RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE ALIMENTOS.
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE ALIMENTOS. EXECUÇÃO. CRÉDITO ALIMENTAR. SOBREPOSIÇÃO AO CRÉDITO DECORRENTE DO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA.
1. Não é razoável que o advogado concorra com a parte que o constituiu ao direito a esta devido e por ele defendido.
2. É princípio do direito alimentar que, observado o caso concreto, tanto quanto possível, os alimentos se sobreponham a qualquer outro crédito.
3. Recurso especial desprovido.
(REsp 1380800/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/11/2013, DJe 24/03/2014)
JURISPRUDÊNCIA NA ÍNTEGRA
RELATORA | : | MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE | : | E S DE C E OUTROS |
ADVOGADO | : | SÉRGIO AUGUSTO SCAGLEA DE OLIVEIRA E OUTRO(S) |
RECORRIDO | : | C M T |
ADVOGADOS | : | ANDERSON GONÇALVES DE FREITAS |
JOSÉ NAJA NEME DA SILVA E OUTRO(S) |
RELATORA | : | MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE | : | E S DE C E OUTROS |
ADVOGADO | : | SÉRGIO AUGUSTO SCAGLEA DE OLIVEIRA E OUTRO(S) |
RECORRIDO | : | C M T |
ADVOGADOS | : | ANDERSON GONÇALVES DE FREITAS |
JOSÉ NAJA NEME DA SILVA E OUTRO(S) |
Forte nessas razões, CONHEÇO do recurso especial e lhe DOU PARCIAL PROVIMENTO, para determinar que os recorrentes e a recorrida sejam pagos em proporções iguais.
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RELATORA | : | MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE | : | E S DE C E OUTROS |
ADVOGADO | : | SÉRGIO AUGUSTO SCAGLEA DE OLIVEIRA E OUTRO(S) |
RECORRIDO | : | C M T |
ADVOGADOS | : | ANDERSON GONÇALVES DE FREITAS |
JOSÉ NAJA NEME DA SILVA E OUTRO(S) |
EMENTA
1. Não é razoável que o advogado concorra com a parte que o constituiu ao direito a esta devido e por ele defendido.
2. É princípio do direito alimentar que, observado o caso concreto, tanto quanto possível, os alimentos se sobreponham a qualquer outro crédito.
3. Recurso especial desprovido.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA:
Promovida a penhora de bem imóvel pelos recorrentes em execução de sentença proferida em ação de arbitramento de honorários advocatícios e tendo havido sucessão de penhora de bem pela parte autora da ação de alimentos da qual se originou o crédito exequendo, passaram a concorrer ao direito ao crédito havido na referida ação o advogado e sua cliente.
A relatora, Ministra Nancy Andrighi, em seu voto, conheceu do recurso especial e deu-lhe parcial provimento, determinando que os recorrentes e a recorrida fossem pagos em igual proporção.
Eis o referido voto no ponto em questão:
"A partir do julgamento, pela Corte Especial, do EREsp 706.331⁄PR, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJe de 31.03.2008, o STJ, aderindo ao posicionamento do STF, que também já era adotado pelas 1ª e 3ª Turmas, consolidou o entendimento no sentido de que os honorários advocatícios, sucumbenciais ou contratuais, constituem verba alimentar. O acórdão foi assim ementado:
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - SUCUMBÊNCIA - NATUREZA ALIMENTAR.
- Os honorários advocatícios relativos às condenações por sucumbência têm natureza alimentícia. Eventual dúvida existente sobre essa assertiva desapareceu com o advento da Lei 11.033⁄04, cujo Art. 19, I, refere-se a 'créditos alimentares, inclusive alimentícios.'
Por conseguinte, se, conforme entendimento pacificado desta Corte, ambos os créditos tem natureza alimentícia, não se justifica a distinção entre crédito alimentar em 'sentido estrito' e em 'sentido amplo'.
Por outro lado, de acordo com o CPC, o credor garantido pela penhora tem direito de preferência sobre os bens penhorados e alienados, de sorte a fazer jus ao levantamento do dinheiro depositado para segurar o juízo ou o produto dos bens alienados, até a satisfação integral do seu crédito. Já o art. 711 do CPC preconiza que quando há concorrência entre vários credores, se não houver preferência entre os créditos, deverá ser observada a anterioridade de cada penhora. Assim se há dívida alimentar em confronto com qualquer outra dívida, essa terá preferência, na medida em que 'a dívida alimentar a todas prefere, pois a todas se sobrepõe o direito à vida, em que se funda da parte do alimentário' (CAHALI, Yussef Said, Dos alimentos, 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 98).
Por essa razão, 'a anterioridade de outra penhora, seja qual for a natureza do crédito - civil, fiscal ou previdenciário - e a existência de outro privilégio, geral ou especial, não preterem ao alimentário' (ASSIS, Araken de, Manual da execução, 12ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.994).
Na hipótese dos autos, apesar de as duas penhoras decorrerem de dívida alimentar, há uma diferença entre esses créditos que não pode ser desconsiderada: enquanto a pensão alimentícia é, via de regra, a única fonte dos alimentos devidos ao alimentado, para o advogado, os honorários advocatícios são recebidos em virtude de contratos firmados com diversos clientes.
[...]
Nessa ordem de idéias, quando os dois créditos alimentícios são postos em confronto, deve-se levar em conta que o alimentado depende totalmente do alimentante para sobreviver. No mais das vezes, sua única fonte de renda decorre dos alimentos prestados, e, por esse motivo, se seu crédito ceder completamente ao crédito de honorários advocatícios, poderá haver violação ao princípio da dignidade da pessoa humana.
Por conseguinte, na hipótese dos autos, em que o crédito da recorrida e dos recorrentes constituem verba alimentar, mas um dos credores conta apenas com a verba recebida do devedor para sua sobrevivência, deve-se ponderar o direito à dignidade dos credores.
Nesse sentido, o princípio da máxima efetividade exige que se atribua à norma constitucional o sentido que maior eficácia lhe conceda, o que, no particular, somente pode ser entendido como a possibilidade de se admitir o concurso entre os credores alimentares, a fim de que não haja constrição à dignidade de nenhum dos credores.
Por conseguinte, o recurso especial merece parcial provimento, a fim de que, reconhecido o caráter alimentar dos créditos dos recorrentes e da recorrida, esses créditos sejam pagos em proporções iguais."
Peço vênia à relatora por não concordar com a distribuição equitativa dos créditos.
Entendo haver o imperativo ético do advogado de não sobrepor seu direito ao direito da parte que o constituiu. Estamos falando de ação alimentícia.
A melhor conduta do advogado, ao perceber que a parte não teria condições de arcar com os ônus processuais, especificamente com os honorários advocatícios, seria orientar a cliente a procurar a Defensoria Pública, mas jamais concorrer com ela ao direito pleiteado, sobretudo, tratando-se de crédito de natureza alimentar. O advogado, ao defender a natureza alimentar de seu próprio crédito, sobrepondo-o ao direito de alimentos da parte que o constituiu, traz-nos um argumento irrespondível em matéria de direito alimentar.
Pode o causídico penhorar seu crédito em prejuízo da execução do crédito da cliente, direito que deveria salvaguardar? No meu entender, estaria no limite do razoável, mas de todo aceitável, que o advogado executasse seu crédito concomitantemente ou logo após a execução do crédito da cliente⁄devedora, mas sem desrespeitar o direito sagrado da parte que o constituiu.
Devemos aqui buscar o princípio adequado, aplicar a teoria de Otto Bachof: se a aplicação pura e simples da lei nos levar a um resultado absurdo, devemos buscar um princípio que faça com que se obtenha a justiça no caso concreto. É exatamente essa a teoria que me move aqui a decidir nesse sentido. Ora, a lei protege primeiro aquele que necessita dos alimentos, e não o instrumento que faz realizar esse direito. Vejo que, na espécie, há um desvio ético, data venia. Não considero isso razoável. Em que situação ficarão, hoje, os necessitados de alimentos no Brasil? Não estamos falando de direito obrigacional, de inventário, de defesa de bens; estamos falando de verba necessária ao sustento da parte.
Não é nada emocional, é razoável. Trata-se do princípio da razoabilidade.
Embora concorde com os fundamentos da relatora quanto à interpretação dada ao princípio constitucional da máxima efetividade, que consistiria em "atribuir à norma constitucional o sentido que maior eficácia lhe conceda, o que, no particular, somente pode ser entendido como a possibilidade de se admitir o concurso entre os credores alimentares, a fim de que não haja constrição à dignidade de nenhum dos credores", parece-me que não podemos fazer disso uma regra, abrindo um precedente que legitime a concorrência de crédito alimentar entre o alimentando e seus advogados. Não é esse o propósito da lei e também não é o propósito da Ordem dos Advogados e de tudo o que defende a Ordem em matéria de justiça distributiva no Brasil.
Portanto, aqui, com a devida vênia, entendo não ser justo que se estabeleça uma concorrência entre os honorários do advogado e os alimentos devidos à parte.
Ante o exposto, conheço do recurso especial e nego-lhe provimento para manter a decisão da Corte de origem.
É o voto.
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RELATORA | : | MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE | : | E S DE C E OUTROS |
ADVOGADO | : | SÉRGIO AUGUSTO SCAGLEA DE OLIVEIRA E OUTRO(S) |
RECORRIDO | : | C M T |
ADVOGADOS | : | ANDERSON GONÇALVES DE FREITAS |
JOSÉ NAJA NEME DA SILVA E OUTRO(S) |
Com essas breves considerações, acompanho a divergência, negando provimento ao recurso especial.