RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA E PROCESSUAL CIVIL.
RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA E PROCESSUAL CIVIL. ALIMENTOS. EXECUÇÃO. PROTESTO E INCLUSÃO DO NOME DO DEVEDOR NOS CADASTROS DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO (SPC E SERASA). POSSIBILIDADE. FORMA DE COERÇÃO INDIRETA DO EXECUTADO. MÁXIMA EFETIVIDADE AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA CRIANÇA E ADOLESCENTE. MÍNIMO EXISTENCIAL PARA SOBREVIVÊNCIA.
1. A proteção integral está intimamente ligada ao princípio do melhor interesse da criança e adolescente, pelo qual, no caso concreto, devem os aplicadores do direito buscar a solução que proporcione o maior benefício possível para o menor. Trata-se de princípio constitucional estabelecido pelo art. 227 da CF, com previsão nos arts. 4° e 100, parágrafo único, II, da Lei n.
8.069/1990, no qual se determina a hermenêutica que deve guiar a interpretação do exegeta.
2. O norte nessa seara deve buscar a máxima efetividade aos direitos fundamentais da criança e do adolescente, especificamente criando condições que possibilitem, de maneira concreta, a obtenção dos alimentos para sobrevivência.
3. O art. 461 do CPC traz cláusula geral que autoriza o juiz, a depender das circunstâncias do caso em concreto, adaptar a técnica processual ao perfil do direito material, com vistas à formação de uma solução justa e adequada do conflito, possibilitando que, por meio de alguma medida executiva, se alcance a realização da justiça (CF, art. 5°, XXXXV).
4. O direito de família é campo fértil para a aplicação dessa tutela específica, notadamente pela natureza das relações jurídicas de que cuida - relações existenciais de pessoas -, as quais reclamam mecanismos de tutela diferenciada. Realmente, a depender do caso concreto, pode o magistrado determinar forma alternativa de coerção para o pagamento dos alimentos, notadamente para assegurar ao menor, que sabidamente se encontra em situação precária e de vulnerabilidade, a máxima efetividade do interesse prevalente - o mínimo existencial para sua sobrevivência -, com a preservação da dignidade humana por meio da garantia de seus alimentos.
5. É plenamente possível que o magistrado, no âmbito da execução de alimentos, venha a adotar, em razão da urgência de que se reveste o referido crédito e sua relevância social, as medidas executivas do protesto e da inscrição do nome do devedor de alimentos nos cadastros de restrição ao crédito, caso se revelem como meio eficaz para a sua obtenção, garantindo à parte o acesso à tutela jurisdicional efetiva.
6. Isso porque: i) o segredo de justiça não se sobrepõe, numa ponderação de valores, ao direito à sobrevivência e dignidade do menor; ii) o rito da execução de alimentos prevê medida mais gravosa, que é a prisão do devedor, não havendo justificativa para impedir meio menos oneroso de coerção; iii) a medida, até o momento, só é admitida mediante ordem judicial; e iv) não deve haver divulgação de dados do processo ou do alimentando envolvido, devendo o registro se dar de forma sucinta, com a publicação ao comércio e afins apenas que o genitor é devedor numa execução em curso.
7. Ademais, o STJ já sedimentou o entendimento de ser "possível o protesto da sentença condenatória, transitada em julgado, que represente obrigação pecuniária líquida, certa e exigível" (REsp 750.805/RS, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, Terceira Turma, DJe 16/06/2009).
8. Trata-se de posicionamento já consagrado em legislações de direito comparado, sendo inclusive previsão do novo Código de Processo Civil, que estabeleceu expressamente a possibilidade do protesto e da negativação nos cadastros dos devedores de alimentos (arts. 528 e 782).
9. Na hipótese, o recorrido, executado na ação de alimentos, devidamente citado, não pagou o débito, sendo que, determinando-se diligências, não foram encontrados bens passíveis de penhora em seu nome. Portanto, considerando-se que os alimentos devidos exigem urgentes e imediatas soluções - a fome não espera -, mostram-se juridicamente possíveis os pedidos da recorrente, ora exequente, de protesto e de inclusão do nome do devedor de alimentos nos cadastros de proteção ao crédito (SPC e Serasa), como medida executiva a ser adotada pelo magistrado para garantir a efetivação dos direitos fundamentais da criança e do adolescente.
10. Recurso especial provido.
(REsp 1533206/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/11/2015, DJe 01/02/2016)
JURISPRUDÊNCIA NA ÍNTEGRA
RECORRENTE | : | A L C DE J (MENOR) |
ADVOGADOS | : | MARIA ANGELICA FELICIANO BARREIROS |
WELLISON CARLOS FONSECA CAMBUÍ | ||
REPR. POR | : | L R F DE C |
RECORRIDO | : | M R DE J |
ADVOGADO | : | DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS |
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
1. A. L. C. de J., representada por sua genitora, ajuizou ação de alimentos em face de M. R. de J., e como o devedor não pagou o débito alimentar nem foram encontrados bens passíveis de penhora, a exequente requereu a expedição de certidão de dívida judicial para fins de protesto e inscrição do nome do devedor nos cadastros de proteção ao crédito.
Quanto a esse ponto, sobreveio parecer favorável do Ministério Público local (fls. 43-44).
O magistrado de piso indeferiu os pedidos ao fundamento de que as relações oriundas do direito alimentar estariam cobertas pelo segredo de justiça, não guardando relação com as operações creditícias (fls. 45-46).
Interposto agravo de instrumento, o Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso, nos termos da seguinte ementa:
Opostos aclaratórios, o recurso foi rejeitado (fls. 120-124).
Irresignada, A. L. C. interpõe recurso especial com fulcro nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, por negativa de vigência aos arts. 3° do ECA, 165, 458, II e 535, II, do CPC.
Afirma que o acórdão foi omisso, especialmente no tocante ao prequestionamento da matéria.
Aduz que é prioritária a defesa dos direitos fundamentais da criança, especialmente a vida, a saúde e a alimentação, devendo-se buscar todas as medidas cabíveis para fazer valer o seu direito, até mesmo a inclusão do nome do executado nos órgãos de proteção ao crédito.
Salienta que se é cabível medida muito mais drástica, prisão civil, plenamente possível a negativação para a mesma finalidade.
Sustenta que a inclusão nos cadastros não acarreta violação ao segredo de justiça; ao revés, constrange o devedor ao pagamento da pensão em atraso.
Contrarrazões às fls. 146-168.
Instado a se manifestar, o membro do Ministério Público Federal opinou pelo não conhecimento do especial (fls. 225-233).
O recurso recebeu crivo de admissibilidade negativo na origem (fls. 170-172), ascendendo a esta Corte pelo provimento do agravo (fls. 206-207).
É o relatório.
RELATOR | : | MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO |
RECORRENTE | : | A L C DE J (MENOR) |
ADVOGADOS | : | MARIA ANGELICA FELICIANO BARREIROS |
WELLISON CARLOS FONSECA CAMBUÍ | ||
REPR. POR | : | L R F DE C |
RECORRIDO | : | M R DE J |
ADVOGADO | : | DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS |
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA E PROCESSUAL CIVIL. ALIMENTOS. EXECUÇÃO. PROTESTO E INCLUSÃO DO NOME DO DEVEDOR NOS CADASTROS DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO (SPC E SERASA). POSSIBILIDADE. FORMA DE COERÇÃO INDIRETA DO EXECUTADO. MÁXIMA EFETIVIDADE AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA CRIANÇA E ADOLESCENTE. MÍNIMO EXISTENCIAL PARA SOBREVIVÊNCIA.
1. A proteção integral está intimamente ligada ao princípio do melhor interesse da criança e adolescente, pelo qual, no caso concreto, devem os aplicadores do direito buscar a solução que proporcione o maior benefício possível para o menor. Trata-se de princípio constitucional estabelecido pelo art. 227 da CF, com previsão nos arts. 4° e 100, parágrafo único, II, da Lei n. 8.069⁄1990, no qual se determina a hermenêutica que deve guiar a interpretação do exegeta.
2. O norte nessa seara deve buscar a máxima efetividade aos direitos fundamentais da criança e do adolescente, especificamente criando condições que possibilitem, de maneira concreta, a obtenção dos alimentos para sobrevivência.
3. O art. 461 do CPC traz cláusula geral que autoriza o juiz, a depender das circunstâncias do caso em concreto, adaptar a técnica processual ao perfil do direito material, com vistas à formação de uma solução justa e adequada do conflito, possibilitando que, por meio de alguma medida executiva, se alcance a realização da justiça (CF, art. 5°, XXXXV).
4. O direito de família é campo fértil para a aplicação dessa tutela específica, notadamente pela natureza das relações jurídicas de que cuida - relações existenciais de pessoas -, as quais reclamam mecanismos de tutela diferenciada. Realmente, a depender do caso concreto, pode o magistrado determinar forma alternativa de coerção para o pagamento dos alimentos, notadamente para assegurar ao menor, que sabidamente se encontra em situação precária e de vulnerabilidade, a máxima efetividade do interesse prevalente - o mínimo existencial para sua sobrevivência -, com a preservação da dignidade humana por meio da garantia de seus alimentos.
5. É plenamente possível que o magistrado, no âmbito da execução de alimentos, venha a adotar, em razão da urgência de que se reveste o referido crédito e sua relevância social, as medidas executivas do protesto e da inscrição do nome do devedor de alimentos nos cadastros de restrição ao crédito, caso se revelem como meio eficaz para a sua obtenção, garantindo à parte o acesso à tutela jurisdicional efetiva.
6. Isso porque: i) o segredo de justiça não se sobrepõe, numa ponderação de valores, ao direito à sobrevivência e dignidade do menor; ii) o rito da execução de alimentos prevê medida mais gravosa, que é a prisão do devedor, não havendo justificativa para impedir meio menos oneroso de coerção; iii) a medida, até o momento, só é admitida mediante ordem judicial; e iv) não deve haver divulgação de dados do processo ou do alimentando envolvido, devendo o registro se dar de forma sucinta, com a publicação ao comércio e afins apenas que o genitor é devedor numa execução em curso.
7. Ademais, o STJ já sedimentou o entendimento de ser "possível o protesto da sentença condenatória, transitada em julgado, que represente obrigação pecuniária líquida, certa e exigível" (REsp 750.805⁄RS, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, Terceira Turma, DJe 16⁄06⁄2009).
8. Trata-se de posicionamento já consagrado em legislações de direito comparado, sendo inclusive previsão do novo Código de Processo Civil, que estabeleceu expressamente a possibilidade do protesto e da negativação nos cadastros dos devedores de alimentos (arts. 528 e 782).
9. Na hipótese, o recorrido, executado na ação de alimentos, devidamente citado, não pagou o débito, sendo que, determinando-se diligências, não foram encontrados bens passíveis de penhora em seu nome. Portanto, considerando-se que os alimentos devidos exigem urgentes e imediatas soluções - a fome não espera –, mostram-se juridicamente possíveis os pedidos da recorrente, ora exequente, de protesto e de inclusão do nome do devedor de alimentos nos cadastros de proteção ao crédito (SPC e Serasa), como medida executiva a ser adotada pelo magistrado para garantir a efetivação dos direitos fundamentais da criança e do adolescente.
10. Recurso especial provido.
VOTO
O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
2. Não se verifica a alegada violação aos arts. 165, 458, II, e 535, II, do Código de Processo Civil, uma vez que o Tribunal de origem se pronunciou de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos, nos limites do seu convencimento motivado e sem contradição.
De fato, basta ao órgão julgador que decline as razões jurídicas que embasaram a decisão, não sendo exigível que se reporte de modo específico a determinados preceitos legais, sendo certo que, nos moldes da jurisprudência desta Corte, como destinatário final da prova, cabe ao magistrado, respeitando os limites adotados pelo CPC, dirigir a instrução e deferir a produção probatória que considerar necessária à formação do seu convencimento.
3. A controvérsia principal está em definir se, na execução de alimentos de filho menor, são cabíveis os pedidos de protesto e de inscrição do nome do devedor de alimentos nos cadastros de proteção ao crédito, notadamente SPC e Serasa.
O Tribunal de Justiça entendeu pela inviabilidade, nos seguintes termos:
Destaco, de plano, que na hipótese de eventual dúvida em relação ao prequestionamento do especial, referido requisito deve ser mitigado em razão da relevância do tema de fundo em específico, inclusive tendo o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do AI n. 375011, Rel. Min. Ellen Gracie, realçado, em casos desse jaez, a possibilidade de relativização dos requisitos de admissibilidade (prequestionamento).
Aliás, o próprio recorrido reconhece a existência de intensa divergência entre os tribunais do País no tocante à referida questão de direito, realçando haver "orientação jurisprudencial de várias Cortes, no sentido de que não é possível a inclusão do nome do devedor de alimentos nos órgãos de proteção ao crédito, inclusive, em que pese a jurisprudência colacionada nos autos, em sentido contrário, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, essa mesma Corte possui posicionamento contrário, conforme jurisprudência" (fl. 162).
4. No mérito, é notória a mudança de paradigma ocorrida com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e, mais tarde, do Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, quando comparados com as legislações pretéritas referentes à infância e juventude.
A doutrina da proteção integral foi expressamente adotada em ambos os normativos, tendo-se estabelecido de forma ampla, e em cláusula aberta, os mecanismos jurídicos voltados à tutela da criança e do adolescente:
Deve-se realçar que a ideologia do ECA está em absoluta consonância com diplomas internacionais que já haviam deslocado o foco normativo do menor em situação irregular para o infante sob o ponto de vista de sua proteção integral, como é o caso da convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas, promulgada no âmbito interno pelo Decreto n. 99.710⁄1990, que acolhe a mesma doutrina jurídica:
No que concerne às ações do Estado direcionadas a assegurar a alimentação da criança, por seus pais ou pessoas por ela responsáveis, a citada Convenção traz norma expressa a respeito da obrigação alimentícia:
Deveras, a proteção integral está intimamente ligada ao princípio do melhor interesse da criança e adolescente, pelo qual, no caso concreto, devem os aplicadores do direito buscar a solução que proporcione o maior benefício possível para o menor.
Trata-se de princípio constitucional estabelecido pelo art. 227 da CF, com previsão nos arts. 4° e 100, parágrafo único, II, da Lei n. 8.069⁄1990, no qual se determina a hermenêutica que deve guiar a interpretação do exegeta, verbis:
Dessarte, o norte nessa seara deve buscar a máxima efetividade aos direitos fundamentais da criança e do adolescente, especificamente criando condições que possibilitem, de maneira concreta, a obtenção dos alimentos para sobrevivência.
5. Por outro lado, não se pode olvidar que o próprio Código de Processo Civil, como instrumento para alcance da prestação jurisdicional, estabelece diversos dispositivos que disponibilizam ao magistrado poderes processuais aptos a garantir a efetivação dos direitos.
O art. 461 do CPC traz cláusula geral que autoriza o juiz, a depender das circunstâncias do caso em concreto, adaptar a técnica processual ao perfil do direito material, com vistas à formação de uma solução justa e adequada do conflito, possibilitando que, por meio de alguma medida executiva, se alcance a realização da justiça (CF, art. 5°, XXXXV).
De fato, assevera a doutrina processualista:
Realmente, o intuito da lei processual foi justamente conferir maior amplitude de poderes, notadamente quanto à aplicação de medidas executivas, intensificando a participação do magistrado na elaboração da solução jurídica mais adequada ao caso, particularidades muitas vezes insuscetíveis de serem previstas pelo legislador, permitindo a efetiva distribuição de justiça, sempre tendo como lastro o princípio da proporcionalidade.
O direito de família é campo fértil para a aplicação dessa tutela específica, notadamente pela natureza das relações jurídicas de que cuida - relações existenciais de pessoas -, as quais reclamam mecanismos de tutela diferenciada.
Com efeito:
6. No mais, é consenso de toda a sociedade sobre a dificuldade, nos dias de hoje, em se garantir, com efetividade, o cumprimento da obrigação pelo devedor alimentar.
Nessa ordem de ideias, estabelecem o códex e a norma de regência (Lei n. 5.478⁄1968), com relação à execução de alimentos, diversas providências na busca do recebimento dos valores devidos: i) desconto em folha; ii) desconto em outros rendimentos; iii) constituição de garantia real ou fidejussória e de usufruto; iv) penhora de bens (coerção patrimonial); e v) prisão civil (coerção pessoal).
Ocorre que, a depender do caso concreto, pode o magistrado determinar forma alternativa de coerção para o pagamento dos alimentos, notadamente para assegurar ao menor, que sabidamente se encontra em situação precária e de vulnerabilidade, a máxima efetividade do interesse prevalente - o mínimo existencial para sua sobrevivência -, com a preservação da dignidade humana por meio da garantia de seus alimentos.
Isso porque a dignidade humana está erigida como valor máximo da Carta Magna, permeando todas as relações jurídicas, material e processual, com o fim de proteger o indivíduo em sua dimensão existencial.
7. Por isso, penso ser plenamente possível que o magistrado, no âmbito da execução de alimentos, venha a adotar, em razão da urgência de que se reveste o referido crédito e sua relevância social, as medidas executivas do protesto e da inscrição do nome do devedor de alimentos nos cadastros de restrição ao crédito, caso se revelem como meio eficaz para a sua obtenção, garantindo à parte o acesso à tutela jurisdicional efetiva.
Deveras, a doutrina corrobora com essa possibilidade:
De fato, como se tem constado na prática, os credores de pensão alimentícia não têm conseguido, por meio dos tradicionais meios executórios postos à sua disposição, satisfazer o seu direito com efetividade, sendo que esta medida de inclusão no rol de devedores é, muitas vezes, o meio coercitivo mais eficaz para que o devedor cumpra a obrigação, podendo, para muitos, ter carga coercitiva maior do que a própria prisão.
É de ter, ainda, que cabe ao magistrado prevenir ou reprimir a prática de atos atentatórios à dignidade da Justiça e partindo da "afirmação fundamental de que os alimentos constituem expressão concreta do princípio da dignidade humana e asseguram a própria subsistência da pessoa humana, é fácil depreender a natural exigência de um mecanismo ágil, célere, eficaz e efetivo de cobrança das prestações alimentícias. Até mesmo porque a relutância no cumprimento da obrigação alimentar coloca em xeque não apenas a efetividade de uma decisão judicial, mas o próprio direito à vida e o fundamento do ordenamento jurídico, que é a proteção do ser humano" (FARIAS, Cristiano Chaves de; e ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: direito das famílias, v. 6, Salvador: Juspodivm, 2013, p. 898).
De fato, o legislador constituinte, diante da colisão de direitos fundamentais entre os valores vida, saúde, dignidade e proteção integral do menor, ora alimentado, e os valores propriedade, liberdade e nome do devedor, alimentante, dá preponderância aos primeiros, ou seja, a sobrevivência do menor, por óbvio, deve prevalecer em detrimento da liberdade e intimidade (sigilo do nome) do devedor.
Rolf Madaleno, em ponderação lapidar, ao tratar da primazia do direito fundamental à tutela executiva de alimentos, leciona:
Somado a isso, é entendimento corrente de que "na hipótese de execução de alimentos não incide o princípio da menor onerosidade do devedor, que cede espaço à regra da máxima efetividade que deve tutelar o interesse do credor em situações como tais" (PAULA, Adriano Perácio. Aspectos da execução de alimentos à luz do código de processo civil reformado in: direito das famílias, organização Maria Berenice Dias. São Paulo: RT, 2009, p. 594).
8. Nessa ordem de ideias, não se verifica justificativa plausível para inviabilizar o protesto e a inscrição do nome do devedor alimentar no SPC ou no Serasa.
Primeiro, porque, como dito, o segredo de justiça não se sobrepõe, numa ponderação de valores, ao direito à sobrevivência e dignidade do menor; segundo, porque o rito da execução de alimentos prevê medida mais gravosa, que é a prisão do devedor, não havendo justificativa para impedir meio menos oneroso de coerção; terceiro, porque a medida, até o momento, só é admitida mediante ordem judicial; e quarto, porque não deve haver divulgação de dados do processo ou do alimentando envolvido, devendo o registro se dar de forma sucinta, com a publicação ao comércio e afins apenas que o genitor é devedor numa execução em curso.
Além disso, como sabido, o protesto é ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida (Lei n. 9.492⁄1997), já tendo o STJ sedimentado o posicionamento de ser "possível o protesto da sentença condenatória, transitada em julgado, que represente obrigação pecuniária líquida, certa e exigível" (REsp 750.805⁄RS, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, Terceira Turma, DJe 16⁄06⁄2009).
Em outro importante precedente, esta Casa assentou que:
Deve ser enfatizado, ainda, que o Provimento n. 3⁄2008 do Conselho da Magistratura de Pernambuco já determina o protesto de decisões irrecorríveis acerca de alimentos provisórios ou provisionais ou de sentença transitada em julgado, em sede de ação de alimentos.
No mesmo sentido, verificam-se o Provimento n. 52⁄2010 do Código de Normas da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul e o Provimento n. 8⁄2009 do Tribunal de Justiça de Goiás.
Trata-se, a propósito, de entendimento já consagrado em legislações de direito comparado - Argentina e Peru -, sendo inclusive previsão expressa do novo Código de Processo Civil, que estabeleceu a possibilidade do protesto e da negativação nos cadastros dos devedores de alimentos:
Ao comentar referidos dispositivos do novo CPC, Cassio Scarpinella esclarece:
9. Na hipótese, o recorrido, executado na ação de alimentos, devidamente citado, não pagou o débito, sendo que, determinando-se diligências, não foram encontrados bens passíveis de penhora em seu nome.
Portanto, considerando-se que os alimentos devidos exigem urgentes e imediatas soluções - a fome não espera –, mostram-se juridicamente possíveis os pedidos da recorrente, ora exequente, de protesto e de inclusão do nome do devedor de alimentos nos cadastros de proteção ao crédito (SPC e Serasa), como medida executiva a ser adotada pelo magistrado para garantir a efetivação dos direitos fundamentais da criança e do adolescente.
10. Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para autorizar tanto o protesto da dívida alimentar como a inscrição do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes.
É o voto.
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Com essas razões, dou provimento ao recurso especial, acompanhando o voto do Ministro Relator.
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RELATOR | : | MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO |
RECORRENTE | : | A L C DE J (MENOR) |
ADVOGADOS | : | MARIA ANGELICA FELICIANO BARREIROS |
WELLISON CARLOS FONSECA CAMBUÍ | ||
REPR. POR | : | L R F DE C |
RECORRIDO | : | M R DE J |
ADVOGADO | : | DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS |
DOU PROVIMENTO ao recurso especial.