Jurisprudência - STJ

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS PREVENTIVO. PRISÃO CIVIL.

Por: Equipe Petições

Facebook icon
e-mail icon
WhatsApp

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS PREVENTIVO. PRISÃO CIVIL. ALIMENTOS. ART. 733, § 1º, CPC. SÚMULA Nº 309/STJ. AÇÃO DE EXONERAÇÃO. OBRIGAÇÃO ALIMENTAR. AÇÃO DE EXECUÇÃO ANTERIOR. IRRETROATIVIDADE.

1. A decretação da prisão do alimentante, nos termos do art. 733, § 1º, do CPC, revela-se cabível quando não adimplidas as três últimas prestações anteriores à propositura da execução de alimentos, bem como as parcelas vincendas no curso do processo executório, nos termos da Súmula nº 309/STJ, sendo certo que o pagamento parcial do débito não elide a prisão civil do devedor.

2. Os alimentos são devidos até o trânsito em julgado da ação de exoneração.

3. O reconhecimento judicial de exoneração do dever alimentar não dispõe de efeito retroativo, não alcançando as parcelas vencidas e não pagas de dívida reconhecida judicialmente em ação de execução, sob pena de privilegiar o devedor de má-fé.

4. Recurso ordinário não provido.

(RHC 35.192/RS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/03/2013, DJe 18/03/2013)

 

Facebook icon
e-mail icon
WhatsApp

JURISPRUDÊNCIA NA ÍNTEGRA

 
RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 35.192 - RS (2013⁄0005873-0)
 
RELATÓRIO
 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): Trata-se de recurso ordinário interposto por RENATO UCHA MOREIRA, com fulcro no art. 105, inciso II, alínea "a", da Constituição Federal em favor de A. G. da R. (paciente) contra acórdão proferido em sede de habeas corpus pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, assim ementado:

"HABEAS CORPUS PREVENTIVO. DÍVIDA DE ALIMENTOS. ILEGALIDADE INEXISTENTE. 1. Não se verificando qualquer ilegalidade ou abuso de poder por parte da autoridade coatora, impõe-se a denegação da ordem. 2. A lei prevê a prisão civil para o caso de inadimplemento da obrigação alimentar e eventuais pagamentos parciais não impedem a sua decretação. 3. Descabe questionar na via restrita do remédio heróico se o valor dos alimentos está adequado ou não às condições econômicas do devedor, pois para isso se destinam as ações revisionais. Ordem denegada" (fl. 1 e-STJ).
 

Noticiam os autos que o ora recorrente impetrou habeas corpus preventivocom pedido liminar, contra decisão do Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Santana do Livramento⁄RS que nos autos de execução de alimentos, proposta por R. N. C. R., decretou a prisão do paciente. Sustentou que A. G. da R. foi exonerado do encargo alimentar por meio de sentença trânsita, e que, a ordem de constrição pessoal a seu ver, versa respeito de dívida inexistente.

O Juízo monocrático, instado a se manifestar, informou que, "em que pese o paciente tenha sido exonerado do dever de pagar alimentos à filha no processo nº 025⁄1.08.0003738-3, ainda persiste a obrigação de pagar o débito alimentar no valor total de R$ 7.132,18, relativo a parcelas vencidas antes do julgamento da referida ação, motivo pelo qual o executado foi intimado para o pagamento da dívida objeto da presente execução, sob pena de prisão" (e-STJ fl. 56).

O Tribunal de origem denegou a ordem pleiteada nos termos da seguinte fundamentação:

"(...) Com efeito, não existe qualquer ilegalidade ou abuso de poder de parte da autoridade apontada como coatora, cumprindo gizar que o executado não justificou de forma satisfatória a sua impossibilidade de prestar os alimentos judicialmente fixados, sendo que foram observadas, rigorosamente, todas as formalidades legais.
O fato de o devedor acenar uma situação financeira delicada ou que foram reduzidas as suas possibilidades momentaneamente ou que a alimentanda não mais necessita, não o eximem do pagamento integral dos alimentos nem excluem a existência do débito, como também não têm o condão de suspender o cumprimento do decreto prisional.
Sendo verídica e passível de comprovação a situação alegada, caberia ao alimentante propor a devida ação revisional, a fim de adequar a obrigação às suas condições, pois na via ordinária própria é que tem lugar tal discussão, e não no âmbito restrito do remédio heróico.
Aliás, pelo que informa o próprio impetrante a questão relativa ao quantum dos alimentos já foi submetida ao crivo judicial, sendo o alimentante exonerado do encargo alimentaNo entanto, decisão lançada não tem o condão de retroagir, isto é, em nada afeta o curso da presente ação de execução.
Descabe, pois, na via restrita do writ, apreciar o binômio possibilidade e necessidade, cuidando-se, aqui, apenas e tão-somente da questão atinente à legalidade ou ilegalidade do decreto de prisão.
E, no caso, a prisão não se afigura ilegal, cumprindo deixar claro, que a orientação jurisprudencial é uníssona no sentido de que é possível a cobrança sob pena de prisão civil de todos os alimentos vencidos no curso do processo, além daqueles vencidos nos três meses anteriores ao ajuizamento da execução. Não é demasiado lembrar, ainda, que o eventual pagamento parcial da dívida também não constitui óbice à segregação.
Não existe, pois, qualquer ilegalidade ou abuso de poder de parte da autoridade coatora, tendo sido observadas, rigorosamente, todas as formalidades legais. Inaceitável – isto sim - é a conduta de suspender os pagamentos ou fazê-lo de forma irregular.
Finalmente, friso que, ao que se infere, a dívida existe, é líquida, certa e exigível, e o decreto prisional decorrente da execução de alimentos proposta está prevista na lei, sendo forma capaz de compelir o devedor a honrar com o pagamento dos alimentos devidos" (e-STJ fls. 62-67).
 

Nas razões do presente recurso ordinário, sustenta o impetrante a existência de sentença proferida nos autos da ação de exoneração de alimentos nº 025⁄1.08.0003738-3, na qual o paciente foi definitivamente liberado da obrigação de pagar pensão à R. N. C. da R., motivo por que entende que "não há falar em prisão civil no processo de execução de alimentos, impondo-se a extinção do feito executivo ou, em último caso, na conversão do rito processual para o previsto no artigo 732 do CPC" (fl. 80), cujo valor já soma a quantia de R$ 7.132,18 (sete mil cento e trinta e dois reais e dezoito centavos). Aduz ter sido proposta a ação de exoneração antes de sua filha ajuizar a ação de execução e que tendo sido julgado procedente o pedido de liberação de pagamentos futuros, em 4.4.2012 (trânsito em 14.5.2012), a dívida não mais pode ser exigida.

Assim, requer o afastamento da medida constritiva de liberdade, pois a "dívida cobrada é inexistente, uma vez que o trânsito em julgado da ação exoneratória, proposta antes do ingresso da execução, retira a atualidade da dívida alimentar executada, não se adequando mais ao rito da coerção pessoal" (e-STJ fl. 82).

O Ministério Público Federal, em parecer, opinou pelo não provimento do recurso, nos termos assim sintetizados:

"RECURSO EM HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PRISÃO. EXISTÊNCIA DE AÇÃO DE EXONERAÇÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. EFEITOS A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO. DÍVIDA.  SUBSISTÊNCIA. EXIGIBILIDADE DA EXECUÇÃO ALIMENTAR. PRECEDENTES. PARECER PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO" (fl. 95 e-STJ - grifou-se).
 

É o relatório.

 
 
RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 35.192 - RS (2013⁄0005873-0)
 
 
VOTO
 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): O recurso ordinário não comporta provimento.

Preliminarmente, revela-se cabível a decretação da prisão do alimentante, nos termos do art. 733, § 1º, do Código de Processo Civil, quando não adimplidas as três últimas prestações anteriores à propositura da execução de alimentos, bem como daquelas vincendas no curso do processo executório, consoante entendimento sumulado por esta Corte Superior no verbete nº 309: "O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo."

Na hipótese dos autos, o impetrante não comprovou o pagamento integral dos valores devidos pelo paciente a partir da propositura da execução dos alimentos, conforme assentado nas informações prestadas pelo juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Santana do Livramento⁄RS:

"(...) em que pese o paciente tenha sido exonerado do dever de pagar alimentos à filha no processo nº 025⁄1.08.0003738-3, ainda persiste a obrigação de pagar o débito alimentar no valor total de R$ 7.132,18, relativo a parcelas vencidas antes do julgamento da referida ação, motivo pelo qual o executado foi intimado para o pagamento da dívida objeto da presente execução, sob pena de prisão" (e-STJ fl. 56 - grifou-se). 
 

Assim, o paciente permanece em atraso com a obrigação alimentar, mantida incólume porquanto anterior à exoneração do dever (a partir de 14.5.2012), como bem esclarecido no parecer ministerial:

"(...) In casu, conforme aponta o d. representante do Ministério Público estadual, às fls. 58⁄61, os valores reclamados referem-se a parcelas dos meses de novembro de dezembro de 2008 e janeiro de 2009, bem como as que se vencerem durante o curso da ação (fls. 07 e 33), ou seja, são anteriores ao julgamento da ação de exoneração ajuizada pelo ora paciente" (e-STJ fl. 97).
 

O acórdão recorrido, ao assentar que a propositura de demanda que visa a exclusão do pagamento da pensão alimentícia (art. 1.699 do Código Civil) não obsta a execução das parcelas já vencidas, cobradas sob o rito do art. 733 do CPC, decidiu em consonância com a jurisprudência deste Tribunal Superior, como se colhe das ementas dos seguintes arestos:

"HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS. ENFRENTAMENTO DA MATÉRIA EM WRIT ANTERIOR. PREJUDICADO. NÃO CONHECIMENTO. AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS. PARCELAS ATRASADAS. EFEITOS NÃO EXTENSIVOS. DECRETO PRISIONAL. LEGALIDADE.
I - Prejudicado é o pedido de habeas corpus requerido com supedâneo em fundamentos já apreciados em writ anterior.
II - Os efeitos da sentença redutora ou supressora na ação de exoneração de alimentos não alcançam parcelas atrasadas.
III - Conhecimento parcial e ordem denegada" (HC nº 152.700⁄SP, Rel. Ministro PAULO FURTADO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄BA), TERCEIRA TURMA, julgado em 18⁄03⁄2010, DJe 26⁄03⁄2010).
 
"HABEAS CORPUS CONTRA DECISÃO LIMINAR EM OUTRO HABEAS CORPUS . NÃO CABIMENTO. DECRETO DE PRISÃO EM EXECUÇÃO DE ALIMENTOS.  PRESTAÇÕES ALIMENTÍCIAS. AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS.
- Não compete ao Superior Tribunal de Justiça  conhecer de 'habeas corpus' impetrado contra decisão de relator que indefere a liminar em outro em 'habeas corpus'.
Os alimentos são devidos até o trânsito em julgado da ação de exoneração.
(HC nº 132.447⁄SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 04⁄03⁄2010, DJe 22⁄03⁄2010 - grifou-se).
 
"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. AÇÃO DE EXONERAÇÃO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. EFEITOS. MOMENTO. TRÂNSITO EM JULGADO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E, NO PONTO, PROVIDO.
Em mais de uma oportunidade esta Corte se manifestou no sentido de que os efeitos da exoneração da pensão alimentícia não retroagem à data da citação, mas apenas têm incidência a partir do transito em julgado da decisão.
Recurso especial conhecido em parte e, no ponto, provido, julgando improcedentes os embargos à execução" (REsp nº 886.537⁄MG, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 08⁄04⁄2008, DJe 25⁄04⁄2008 - grifou-se).
 
"CIVIL. HABEAS CORPUS. PENSÃO ALIMENTÍCIA. NECESSIDADE. QUITAÇÃO. INTEGRALIDADE. LEGALIDADE. PRISÃO. DILAÇÃO PROBATÓRIA. VIA INADEQUADA. AÇÃO DE EXONERAÇÃO NÃO TRANSITADA EM JULGADO. ALIMENTOS DEVIDOS.
1. Faz-se necessária a quitação integral das três últimas parcelas anteriores ao ajuizamento da execução, acrescidas das vincendas, para que seja afastada a aplicação do disposto no art. 733, § 1º, do CPC, providência não adotada na espécie. Precedentes.
2. Eventuais justificativas cifradas em aspectos de índole fático-probatória, como eventual incapacidade financeira do paciente, bem como existência de dívida da executada não saldada, não se submetem à augusta via do writ.
3. Até o trânsito em julgado da ação de exoneração, os alimentos são devidos.
4. Ordem denegada" (HC nº 87.036⁄RJ, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 06⁄12⁄2007, DJ 17⁄12⁄2007 - grifou-se).
 

Não se desconhece que a Segunda Seção desta Corte está examinando a questão do alcance dos efeitos da decisão que exonera ou reduz a pensão alimentícia no EREsp nº 1.181.119⁄RJ, de relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, com atual pedido de vista da Ministra Maria Isabel Gallotti. Contudo, até o encerramento do referido julgamento impõe-se aplicação da jurisprudência majoritária desta Corte que mitiga a literalidade do artigo 13, § 2º da Lei nº 5.478⁄68.

Registre-se que a hipótese versa sobre parcelas atrasadas, já consolidadas  desde novembro de 2008 (e-STJ fl. 97), antes mesmo do julgamento da ação de exoneração, cuja procedência, a posteriori, não pode representar verdadeira liberação do devedor de dívida alimentar reconhecida judicialmente como devida à sua filha maior (27 anos), sob pena de beneficiar quem deliberadamente não cumpre o dever de pagamento dos alimentos pela mera expectativa de futura isenção. A injustificada omissão, neste caso, privilegiaria o devedor de má-fé.

Nesse sentido, corroborando o entendimento esposado nos apontados precedentes desta Corte, cite-se abalizada doutrina:

"As demandas revisionais devem adotar o procedimento da Lei de Alimentos (13). O ingresso da demanda não autoriza o devedor a reduzir o valor dos alimentos ou a deixar de pagá-los. A alteração do encargo depende de chancela judicial. A propositura da ação também não enseja a suspensão do processo de execução. Achatado o valor dos alimentos ou extinta a obrigação, a sentença não dispõe de efeito retroativo, não alcançando as parcelas vencidas e não pagas. Admitir a possibilidade de fazer retroagir o valor fixado a menor - ou até na hipótese de exclusão dos alimentos - alcançando as parcelas vencidas e não pagas incentivaria o inadimplemento. Como os alimentos, repita-se, são irrepetíveis, aquele que pagou o valor devido até a data da decisão não teria como reaver as diferenças. Somente seria beneficiado quem não pagou a verba alimentar, aquele que se quedou inadimplente à espera da sentença. Dita solução, às claras, afrontaria o princípio da igualdade.
A propositura da ação revisional intentada pelo alimentante não pode incentivá-lo a deixar de pagar os alimentos ou a proceder à redução do seu valor do modo que melhor lhe aprouver. Admitir tal possibilidade daria ensejo, inclusive, à suspensão do processo de execução, até o trânsito em julgado da demanda revisional, sob o fundamento de que o encargo alimentar pode ser reduzido ou excluído. Assim, não há como conceder efeito retroativo à redução ou exclusão do dever de pagar alimentos. O resultado seria desastroso. Além de incentivar a mora, induziria a todos que são executados a buscarem a via judicial, propondo ação de redução ou exclusão do encargo, tão só para verem a execução suspensa.
A regra do § 2º do art. 13 da Lei de Alimentos não tem aplicação quando os alimentos foram reduzidos ou houve a exoneração do devedor. Prevalece o princípio da irrepetibilidade dos alimentos. Portanto, achatado o seu montante ou extinta a obrigação, a decisão judicial não dispõe de efeito retroativo, não alcançando as parcelas vencidas e não pagas. Somente quando os alimentos são majorados, por meio de sentença transitada em julgado, é que se pode falar em efeito retroativo à data da citação.
Qualquer outra solução geraria impasse absolutamente desarrazoado. Primeiro estimularia o devedor a deixar de proceder ao pagamento dos alimentos ao intentar demanda revisional ou exoneratória, para se beneficiar do efeito retroativo da sentença e deixar de pagar o valor devido.
A retroatividade aceita por alguns julgados não leva sequer em conta que pune o alimentante que cumpre com o pagamento e beneficia o devedor inadimplente. Vetada a devolução das parcelas pagas, o que pagou não pode pleitear a compensação, enquanto aquele que se quedou em mora irá beneficiar-se com o descumprimento do encargo alimentar. Assim, por qualquer ângulo que se atente ao tema, não é possível deixar ao bel-prazer do devedor o direito de suspender o pagamento dos alimentos para se beneficiar de sua omissão" (Maria Berenice Dias, Manual de Direito das Famílias, 6ª edição, Editora Revista dos Tribunais,  pág. 584 - grifou-se).
 

Ante o exposto, nego provimento ao recurso ordinário.

É como voto.