquirindo os elementos basilares da obrigação alimentar em consonância com a orientação jurisprudencial desta Corte e segundo as regras jurídicas aplicáveis à matéria.
Desta maneira, não há falar em violação ao art. 1.694, caput e §1º e 1.695, do Código Civil.
Por fim, o recurso especial do réu devolve ao conhecimento desta Corte Superior mais duas questões.
Passo a analisá-las pontualmente a seguir.
III - Violação aos artigos 396, 397 e 398 do CPC⁄1973 (atuais artigos 434, 435 e 437 do CPC⁄2015)
A irresignação recursal do réu baseia-se na admissão, pelo Tribunal quo, de documentos novos que teriam sido anexados pela recorrida na apelação, dentre os quais uma planilha intitulada de "relação de despesas necessárias para a manutenção do padrão de vida da M. A. anterior à separação".
Não vislumbro, entretanto, violação aos dispositivos legais mencionados, porquanto o Tribunal de origem, inobstante tenha levado em consideração a documentação de fl. 3468, o fez apenas "como espelho para se vislumbrar o padrão social que ocupava à época da separação e o padrão em que a autora vive atualmente", corroborado pelo seu depoimento pessoal, no qual mencionou o total das suas despesas, "confirmando que foi levada a reduzir drasticamente seus gastos com diversos itens mensais de suas despesas", [...] o que demonstra que a matéria foi amplamente discutida nos autos", conforme esclarecido no acórdão dos embargos de declaração (fl. 3744).
Constou, ainda, que "as despesas mencionadas pela autora na planilha por ela apresentada (...) não foram o ponto nodal para a fixação de alimentos, tanto que foram fixados em valor muito abaixo daquele lançado na referida planilha".
Verifica-se, assim, que tais documentos, por si sós, não eram indispensáveis à apreciação da demanda.
Ademais, o réu teve a oportunidade de se manifestar acerca do conteúdo desta planilha em contrarrazões ao recurso de apelação, devidamente apresentadas às fls. 3567⁄3592, quando postulou o desentranhamento.
Inexiste, desse modo, prejuízo à defesa do recorrente, na linha da orientação jurisprudencial desta Corte, tampouco tenho por caracterizada a má-fé da recorrida, que sequer é alegada pelo recorrente.
À propósito:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. JUNTADA DE DOCUMENTO NA FASE RECURSAL. POSSIBILIDADE. PRECLUSÃO. INOCORRÊNCIA. INTIMAÇÃO DA APELADA. INOVAÇÃO DE JULGAMENTO. AGRAVO IMPROVIDO.
1. "A juntada de documentos com a apelação é possível, desde que respeitado o contraditório e inocorrente a má-fé, com fulcro no art. 397 do CPC." (REsp nº 980.191⁄MS, Relatora Ministra Nancy Andrighi, in DJe 10⁄3⁄2008).
2. Reconhecido no acórdão estadual que os documentos juntados na fase recursal apenas corroboravam as alegações das partes e todo o conjunto probatório já encartado aos autos, constituindo-se o próprio fundamento da ação, não há falar em preclusão, a consequencializar eventual violação dos artigos 473 e 517 do Código de Processo Civil. 3. Em sede de agravo regimental não se conhece de alegações estranhas às razões do agravo de instrumento, por vedada a inovação de fundamento.
4. Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1120022⁄SP, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, Primeira Turma, julgado em 18⁄05⁄2010, DJe 02⁄06⁄2010);
 
 
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. JUNTADA DE DOCUMENTOS NOVOS. POSSIBILIDADE. MULTA COMINATÓRIA. FIXAÇÃO NA TUTELA ANTECIPADA. CONDIÇÃO RESOLUTIVA. PLEITO IMPROCEDENTE. INSUBSISTÊNCIA DA MEDIDA COERCITIVA. EFEITO RETROATIVO. PRECLUSÃO DA QUESTÃO. NÃO OCORRÊNCIA. EXAME DE OFÍCIO.
1. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de ser possível a juntada de documentos novos na fase recursal, desde que não se trate de documento indispensável à propositura da ação, não haja má-fé na ocultação do documento e seja ouvida a parte contrária.
(...)
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1362266⁄AL, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Terceira Turma, DJe 10⁄09⁄2015).
 
 
Como reforço argumentativo, acrescento que as despesas da recorrida, explicitadas na referida planilha, vêm sendo alegadas desde a petição inicial e totalizam, exatamente, o valor dos alimentos pleiteados naquela oportunidade, constando dos autos, ainda, planilha semelhante às fls. 315⁄3116, anexada antes da prolação da sentença.
Afasto, assim, a alegação de violação aos artigos 396, 397 e 398 do CPC⁄1973 e passo à análise do último ponto de irresignação recursal do réu.
 
IV - Violação aos artigos 187, 189, 190, 191, 192, 201 e 202 da Lei n.º 6.404⁄76
Aqui também melhor sorte não socorre o recorrente.
Ao que se pode constatar da leitura do acórdão recorrido, o Tribunal quo não adentrou na forma de apuração dos lucros, reservas e dividendos das sociedades anônimas, matérias de que tratam os artigos em comento.
Com efeito, o que o Tribunal de origem fez foi sopesar os sinais exteriores de riqueza do recorrente, a fim de aferir a sua real capacidade financeira e a condição econômica familiar ao tempo da coabitação, analisando as declarações de imposto de renda e os extratos de movimentações financeiras das partes e das empresas familiares.
A partir desta análise, reconheceu-se a alta lucratividade das empresas familiares e a ampla possibilidade financeira do recorrente, decorrente dos dividendos que recebe mensalmente como gestor e usufrutuário, aliado aos rendimentos auferidos do aluguel de shopping que está em seu nome.
Ainda, concluiu-se pela existência de confusão patrimonial entre as empresas familiares e as pessoas físicas que as integram, corroborada pelas movimentações milionárias entre estas e pelo fato de que todas as despesas pessoais do réu e da família são pagas por aquelas empresas, direta ou indiretamente, o que corrobora a assertiva de que o réu "tem livre disposição de todo o capital representado pelas empresas que controla".
Nada dispôs, repita-se, acerca dos dispositivos legais ora reputados violados.
Conforme já decidiu esta Corte, "para que se configure o prequestionamento, é necessário que o tribunal de origem se pronuncie especificamente acerca da matéria articulada pela parte, emitindo juízo de valor em relação aos dispositivos legais indicados e examinando a sua aplicação ou não ao caso concreto", e, ainda, "se a alegada violação não foi discutida na origem e não foi verificada nesta Corte existência de erro, omissão, contradição ou obscuridade, não há falar em prequestionamento da matéria nos termos do art. 1.025 do CPC⁄2015" (AgInt no AREsp 1234093⁄RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Terceira Turma, DJe 03⁄05⁄2018).
Nestas circunstâncias, incide o disposto no enunciado da Súmula n.º 211⁄STJ.
Com essas considerações, deve ser mantido, in totum, o acórdão recorrido.
Ante o exposto, nego provimento aos recursos especiais, ficando revogada a tutela provisória concedida.
Restabelecido o acórdão recorrido, em que majorados os alimentos definitivos, seus efeitos retroagirão à data da citação do réu (art. 13, §2º, da Lei n.º 5.478⁄68), conforme estabelecido pelo Tribunal a quo e na linha da orientação jurisprudencial desta Corte (EREsp 1181119⁄RJ, Rel. p⁄ Acórdão Ministra Maria Isabel Gallotti, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27⁄11⁄2013, DJe 20⁄06⁄2014).

É o voto.

Jurisprudência do stj na íntegra